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Estado de Minas PENSAR

Nova edi��o reafirma a for�a po�tica de "Mar�lia de Dirceu"

Passados mais de 200 anos da edi��o original, musicalidade das liras de Tom�s Ant�nio Gonzaga trazem beleza e acalentam o cora��o


21/04/2023 04:00 - atualizado 21/04/2023 00:34

Marília de Dirceu
Mar�lia de Dirceu (foto: Quinho)

 

Mar�lia est� no Olimpo das emo��es de Dirceu. Mas entre os dois h� um mar imenso, ilhas de sofrimento separando os cora��es, e, apaixonadamente, maravilhas a serem escritas sobre os sentimentos – t�o vastos que as profundezas do Oceano Atl�ntico n�o conseguem afogar. Como s� mesmo a poesia para enaltecer a grandeza dos afetos, e aplacar suas dores, Dirceu, no corpo e alma de Tom�s Ant�nio Gonzaga (1744-1810), escreve as liras em ode � saudosa musa Mar�lia, a jovem Maria Doroteia Joaquina de Seixas (1767-1853).

 

O resultado, passados mais de 200 anos, est� na nova edi��o de “Mar�lia de Dirceu”, lan�amento do selo Penguin, da Companhia das Letras. Independentemente da �poca em que se vive, os versos trazem beleza, transportam o leitor no balan�o do tempo e acalentam o cora��o com a “tenra m�o de Amor”. O livro re�ne as liras reconhecidas e publicadas, al�m da produ��o ap�crifa, de um dos autores mais importantes do arcadismo brasileiro.

 

Personagem hist�rico associado � Conjura��o ou Inconfid�ncia Mineira (1788-1789), movimento lembrado hoje, 21 de Abril, em solenidade c�vica em Ouro Preto, na Regi�o Central de Minas, Tom�s Ant�nio Gonzaga, que assinou T.A.G., foi condenado � pris�o e exilado em Mo�ambique, na �frica, at� o fim da vida. Mas n�o morreu de amor – l�, constituiu fam�lia, mas isso � outra hist�ria, pois o que est� nas p�ginas da obra � grande parte da sua poesia l�rica, publicada, pela primeira vez, em 1792, pela Tipografia Nunesiana de Lisboa, Portugal. Assim, nos versos, existe apenas Mar�lia no foco de Dirceu.

 

Conforme divulgado pela editora, Gonzaga, na primeira parte das liras, personifica o sentimento amoroso em “Mar�lia”, alvo rom�ntico de “Dirceu”, aludindo � natureza idealizada e � durabilidade da arte frente ao ef�mero da vida. J� na segunda, as afli��es do c�rcere ecoam nos versos a partir de tem�ticas que sugerem melancolia e a constante saudade da amada. 

 

Nesta edi��o da obra po�tica do arcadismo brasileiro, o conjunto, que possuiu muitas vers�es, aparece com estabelecimento de texto a cargo de Heidi Strecker, bacharela em letras e em filosofia pela Universidade de S�o Paulo (USP) e mestre em estudos comparados de literaturas de l�ngua portuguesa com a disserta��o “Figura de Mar�lia: Aspectos da po�tica de Tom�s Ant�nio Gonzaga”.

 

Vale esclarecer que o “estabelecimento de texto” � feito, em geral, em escritos de autores cl�ssicos que, normalmente, t�m in�meras edi��es e at� vers�es distintas. A editora explica que “�s vezes, duas obras s�o reunidas num s� volume, ou � feita alguma colet�nea que corta uma parte de um texto, enfim, s�o in�meras as altera��es que podem ocorrer ao longo de anos de publica��o”. Assim, quem faz o estabelecimento pesquisa as diferen�as entre essas edi��es, tentando, de certa forma, encontrar a vers�o que mais se aproxima do desejo “original” de seu autor.

 

 

 

IMPACTO P�BLICO 

 

O professor de literatura da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), S�rgio Alcides, destaca dois aspectos fundamentais da obra: o grande impacto p�blico causado na �poca do lan�amento da primeira edi��o de “Mar�lia de Dirceu”, no s�culo 18, e por n�o ser uma po�tica redut�vel ao academicismo predominante na �poca. “O livro fala da vida, n�o se restringindo a cumprir preceitos de tratados de po�tica acad�mica, muito r�gidos, exigidos no seu tempo.”

