
Conte�do verificado: Texto do site Pleno.News que usou trechos de reportagem da ag�ncia estatal turca Anadolu sobre a rela��o da hidroxicloroquina com o baixo n�mero de �bitos por covid-19 em Cuba
� enganoso que o bom desempenho de Cuba frente � pandemia de covid-19 seja atribu�do ao uso de hidroxicloroquina. � o que afirma, erroneamente, texto do site Pleno.News que viralizou nas redes sociais no Brasil. As informa��es, baseadas em reportagem da ag�ncia de not�cias estatal turca Anadolu, foram compartilhadas, por exemplo, pelos deputados federais Carla Zambelli (PSL-SP) e Marco Feliciano (Republicanos-SP).
Para fazer a rela��o entre a hidroxicloroquina e o baixo n�mero de mortes no pa�s, o texto distorce declara��es do pesquisador cubano Agust�n Lage, consultor de um grupo de organiza��es que colabora com o Minist�rio da Sa�de P�blica de Cuba. Em entrevista ao Comprova, Lage afirmou ter dito que a droga faz parte do tratamento juntamente com outros medicamentos, mas que n�o pode ser considerada a �nica respons�vel pelo bom desempenho do pa�s no combate � pandemia – informa��o acrescentada em uma atualiza��o do texto no site Pleno.News em 16 de julho.
Entretanto, o Comprova tamb�m conversou com Ricardo Pereda, coordenador do grupo para o tratamento da covid-19 no minist�rio e, de acordo com ele, o protocolo cubano para a doen�a n�o inclui a hidroxicloroquina – apenas a cloroquina foi incorporada.
Como verificamos?
O primeiro passo foi procurar pelos termos “Agust�n Lage” e “hydroxychloroquine” no Google para ler a entrevista original do pesquisador cubano. A busca nos retornou uma reportagem publicada pela ag�ncia turca Anadolu. O texto afirma que “autoridades m�dicas cubanas dizem que o pa�s usa a hidroxicloroquina e outras drogas exclusivas para o tratamento contra o novo coronav�rus”.
Como a Anadolu � estatal, consultamos mat�rias publicadas em ve�culos internacionais para saber qual � o posicionamento do governo turco com rela��o � hidroxicloroquina. Solicitamos informa��es ao Minist�rio da Sa�de da Turquia em 15 de julho, mas n�o obtivemos resposta at� a publica��o desta verifica��o.
O segundo passo foi entrar em contato com Agust�n Lage. O texto publicado pela Anadolu diz que ele � consultor do presidente do grupo empresarial BioCubaFarma e ex-diretor do Centro de Imunologia Molecular (CIM) de Havana. Assim, entramos em contato por e-mail e por mensagens no Facebook com as duas institui��es, bem como com o Minist�rio da Sa�de cubano, em 16 de julho. Tanto o CIM quanto a BioCubaFarma confirmaram que ele era, respectivamente, ex-diretor e consultor cient�fico. Disseram que passariam nosso contato para o pesquisador, mas n�o tivemos retorno.
O Projeto Comprova, ent�o, solicitou a jornalistas cubanos que participam da alian�a de organiza��es latino-americanas de fact-checking LatamChequea o contato de Lage. Eles nos passaram o e-mail do m�dico e, assim, conseguimos abord�-lo sobre sua entrevista para a ag�ncia turca e tamb�m sobre suas afirma��es acerca da hidroxicloroquina. Lage ainda nos passou o contato de Ricardo Pereda, coordenador do grupo para o tratamento da covid-19 no Minist�rio da Sa�de P�blica de Cuba. Ele nos informou, por e-mail, que o protocolo cubano n�o inclui a hidroxicloroquina, dado que pudemos confirmar no site Covid19CubaData, enviado por um dos jornalistas cubanos. Com essa informa��o, tentamos falar novamente com Lage, mas ele n�o respondeu mais os e-mails at� a publica��o deste texto.
O Comprova fez esta verifica��o baseado em informa��es cient�ficas e dados oficiais sobre o novo coronav�rus e a covid-19 dispon�veis no dia 24 de julho de 2020.
Verifica��o
TEXTO DA AG�NCIA ANADOLU
A ag�ncia estatal turca Anadolu publicou, em 10 de julho, uma reportagem sobre o tratamento precoce da covid-19 em Cuba. A mat�ria entrevista o m�dico cubano Agust�n Lage, identificado como “consultor do presidente da BioCubaFarma e ex-diretor do Centro de Imunologia Molecular de Havana”.
