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Estado de Minas POESIA

Confira poemas de 'Tangente do cobre', de Alexandre Pilati

Versos est�o no quinto livro do poeta, ensa�sta e professor da Universidade de Bras�lia


11/06/2021 04:00 - atualizado 11/06/2021 08:16

 

Estudo para sonho

 

nas tardes de s�bado 

as cidades ficam irm�s

ombreiam-se de Quito a Calcut�

Uagadugu ou S�o Paulo. 

 

todas (ou quase todas)

nos cedem, estufas silentes,

o quente conforto 

de um abra�o-mundo

 

onde as �rvores p�em 

as sombras e dispersam-se

por momentos preciosos

as unhas de amea�a do futuro.

 

podemos talvez engatinhar

atr�s de uma brisa de ilus�o

ou pregui�a, nariz � janela

ou p�s no ch�o popular da pra�a

 

(encare �s quinze e trinta e um

de uma tarde de s�bado

quem mora na rua bem

dentro do ouro sujo dos olhos

 

e ou�a de sua boca fechada

os estilha�os de vida, flores

e sonhos viajarem

at� voc� em murm�rio motor).

 

pois o dinheiro trope�a

em suas pr�prias pernas

golpeado por uma luz

que sangra sonho. 

 

luz que ao ampliar-se

deita-nos em um colo

imenso, triste e bom:

dispensa-se a dor

apagam-se energias.

 

s�o uterinas as cidades

quando as tardes de s�bado

deixam supor que estamos

sob um manto de amor.

De noite eu rondo a cidade

 

tr�s ou dois pipocos

e apenas isso basta 

para uma cara na cal�ada

 

outra cara achatada na cal�ada

a sirene � a �ltima lembran�a

de algo sublime dentro do trevor

 

quando a tropa vira a esquina

h� quem diga que � o cobre um clarim que urra

 

enquanto um c�o que n�o late nem morde

cheira o sangue e uiva imitando as sereias azedas

 

a tropa que dobra a esquina enquanto

a noite toda se transforma em cortejo f�nebre

at� a tua soleira

sem tambor ou m�sica

 

outra cara achatada na cal�ada

tr�s ou dois pipocos

e apenas isso basta

Baleia

 

naquela beira da cerca

est� posto no ch�o

o olhar da cachorra ferida

 

naquela seca do ch�o

est� disposto o sangue

duro da cadela ferida

 

aquele olhar define

pelos erros de todos

a cachorra que morre

entre a cerca e a seca

 

em mi�do manso desespero

sua for�a sua vida sua esperan�a

todas presas no cadeado do instante

 

im�vel longo lento instante

em que o ar e o existir divorciam-se

para todos os s�culos vindouros

 

a cadela ainda aprecia a coceira

de quando a carne se torna areia

e mat�ria para osso e abutre

 

o p�r do sol tamb�m � fato grandioso

para o raso de seus olhos

onde se intui certa evid�ncia de sonho

 

a cadela morre sem volta

a cachorra leva no colo a boca

sem dentes que ontem nos sorriu

 

atrav�s da inf�mia que � uma crian�a sem casa 

Caracol

 

livros que li

 

esta casca

de peles e palavras

 

esta casa

de dan�as e dilema

que me fiz

 

patu� de afetos

que me protege 

por dentro de mim

Selo

 

espalho algumas palavras

sobre teu corpo

para tentar legar

aos que vir�o

mil anos depois de n�s

a beleza tua

que orienta

a independ�ncia deste instante

 

mas desesperam fr�geis

as palavras porque

n�o chegam a ti

n�o te recomp�em

n�o te ultrapassam

s�o m�nimas

diante do que inundas

 

e nessa insufici�ncia

tornam-se as palavras

mais humanas e reais

afeitas ao tempo

assimiladas � possibilidade

que emprenha

o que tem morte

e sabe de finais

 

pelo que n�o digo

pelo que me falta

pelo que desejo

abra�o-te outra vez

 

e por um inusitado acontecer

tua beleza segue

reverberando para al�m

de cada conceito e de cada som

 

penetra s�lida e calada

os desv�os

da vida

feito o riso rosa do sol

que colore nossa esperan�a

sob os mil�metros doces da luz

 

tua beleza entretanto

deste longe sonho

sempre volta

 

e grava nas retinas tristes

do tempo o selo

que nos deixa mais vivos

atrav�s da teia

que a ti me ata

 

sob a forma do amor

que s� se diz de todo

com as palavras

que a humanidade livre

ainda inventar�

 

 

Sobre o autor

 

Alexandre Pilati � poeta, ensa�sta, cr�tico liter�rio e professor de literatura brasileira na Universidade de Bras�lia (UnB). � autor de “sqs 120m2 com dce” (NTC, 2004); “praf�ra” (7Letras, 2007); “e outros nem tanto assim” (7Letras, 2015) e “Autofonia” (Penalux, 2018). Os poemas acima s�o de “Tangente do cobre”, quinto livro de poemas do autor, rec�m-lan�ado pela Editora Laranja Original 


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