
Com o Produto Interno Bruto (PIB) em alta e a infla��o e o desemprego em baixa, os institutos e especialistas consultados pela BBC News Mundo (servi�o em espanhol da BBC) avaliam de forma positiva a situa��o da economia espanhola em termos gerais.
No entanto, na recente pesquisa de junho do Centro de Investiga��o Sociol�gica (CIS) de Espanha, 43,1% dos cidad�os qualificaram a situa��o econ�mica geral como “ruim” e 13,8% como “muito ruim”.
Essa discrep�ncia entre a percep��o e a realidade est� sendo ampliada durante a campanha para as elei��es gerais do pr�ximo domingo (23/7), em que diferentes partidos pol�ticos manipulam os n�meros a seu favor, destacando os indicadores que lhes s�o mais convenientes.
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Enquanto o presidente do governo e l�der do Partido Socialista Oper�rio Espanhol (PSOE), Pedro S�nchez, afirma que a economia espanhola “est� andando como se fosse uma moto", o presidente do conservador Partido Popular (PP) e l�der da oposi��o, Alberto N��ez Feij�o, diz que o pa�s "est� estagnado."
A economia � um tema central no pleito. Segundo as sondagens, o direitista PP passaria a ser o partido mais votado, seguido do governista PSOE. Quem chegar em terceiro pode ser decisivo para o resultado da elei��o: o Vox de extrema-direita — que tudo indica que governaria com o PP — ou a rec�m-lan�ada coaliz�o de esquerda espanhola Sumar — que se tornaria parceira do PSOE em um governo de coaliz�o.
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Verdades absolutas
“Cada um v� o que lhe conv�m. Um diz que estamos crescendo muito r�pido e o outro diz que sim, mas que ca�mos ainda mais r�pido (durante a pandemia) ”, explica � BBC News Mundo Javier Quesada, especialista do Instituto Valenciano de Pesquisas Econ�micas (IVIE).
“Enquanto um fala em PIB (o conjunto das riquezas da economia), outro fala em PIB per capita (essa riqueza dividida pela popula��o do pa�s). Isso faz parte do jogo."
“N�o h� d�vida de que, se a economia vai bem, isso � bom para que os que est�o no poder consigam renovar o mandato. E que quem quer chegar ao poder tem que procurar fazer com que a popula��o perceba a necessidade de mudar”, diz.
“Isso significa que a opini�o p�blica neste momento est� altamente contaminada por not�cias favor�veis %u200B%u200Bou desfavor�veis.”
A mesma opini�o � compartilhada por Mart� Parellada, professor de economia da Universidade de Barcelona e presidente do Instituto de Economia de Barcelona (IEB). Ele explica que, para entender a vis�o negativa que os espanh�is t�m da economia, � preciso levar em considera��o “a batalha eleitoral” em jogo.
"Logicamente, se a alternativa ao atual governo usar como argumento substancial contra o governo que a situa��o econ�mica est� ruim, provavelmente isso acabar� afetando as pesquisas de opini�o dos espanh�is", disse Parellada � BBC News Mundo.

O crescimento da economia espanhola
Em 2022, a Espanha registou um crescimento do PIB de 5,5% — o s�timo maior da Uni�o Europeia, segundo dados do Eurostat (Escrit�rio Europeu de Estat�stica), � frente de outras grandes economias europeias como a Holanda (4,3% ), It�lia (3,7%), Fran�a (2,5%) e Alemanha (1,8%).
Da mesma forma, o Banco da Espanha melhorou sua previs�o para este ano e estimou que o PIB crescer� a uma taxa de 2,3%, enquanto a infla��o continuar� moderada e fechar� 2023 em uma m�dia de 3,2%, ante 8,4% registrados em 2022.
“Na minha opini�o, n�o acho que a situa��o da economia espanhola possa ser avaliada de outra forma que n�o seja positiva. Os indicadores s�o bons sob qualquer ponto de vista”, avalia Parellada, embora reconhe�a que h� problemas de produtividade e renda per capita abaixo da m�dia da Uni�o Europeia.
A pujan�a das exporta��es, o dinamismo do emprego e a flexibiliza��o dos pre�os da energia s�o algumas das principais raz�es para a melhoria das previs�es do Banco de Espanha.
“O momento atual da economia espanhola � muito positivo. Mas tamb�m � verdade que se colocarmos num contexto mais geral a m�dio prazo, a economia espanhola foi a �ltima a recuperar a queda do PIB sofrida durante a covid”, analisa Omar Rachedi, professor associado do Departamento de Economia , Finan�as e Contabilidade na Escola Superior de Administra��o e Gest�o de Empresas (ESADE).
A essa lenta recupera��o se soma a elevada d�vida p�blica espanhola, que voltou a bater um novo recorde hist�rico em maio, ultrapassando os 1,54 bilh�es de euros devido ao enorme impacto da pandemia na economia. Esse � um dos pontos fracos da economia espanhola.

