
Muitos trabalhadores est�o reavaliando sua rela��o entre trabalho e vida pessoal e tentando dar uma pausa para se recuperar. Apesar disso, muitos ainda t�m dificuldades em solicitar dias de folga.
A quantidade de f�rias remuneradas que trabalhadores recebem varia ao redor do mundo, mas aqueles baseados nos Estados Unidos parecem estar entre os mais relutantes a tirar folga.
Os trabalhadores americanos geralmente t�m direito a menos f�rias remuneradas que os de na��es europeias (n�o h� um n�mero nacional m�nimo de dias estabelecido por lei nos EUA). Ainda assim, segundo um levantamento de 2017, o trabalhador m�dio dos EUA disse que havia tirado cerca da metade (54%) das f�rias a que tinha direito nos 12 meses anteriores.
E as coisas parecem ter piorado. Em 2018, um relat�rio mostrou que trabalhadores americanos deixaram de usar 768 milh�es de dias de folga remunerada - um aumento de 9% em rela��o a 2017.
Est� claro, no entanto, que os trabalhadores americanos querem mais dias de folga.
Uma pesquisa de 2019 mostrou que um em tr�s americanos aceitaria uma redu��o de sal�rio para ter dias ilimitados de folga - pol�tica em que o funcion�rio negocia as f�rias com seu chefe direto, de acordo com a necessidade e viabilidade.
Empregadores t�m respondido a esse interesse: no site de empregos Indeed, as ofertas de emprego sem limites para f�rias aumentaram 178% de maio de 2015 a maio de 2019. Mas o levantamento mostra que, mesmo em casos em que os trabalhadores podem tirar quanto tempo de f�rias quiserem, eles tendem a tirar menos dias de folga que empregados com um n�mero determinado de dias.
Se todos os sinais apontam na dire��o de que folgas remuneradas s�o necess�rias e encorajadas, por que tantos trabalhadores nos EUA ainda deixam de tirar todo o seu per�odo de f�rias? A resposta est� na complexa mistura de press�es profissionais e valores culturais que, combinados, mant�m os trabalhadores americanos presos a suas mesas de trabalho - mesmo que eles prefiram n�o estar ali.
O papel da cultura corporativa
Mundo afora, um determinante chave sobre se empregados sentem-se confiantes para tirar todas as suas f�rias � a cultura corporativa. Chefes que valorizem comportamentos saud�veis incentivar�o seus funcion�rios a sair de f�rias, enquanto chefes que valorizem a presen�a f�sica v�o impedi-los.
Em ambientes de trabalho muito competitivos, funcion�rios que saem de f�rias temem ser tratados de forma ruim ou perder futuras oportunidades. Um estudo de 2018 mostrou que uma das principais raz�es pelas quais funcion�rios americanos n�o tiravam folga era o medo de ser vistos como substitu�veis.
Christie Engler, diretor de recursos humanos da Consolidated Employer Services, empresa de solu��es de RH baseada em Powell, no Estado americano de Ohio, diz: "Eles podem ser descartados ou vistos negativamente por seu chefe e por outros no escrit�rio. J� vi l�deres fazendo as pessoas se sentirem mal por tirar folga".
Engler afirma que essa cultura � claramente diferente no setor p�blico, em que professores, por exemplo, t�m f�rias determinadas e sindicatos fortes.
No setor privado, por�m, a amea�a � real. A associa��o de turismo dos EUA identificou que 28% das pessoas n�o tiraram f�rias em 2014 puramente para demonstrar dedica��o a seu emprego e n�o ser visto como um "slacker" - um pregui�oso.
"Culturalmente, nos EUA, n�s consideramos sair de folga o mesmo que pedir demiss�o ou n�o ter uma boa �tica profissional", afirma Joey Price, CEO de uma consultoria de RH baseada em Baltimore.
"H� um estigma em torno da ideia de n�o trabalhar."
Esse medo de que chefes considerem que algum funcion�rio n�o esteja comprometido com o trabalho de forma adequada � t�o predominante que pode at� levar empregados a enganarem seus empregadores em vez de pedir f�rias diretamente.
