
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) devem julgar em breve o recurso extraordin�rio que poder� descriminalizar o uso de drogas para consumo pr�prio no Brasil. A a��o, interposta no STF pela Defensoria P�blica de S�o Paulo, pede que um homem condenado a dois meses de presta��o de servi�o � comunidade por portar 3g de maconha n�o seja punido. A discuss�o � antiga e envolve muita controv�rsia entre setores progressistas e conservadores da sociedade.
O relator do caso � o ministro Gilmar Mendes, que, na �ltima quinta-feira, liberou o processo para ser apreciado pelo plen�rio da Corte. A partir de agora, a decis�o est� nas m�os do presidente do Supremo, ministro Ricardo Lewandowski, que dever� indicar quando o recurso ser� analisado. O processo estava parado por causa da composi��o do STF, incompleta desde a sa�da do ministro Joaquim Barbosa. A vac�ncia de 11 meses na Corte foi preenchida ap�s a chegada do ministro Luiz Edson Fachin.
A a��o tem repercuss�o geral, ou seja, a decis�o que for aplicada ao caso concreto ser� estendida a processos semelhantes em inst�ncias inferiores. Na pr�tica, caso os ministros sejam favor�veis � tese apresentada, isso representaria a libera��o do porte de pequenas quantidades de drogas no Brasil. O argumento da defesa � o de que o artigo 28 da Lei Antidrogas viola a Constitui��o no que se refere ao direito � vida privada.
O referido artigo estabelece que � crime “quem adquirir, guardar, tiver em dep�sito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autoriza��o ou em desacordo com determina��o legal”. A discuss�o chegou ao Supremo em 2011 e, na �poca, a Procuradoria-Geral da Rep�blica (PGR) foi contra a descriminaliza��o. Segundo a PGR, a lei visa proteger a sa�de publica.
O argumento, no entanto, � refutado pelo coordenador de Rela��es Institucionais da Plataforma Brasileira de Pol�tica de Drogas, o cientista pol�tico Gabriel Santos Elias. “O Estado deve ter, sim, uma pol�tica de sa�de para usu�rios de drogas. Ele restringe o acesso a medicamentos derivados das drogas, como o THC e canabidiol, mas ao mesmo tempo n�o oferece tratamento aos usu�rios.”
Contradi��o
Defensor da descriminaliza��o, Gabriel Santos questiona uma contradi��o que ocorre no Brasil. “Muitas vezes o governo combate as drogas il�citas, mas permite o consumo de �lcool e cigarro. A maconha, por exemplo, tem menos rela��o com a viol�ncia do que as drogas consideradas l�citas. Qualquer pol�tica p�blica de sa�de tem que ser baseada em evid�ncias cient�ficas, e os direitos humanos devem permear essa discuss�o”, defende.
Em 2013, ex-ministros da Justi�a, como Nelson Jobim e M�rcio Thomaz Bastos, enviaram of�cio ao ministro Gilmar Mendes, relator do recurso, pedindo a descriminaliza��o do porte de drogas para uso particular. Os juristas afirmaram que a atual pol�tica de combate �s drogas � um fracasso e afirmaram que oferecer tratamento ao usu�rio � mais adequado do que rotul�-lo como criminoso.
O ministro Marco Aur�lio Mello n�o quis antecipar o voto, mas criticou o modo como o tema � tratado no Brasil. “Aqui se inverte a ordem natural das coisas. Primeiro, deveria vir a apura��o dos fatos e, depois, caso seja culpado, a pris�o do indiv�duo. � por isso que a popula��o carcer�ria provis�ria chegou ao mesmo patamar dos detentos considerados definitivos, com senten�a decretada. A quest�o de enquadrar algu�m como usu�rio ou traficante � complexa e merece um estudo mais aprofundado.”
Um dos problemas que dever� ser enfrentado pelos ministros da Corte trata da diferencia��o entre usu�rio e traficante. N�o h�, atualmente, crit�rios que definam o que pode ser considerado consumo pessoal ou o que � tr�fico. Hoje, essa decis�o cabe ao policial que efetua a pris�o. � prov�vel que Gilmar Mendes sugira que, no ato da apreens�o, a pessoa seja levada a um juiz para que analise, antes de qualquer medida, se deve ser enquadrado como usu�rio ou traficante. Nos pa�ses em que o uso foi descriminalizado, a diferen�a foi estabelecida a partir da quantidade de droga portada.
O modelo � defendido pelo advogado Rafael Cust�dio, coordenador do programa de justi�a da Conectas Direitos Humanos. “� preciso um crit�rio absoluto quanto a isso. Para n�s, 50 gramas de maconha � um n�mero razo�vel. N�o pode haver interpreta��o subjetiva, sabemos que preconceito e racismo falam mais alto nesses casos. Um jovem negro da periferia jamais ser� julgado da mesma forma que um branco de classe m�dia”, compara.