 

“Foi um livro que vendeu muito quando publicado pela primeira vez. Teve sucesso editorial, em Portugal, compar�vel �s obras dos portugueses Luiz de Cam�es (1524-1580), autor de ‘Os Lus�adas’, e Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765-1805)”, explica S�rgio Alcides.

 

Diante da grande aceita��o pelo p�blico, foi feita uma edi��o ap�crifa, falsa, imitando o estilo de Tom�s Ant�nio Gonzaga, e circulando, no s�culo 19, como se fosse de autoria dele. “No s�culo 20, � que a cr�tica liter�ria terminou de demonstrar que essa terceira parte era falsa, sendo, ent�o, desfeita a fraude.”  

 

O livro teve muita influ�ncia (posterior) na poesia brasileira do s�culo 19, “inclusive porque ficou associada a ele, inevitavelmente, a hist�ria bem conhecida do infort�nio amoroso do autor, que n�o p�de se casar, como pretendia, com a mo�a da sociedade mineira representada pela personagem Mar�lia”.

 

 

 

PURA M�SICA 

 

Quem nunca leu as liras “compostas” por Dirceu em homenagem a Mar�lia pode consider�-las m�sica para os olhos.  E n�o apenas para os ouvidos. Um exemplo:

 

“Se o vasto mar se encapela,

E na rocha em flor rebenta,

Grossa nau, que n�o tem leme,

Em v�o sustentar-se intenta;

At� que naufraga, e corre

� discri��o da tormenta.

 

Quem n�o tem uma Beleza,

Em que ponha o seu cuidado,

Se o C�u se cobre de nuvens,

E se assopra o vento irado,

N�o tem for�as que resistam

Ao impulso do seu fado.”

 

Na introdu��o do livro, a professora Adma Muhana, doutora em filosofia pela USP, onde ensina literatura portuguesa desde 2004, ressalta: “’Mar�lia de Dirceu’ � um livro acerca do qual muitos j� ouviram falar. Seja em raz�o de Tom�s Ant�nio Gonzaga, seu autor, ser considerado um dos principais mentores da Inconfid�ncia Mineira; seja por alguns cr�ticos da literatura terem identificado na obra a origem de uma poesia propriamente brasileira; seja, enfim, em raz�o da musicalidade dos seus versos. O fato � que, dos escritores ‘ditos’ coloniais, Gonzaga foi o que teve maior quantidade de edi��es no Brasil e um dos mais admirados pelos leitores de poesia”.

 

Adma Muhana escreve ainda que desde o in�cio do s�culo 19 as liras de Mar�lia de Dirceu foram objeto de partituras musicais, de que se encontram c�pias em arquivos e bibliotecas brasileiras e portuguesas. E cita o coment�rio de Luciana Stegagno Picchio, em “Hist�ria da literatura brasileira (1977): “Poeta disputado pelas duas literaturas, a brasileira e a portuguesa, Gonzaga � aqui registrado sobretudo como uma encarna��o de um mito rom�ntico brasileiro: o do conjurado ‘inconfidente’ e do homem enamorado lan�ado ao c�rcere na v�spera do casamento”.

 

 

 

DE CARNE E OSSO 

 

No Museu da Inconfid�ncia, na Pra�a Tiradentes, no Centro Hist�rico de Ouro Preto, repousam os restos mortais de Maria Doroteia Joaquina de Seixas (1767-1853), a musa Mar�lia de Tom�s Ant�nio Gonzaga, o Dirceu. H�, na l�pide, uma inscri��o mesclando realidade e fic��o, conforme notou a escritora e pesquisadora Cl�udia Gomes Pereira.

 

“Logo abaixo do nome de batismo de Maria Doroteia (falecida h� 170 anos), est� escrito, entre par�nteses, Mar�lia de Dirceu. Portanto, � a personagem se juntando � realidade”, afirma Cl�udia Pereira, para quem a hist�ria de amor de Gonzaga e Maria Doroteia atravessou os tempos, e a literatura e permanece na mem�ria afetiva e cultural do Brasil. “Tal qual a hist�ria de ‘Romeu e Julieta’, guarda essa mistura de fic��o e realidade”, compara. Cl�udia conta que Doroteia foi sepultada na Igreja Nossa Senhora da Concei��o, de Ouro Preto, e depois teve os restos mortais trasladados para o Museu da Inconfid�ncia, onde fica na sala anterior ao Pante�o dos Her�is da Inconfid�ncia Mineira.  

