
Agora � um porto assustado com o crime das gangues de narcotr�fico nas ruas e pris�es, mas uma viol�ncia menos barulhenta j� se enraizou nas montanhas de Guayaquil, em uma favela com nome b�blico e menos conhecida que a hom�nima no Rio de Janeiro.
Monte Sina� � um morro com 55 assentamentos irregulares que cresceram atr�s do pr�spero porto equatoriano, envolvido em uma espiral sangrenta que deixou 861 homic�dios at� agora este ano, 32,5% de todos os casos registrados no pa�s.
Em seus 9.300 hectares (100 km2), meio milh�o de pessoas sobrevivem sem servi�os b�sicos, segundo o censo municipal de Guayaquil (2,8 milh�es de habitantes).
S� em Cidade de Deus, 40.000 pessoas pobres vivem espremidas em casas semi-acabadas ou pr�-fabricadas, t�o estreitas que os banheiros ficam do lado de fora.
Os primeiros a se instalarem neste local foram os evang�licos protestantes que deram o nome de Cidade de Deus, o mesmo da famosa favela carioca que o cinema retratou em 2002.
Aqui "cada casa tem fossa s�ptica. Fizemos um esfor�o para colocar postes para a eletricidade; quatro postes na rua nos custaram 200 d�lares", diz Marisol Ch�vez.
L�der de bairro de 40 anos, Ch�vez mora em um quarto com duas camas juntas. At� recentemente sobrevivia como camel� e do trabalho espor�dico como pedreiro de seu marido, mas com o nascimento recente de seu beb� passou a dedicar-se aos seus cuidados.
"N�o temos quase nada e sofremos muito", abrevia.
Ch�vez chegou ao morro em 2019 expulsa de outro assentamento irregular. Aqui "n�o havia nada, pura vegeta��o rasteira, terra, arbustos com espinhos", lembra.
A superlota��o habitacional em Guayaquil (14,6%) supera a m�dia nacional (9,6%), segundo a autoridade estat�stica (INEC). A pobreza (20,1%) tamb�m � maior no porto do que no resto do pa�s (16,7%).
- "Vacinar" -
Nascida de uma invas�o h� 22 anos, Cidade de Deus tamb�m carece de �gua pot�vel.
Caminh�es-pipa sobem pelas ruas sem asfalto. Um tanque de 55 gal�es custa 75 centavos de d�lar, enquanto no rico setor de La Puntilla um metro c�bico de �gua pot�vel (264 gal�es) custa 0,72 centavos de d�lar.
Pobreza, superlota��o, falta de servi�os b�sicos e viol�ncia comp�em o que a ONU chama de "armadilha da pobreza", da qual � dif�cil escapar.
As gangues criminosas estenderam seus bra�os at� o superlotado Monte Sinai. "Casa vigiada", diz uma placa.

Vizinhos dizem que a frase � um aviso intimidador para "aqueles que devem dinheiro a Los Choneros", uma das 26 organiza��es criminosas que atuam no Equador.
Os membros de gangues extorquem ou "vacinam" as comunidades para garantir sua seguran�a, mas na realidade � o custo que devem pagar para viver.
Em poucos dias passar�o de casa em casa cobrando "dois d�lares", avisou um dos chefes da fac��o, segundo um dos moradores.
As gangues usam os jovens como m�o de obra barata. Eles "s�o cem vezes mais propensos a ca�rem no tr�fico", diz C�sar C�rdenas, diretor do Observat�rio de Servi�os P�blicos de Guayaquil.
- Sem projeto -
Antes das primeiras invas�es, o Monte Sinai era uma �rea de propriedades privadas e estatais onde um traficante tamb�m havia constru�do sua fazenda, conta a arquiteta e urbanista Rosa Rada.
Com a estrada Perimetral, que liga a zona industrial ao porto, o morro come�ou a se "urbanizar" em 1984.
Para chegar ao centro de Guayaquil, os moradores da Cidade de Deus devem caminhar cerca de meia hora at� a estrada mais pr�xima e usar transporte p�blico, em trajetos que podem levar at� uma hora e meia.
As escolas tamb�m est�o longe. Durante a pandemia, as crian�as receberam uma ou outra aula em lousas e mesas instaladas em p�tios empoeirados.
Segundo o Minist�rio de Desenvolvimento Urbano e Habita��o, um ter�o da �rea de Guayaquil � habitada irregularmente por migrantes rurais que, em muitos casos, foram enganados por traficantes de terras.
As autoridades locais planejam legalizar 8.000 casas em um plano de regulariza��o progressiva.
Sem habita��o "n�o h� projeto de vida nem se pode planejar um futuro", diz o chefe do Observat�rio.