Checamos: Postagens com c�psula vazia n�o provam 'conspira��o' de prefeitos contra cloroquina

Publica��es compartilhadas mais de 11,2 mil vezes nas redes sociais desde o �ltimo dia 7 de agosto afirmam mostrar uma c�psula de cloroquina aberta, aparentemente vazia, distribu�da por alguns prefeitos para “provar” que este medicamento n�o funciona contra o novo coronav�rus.

A imagem, na verdade, foi retirada de um v�deo que mostrava ivermectina, entregue em uma a��o realizada por empres�rios no Mato Grosso, em parceria com um hospital privado.

“A canalhice de alguns prefeitos: Comprimidos de Cloroquina esvaziados s� para tentar ‘provar’ que a terapia n�o funciona”, diz o texto que acompanha a imagem do medicamento aberto, que viralizou no Facebook (1, 2, 3), Twitter (1) e Instagram (1, 2, 3) desde o in�cio de agosto.

Por vezes, algumas postagens s�o acompanhadas de uma captura de tela em que se v� nome do usu�rio @blogdojefferson, sugerindo que a publica��o seria de Roberto Jefferson, presidente nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), com a seguinte legenda: “Abram, chequem e se poss�vel, guardem uma pequenina amostra. Caso sintam que algo est� errado, procurem a Pol�cia Federal e entreguem a amostra do conte�do”.

A imagem viralizada � na verdade, um fragmento de um v�deo sobre um caso ocorrido no munic�pio de Pontes e Lacerda, no Mato Grosso. A grava��o foi feita por uma mulher que diz ter recebido ivermectina – n�o cloroquina – no hospital privado Vale do Guapor�, na cidade mato-grossense, que fechou uma parceria com empres�rios locais para a distribui��o deste medicamento como profilaxia da COVID-19, embora n�o tenha efic�cia comprovada.

Ivermectina, n�o cloroquina

Uma pesquisa inicial no Google por “c�psula + vazia” mostrou que uma hist�ria semelhante � da suposta c�psula de cloroquina vazia havia acontecido em Pontes e Lacerda, mas com a ivermectina. A partir desta informa��o, o Checamos buscou publica��es que mencionassem a “ivermectina esvaziada”, chegando a tr�s postagens. Nelas, havia um v�deo, com uma qualidade superior �s das fotos viralizadas nas redes sociais, possibilitaram a identifica��o do nome do medicamento: ivermectina de 6mg.

No v�deo, uma mulher diz: “Eu fui na Santa Casa pegar uma ivermectina para poder tomar mais a minha filha. [...] E hoje era a data certa de tomar a segunda dose, com 15 dias. [...] Ela tomou um comprimido e o outro, por curiosidade, eu acredito, ela foi e abriu. Olha o que tinha dentro da c�psula. Nada!”.

A imagem viralizada nas redes sociais corresponde a um fragmento do v�deo em que a mulher mostra a c�psula de ivermectina vazia.

A partir da informa��o do local onde isso teria ocorrido e o nome da coordenadora do projeto mencionado, Eliana Matsuda, o Checamos fez uma busca no Facebook e encontrou uma transmiss�o ao vivo realizada em 2 de julho de 2020 pela p�gina Lacerda 24 horas com Matsuda em frente ao Hospital Vale do Guapor� (HVG).

Segundo a descri��o do v�deo, tratava-se de um grupo de empres�rios que montou uma campanha para o “bloqueio da COVID-19” em Pontes e Lacerda e que distribuiria 10 mil doses de ivermectina gratuitamente.

Com in�cio em 6 de julho, a campanha, segundo Eliana Matsuda, era uma parceria entre empresas, o Hospital Vale do Guapor� e m�dicos. O protocolo de medica��o, por sua vez, foi feito pela doutora Jaqueline Margonato, do HVG.

A coordenadora do projeto e a doutora Jaqueline ressaltaram que, embora existam m�dicos que defendem o uso do medicamento, n�o h� comprova��o cient�fica da sua efic�cia na profilaxia da COVID-19.

Em contato telef�nico, Eliana Matsuda ressaltou que a iniciativa foi firmada entre empres�rios e o hospital sem “cunho pol�tico nem dinheiro p�blico”.

