A fio d'�gua, atrav�s do Pantanal, a maior plan�cie alagada do mundo, o bi�logo brasileiro Fernando Tortato esquadrinha a margem, em busca de algum sinal da presen�a de Ousado, uma on�a gravemente queimada nos inc�ndios que devastaram o bioma no ano passado.
Mil quil�metros mais ao norte, �s margens da floresta amaz�nica, Roberto Eduardo Stofel observa com bin�culos uma aguieta, filhote de �guia, sozinha em seu ninho, enquanto seus pais penam para encontrar comida.
A majestosa on�a e o espetacular gavi�o-real (tamb�m conhecida como harpia) s�o duas entre as esp�cies mais emblem�ticas amea�adas pela acelera��o da destrui��o da Amaz�nia, cuja biodiversidade extraordin�ria corre o risco de desaparecer quando a floresta tropical alcan�ar seu "ponto de inflex�o".
Para os cientistas este ser� o est�gio em que um ciclo vicioso de desmatamento e inc�ndios florestais secar� a floresta, que se tornar� savana - com as consequ�ncias catastr�ficas para as tr�s milh�es de esp�cies de plantas e animais que ela abriga.
- O desaparecimento dos 'rios voadores' -
A on�a e o gavi�o-real j� come�am a sofrer.
Ousado, um macho de quatro anos e 75 quilos, ficou ferido h� um ano em queimadas que devastaram o Pantanal, em plena esta��o seca.
Esta imensa regi�o de pradarias e savana inundadas, que margeia o sul da Amaz�nia, atrai turistas de todo o mundo pela riqueza de sua fauna selvagem.
Mas perto de um ter�o do territ�rio se incendiou no ano passado, e uma multid�o de animais morreram ou ficaram feridos, entre eles Ousado, resgatado com queimaduras de terceiro grau nas patas, mal conseguindo caminhar.
Veterin�rios levaram o felino com manchas amarelas e pretas para uma cl�nica especializada, o trataram e depois o reintroduziram na natureza com uma coleira de GPS para acompanhar sua recupera��o - aparentemente, est� em boas condi��es.
A destrui��o do Pantanal, explica Tortato, � diretamente ligada � da Amaz�nia. Gra�as a suas 390 bilh�es de �rvores, a floresta tropical produz vapor d'�gua que leva chuvas para grande parte da Am�rica do Sul no fen�meno conhecido como "rios voadores".
Como rios de neblina, sobem para o c�u para formar vastas nuvens semelhantes a algod�o. Estes "rios flutuantes" transportam mais �gua do que o pr�prio rio Amazonas.
Derrubar a floresta para abrir espa�o para a agricultura e a pecu�ria diminui "a quantidade de �gua que poderia chegar no Pantanal" atrav�s dos rios voadores, explica Tortato, de 37 anos, membro do grupo ambientalista Panthera.
Considerada como "quase amea�ada", a on�a, o maior felino das Am�ricas, tem seu h�bitat na Amaz�nia. Mas nas duas �ltimas d�cadas, sua popula��o diminuiu entre 20% a 25%.
- Amea�a de fome -
Conhecido por sua envergadura imponente, as garras potentes e os tufos de plumas na cabe�a, o gavi�o-real �, assim como a on�a, um dos maiores predadores da Amaz�nia.
Pode chegar a pesar 10 quilos e ataca com precis�o as presas que ca�a na floresta: pregui�as, macacos e at� mesmo cerv�deos.
Mas apesar de seus talentos para ca�ar, os gavi�es-reais s�o amea�ados pela fome.
S�o necess�rios cerca de dois anos para que estas aves de rapina, de cor cinza e branca e que formam casal com o mesmo indiv�duo por toda a vida, criem seus filhotes.
Criam um de cada vez e precisam de um territ�rio enorme para ca�ar suficientemente.
Um estudo recente revelou que os gavi�es-reais n�o conseguem sobreviver em uma regi�o desmatada em mais de 50% - o que se torna cada vez mais frequente nos confins da Amaz�nia.
"Est� correndo um grande risco de extin��o por desmatamento e abates de madeira" nesta regi�o, diz Stofel, de 43 anos, que trabalha em um programa de preserva��o dos gavi�es reais em Cotrigua�u, no Mato Grosso.
A regi�o fica no famoso "arco do desmatamento". Em uma met�fora pungente da situa��o cr�tica destas �guias, jornalistas da AFP viram uma ave se alimentar da carne deixada para ela perto de um caminh�o carregado com troncos gigantescos de �rvores retiradas da floresta.
"N�s j� acompanhamos ninhos, fazendo monitoramento, em que o filhote morreu de fome porque os pais n�o conseguiram ca�ar. N�o tinha o suficiente", diz Stofel.
- Quest�o de sobreviv�ncia (a nossa) -
� crucial proteger a biodiversidade amea�ada da Amaz�nia e n�o apenas pela fauna e flora, diz Cristiane Mazzetti, da ONG ambientalista Greenpeace.
A natureza tem um papel essencial na capacidade do planeta de fornecer alimento, oxig�nio, �gua, poliniza��o e uma mir�ade de outros servi�os ambientais dos quais a vida precisa.
"A biodiversidade, uma vez que voc� perde, n�o ressuscita de novo", diz Mazzetti. "Manter a biodiversidade � importante para nossa pr�pria sobreviv�ncia".