
Todos eles confessaram o crime em 2007 -depois de anos sob tortura. Por isso, a defesa argumenta que as declara��es s�o inadmiss�veis como prova. A acusa��o teme que elas sejam descartadas, enfraquecendo as chances dos r�us serem condenados � morte.
O impasse poderia ser resolvido por um acordo entre as partes, em que os acusados reconheceriam a culpa em troca de pris�o perp�tua, em vez da pena capital. A solu��o vem ganhando for�a nos �ltimos meses, e reuni�es entre a Procuradoria e familiares das v�timas e sobreviventes para discutir a proposta foram realizadas.
Alguns apoiam a ideia para encerrar o caso, outros exigem um julgamento que d� transpar�ncia ao que ocorreu -sobretudo ao papel do governo saudita- e leve � execu��o dos culpados.
Do lado da Casa Branca, um acordo tamb�m � politicamente espinhoso: que presidente quer ser lembrado como aquele que negociou com os arquitetos do ataque �s Torres G�meas?
Na �ltima quarta-feira (6), o governo de Joe Biden j� rejeitou, por exemplo, uma lista de condi��es propostas pela defesa para aceitar um acordo, entre elas tratamento para dist�rbios do sono, les�es cerebrais e danos gastrointestinais, que os r�us afirmam ser consequ�ncia do per�odo em que foram torturados. A informa��o foi obtida pelo jornal The New York Times.H� ainda outro complicador: em agosto, uma junta m�dica militar avaliou que um dos acusados, em decorr�ncia de uma doen�a mental, � incapaz de ir a julgamento ou fazer um acordo, segundo o jornal americano.
Ele teria recebido o diagn�stico de transtorno de estresse p�s-traum�tico. Cabe agora ao juiz decidir se ele ser� separado dos demais ou se a Justi�a vai aguardar o tratamento do r�u.
O principal acusado � o paquistan�s Khalid Shaikh Mohammed, 58, apelidado de KSM. Capturado em 2003, � apontado como o idealizador do ataque -ele teria proposto o sequestro de avi�es ao ent�o l�der da Al Qaeda, Osama bin Laden, e supervisionado todo o planejamento da opera��o.
Os outros quatro r�us s�o os sauditas Walid bin Attash, 45, e Mustafa al Hawsawi, 55, o iemenita Ramzi bin al-Shibh, 51, avaliado como incapaz pela junta m�dica, e o paquistan�s Ammar al-Baluchi, 46.

Eles s�o acusados de terrorismo, conspira��o e assassinato de civis, entre outros crimes. Segundo o indiciamento, todos eles ajudaram de alguma forma os 19 sequestradores nos dois avi�es lan�ados contra o World Trade Center, no que se chocou com o Pent�gono e no que caiu em um campo na Pensilv�nia ap�s um embate com os passageiros, causando a morte de 2.976 pessoas.
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Os cinco homens foram capturados pelos Estados Unidos em 2002 e 2003 e levados para pris�es secretas da CIA, a ag�ncia de intelig�ncia americana, onde foram submetidos �s chamadas "t�cnicas avan�adas de interrogat�rio", como waterboarding (simula��o de afogamento), walling (bater a cabe�a de uma pessoa contra a parede), priva��o de sono, nudez for�ada e "alimenta��o retal", uma forma de viola��o sexual.
Em 2006, eles foram transferidos para Guant�namo, em Cuba. Em raz�o das torturas sofridas nos anos anteriores, foram enviados agentes do Departamento de Justi�a e do FBI, conhecidos como "equipe da limpeza", para obter confiss�es volunt�rias dos cinco homens.
A defesa, no entanto, diz que mesmo essas declara��es n�o s�o admiss�veis como prova porque os r�us foram condicionados a admitir culpa ap�s anos de viol�ncia.
Esse argumento ganhou for�a no m�s passado, ap�s um juiz decidir que a declara��o de culpa nas mesmas condi��es obtida de um r�u acusado por outro atentado n�o � v�lida.
"Qualquer resist�ncia que o acusado poderia ter tido quando solicitado a incriminar a si mesmo foi intencionalmente e literalmente espancada para fora dele anos antes", diz o juiz na senten�a.
J� Terry Strada, diretora da organiza��o Fam�lias Unidas do 11 de Setembro, que representa cerca de 10 mil pessoas entre familiares de v�timas e sobreviventes, argumenta que h� muitas evid�ncias al�m das confiss�es que podem ser usadas pelos procuradores.
Strada perdeu o marido, Tom, na �poca com 41 anos. Ele estava no 104º andar da torre norte do World Trade Center. Ela conta que ele trabalhava no mercado financeiro e havia ido ao escrit�rio naquele dia para receber "baby trades".
"Em Wall Street, quando uma pessoa tem um novo beb�, ela vai � empresa para receber dos colegas essas opera��es de parab�ns", explica. O terceiro filho do casal havia nascido quatro dias antes dos ataques.