 

Estudiosa, com mestrado e doutorado, da vida e obra da poetisa Beatriz Brand�o (1779-1868) – Beatriz foi fundadora de uma escola de mo�as em Ouro Preto, era escritora de vanguarda e prima de Maria Doroteia –, Cl�udia explica que, em texto publicado pela poetisa na ocasi�o da morte da prima, ela usa as palavras “mulher inteligente, perspicaz, muito bonita e realmente musa de Gonzaga” para descrev�-la.

 

A exemplo da hist�ria de Romeu e Julieta, de William Shakespeare (1564-1616), Maria Doroteia e Tom�s foram separados desgra�adamente – esses dois, na realidade, pela Coroa portuguesa. “J� Mar�lia e Dirceu continuam juntos, eternizados na obra liter�ria.”

 

Condenado a 10 anos de degredo em Mo�ambique, onde viveu at� o final da vida, em 1809, Tom�s se casou, l�, com Juliana de Souza Mascarenhas, ent�o com 19 anos, com quem teve um casal de filhos. J� Maria Doroteia nunca se casou, vivendo reclusa em Ouro Preto, e saindo de casa apenas para ir � missa.

 

 

 

IMP�RIO PORTUGU�S 

 

Conhecer as liras dedicadas a Mar�lia de Dirceu � tamb�m mergulhar nas hist�rias de Minas Gerais e d’al�m-mar. Escreveu Adma Muhana: “Devemos pensar, com efeito, que a vida e a obra de Tom�s Ant�nio Gonzaga remetem aos �ltimos momentos do ‘imp�rio mar�timo portugu�s’. Nascido no Porto, em 1744, aos sete anos ele foi com a fam�lia para o Recife (PE), onde o pai serviria como magistrado. Da�, foi mandado para a Bahia, a fim de prosseguir os estudos no Col�gio dos Jesu�tas, no qual deve ter permanecido at� 1759, quando a Companhia de Jesus foi suprimida no reino de Portugal. Em 1761, seguiu para a metr�pole, tendo se doutorado em Leis na Universidade de Coimbra, em1768, como tantos filhos de funcion�rios da administra��o real. Serviu como juiz de fora em Beja e, em 1782, foi nomeado ‘ouvidor’ e ‘procurador dos defuntos e ausentes’ de Vila Rica (ex-Ouro Preto), onde se consolida sua carreira pol�tica e po�tica, aos 38 anos.”

 

Em Vila Rica, Tom�s se aproxima do c�rculo letrado de Cl�udio Manuel da Costa e do c�nego Lu�s Vieira da Silva, e entra em conflito de jurisdi��o com o desp�tico governador Luiz da Cunha Meneses, contra quem escreve as sat�ricas “Cartas chilenas”. “J� inserido na sociedade mineira, prepara-se para se casar com a jovem Maria Doroteia de Seixas, rica sobrinha de um ajudante de ordens do governador, em quem se identifica a personagem “Mar�lia” dos seus poemas – quando � promovido a desembargador da cidade da Bahia, em 1788. Por�m, depois de solicitar a licen�a � rainha dona Maria I, e faltando dias para o casamento, � denunciado pelo tenente-coronel Joaquim Silv�rio dos Reis como um dos conjurados da conspira��o que visava a subtrair a Capitania de Minas Gerais � Coroa, o que motivou sua pris�o em maio de 1789.”

 

Mesmo que incont�veis vezes tenha afirmado inoc�ncia e o pr�prio Tiradentes (Joaquim Jos� da Silva Xavier, 1746-1792 um dos expoentes da Conjura��o Mineira) confirmasse “que Gonzaga n�o tomara parte nos concili�bulos, houve quem dissesse que ele estava cotado para ser o primeiro governante da nova Rep�blica e autor da sua Constitui��o. Entre seus pertences sequestrados por ordem do governador, al�m de m�veis e objetos dom�sticos, roupas e cal�ados de boa extra��o, pr�prios de um “tipo de vida pacato e burgu�s”, foram encontrados perto de cem livros “franceses, portugueses e latinos”. Levado ao Rio de Janeiro, Gonzaga permaneceu no c�rcere da ilha das Cobras at� ser transferido para as Casas da Ordem Terceira de S�o Francisco, como preso incomunic�vel. Depois de cinco interrogat�rios sobre a conjura, no fim de exatos tr�s anos foi condenado a degredo perp�tuo em Angola, pena comutada por dez anos em Mo�ambique, para onde partiu “pelo navio da �ndia Nossa Senhora da Concei��o - Princesa de Portugal”.

