
Em qualquer discuss�o sobre se uma vacina � segura, h� um dado que vale a pena ter em mente: 1 em 850. Cerca de 1 em cada 850 habitantes do Brasil j� morreu de uma doen�a respirat�ria grave durante a pandemia de COVID-19 em 2020, um patamar 20 vezes maior do que em 2019. Esta � a amea�a conhecida da doen�a em rela��o � qual todos os riscos de medicamentos e vacinas devem ser analisados.
At� agora, duas pessoas no Reino Unido que receberam a vacina da Pfizer/BioNTech contra o coronav�rus tiveram rea��es al�rgicas. M�dicos afirmam que elas tiveram
uma rea��o anafilactoide, que tende a envolver erup��o na pele, falta de ar e, �s vezes, queda da press�o arterial. Isso n�o � a mesma coisa que anafilaxia, que pode ser fatal. Ambas s�o funcion�rios do NHS (o SUS brit�nico), t�m hist�rico de alergias graves e carregam sempre canetas de adrenalina.
Peter Openshaw, professor e especialista em imunologia do Imperial College London, disse: "O fato de descobrirmos t�o precocemente essas duas rea��es al�rgicas e de o �rg�o regulador brit�nico ter agido logo sobre isso ao emitir um veto � vacina para pessoas com alergias graves mostra que o sistema de monitoramento est� funcionando bem."
Ent�o, o que significa dizer que as vacinas contra COVID-19 s�o "seguras" para uso?
"Se voc� pensa em absolutamente nenhum efeito adverso, ent�o nenhuma vacina e nenhum rem�dio ser�o ‘seguros’ nesse sentido. Todo medicamento eficaz tem efeitos indesejados. Ent�o, quando falamos que � ‘seguro’, falamos do peso dos efeitos indesejados em compara��o com o benef�cio � muito claramente a favor do benef�cio", explica Stephen Evans, professor da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.
O �rg�o regulat�rio do Reino Unido, o MHRA (uma esp�cie de Anvisa), decidiu que a vacina da Pfizer/BioNTech atingiu esse patamar citado por Evans. E as exig�ncias feitas em rela��o a vacinas s�o enormes.
Alto n�vel de exig�ncia
H� alguns medicamentos que acarretam consequ�ncias realmente brutais no corpo, mas ainda assim s�o aprovadas porque avaliou-se que o benef�cio compensa o risco.

O tratamento de quimioterapia, por exemplo, tem uma lista enorme de efeitos danosos ao corpo, como exaust�o, perda de cabelo, anemia, infertilidade e problemas de mem�ria e de sono.
No entanto, quando os pacientes est�o lidando com uma eventual morte por um c�ncer terminal, ningu�m questiona os medicamentos usados.
Outros podem ter efeitos colaterais graves que s�o incrivelmente raros. O analg�sico ibuprofeno, que quase todos n�s temos em casa e tomar�amos sem hesitar, pode causar sangramento e formar buracos no est�mago e nos intestinos, dificuldade para respirar e danos aos rins.
Os riscos existem, mas s�o amplamente superados pelos benef�cios.

