
A mandioca foi batizada de quimera. Na mitologia grega, o termo � dado a um monstro cuja apar�ncia revela um h�brido de v�rios animais. Na pesquisa de Nassar, por sua vez, o nome indica que o tub�rculo re�ne caracter�sticas de duas variedades compat�veis -uma delas � silvestre e a outra, cultivada- que foram postas em contato para que sintetizassem a nova mandioca, sem qualquer tipo de cruzamento sexual.
"A quimera estimula a produ��o de ra�zes. N�s aumentamos o tamanho da raiz e, ent�o, elevamos a produ��o de f�cula, da farinha, do amido. N�s aumentar�amos a produ��o nacional duas ou tr�s vezes", diz Nassar.
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De acordo com o pesquisador, a ideia � que, juntas com outras variedades de mandioca melhoradas, estacas da quimera sejam levadas a cinco agricultores paraibanos depois do per�odo de seca do inverno deste ano. A finalidade � aumentar a produ��o local.
Para isso, o professor afirma ter submetido o projeto ao Minist�rio do Desenvolvimento Agr�rio. Segundo ele, as tratativas ainda est�o no in�cio e ainda h� muito para ser organizado. Procurada pela Folha, a pasta diz que ainda n�o h� nada de concreto que possa ser divulgado sobre a iniciativa.
As quimeras foram desenvolvidas h� cerca de oito anos, segundo Nassar, e ser�o propagadas para os agricultores.
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De acordo com o cientista, tamb�m devem ser escolhidas casas de farinha para receber instru��es sobre como enriquecer a farinha da mandioca por meio da folha do tub�rculo. A adi��o, diz ele, � capaz de elevar o teor proteico de 1% para 9%.
Em seu mestrado, conclu�do em 2019, a agr�noma Deziany da Silva Ferreira, 28, usou as quimeras desenvolvidas por Nassar, seu coorientador � �poca, entre as variedades de mandioca analisadas pelo projeto. Ao final da experi�ncia, ela verificou que as quimeras tinham boa resist�ncia aos nemat�ides, vermes microsc�picos que causam danos �s ra�zes das plantas, e tamb�m era capaz de transferir resist�ncia de uma variedade a outra em um curto per�odo de tempo.
Segundo Ferreira, a pesquisa foi bancada pela Funagib, funda��o criada por Nassar para promover e subsidiar, com recursos pr�prios, pesquisas sobre a mandioca.
"Foi um trabalho muito interessante. � muito importante, principalmente para a �frica, que utiliza muito a mandioca como manufatura", diz ela.
A funda��o foi criada por Nassar depois de ele ter sido condecorado, em 2014, com o Kuwait International Prize of Environment por suas pesquisas em torno do melhoramento da mandioca. O cientista recebeu US$ 100 mil (cerca de R$ 250 mil, � �poca).
H� quase 50 anos no Brasil, Nassar veio ao pa�s em 1974 para estudar a cultura da mandioca na regi�o. Coletou e catalogou variedades silvestres e ajudou, ainda no s�culo passado, a desenvolver um h�brido resistente ao mosaico africano, uma praga que assolou as planta��es do tub�rculo em pa�ses da �frica e causou fome na regi�o.
Fora do meio acad�mico, o melhoramento gen�tico da mandioca faz parte das pesquisas do IAC (Instituto Agron�mico), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de S�o Paulo, desde a d�cada de 1930, segundo Jos� Carlos Feltran, pesquisador da institui��o.
Ele afirma que o desenvolvimento de uma nova variedade melhorada pode levar mais de 12 anos e custar de US$ 1 milh�o a US$ 2 milh�es (cerca de R$ 4,8 milh�es a R$ 9,7 milh�es). "S�o considerados a equipe envolvida, a estrutura f�sica, que inclui pr�dios, laborat�rios, fazendas, ve�culos etc., e o sal�rio das pessoas nesse tempo. Quem financia isso � o poder p�blico", diz.
Diferentemente da t�cnica utilizada pelo professor Nagib, o melhoramento da mandioca no IAC cruza as variedades. Feltran explica que, a partir disso, � feita uma sele��o a cada plantio com as plantas resultantes daquela fecunda��o at� encontrar uma nova variedade com as caracter�sticas desejadas.
At� hoje, foram 24 novas variedades liberadas para agricultores pelo IAC, segundo Feltran, algumas para mesa (consumo humano) e outras para a ind�stria.
"A mandioca, para a ind�stria, tem como ponto principal a produ��o de farinha e amido. Ela tem alta produtividade, resist�ncia a bacteriose, alto teor de mat�ria seca nas ra�zes, o que resulta em alto rendimento de farinha e f�cula na ind�stria, e elevado teor de �cido cian�drico, que forma o cianeto, presente na raiz. Essas variedades n�o servem para consumo humano", explica.
A �ltima variedade de mandioca catalogada pelo IAC, em 2021, tem de 680 a 800 unidades internacionais de vitamina A por cem gramas de raiz, de acordo com Feltran -mais que o triplo observado em outra variedade anterior.