Tamb�m por telefone, a administradora do HGV Claudenice Luiza Lima assinalou que a mulher que gravou o v�deo com a c�psula de ivermectina n�o entrou em contato com a institui��o e que o laborat�rio onde os medicamentos foram comprados disse “n�o haver possibilidade de a c�psula ter ficado vazia porque o processo � automatizado”.

Por fim, relatou que a equipe “abriu outras caixas de medicamento e n�o encontrou c�psulas com defeito”.

O Checamos tamb�m entrou em contato por telefone com a prefeitura de Pontes e Lacerda, que afirmou n�o ter inger�ncia sobre o tema, e com a Secretaria de Sa�de do munic�pio, que acrescentou que o Hospital Vale do Guapor� � privado.

A equipe de checagem da AFP conversou com o presidente do Conselho Municipal de Sa�de de Pontes e Lacerda, Elizeu Almeida, que assinalou que soube do ocorrido pelas m�dias sociais e, por se tratar de um caso isolado e sem notifica��o formal, n�o deliberou sobre o tema.

A ivermectina industrializada � produzida em forma de comprimido, mas � poss�vel encontrar o medicamento em c�psulas em farm�cias de manipula��o. Em nota, o Hospital Vale do Guapor� informou que recorreu a um laborat�rio de manipula��o local porque “n�o havia na ind�stria, nos distribuidores e no com�rcio a ivermectina industrializada”.

Roberto Jefferson

Algumas imagens viralizadas nas redes t�m como base uma suposta publica��o feita pelo ex-deputado Roberto Jefferson, atual presidente nacional do PTB. Nas redes sociais dele, por�m, n�o h� nenhum registro de tal publica��o.

O ex-deputado e outros aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) s�o alvo de um inqu�rito sobre dissemina��o de not�cias falsas e ataques a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Na imagem em quest�o, � poss�vel ver que o nome do usu�rio � “blogdojefferson”, o mesmo que Roberto Jefferson usava para publicar tu�tes. Contudo, a conta dele na rede social est� suspensa desde 24 de julho, ap�s decis�o do ministro do STF Alexandre de Moraes.

Desde que sua conta foi bloqueada, Roberto Jefferson passou a usar o Twitter pelo usu�rio “@bobjeffhd”, como se pode confirmar em sua p�gina verificada no Facebook, no qual n�o consta nenhuma publica��o sobre c�psulas esvaziadas de cloroquina. Tamb�m n�o h� registros nas contas no pr�prio Facebook e no Instagram. Na rede social Parler, por sua vez, n�o foi encontrado nenhum perfil de usu�rio @blogdojefferson.

Em contato com a equipe de checagem, a assessoria do pol�tico negou que ele tenha feito a postagem.

A cloroquina e seu derivado, hidroxicloroquina, tem estado em evid�ncia desde o in�cio da pandemia, principalmente pela defesa de seu uso no tratamento contra a COVID-19 por parte do presidente Bolsonaro. Ap�s testar positivo para a doen�a no in�cio de julho, o chefe de Estado divulgou um v�deo em que aparecia supostamente tomando hidroxicloroquina e disse “estar se sentindo muito bem”. Cerca de duas semanas depois, anunciou que seu teste havia dado negativo.

A cloroquina e a hidroxicloroquina n�o t�m comprova��o de efic�cia no tratamento da doen�a causada pelo novo coronav�rus. A ag�ncia de Medicamentos e Alimentos dos Estados Unidos (FDA) revogou a autoriza��o de uso de emerg�ncia destes rem�dios, enquanto a Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) suspendeu seus estudos com a droga segue sem indicar qualquer medicamento espec�fico.

Em resumo, � falso que a imagem viralizada de uma c�psula aberta e aparentemente vazia seja de cloroquina e tenha sido distribu�da por prefeitos para “provar” que ela n�o funciona contra a COVID-19. Na verdade, trata-se do fragmento de um v�deo no qual uma mulher faz uma den�ncia sobre uma c�psula supostamente vazia de ivermectina, entregue em uma a��o de empres�rios do munic�pio de Pontes e Lacerda (MT), com a parceria de um hospital privado.

Esta investiga��o faz parte do Projeto Comprova. Participaram jornalistas da AFP, Estad�o e UOL.