"O conceito de ‘seguro’ n�o � uma coisa absoluta, � ‘seguro’ no contexto de cada uso", explica Evans.
A principal diferen�a com as vacinas � que elas s�o administradas a pessoas saud�veis e isso muda drasticamente o equil�brio. Ou seja, qualquer risco envolvido na aplica��o precisa necessariamente ser muito pequeno.
Uma decis�o de 10 mil p�ginas
Os �rg�os reguladores no Reino Unido tomaram a decis�o de autorizar a distribui��o da vacina contra COVID-19 baseados em muito mais informa��es do que vieram a p�blico, geralmente em forma de comunicados � imprensa.
N�o h� jeito de esconder qualquer coisa nesse processo. Se houver algum problema ligado � seguran�a da vacina ou mesmo lacunas, os reguladores v�o enxerg�-los.
Os fabricantes da vacina precisam entregar todos os dados ligados aos estudos em laborat�rio, estudos em animais, os testes de seguran�a de fase 1, os testes de dosagem de fase 2 e as informa��es sobre a fase 3, onde se determina se o imunizante funciona e se � seguro.
"Isso totaliza pelo menos 10 mil p�ginas de informa��es", explica Evans, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.
A vacina Pfizer/BioNTech reduz os casos de COVID-19 em cerca de 95% das pessoas imunizadas, mas acarreta efeitos colaterais bastante comuns, incluindo dor no local da inje��o, dor de cabe�a, calafrios e dores musculares. Isso pode afetar mais de 1 em cada 10 pessoas.
Todos esses s�o sinais do sistema imunol�gico entrando em a��o e podem ser controlados com paracetamol, por exemplo.
Segundo dados da US Food and Drug Administration (FDA, uma esp�cie de Anvisa dos Estados Unidos), os estudos com a vacina da Pfizer/BioNTech apontaram que no grupo de pessoas que desenvolveram algum efeito colateral foram registrados dor no bra�o (84%), cansa�o (63%), dor de cabe�a (55%), dor muscular (38%), calafrio (32%) e febre (14%).
“A vacina de RNA (como a da Pfizer/BioNTech) para a COVID-19 j� foi testada em mais de 70 mil pessoas nos ensaios cl�nicos de fase 3. Os efeitos adversos mais s�rios observados s�o dor moderada/intensa no local de aplica��o e febre. Pode ser que ocorra um efeito adverso raro (por exemplo, 1 em 1 milh�o) que n�o foi detectado em fase 3? Sim. Mas o acompanhamento dos vacinados para efeitos adversos continua depois da aprova��o. Ser� a fase 4. Resumindo: at� o momento, n�o h� nenhuma indica��o que as vacinas de mRNA n�o sejam seguras. Eu tomaria essa vacina e a aplicaria no meu filho, o meu bem mais precioso”, afirmou a m�dica epidemiologista Denise Garrett, vice-presidente do Instituto Sabin de Vacinas.
Em rela��o � vacina em desenvolvimento pela Universidade de Oxford em parceria com a farmac�utica AstraZeneca, nenhum evento adverso grave ou morte foram associados � aplica��o da vacina ChAdOx1 nCoV-19. Dos 175 eventos graves do tipo que ocorreram durante os estudos, apenas dois foram inicialmente associados � aplica��o da vacina.
Um deles inclusive levou � paralisa��o dos estudos em setembro, at� que um comit� independente avaliasse a rela��o de causa e efeito entre a vacina e o efeito adverso (um quadro de mielite transversa, uma esp�cie de inflama��o na medula). Dias depois, a Anvisa autorizou a retomada dos estudos no Brasil porque “concluiu que a rela��o benef�cio/risco se mant�m favor�vel”.
O segundo caso foi em um paciente que desenvolveu febre acima de 40ºC depois de receber a primeira dose, mas n�o teve o mesmo quadro na segunda dose. Ainda n�o foi revelado se esse paciente pertence ao grupo que recebeu a vacina de verdade ou �quele que recebeu a dose placebo. Essa divis�o dos participantes � feita nos estudos para determinar efic�cia e seguran�a sem qualquer vi�s.
"Os profissionais do MHRA (a Anvisa brit�nica) s�o muito experientes, podemos ficar tranquilos se o regulador disser que os benef�cios claramente superam os riscos, que deveria ser o objetivo de tudo", afirma Penny Ward, professora e pesquisadora do King's College London e da Faculdade de Medicina Farmac�utica.
Problemas mais raros
� sempre poss�vel que as vacinas tenham consequ�ncias para a sa�de que ainda n�o ficaram claras.
Existem dados dispon�veis sobre ao menos 20 mil pessoas que foram imunizadas no estudo da Pfizer/BioNTech, 15 mil na vacina Moderna e 10 mil para a desenvolvida por Oxford/AstraZeneca.
Isso � o suficiente para mostrar que as vacinas funcionam e detectar problemas comuns. Mas esses estudos podem n�o conseguir captar algo que afeta 1 em cada 50 mil pessoas que s�o imunizadas, por exemplo.
“Se o efeito colateral for extremamente raro, voc� nem sempre consegue identific�-lo antes de uma autoriza��o, e precisaria avaliar antes milh�es de pessoas”, explica Ward.
Isso � verdadeiro para todas as vacinas aprovadas. N�o � um problema �nico ou novo com os imunizantes contra a COVID-19.
A vacina da gripe sazonal foi associada a uma chance de 1 em 1 milh�o de desenvolver a s�ndrome de Guillain-Barr�, mas o pr�prio v�rus da gripe causa mais casos do que isso. E cerca de 1 em 900 mil pessoas tem rea��es al�rgicas graves, conhecidas como anafilaxia, a uma vacina.
"Muitos de n�s n�o pensamos duas vezes antes de dirigir para algum lugar, mas o risco de um acidente de carro � muito maior do que os efeitos graves de uma vacina", afirma Ward.
N�o caia em not�cias falsas
O perigo em torno do debate sobre efeitos colaterais � que as pessoas presumem erroneamente que problemas de sa�de que acontecem por coincid�ncia foram causados %u200B%u200Bpela vacina.
� f�cil prever que haver� hist�rias assustadoras nos pr�ximos meses: seja na imprensa ou nas redes sociais, com origens equivocadas ou simplesmente maliciosas.
Mas a verdade � que as pessoas ficam doentes o tempo todo. A cada 5 minutos no Reino Unido, uma pessoa tem um ataque card�aco e uma pessoa tem um derrame.
Mais de 600 mil pessoas morrem por ano.
Haver� casos em que um dia algu�m receber� a vacina, logo depois, ter� um s�rio problema de sa�de que teria acontecido mesmo se n�o tivesse sido imunizada.
“Podemos ver coisas que acontecem por infeliz coincid�ncia”, alerta Ward, do King's College London e da Faculdade de Medicina Farmac�utica.
H� uma amea�a real de repeti��o de erros cometidos quando a vacina MMR (sarampo, caxumba e rub�ola) foi falsamente associada ao autismo e levou a uma queda no n�mero de crian�as imunizadas.
� por isso que voc� precisar� manter a cabe�a no lugar enquanto o programa de vacina��o avan�a pelo mundo.
E � por isso que a seguran�a das vacinas � monitorada muito depois de uma delas ser aprovada para ver se h� algum problema de sa�de desconhecido. A Anvisa brit�nica, por exemplo, tem um programa para registro de problemas pelos pacientes e monitora dados an�nimos de consult�rios m�dicos em busca de quaisquer sinais de alerta ligados � vacina.
* Com informa��es adicionais de Nick Triggle e Rachel Schraer, da BBC News, e Matheus Magenta, da BBC News Brasil.

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