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Estado de Minas REVOLTA

Guerra na Ucr�nia: Qual a chance de insurg�ncia popular ucraniana contra o ex�rcito russo?

Algumas cenas sugerem que a guerra dos ucranianos contra o invasor russo j� tem um car�ter insurrecional, irregular ou de guerrilha.


17/03/2022 08:42 - atualizado 17/03/2022 12:30


Civis preparam coquetéis molotov e treinam em meio a ataques russos em Lviv, na Ucrânia, em 08 de março de 2022
Cenas como esta mostram que a guerra dos ucranianos contra o invasor russo j� tem um car�ter insurrecional (foto: Alejandro Martinez/Anadolu Agency via Getty Images)

O presidente da Ucr�nia, Volodymyr Zelensky, conclama compatriotas a resistir � invas�o russa at� o autossacrif�cio. O ex-presidente Petro Poroshenko empunha, em entrevista de TV, um fuzil AK-47. Uma f�brica de cerveja anuncia que migrou da produ��o de bebidas para a de coquet�is molotov. Um morador de Lviv mostra uma submetralhadora e diz que � adequada para o combate casa a casa. O autoproclamado porta-voz de um certo Movimento de Resist�ncia Ucr�nia Livre diz contar com cerca de mil guerrilheiros camuflados "atr�s das linhas inimigas" - em Mariupol, Sumy, Kharkiv e Irpin.

Essas e outras cenas, exibidas ou descritas pela imprensa nos �ltimos 18 dias, sugerem que a guerra dos ucranianos contra o invasor russo j� tem um car�ter insurrecional, irregular ou de guerrilha.

Nesse terreno, a Ucr�nia tem uma longa hist�ria que remonta � Idade M�dia. Resta saber se a tradi��o tem chances de reviver no s�culo 21.

Com um territ�rio composto de partes de grandes imp�rios do passado, a Ucr�nia cultua hoje tanto her�is e m�rtires derrotados - quando ucranianos tentaram obter independ�ncia e foram massacrados - quanto chefes vitoriosos da resist�ncia a Napole�o e da Segunda Guerra Mundial.

Nas galerias de honra de museus e memoriais, soldados profissionais figuram lado a lado com guerrilheiros - homens e mulheres - que nunca pisaram em academias militares.

Esse passado � visto por alguns como um ind�cio de que a invas�o determinada pelo presidente russo, Vladimir Putin, ter� o mesmo destino de campanhas como as ocupa��es sovi�tica e norte-americana no Afeganist�o e norte-americana no Iraque: exuberantes opera��es militares incapazes de vencer inimigos fracos, mas flex�veis e com moral elevada.

Um dia depois de os tanques russos cruzarem a fronteira, o especialista em intelig�ncia Douglas London escreveu na revista Foreign Affairs que a estrat�gia ucraniana "n�o depende de repelir uma invas�o russa, mas sim em fazer Moscou sangrar a ponto de tornar a ocupa��o insustent�vel".

A doutora em Estudos Estrat�gicos Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Tamiris Pereira dos Santos diz que a estrat�gia de sangria (bloodletting, em ingl�s) foi adotada de forma consciente pela Ucr�nia, mas deve ser vista com cautela.

"A quest�o �: se formos pensar em sangria nesse caso, o quanto a Ucr�nia � capaz de impingi-la � R�ssia? S�o capacidades bastante assim�tricas postas em jogo para que essa premissa seja, de fato, v�lida", afirma.


Volodymyr Zelensky
O presidente Volodymyr Zelensky conclamou a popula��o a resistir � invas�o russa (foto: Emin Sansar/Anadolu Agency via Getty Imy via Getty)

Tamiris n�o considera que o caso da Ucr�nia seja compar�vel ao da ocupa��o do Iraque pelos Estados Unidos.

"Naquele caso, os norte-americanos n�o conseguiram efetivamente uma vit�ria em raz�o da capacidade insurgente da regi�o, que se infiltrou entre a popula��o iraquiana e causou bastante desgaste aos Estados Unidos", argumenta.

A pesquisadora da Rede de Ci�ncia, Tecnologia e Inova��o e Defesa do Minist�rio da Defesa e da Coordena��o de Aperfei�oamento de Pessoal T�cnico de Ensino Superior (Capes) Ana Carolina de Oliveira Assis afirma que o emprego de t�ticas insurgentes pela Ucr�nia foi percept�vel desde o primeiro momento.

"Com o passar do tempo e o avan�o russo, somados � falta de apoio de tropas ocidentais, � de se esperar que a Ucr�nia utilize todos os meios poss�veis para resistir e adote cada vez mais t�ticas insurgentes", afirma a especialista e doutoranda em Ci�ncia Pol�tica pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Nas ci�ncias militares, o emprego de engajamento de civis, franco-atiradores, emboscadas e sabotagem � chamado de guerra irregular - em oposi��o � guerra regular, na qual s�o utilizados pessoal, equipamentos e formas de atua��o profissionais.