Em 2019, uma pesquisa com trabalhadores americanos mostrou que mais de um em tr�s que responderam admitir ter fingido estar doente para conseguir tirar um dia de folga, e 27% optaram por "inventar uma hist�ria qualquer" em vez de pedir pela folga com anteced�ncia.
'Voc� tem que ralar'
Mesmo que uma empresa n�o impe�a funcion�rios de sa�rem de f�rias, em muitos ambientes de trabalho "trabalhar o m�ximo poss�vel � algo abra�ado como uma medalha de honra", afirma Engler.
Um estudo de 2019 mostrou que tanto conservadores como liberais dos EUA acreditam, igualmente, na import�ncia de se trabalhar duro para atingir sucesso.
A press�o pelo bom desempenho n�o � apenas uma expectativa moral;
predominantemente, trabalhadores nos EUA acreditam que oferecer um "desempenho excelente" � a melhor maneira de conseguir um aumento de sal�rio.
Isso pode facilmente levar a excesso de trabalho - algo que Michael Komie, psicanalista e professor de psicologia cl�nica na cidade de Chicago, descreve como "um problema de sa�de p�blica" nos Estados Unidos.
Em alguns ambientes de trabalho, cumprir suas horas de trabalho previstas � apenas o come�o. Pesquisas mostram que uma presen�a constante no lugar de trabalho e passar "tempo passivo cara a cara" com colegas, durante e fora das horas regulares de trabalho, podem fazer com que funcion�rios tenham mais chances de ser vistos como confi�veis e comprometidos.
Price afirma que isso cria uma din�mica em que "voc� tem que ralar, voc� tem que trabalhar at� altas horas, voc� tem que estar no pr�dio para que o chefe veja que voc� est� trabalhando".
Nesse contexto, o n�mero de dias de folga que um funcion�rio tem em seu contrato pode n�o importar. De fato, estudos mostraram que trabalhadores americanos com contratos que incluem f�rias ilimitadas �s vezes tiram menos dias que aqueles com planos tradicionais, se a empresa n�o promover uma cultura que encoraje ou exija que funcion�rios tirem f�rias.
Alguns cr�ticos acreditam que folgas remuneradas ilimitadas na verdade desestimulam os trabalhadores a sair de f�rias, porque a falta de regras formais sobre quantos dias algu�m pode ficar de folga pode deixar um v�cuo que � facilmente preenchido pela press�o para continuar trabalhando.
Empresas enxutas
Trabalhadores tamb�m podem enfrentar pr�ticas profissionais arraigadas que n�o permitem facilmente que eles tirem folgas.
Empresas podem ser estruturadas com equipes enxutas, o que significa que colegas n�o podem cobrir a aus�ncia de um funcion�rio devido a sua pr�pria carga de trabalho ou n�o t�m conhecimento suficiente para assumir suas tarefas. Nesse caso, tirar folga significa ter uma montanha de trabalho a fazer quando voc� retorna ou sobrecarregar colegas com tarefas adicionais.
Esse tipo de modelo enxuto � um legado negativo do ideal tradicional de trabalho americano, diz Price.
"N�s ainda estamos tentando aplicar na era do trabalhador de conhecimento os princ�pios de gerenciamento que eram eficazes na era da ind�stria e linhas de montagem. O sistema de trabalho n�o � desenhado para pessoas tirarem dias de f�rias, e o resultado final que as pessoas veem quando algu�m sai de folga � que seu departamento est� ficando para tr�s."

Isso leva algumas pessoas a sentir que tirar folga vai refletir t�o mal neles mesmos e em sua equipe que simplesmente n�o vale a pena. "O estresse, a culpa ou a vergonha que as pessoas sentem por tirar f�rias � muito real. Ent�o eles simplesmente engolem e seguem trabalhando", afirma Price.
Sentir-se amarrado a sua mesa de trabalho pode inclusive levar alguns funcion�rios a achar que s�o indispens�veis.