Infla��o
A infla��o fechou junho em 1,9%. O n�mero � inferior aos de Fran�a (5,3%) e Alemanha (6,8%). No entanto, a infla��o de alimentos continua acima dos 10%, pesando muito no or�amento das fam�lias.
"Quando voc� vai ao supermercado, tende a levar mais em conta a varia��o de pre�os de um produto que talvez compre com mais frequ�ncia ou que seja mais importante para voc�, portanto, embora talvez apenas alguns produtos subam, a sua sensa��o � de aumento generalizado da infla��o, embora isso n�o seja verdade”, explica Rachedi � BBC Mundo.
Para entender por que a sociedade percebe que as coisas est�o piores do que dizem os indicadores macro, � preciso olhar para o micro. O que as pessoas percebem n�o � o quanto o PIB cresceu, mas sim o pre�o da gasolina, os produtos da cesta de compras ou a conta de luz.

“Se voc� olhar os dados macroecon�micos, parece que est� tudo bem. Empregos foram gerados, a infla��o est� diminuindo, tudo isso � favor�vel. Agora, se voc� conversar com as pessoas, elas podem ter uma percep��o diferente”, diz Quesada.
“A vida ficou muito cara e o que as pessoas percebem mais diretamente � como a comida ficou mais cara. As pessoas veem que est� cada vez mais dif�cil chegar ao final do m�s porque a infla��o corr�i as melhorias salariais que ocorreram, mas elas ficam atr�s do crescimento dos pre�os."
A infla��o � um dos principais temores da popula��o e o principal inimigo dos governos.
“Os dados macroecon�micos s�o muito bons, sim, mas existe uma palavra m�gica, que se chama infla��o. A infla��o que continua alta em toda a Europa e que est� matando os governos. Essa � uma li��o que a hist�ria da Europa nos d�”, explica Cristina Monge, cientista pol�tica e professora da Universidade de Zaragoza, � BBC Mundo.
“Voc� pode ter �timos dados macro, mas v� que seu empr�stimo imobili�rio subiu 200 euros por m�s ou que vai ao supermercado e que o dinheiro n�o compra tanto como antes. Portanto, a percep��o em microeconomia n�o � a mesma que em macroeconomia”, aponta o especialista.
Narrativa
O caso da percep��o negativa da economia n�o � exclusivo da Espanha. De acordo com uma pesquisa publicada recentemente pelo Pew Research Center, a maioria dos adultos em 18 dos 24 pa�ses pesquisados %u200B%u200Bclassificou a situa��o econ�mica em seus pa�ses como “ruim”.
Na Espanha, 72% dos pesquisados %u200B%u200Bo avaliaram negativamente, dentro da m�dia do estudo em que apenas M�xico, �ndia, Indon�sia e Holanda registraram uma maioria que o descreveu como "boa”.
“Voc� pode ter um crescimento concentrado em algumas parcelas da popula��o, ent�o nem todos podem se beneficiar desse crescimento”, diz Rachedi. "Os dados de emprego e parte da pol�tica fiscal me fazem pensar que, de maneira geral, a situa��o n�o � t�o negativa quanto percebida pela popula��o."
“Essa discrep�ncia n�o � apenas algo que acontece na Espanha. Exatamente o mesmo debate existe agora nos Estados Unidos, onde novamente h� n�veis recordes de emprego, mas as pessoas continuam tendo a ideia de que h� quase uma recess�o e uma crise que continua sendo anunciada e nunca aparece.”

Em sua opini�o, essa discrep�ncia pode ser, em parte, um legado dos �ltimos 20 anos de crescimento, em que parte da popula��o se beneficiou de uma renda maior. Mas tamb�m se deve, em parte, ao que o Pr�mio Nobel Robert J. Shiller chamou de "narrativa econ�mica".
"Uma narrativa econ�mica � uma hist�ria contagiante que tem o potencial de mudar a forma como as pessoas tomam decis�es econ�micas." Essa teoria explica como a hist�ria pode moldar nossa percep��o da realidade e, na opini�o de Rachedi, pode ser o que est� acontecendo na Espanha.
“Se a mesma hist�ria se repetir, pode ter um efeito muito importante na popula��o, principalmente em um momento como agora em que as redes sociais s�o t�o importantes”, aponta.
“Acho que tamb�m em parte pelas caracter�sticas dessa recupera��o com crescimento do PIB que tamb�m vem com infla��o alta. Por exemplo, isso � muito interessante quando se observa a forte correla��o nos EUA entre as pesquisas favor�veis %u200B%u200Bao presidente e o pre�o da gasolina. A� voc� v� como cada vez que o pre�o da gasolina sobe, h� uma queda no apoio ao presidente.”
Nas elei��es deste domingo na Espanha, veremos qual das "narrativas econ�micas" mais convenceu os eleitores ou se a percep��o de muitos cidad�os de que � cada vez mais dif�cil sobreviver � motivo suficiente para mudar o governo.