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Natalia Ginzburg radicaliza t�cnica no romance 'A cidade e a casa'

Com linguagem l�mpida, italiana d� vida �s rela��es afetivas dos personagens usando exclusivamente as cartas que eles enviam uns aos outros


24/03/2023 04:00 - atualizado 24/03/2023 01:51

Natalia Ginzburg (1916-1991)
Natalia Ginzburg (1916-1991): continuidade de linguagem entre seus livros de fic��o, ensaios e discursos que ela proferia como deputada eleita pelo Partido Comunista italiano (foto: divulga��o)
 
Sergio Karam
Especial para o EM
 
“A cidade e a casa”, de 1984, foi o �ltimo romance publicado pela italiana Natalia Ginzburg (1916-1991), agora lan�ado no Brasil pela Companhia das Letras, em tradu��o de Iara Machado Pinheiro. Assim como “Caro Michele”, de 1973, � um romance epistolar, mas nele a autora n�o se vale de nada al�m das cartas propriamente ditas, ao passo que no romance de 1973 ainda h� trechos descritivos e alguns di�logos. Nesse sentido, � uma radicaliza��o do processo – n�o que um romance epistolar fosse exatamente uma novidade em meados dos anos 1980.

Novidade ou n�o, o que realmente importa � a capacidade que Ginzburg tem de dar vida aos personagens usando exclusivamente as cartas que eles enviam uns aos outros. A hist�ria que ela conta � basicamente uma hist�ria de desagrega��o familiar, de rela��es afetivas complicadas (tem alguma que n�o seja?), de viagens de seus personagens dentro e fora da It�lia, de mudan�as de domic�lio, de amizades improv�veis, de amores ou quase-amores de todo tipo. E tudo chega ao leitor na linguagem elegante e l�mpida de Ginzburg, avessa ao palavreado obscuro, a mesma linguagem que ela utilizava em seus ensaios.

Ali�s, um dos grandes prazeres proporcionados pela leitura de qualquer livro de Natalia Ginzburg � perceber essa continuidade de linguagem entre seus livros de fic��o e seus livros de ensaios, algo que se reflete at� mesmo nos discursos que ela proferia como deputada eleita pelo Partido Comunista italiano, a julgar pelos trechos reproduzidos numa biografia da autora. Em qualquer dos casos, � como se ela estivesse conversando conosco, em linguagem acess�vel, mas intensa e luminosa em sua generosidade.


Turma de escritores


Natalia Ginzburg integrou aquela turma de escritores ligados � editora italiana Einaudi, junto a Cesare Pavese, Elio Vittorini e Italo Calvino, autores que, al�m de escreverem seus pr�prios livros, atuaram como editores de outros – n�o � toa h� um livro de Calvino chamado “I libri degli altri”, traduzido para o espanhol por Aurora Bern�rdez (Editorial Siruela, 2014), mas n�o para o portugu�s brasileiro (al�, al�, editoras!).

Salvo engano, Ginzburg foi a primeira dentre eles a ter um livro traduzido no Brasil – seu terceiro romance, “Tutti i nostri ieri”, de 1952, saiu aqui com o t�tulo de “A vida n�o se importa”, j� em 1960, pela editora Ibrasa. Depois disso, iriam se passar 26 anos at� que ela tivesse outros livros traduzidos no Brasil: em 1986, foi publicada uma nova tradu��o de “Tutti i nostri ieri”, dessa vez com o t�tulo de “Todas as nossas lembran�as”, pela Art Editora, na cole��o As escritoras, e uma primeira tradu��o do romance “Caro Michele”, pela Editora Paz e Terra, na cole��o Mulheres e literatura. Dois anos depois, dentro da mesma cole��o da Paz e Terra, publicou-se o romance “L�xico familiar”, de 1963, seu livro mais conhecido.

Um salto de dez anos nos leva at� 1998, quando se publica uma tradu��o do primeiro romance de Ginzburg, “O caminho que leva � cidade”, pela editora Primeira Edi��o, tradu��o assinada por uma certa Denise Tornimparte, que faz uma gra�a com o fato de Ginzburg ter publicado esse romance, em 1942, sob o pseud�nimo de Alessandra Tornimparte. � na primeira d�cada do s�culo 21 que vai ocorrer a publica��o mais regular dos livros da autora no Brasil: em 2001, a Berlendis & Vertecchia publica “Foi assim”, tradu��o do segundo romance de Ginzburg, dentro da cole��o Letras italianas; em 2003, a Jos� Olympio publica o volume “Fam�lia”, de 1977, reunindo dois contos longos, “Fam�lia” e “Burguesia”.

Em 2009 e 2010, a Cosac Naify republica dois romances de Ginzburg, dentro da cole��o Mulheres Modernistas: uma nova tradu��o de “Caro Michele” e uma reedi��o de “L�xico Familiar”. Cinco anos depois, em 2015, � a vez de “As pequenas virtudes”, pequena joia reunindo onze textos de n�o-fic��o (cr�nicas? ensaios? mem�rias? tudo isso junto?), publicado j� nos estertores da Cosac Naify.