A guerra irregular pode ser o �nico meio dispon�vel num conflito de independ�ncia ou liberta��o nacional, quando popula��es numerosas e sem for�as armadas precisam enfrentar um ocupante poderoso.

Pode, tamb�m, ser utilizada de forma acess�ria ou complementar por um ex�rcito regular - a fim de executar a��es de retaguarda, surpreendendo o inimigo, ou em �reas in�spitas ou densamente povoadas que dificultem o uso de blindados ou de avia��o.

Esse �ltimo caso � o da Ucr�nia, que conta com for�as armadas expressivas, mas com poder de fogo 10 vezes inferior ao da R�ssia.

"Uma das principais caracter�sticas da guerra irregular � a import�ncia da opini�o p�blica. Uma vez que o pa�s dito mais fraco n�o teria como vencer o poderio militar do inimigo, a opini�o popular torna-se o principal alvo", afirma Maria Eduarda Dourado, mestre em Rela��es Internacionais pela Universidade Estadual da Para�ba.

O objetivo da guerra irregular, segundo a pesquisadora, � minar a aspira��o do pa�s inimigo � legitimidade de suas a��es.

"Ao dizer que h� civis ucranianos dispostos a perder a vida utilizando apenas coquet�is molotov em combate direto com soldados e tanques russos, Zelensky refor�a a narrativa ucraniana e constr�i uma imagem negativa da R�ssia e de seu l�der, Vladimir Putin", complementa Maria Eduarda.

Os n�meros avassaladores da invas�o russa - o governo dos Estados Unidos estimava que a R�ssia tinha posicionado 150 mil a 190 mil soldados na fronteira antes de 24 de fevereiro, quando se iniciou o ataque - sugerem que Moscou acreditava que alcan�aria seus objetivos de forma fulminante, anulando a capacidade de rea��o do inimigo.

"Guerra � algo politicamente impopular. Putin estava mirando uma conquista veloz dos principais pontos estrat�gicos do territ�rio ucraniano", afirma Maria Eduarda.

A realidade, por�m, assumiu contornos muito distintos.

"Ao contr�rio do que era esperado, Putin viu uma parte da Ucr�nia resistir fortemente, em especial a parte ocidental, onde h� maior identifica��o com os pa�ses e a cultura ocidental", analisa.

O planejamento de uma campanha como a da R�ssia na Ucr�nia inclui cen�rios variados, e � prov�vel que as for�as armadas russas tenham considerado a perspectiva de enfrentar resist�ncia popular.

N�o h�, por�m, garantia de que essa presci�ncia seja o caminho para o sucesso.

"Considerar a possibilidade de insurg�ncia n�o elimina as dificuldades que a R�ssia pode encontrar ao utilizar t�ticas e equipamentos de contra-insurg�ncia. Al�m das quest�es log�sticas, o problema de diferenciar civis e militares, outro obst�culo seria o apoio ocidental � resist�ncia ucraniana", considera Ana Carolina.


Um ucraniano aprende a manusear um fuzil AK-47, enquanto civis passam por treinamento militar básico em centro de voluntários em uma instituição educacional estatal, em 5 de março de 2022 em Odessa, Ucrânia
Ucranianos receberam treinamento militar b�sico em Odessa como prepara��o para ataque russo (foto: Scott Peterson/Getty Images)

Esse apoio, explica a pesquisadora, seria uma fonte importante de recursos e armamentos e levaria a um prolongamento da resist�ncia e um enfraquecimento militar e pol�tico russo com o passar do tempo.

No domingo (13/3), m�sseis russos atingiram uma base militar ucraniana em Starychi, distante 46 quil�metros de Lviv e a cerca de 25 quil�metros da fronteira com a Pol�nia, segundo a administra��o regional militar de Lviv.

� o ataque mais pr�ximo do territ�rio de um pa�s da Otan desde o in�cio da campanha.

Essa vizinhan�a n�o � o �nico fator a servir de complicador na equa��o da guerra.

"Como o Ocidente n�o est� intervindo diretamente com soldados e armamentos, apenas doando material b�lico, dinheiro e outros recursos para a Ucr�nia, aumenta a probabilidade de o conflito evoluir para uma guerra de insurg�ncia, com os ucranianos utilizando todos os meios ao seu alcance para manter a atual posi��o", afirma Ana Carolina.

Tamiris considera que escalar a guerra ou participar diretamente do conflito n�o seja uma estrat�gia do Ocidente, condi��o que aumenta as chances de a Ucr�nia recorrer � insurg�ncia.

"No caso de participa��o mais efetiva dos Estados Unidos e da Europa ocidental, existe a possibilidade de a China vir em socorro da R�ssia. Um envolvimento ocidental direto poderia, de fato, causar a eclos�o de uma guerra mundial - algo que, acredito, n�o se queira repetir t�o cedo", conclui.

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