O conte�do d� destaque ao uso da hidroxicloroquina no tratamento. Segundo Lage afirma na reportagem, os m�dicos cubanos est�o cientes da “pol�mica” envolvendo o medicamento, mas “consideram positivos os resultados” que sua prescri��o alcan�ou. Ainda nas palavras do m�dico, a hidroxicloroquina “� usada nos est�gios iniciais da doen�a em pacientes sem comorbidades, uma vez que a droga poderia agrav�-las”. Em seguida, ele nega que a hidroxicloroquina seja “o principal produto usado no protocolo de tratamento da covid-19” e destaca o papel da BioCubaFarma no combate � pandemia, uma vez que alguns dos rem�dios s�o produzidos em Cuba.
O governo da Turquia considera a prescri��o de hidroxicloroquina como um fator preponderante no combate � pandemia no pa�s, conforme disse � rede norte-americana CBS um dos consultores do grupo montado para atuar contra a pandemia. J� a rede brit�nica BBC mostrou o entusiasmo do diretor de um hospital onde � utilizado o protocolo de tratamento com o medicamento. Ambos os textos lembram que estudos ao redor do mundo falharam em provar a efic�cia da hidroxicloroquina no tratamento da covid-19 (veja mais abaixo).
O QUE DIZ AGUST�N LAGE
O m�dico afirmou por e-mail ao Projeto Comprova que o prop�sito de sua entrevista para a ag�ncia Anadolu era falar dos produtos da biotecnologia cubana. “Ao que parece, os jornalistas estavam especialmente interessados nestes dois medicamentos (cloroquina e hidroxicloroquina), por isso, lhe deram maior visibilidade (no texto)”, disse o especialista.
Questionado se a hidroxicloroquina � um dos medicamentos respons�veis pelo baixo n�mero de mortes pela covid-19 em Cuba, Lage respondeu falando sobre a cloroquina – os dois medicamentos levam a mesma subst�ncia (a cloroquina), mas t�m efeitos distintos, segundo reportagem do UOL. Ao Comprova, Lage escreveu: “Eu n�o disse que a cloroquina foi respons�vel pela baixa mortalidade da covid-19 em Cuba. Este � um dos medicamentos, dentre outros. Na verdade, a baixa mortalidade no pa�s � resultado da pol�tica de sa�de estabelecida em plano �nico que envolve muitos minist�rios e organiza��es do Estado e que inclui a��es epidemiol�gicas e cl�nicas”.
Depois de conversar com Pereda, do Minist�rio da Sa�de P�blica de Cuba, e ser informado de que o pa�s n�o inclui a hidroxicloroquina em seu protocolo, o Comprova tentou falar novamente com Lage, mas ele n�o respondeu as perguntas enviadas por e-mail.
Protocolo da covid-19 em Cuba
Diferentemente do que afirma o texto da Anadolu, Cuba n�o usa a hidroxicloroquina, conforme contou ao Comprova Ricardo Pereda, coordenador do grupo central para tratamento da covid-19 do Minist�rio da Sa�de P�blica cubano. A informa��o tamb�m foi confirmada no site Covid19CubaData, que apresenta os medicamentos usados em cada vers�o do protocolo cubano e � utilizado pelo governo.
“A partir da segunda vers�o do protocolo, utilizamos a cloroquina; n�o dispusemos de hidroxicloroquina”, afirmou, por e-mail, Pereda. Na quarta atualiza��o do protocolo, o pa�s passou a utilizar a cloroquina em conjunto com outras drogas em pacientes testados positivos para covid-19 e com sintomas cl�nicos de evolu��o para uma piora. De acordo com o especialista, os protocolos cubanos se baseiam em terapias combinadas com medicamentos resultantes da biotecnologia nacional e uma nova vers�o do protocolo vai ser lan�ada oficialmente nos pr�ximos dias.
Questionado sobre se a cloroquina � uma das respons�veis pelo baixo n�mero de v�timas do novo coronav�rus em Cuba, como afirma o texto verificado, Pereda foi categ�rico: “N�o � uma droga. � uma estrat�gia epidemiol�gica de interven��o em escala nacional, a partir de um plano nacional dirigido pelo estado, no qual todos participam”. E acrescentou que o sucesso tamb�m � resultado de medidas como o isolamento de contatos suspeitos e confirmados, o tratamento no in�cio dos sintomas – e tratamentos para as diferentes fases da doen�a – e a combina��o de medicamentos. “N�o existe, at� agora, um medicamento de total efic�cia comprovada, que seja o respons�vel pelos resultados favor�veis”, esclareceu.
No contato com o Comprova, Pereda afirmou que “toda a sociedade, de uma forma ou de outra, participou do combate � covid-19” e exemplificou medidas como “a educa��o da popula��o, a informa��o correta, a total transpar�ncia da informa��o a que o povo tem acesso diariamente e as campanhas educativas em todos os meios dispon�veis”.
