Coronav�rus: como 'pandemia de sedentarismo' pode levar a surto de obesidade

Shar Reid n�o passava por um bom momento quando a pandemia de covid-19 come�ou. Ela havia se mudado recentemente para uma nova cidade no Reino Unido para continuar seus estudos para ser advogada e passou a morar longe da fam�lia e dos amigos. Asm�tica, ela teve de se confinar. "Eu me sentia desanimada, isolada e em p�nico. N�o queria sair e tudo o que fiz foi assistir ao Netflix", disse Shar � BBC.

• 'Exibir corpo perfeito nas redes se tornou ang�stia na minha vida': o desabafo de uma influencer brasileira
• 'O que vejo em humanos confinados � parecido a papagaios enjaulados arrancando as pr�prias penas', diz cientista

"Minha contagem de passos era terr�vel, algo em torno de 2 mil por dia", acrescenta ela.

Embora haja muito debate sobre a contagem de passos como medida de condicionamento f�sico e conselhos m�dicos mais recentes sugiram que a intensidade do exerc�cio � mais importante do que a quantidade, estudos t�m mostrado que uma contagem de passos mais alta est� associada a uma sa�de melhor.

Shar, de 30 anos, foi um caso perfeito da "pandemia de inatividade" temida por especialistas em sa�de como um resultado das quarentenas em todo o mundo.

Eles temem que uma queda brusca nos n�veis de condicionamento f�sico possa ser seguida por um aumento nas doen�as cr�nicas associadas � falta de exerc�cios f�sicos, como obesidade e problemas card�acos.

Algumas dessas condi��es tamb�m tornam as pessoas mais propensas a sofrer os efeitos graves da COVID-19, em meio a relatos de segundas ondas de cont�gio em v�rias partes do globo.

Uma an�lise publicada pelo Banco Mundial em 26 de agosto apontou que a obesidade n�o s� aumenta o risco de morte em pacientes com COVID-19 em quase 50%, mas tamb�m pode limitar a efici�ncia de uma vacina contra o novo coronav�rus.

Uma queda global - e n�o est� melhorando

Na pesquisa mais abrangente at� agora, a fabricante de monitores de atividade f�sica Fitbit analisou os dados de 4 milh�es de usu�rios em todo o mundo em mar�o e em junho.

O n�mero m�dio de passos dados por dia durante o isolamento caiu drasticamente em compara��o com os mesmos per�odos em 2019.

E, olhando para os dados de junho, os cientistas descobriram que as pessoas ainda n�o haviam atingido os mesmos n�veis de atividade do ano passado, mesmo onde o isolamento foi afrouxado ou suspenso.

Os mais jovens (18-29 anos) foram os que apresentaram menor n�vel de atividade.

"Altos n�veis de estresse podem afetar nosso sono e nos fazer sentir lentos e cansados, reduzir nossos n�veis de energia e nos tornar menos propensos a fazer exerc�cios", disse Punam Krishan, diretor da Sociedade Brit�nica de Medicina de Estilo de Vida.

"Quando n�o nos exercitamos, fazemos escolhas alimentares piores intuitivamente, o que nos prende em um ciclo negativo que acaba afetando nossa sa�de f�sica e nosso bem-estar emocional e mental."

V�rios pa�ses relataram que medidas de isolamento levaram ao ganho de peso em sua popula��o em algum momento — no Brasil, por exemplo, uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais mostrou que quase quatro em cada dez pessoas engordaram durante o pandemia.

It�lia, Fran�a, Reino Unido e Israel tamb�m relataram aumentos no peso de sua popula��o durante o per�odo de isolamento.

O sedentarismo impulsionado pela pandemia � uma preocupa��o da Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS), que criou uma campanha com a hashtag #HealthyAthome (#Saud�velEmcasa), com informa��es sobre exerc�cios simples e a quantidade de atividade necess�ria para diferentes faixas et�rias.

Um alerta no M�xico

O M�xico teve uma das quedas mais dram�ticas na contagem de passos entre as na��es pesquisadas pela Fitbit, de quase 80% em junho de 2020 em compara��o com o mesmo per�odo do ano passado.

O pa�s tem atualmente o terceiro maior n�mero de mortes por covid-19 (mais de 62,5 mil at� 28 de agosto). Mais de 70% dos mortos tinham condi��es pr�-existentes, como hipertens�o, diabetes ou obesidade.

H� uma especial preocupa��o com o n�mero de casos e mortes entre crian�as. Os casos aumentaram de 84 para mais de 2,6 mil apenas entre 12 de abril e 8 de junho, segundo o Minist�rio da Sa�de mexicano.

O Unicef, ag�ncia da ONU para assuntos de inf�ncia, entrevistou 8 mil mexicanos com idade entre 13 e 30 anos e descobriu que cerca de metade deles t�m se exercitado menos durante a pandemia.

"Muitos n�o v�o � escola ou t�m medo de sair de casa", explica Mauro Brero, nutricionista da Unicef.

"O M�xico j� estava entre os pa�ses com altas taxas de obesidade em crian�as e adolescentes antes da pandemia. Agora, as coisas podem piorar e deixar mais jovens vulner�veis", diz o especialista.

O estudo da Fitibit mostrou que mesmo os pa�ses que n�o realizaram um isolamento total registraram uma queda na contagem de passos: no Jap�o, a atividade em junho ainda era 11% menor que em 2019.

Os n�meros sugerem que as pessoas n�o se sentiam seguras o suficiente para manter suas rotinas.