"O empregado tem a fantasia de que � t�o importante para o que faz que ele vai deixar o empregador na m�o se n�o estiver l�", explica Komie.
Poucos trabalhadores s�o t�o particularmente talentosos ou t�m um conhecimento t�o �nico que apenas eles podem desempenhar suas fun��es, mas essa fantasia pode se misturar com a realidade quando um plano ruim significa que o fluxo de trabalho � interrompido quando um funcion�rio espec�fico est� ausente porque ningu�m mais pode realizar suas tarefas.
Uma consequ�ncia disso � que, caso consiga sair de f�rias, a maioria dos americanos acaba levando trabalho junto. Um estudo de 2017 mostrou que 66% dos trabalhadores dos EUA relataram ter trabalhado durante suas f�rias, com 29% respondendo a solicita��es de colegas, e 25% a pedidos de seus chefes.
N�o surpreende, ent�o, que, em vez de ajudar a reduzir o estresse, "nos EUA ficar distante do trabalho pode produzir ansiedade", afirma Komie.
'Conversas mais saud�veis'
Atualmente, o movimento conhecido como o "Grande Pedido de Demiss�o" (profissionais deixando empregos ap�s a pandemia, em busca de uma melhor qualidade de vida) est� for�ando empresas dos EUA a repensar como elas podem reter trabalhadores - mas estes ainda n�o parecem dar prioridade �s f�rias remuneradas.
Uma pesquisa de 2021 sobre satisfa��o de trabalhadores mostrou que, apesar de estar descontentes com a quantidade de f�rias remuneradas que recebiam, eles estavam ainda mais descontentes com o estresse no trabalho, o sal�rio, os benef�cios de aposentadoria e assist�ncia de sa�de e oportunidades de promo��o.
Price acredita que empresas estejam respondendo �s demandas de alguns trabalhadores - trabalho flex�vel, por exemplo - porque mudan�as no ambiente de trabalho impostas durante a crise da pandemia fizeram com que elas parecessem uma possibilidade realista. Enquanto isso, a conversa a respeito de folga remunerada n�o avan�ou muito, embora a demanda esteja come�ando a crescer.

Price introduziu recentemente em sua empresa o modelo de f�rias remuneradas ilimitadas, juntamente com um "sistema de trabalho para dar apoio � aus�ncia", para reter e atrair trabalhadores altamente qualificados.
Num n�vel pr�tico, isso significa garantir que pelo menos duas pessoas da equipe tenham conhecimento sobre todos os projetos, planejamento de futuro para lidar com aus�ncias e fazer com que seus clientes estejam cientes de que tempos de f�rias s�o considerados nos prazos finais dos projetos.
Mais que qualquer coisa, por�m, ele diz que os funcion�rios precisam sentir-se apoiados para tirar f�rias em vez de ficar preocupados com a possibilidade de serem penalizados por isso.
"O primeiro passo � ter conversas mais saud�veis sobre dias de folga, para que as pessoas n�o sintam o estigma", afirma ele. Isso come�a com empregadores enviando uma mensagem clara: "Tudo bem tirar um dia de folga. N�s n�o vamos julg�-lo negativamente por isso".
Tamb�m existe esperan�a de que uma legisla��o a respeito de f�rias remuneradas e uma maior consci�ncia sobre riscos para a sa�de mental do excesso de trabalho possam ser catalisadoras para uma mudan�a.
"H� muitos estudos que mostram que precisamos tirar folga, precisamos ter uma boa sa�de mental, e sistemas de trabalho que sejam mais emp�ticos levam a uma cultura de ambiente de trabalho mais produtiva", acrescenta Price.
At� que essa mensagem seja espalhada pelo pa�s, empregados nos EUA que queiram passar menos tempo no trabalho podem ter que procurar lugares para trabalhar em que tirar folga n�o seja visto como um pedido especial.
� uma li��o da qual trabalhadores do mundo tamb�m devem ficar cientes, mesmo que em muitos lugares haja menos press�o para abrir m�o das folgas. Afinal, todo mundo precisa de uma pausa.
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