BioCubaFarma e Centro de Imunologia Molecular de Havana
Segundo Lage, a BioCubaFarma � um grupo de 32 empresas da �rea farmac�utica e de biotecnologia, que colabora estreitamente com o Minist�rio da Sa�de P�blica de Cuba, mas n�o faz parte dele. A institui��o atua em diferentes programas de sa�de do governo por meio de pesquisas e fornecimento de diferentes rem�dios – � respons�vel pelo fornecimento de 60% dos medicamentos considerados essenciais em Cuba, inclusive de alguns para o tratamento da covid-19, “garantindo a cobertura nacional e o acesso universal gratuito para o paciente”. A empresa n�o participa da formula��o do protocolo de tratamento.
J� o Centro de Imunologia Molecular (CIM) de Havana, que Lage dirigiu at� 2018 e atualmente mant�m rela��es como docente, � um centro de pesquisa. Seu campo de atua��o � o tratamento de c�ncer e outras doen�as n�o infecciosas. Por isso, conforme explicou Lage, o papel do CIM no combate da covid-19 tem sido prestar apoio para outras institui��es de atua��o mais direta.
Hidroxicloroquina e cloroquina
Em 20 de maio, o protocolo adotado pelo Minist�rio da Sa�de brasileiro ampliou a possibilidade do uso das duas drogas para pacientes com sintomas leves da doen�a – at� ent�o, elas eram previstas apenas em casos graves e com monitoramento em hospitais. A publica��o foi uma press�o pol�tica do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e custou o cargo do ent�o ministro da Sa�de Nelson Teich. O documento, por�m, ressalta que n�o h� comprova��o da efic�cia das medica��es e deixa sua prescri��o a crit�rio dos m�dicos.
Tamb�m em maio, o Journal of the American Medical Association (Jama) e o British Medical Journal (BMJ) publicaram pesquisas questionando a efic�cia tanto da cloroquina quanto da hidroxicloroquina. Os resultados dos estudos apontaram que pacientes tratados com essas drogas n�o tiveram melhores resultados que aqueles que n�o receberam os mesmos rem�dios.
Em junho, pesquisadores do Recovery, estudo cl�nico conduzido no Reino Unido, afirmaram n�o haver benef�cio no uso da hidroxicloroquina em pessoas com covid-19.
A Organiza��o Mundial de Sa�de (OMS) informou no dia 4 de julho deste ano que aceitou a recomenda��o do Comit� Diretor Internacional do Estudo de Solidariedade – grupo de estudos cl�nicos, do qual participam 5500 pacientes em 21 pa�ses – para interromper os estudos sobre hidroxicloroquina devido aos baixos resultados e avan�os na redu��o da mortalidade de pacientes com covid-19 hospitalizados. “Esses resultados provis�rios mostram que a hidroxicloroquina e o lopinavir/ritonavir produzem pouca ou nenhuma redu��o na mortalidade de pacientes com covid-19 hospitalizados quando comparados ao padr�o de atendimento. Os investigadores do estudo interromperam os estudos com efeito imediato”, explica a declara��o, no site da OMS.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conte�dos suspeitos sobre a pandemia de covid-19 que viralizam nas redes sociais. As ondas de desinforma��o s�o pautadas pela polariza��o e o mesmo padr�o se repete na pandemia. A hidroxicloroquina e a cloroquina foram levadas para o centro da disputa ideol�gica ap�s os presidentes Donald Trump, dos Estados Unidos, e Jair Bolsonaro, do Brasil, defenderem seu uso – mesmo sem comprova��o cient�fica.
A Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) salienta que at� o momento n�o h� tratamento ou vacina dispon�vel para a covid-19. Apesar disso, cada pa�s adota um protocolo de tratamento dos sintomas e de apoio aos doentes que considerar melhor. Por isso, os protocolos de outros pa�ses s�o comumente tirados de contexto para avalizar um tipo ou outro de rem�dio.
O Comprova j� desmentiu que a �frica tivesse controlado a pandemia apenas com o tratamento do verm�fugo ivermectina. Tampouco o uso da cloroquina seria respons�vel pela situa��o da covid-19 no Senegal.
O texto publicado pelo site Pleno.News teve mais de 247 mil intera��es at� a publica��o desta checagem, segundo a ferramenta de monitoramento de redes sociais CrowdTangle. As informa��es foram compartilhadas por outros blogs como o Gazeta Brasil e tamb�m serviram de fonte para post dos deputados federais Carla Zambelli (PSL-SP) e Marco Feliciano (Republicanos-SP)
Enganoso, para o Comprova, � todo o conte�do retirado do contexto original e usado em outro com o prop�sito de mudar o seu significado; que induz a uma interpreta��o diferente da inten��o de seu autor; conte�do que confunde, com ou sem a inten��o deliberada de causar dano.