Pesquisadores da Universidade de Tsukuba, com sede em T�quio, detectaram uma "redu��o significativa" no tempo de atividade f�sica entre os idosos do pa�s durante a pandemia, e mais de 28% dos japoneses t�m 65 anos ou mais.

A diabetes da �ndia preocupa

Na �ndia, a contagem m�dia de passos ainda era 11% menor em junho. H� um receio de que ocorra uma "pandemia de diabetes" em um dos pa�ses mais afetados por essa doen�a.

Estima-se que mais de 70 milh�es de indianos sejam diab�ticos, n�mero superado apenas pela China.

Uma equipe de m�dicos de Nova Delhi que acompanhou mais de cem pacientes diab�ticos durante a pandemia descobriu n�o apenas que uma quantidade significativa deles (42%) reduziu os n�veis de exerc�cios, mas tamb�m que comeram mais carboidratos, o que n�o � recomendado.

"A �ndia foi atingida pela pandemia em um momento em que as pessoas j� lutavam contra o sedentarismo", explica Aman Dhall, um blogueiro indiano de fitness.

"Em 2016, um estudo da OMS j� havia mostrado que 35% dos indianos n�o eram suficientemente ativos."

"N�s somos muito bons em assistir esportes, mas n�o em pratic�-los", acrescenta Dhall, que acredita que o isolamento "tornou os indianos mais sedent�rios".

Pessoas sob risco tamb�m 'largaram de m�o'

O aumento do risco de desenvolver doen�as e se tornar mais vulner�vel � COVID-19 n�o parece motivar muitas pessoas a se levantarem do sof�.

Esta foi uma conclus�o a que chegou Nina Rogers, epidemiologista da University College London, no Reino Unido, que trabalhou ao lado de colegas da University of Bath para entrevistar mais de 5,8 mil brit�nicos com 20 anos ou mais durante a pandemia.

A maioria (60%) afirmou ter mantido seus n�veis de atividade f�sica e apenas cerca de 25% admitiu que os tinha reduzido.

O problema � que mais pessoas com problemas de sa�de que as tornam mais vulner�veis � COVID-19 faziam parte do grupo que "largou de m�o".

"Isso foi uma surpresa", diz Rogers. "� preocupante. Podemos ter outros per�odos de isolamento, que podem levar a per�odos prolongados de pouca atividade f�sica. Isso poderia aumentar o tamanho da popula��o mais vulner�vel a complica��es graves da covid-19."

Voltar a se exercitar � dif�cil

Mas romper com a da "rotina do isolamento" � algo mais f�cil de falar do que de fazer.

Abueng Sekgwelea, uma professora de taekwondo e instrutora de fitness baseada em Joanesburgo, na �frica do Sul, disse � BBC que � f�cil para as pessoas perderem a motiva��o em tempos como estes.

"As pessoas n�o est�o bem emocionalmente. Alguns de meus alunos precisam se conseguir uma alimenta��o adequada antes de realmente pensarem em se exercitar", diz Sekgwelea.

"Mas � importante que cuidemos uns dos outros. Uma amiga meu que n�o fazia exerc�cios regularmente teve um derrame durante o confinamento."

Ela ajudou desde ent�o ajudou sua amiga a se recuperar. "Ela perdeu 10 kg desde que comecei a trabalhar com ela", diz Sekgwelea.

� de alguma forma uma distra��o bem-vinda da pr�pria situa��o da instrutora de fitness: ela n�o tem alunos e nenhuma renda no momento por causa das restri��es do isolamento na �frica do Sul, que est�o apenas come�ando a serem afrouxadas.

"Isso me afetou mais emocionalmente do que financeiramente. Eu tive que me certificar de que permaneceria ativa. Ent�o, usei escadas para exerc�cios aer�bicos, por exemplo. Quero mostrar �s pessoas que elas n�o precisam de academia para se manter em forma."

A jornada de Shar

Lembra-se de Shar Reid, a futura advogada? Ela tamb�m perseverou.

Come�ando com as sess�es de exerc�cios extremamente populares no YouTube do guru do fitness brit�nico Joe Wicks, ela se levantou do sof� e usou �reas remotas perto de sua casa para fazer longas caminhadas.

View this post on Instagram

Taken the leap and sharing my lockdown fitness journey. It's tough without a PT and no weights but surprisingly I have enjoyed the new challenge! . . . #fitnessjourney #nutrition #health #gym #exercise #cardio #strengthtrainingforwomen #strengthtraining

A post shared by Shar (@shars_fitnessjourney) on May 16, 2020 at 2:12am PDT

� uma hist�ria que Shar agora conta em seu perfil no Instagram, com postagens que n�o s�o apenas fotos de treinos comuns, mas tamb�m incluem cita��es motivacionais com as quais ela espera inspirar outras pessoas.

"A maioria dos meus amigos estava apenas bebendo e comendo durante o confinamento", diz ela. "Por estar no grupo de risco por causa da asma, eu precisava me proteger."

• COMO SE PROTEGER: O que realmente funciona
• COMO LAVAR AS M�OS: V�deo com o passo a passo
• TRATAMENTOS: Os 4 avan�os que reduzem risco de morte por covid-19
• SINTOMAS E RISCOS: Caracter�sticas da doen�a
• 27 PERGUNTAS E RESPOSTAS: Tudo que importa sobre o v�rus
• MAPA DA DOEN�A: O alcance global do novo coronav�rus

• Clique para assinar o canal da BBC News Brasil no YouTube

J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!