Desde 2017, a editora respons�vel pela publica��o de quase todos os livros de Ginzburg no Brasil � a Companhia das Letras, que reeditou os tr�s livros nomeados acima (pertencentes ao esp�lio da Cosac Naify) e publicou ainda “A fam�lia Manzoni” e “A cidade e a casa”, rec�m-sa�do do forno, al�m de “Todos os nossos ontens”, uma edi��o especial para o clube de assinatura TAG Livros. Uma exce��o � o livro “N�o me pergunte jamais”, reuni�o de 32 textos publicados na imprensa italiana entre 1968 e 1970, que saiu aqui pelas m�os da Editora  yin�, em 2022, dentro da cole��o Das Andere.

Da obra de Natalia Ginzburg, o que ainda n�o foi traduzido no Brasil? Tr�s romances, seus textos para teatro e alguns ensaios, entre eles um delicioso texto sobre o russo Anton Tch�khov, que tem tradu��o para o espanhol. Outro livro interessant�ssimo, tamb�m traduzido para o espanhol, � “Natalia Ginzburg, audazmente t�mida”, biografia escrita pela alem� Maja Pflug, lan�ada em 2020 na Argentina pela Editorial Siglo XXI, em tradu��o de Gabriela Adamo.

Em resumo: no Brasil foram publicados, at� o momento, dez livros diferentes de Natalia Ginzburg: sete romances (dois deles com mais de uma tradu��o), um livro com dois contos longos e dois livros de ensaios/cr�nicas. � uma parte significativa de sua obra, mas, vindo de uma escritora como ela, n�o h� por que n�o desejar a publica��o de seus outros livros.
 

Estante
As edi��es brasileiras de livros de Natalia Ginzburg

  •  “A vida n�o se importa”. S�o Paulo: Ibrasa, 1960. Trad. J. Monteiro. Cole��o Biblioteca Literatura Moderna, v. 8. [tradu��o de Tutti i nostri ieri, de 1952]
  • “Todas as nossas lembran�as”. S�o Paulo: Art Editora, 1986. Trad. Maria Bet�nia Amoroso. Cole��o As escritoras, v. 8. [tradu��o de Tutti i nostri ieri, de 1952]
  • “Todos os nossos ontens”. S�o Paulo: Companhia das Letras, 2020. Edi��o especial para o clube de assinatura de livros TAG Livros. Trad. Maria Bet�nia Amoroso (tradu��o refeita). Posf�cio de Vilma Ar�as. [tradu��o de Tutti i nostri ieri, de 1952]
  • “Caro Michele”. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. Trad. Federico Mengozzi. Cole��o Mulheres e literatura, v. 1. [tradu��o de Caro Michele, de 1973]
  • “Caro Michele”. S�o Paulo: Cosac Naify, 2010. Trad. Homero Freitas de Andrade. Cole��o Mulheres Modernistas. Reeditado pela Companhia das Letras em 2021, com posf�cio de Vilma Ar�as. [tradu��o de Caro Michele, de 1973]
  • “L�xico familiar”. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. Trad. Homero Freitas de Andrade. Cole��o Mulheres e literatura, v. 4. Reeditado em 2009 pela Cosac Naify, na Cole��o Mulheres Modernistas. Reeditado pela Companhia das Letras em 2018, com pref�cio de Alejandro Zambra e posf�cio de Ettore Finazzi-Agr�. [tradu��o de Lessico famigliare, de 1963]
  • “O caminho que leva � cidade”. S�o Paulo: Primeira Edi��o, 1998. Trad. Denise Tornimparte. [tradu��o de La strada che va in citt�, de 1942, seu primeiro romance, publicado sob o pseud�nimo de Alessandra Tornimparte]
  • “Foi assim”. S�o Paulo: Berlendis & Vertecchia, 2001. Trad. �dson Roberto Bogas Garcia, ilustra��es de Paulo Pasta. Cole��o Letras italianas, v. 4. [tradu��o de � stato cos�, de 1947]
  • “Fam�lia”. Rio de Janeiro: Jos� Olympio, 2003. Trad. Joana Ang�lica d’�vila Melo. Inclui dois contos longos, “Fam�lia” e “Burguesia”, al�m de uma antologia cr�tica e uma cronologia da vida e das obras da autora. [tradu��o de Famiglia e Borghesia, de 1977]
  • “As pequenas virtudes”. S�o Paulo: Cosac Naify, 2015. Trad. Maur�cio Santana Dias. Inclui onze ensaios. Reeditado pela Companhia das Letras em 2020. [tradu��o de Le piccole virt�, de 1962]
  • “A fam�lia Manzoni”. S�o Paulo: Companhia das Letras, 2017. Trad. Homero Freitas de Andrade. Introdu��o de Salvatore Silvano Nigro. [tradu��o de La famiglia Manzoni, de 1983]
  • “N�o me pergunte jamais”. Belo Horizonte: Editora  �yin�, 2022. Trad. Julia Scamparini. Cole��o Das Andere, v. 40. Re�ne 32 textos, a maioria deles publicados no jornal La Stampa, de Turim, entre dezembro de 1968 e outubro de 1970. [tradu��o de Mai devi domandarmi, de 1970]

“A cidade e a casa”

  • Natalia Ginzburg
  • Tradu��o e posf�cio de Iara Machado Pinheiro
  • Inclui “�ltimas cartas de pessoas comuns”, entrevista concedida por Ginzburg a Severino Cesari.
  • Companhia das Letras 
  • 304 p�ginas
  • R$ 79,90  


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