'Foi um assalto na casa', disse um psicanalista sobre Maria da Penha, brasileira que deu nome � lei contra viol�ncia dom�stica. No v�deo da entrevista, compartilhado centenas de vezes nas redes sociais desde 5 de junho de 2022, ele explica que ela teria ficado parapl�gica ap�s uma tentativa de roubo. No entanto, nos autos do processo e na senten�a, o ent�o marido de Maria da Penha foi reconhecido como o autor dos disparos.
'Quantos de n�s sab�amos disto? A Maria da Penha ficou na cadeira de rodas devido a um assalto, n�o por culpa do marido', escreveu um usu�rio no Twitter (1, 2) ao compartilhar a sequ�ncia.
Conte�do semelhante tamb�m circula no Facebook (1, 2, 3), Instagram (1, 2, 3), Kwai (1, 2), TikTok e YouTube.

No fragmento viralizado nas redes sociais, Ventura questiona o caso emblem�tico que deu origem � Lei 11.340/06, promulgada em 2006 e que 'cria mecanismos para coibir a viol�ncia dom�stica e familiar contra a mulher'.
A vers�o sustentada por Ventura � a mesma da tese de defesa do acusado pelo crime e ex-marido de Maria da Penha, Marco Antonio Her�dia Viveros.
A 1ª Vara do J�ri da Comarca de Fortaleza, no Cear�, unidade onde tramitou o processo � �poca, enviou ao AFP Checamos os documentos referentes � senten�a condenat�ria e � senten�a de pron�ncia, no qual o juiz admite e reconhece a acusa��o como sendo um crime contra a vida e encaminhando o julgamento para o Tribunal do J�ri.
Nos documentos judiciais estabelece-se que n�o havia ind�cios de assalto. A tese da defesa foi refutada pelo juiz na decis�o de pron�ncia do caso.

O caso Maria da Penha
Em 1983, Maria da Penha Maia Fernandes foi baleada nas costas, enquanto dormia, pelo seu ent�o marido, Marco Antonio Her�dia Viveros, ficando parapl�gica devido a les�es irrevers�veis.
Na �poca, o agressor declarou � pol�cia que o casal tinha sido v�tima de uma tentativa de assalto e que o tiro foi disparado por assaltantes que invadiram a resid�ncia do casal. Essa vers�o foi desmentida pela per�cia.

Ao voltar para casa, Maria da Penha foi novamente v�tima de tentativa de feminic�dio por parte de Viveros. O ex-marido a manteve em c�rcere privado por duas semanas, per�odo em que tentou eletrocut�-la durante o banho. Ap�s essa segunda tentativa, ela levou o caso � Justi�a.
Maria da Penha esperou por oito anos at� o primeiro julgamento, que aconteceu em 1991, — na ocasi�o, seu ex-marido foi sentenciado a 15 anos de pris�o, mas a defesa recorreu da decis�o e Viveros foi colocado em liberdade.
Em 1996, houve o segundo julgamento e Viveros foi condenado a 10 anos e 6 meses de pris�o, contudo, novamente, n�o cumpriu a pena. Entre 1997 e 2001, o recurso ficou estagnado no Tribunal de Justi�a do Cear� (TJ-CE) � espera de julgamento. O agressor de Maria da Penha foi preso em 2002, 19 anos ap�s o crime.

Legisla��o sobre viol�ncia dom�stica
Na �poca do caso de Maria da Penha, o Brasil n�o tinha uma legisla��o espec�fica para viol�ncia dom�stica ou feminic�dio.
O Brasil foi denunciado na Comiss�o Interamericana de Direitos Humanos por omiss�o em rela��o � viol�ncia dom�stica em um documento publicado em 4 de abril de 2001.
'A Comiss�o considera que as decis�es judiciais internas neste caso apresentam uma inefic�cia, neglig�ncia ou omiss�o por parte das autoridades judiciais brasileira e uma demora injustificada no julgamento de um acusado, bem como p�em em risco definitivo a possibilidade de punir o acusado e indenizar a v�tima', diz um trecho do relat�rio.
O pa�s foi responsabilizado pela toler�ncia e omiss�o estatal sistem�ticas no tratamento de casos de viol�ncia contra a mulher. A Organiza��o dos Estados Americanos (OEA) recomendou ao governo brasileiro a ado��o de uma lei espec�fica que pudesse prevenir a viol�ncia dom�stica e proteger a mulher.
Em 2006, foi sancionada a Lei 11.340/06, que ficou conhecida como Lei Maria da Penha, e criou mecanismos de combate e puni��o para agress�es contra mulheres.
O conte�do tamb�m foi checado pelo Aos Fatos, Estad�o Verifica e UOL.