Ela participou de uma reuni�o de fam�lias com os procuradores na Fl�rida para explicar como se daria um acordo com os r�us. Na ocasi�o, afirma, ouviu que a solu��o encerraria o processo mais r�pido, mas tamb�m que possuem provas fortes contra os acusados.
"Eu quero que o julgamento aconte�a, que as evid�ncias venham � tona. Eu n�o quero que elas sejam enterradas, que sejam inadmiss�veis. Quero ouvir tudo para que possamos aprender tudo sobre como e por que fomos t�o brutalmente atacados em 11 de Setembro", afirma � Folha de S.Paulo, destacando que essa � sua posi��o pessoal, n�o da organiza��o.
Para Strada, o governo deseja um acordo para impedir que informa��es sobre o papel da Ar�bia Saudita, um importante aliado americano no Oriente M�dio, sejam reveladas pelos r�us. Outro objetivo seria esconder o que chama de "comportamento nefasto" da intelig�ncia americana.
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Outros familiares de v�timas assinaram uma carta enviada ao presidente Joe Biden pedindo que ele interfira para que um acordo n�o seja fechado com os acusados.
Mas h� tamb�m quem defenda essa solu��o. Uma das representantes mais vocais desse grupo � a documentarista Terry Rockefeller, integrante do grupo Peaceful Tomorrows (amanh�s pac�ficos), que pede uma resposta n�o violenta aos atentados.
Rockefeller perdeu a irm�, Laura, que tamb�m estava na torre norte. Em um artigo publicado no final de agosto, ela diz que um julgamento poderia levar anos em decorr�ncia de questionamentos quanto � validade das provas. Se um dos r�us morrer antes de ser sentenciado, ele poderia, no limite, ser considerado inocente ao final de tudo, alerta.
Um acordo, por sua vez, obrigaria os r�us a admitirem todos os crimes que cometeram ou dos quais t�m ci�ncia, a abrirem m�o de recorrer da senten�a, e poderia incluir a possibilidade de familiares das v�timas fazerem perguntas, afirma Rockefeller.
Ela diz ainda que tamb�m quer mais informa��es sobre o envolvimento saudita nos atentados, "mas toda a minha experi�ncia com o caso do 11 de Setembro em Guant�namo me diz que essa � uma informa��o que nunca vamos ouvir em um julgamento por uma comiss�o militar".
"O 22º anivers�rio das mortes dos nossos entes queridos � a ocasi�o ideal para encerrar a falida comiss�o militar do 11 de Setembro, responder �s nossas perguntas e nos garantir uma conclus�o judicial", diz.
As comiss�es militares de Guant�namo possuem regras pr�prias e foram criadas pelo governo Bush em 2001 para julgar estrangeiros no contexto da Guerra ao Terror. Muitos dos documentos legais -j� s�o quase 12 mil no caso do 11 de Setembro- s�o confidenciais ou parcialmente censurados.
Para organiza��es de direitos humanos como a Human Rights Watch, as comiss�es carecem de autonomia e imparcialidade, o que pode tornar a senten�a ileg�tima na percep��o nacional e internacional. A pr�pria Suprema Corte chegou a julg�-las inconstitucionais em 2006.
Em resposta, algumas mudan�as foram feitas, com uma grande reforma em 2009, durante o governo de Barack Obama. Houve uma tentativa de transferir o julgamento para a Justi�a Federal, abandonada diante da repercuss�o negativ e eventualmente proibida pelo Congresso.
O julgamento dos cinco homens foi reiniciado oficialmente em 2012, mas, mesmo ap�s as mudan�as, ainda h� muitas cr�ticas ao seu funcionamento.
"Em 2013, uma audi�ncia no caso do 11 de Setembro foi interrompida quando uma luz vermelha de censura piscou inesperadamente e o �udio para a galeria da sala do tribunal foi abruptamente cortado, sem aviso pr�vio, e muito menos permiss�o do juiz. O corte unilateral foi posteriormente atribu�do � CIA", escrevem Letta Tayler e Elisa Epstein em artigo da s�rie "Custos da Guerra", da Universidade Brown.
A defesa tamb�m acusa a CIA e os procuradores de se negarem a entregar materiais solicitados, ou a faz�-lo o mais devagar poss�vel. Por se tratar de um assunto de seguran�a nacional, o juiz n�o pode obrig�-los a revelar informa��es.
"As comiss�es militares de Guant�namo s�o literalmente desenhadas para maximizar os benef�cios do programa de tortura enquanto escondem o m�ximo poss�vel de informa��es constrangedoras sobre tortura", escreveu a advogada Alka Pradhan, que integra o time de defesa de Ammar al-Baluchi, sobre a decis�o recente de descartar uma confiss�o obtida pela "equipe de limpeza".
"N�s ainda estamos nessa luta no caso do 11 de Setembro, mas a decis�o de hoje desestabiliza fundamentalmente todo o sistema de comiss�es militares", completou.