 

“Mar�lia de Dirceu”

 

  • Tom�s Ant�nio Gonzaga
  • Edi��o Penguin-Companhia das Letras
  • 280 p�ginas
  • R$ 34,90. E-book: R$ 19,90

 

 

Hist�rias das edi��es

 

Algumas edi��es de “Mar�lia de Dirceu” ocorreram ainda em vida de Tom�s Ant�nio Gonzaga, explica Adma Muhana na introdu��o do livro, “sem que tenhamos not�cia do grau de interfer�ncia sua nessas publica��es, ainda mais residindo em Mo�ambique, t�o longe da metr�pole”. Costuma-se considerar que aquela de 1799, reeditada em 1802 em duas partes, corresponde � fei��o do livro pretendida pelo autor. “Alguns poemas encontrados mais tarde e inseridos na primeira ou na segunda parte, outros cuja posi��o � modificada ao longo das edi��es, n�o alteram, substancialmente, o sentido do livro.”

 

H� uma primeira parte, com 33 liras, “em que o poeta externa seu amor por Mar�lia, numa linguagem doce, cant�bile, geralmente em redondilhas, em versos alegres e meigos, num cen�rio ameno e campestre”. “E uma segunda parte, com 32 liras (eventualmente, em edi��es com 34, 37 ou 38 liras ap�crifas, cujo cen�rio � uma masmorra ‘cruel e tenebrosa’, ‘imunda e feia’, onde o poeta relembra os tempos felizes com a amada, que o sustentam em meio � presente tristeza; a�, protesta inoc�ncia e acusa a injusti�a, al�m de proferir consola��es a Mar�lia, dando-lhe esperan�as de um futuro sem perigos e dores. A terceira parte, supostamente ap�crifa, de temas e g�neros po�ticos variados, al�m de poemas dirigidos a Mar�lia, apresenta poemas amorosos a diversas pastoras e aqueles em louvor a personagens da corte.”

 

POR QUE DIRCEU? 

 

Muitos leitores podem se perguntar sobre a origem do nome Dirceu. Eis a explica��o nas palavras de Adma Muhana: “� sabido que desde a Laura, de Petrarca (1304-1374), as amadas dos poetas tamb�m receberam nomes motivados, pass�veis de reunir numa s� figura feminina as diversas ocasi�es de uma hist�ria amorosa. No s�culo XVI, Diogo Bernardes cantou uma Mar�lia, Manuel Botelho de Oliveira cantou sua ‘Anarda’ e, para nos restringirmos ao Setecentos portugu�s, ‘Mar�lias’ foram cantadas ainda por Alexandre de Gusm�o, Manuel Maria Barbosa du Bocage, Pedro Correia Gar��o e outros, como Tom�s Ant�nio Gonzaga. Quanto a Dirceu, � igualmente conhecido que os poetas da Arc�dia adotavam nomes pastoris, como Glauceste Sat�rnio (Cl�udio Manuel da Costa), Termindo Sip�lio (Bas�lio da Gama), Elmano Sadino (Manuel do Bocage), Albano (d. Jo�o V) etc.”

 

“Interessante notar, por�m, que enquanto em Petrarca uma complexa conven��o po�tica far� de Laura a alma (l’aura) do poeta, preciosa como o ouro (l’aurea), por isso loura como o sol, e por meio da qual a coroa de louros da vit�ria, a l�urea, lhe ser� entregue; em Gonzaga, “louro” ser� n�o a ninfa Dafne, cobi�ada e metamorfoseada no loureiro para escapar do deus Apolo, mas o pr�prio Deus da poesia, e, por conseguinte, o pr�prio poeta, que naquele se converte.”

 

O que � o arcadismo?

 

O arcadismo � uma escola liter�ria que surgiu na Europa no s�culo 18 mais precisamente entre 1756 e 1825, tamb�m denominada de setecentismo ou neoclassicismo. O nome arcadismo se refere � Arc�dia, regi�o campestre do Peloponeso, na Gr�cia antiga, tida como ideal de inspira��o po�tica. 

 

AMOR �S LETRAS

 

O poeta... Tom�s Ant�nio Gonzaga nasceu na cidade do Porto, em Portugal, em 1744. Viveu a inf�ncia no Brasil, mas retornou ao pa�s natal para terminar seus estudos na Universidade de Coimbra. Mais tarde, tornou-se ouvidor-geral na Comarca de Vila Rica, hoje Ouro Preto, at� o suposto envolvimento com a Inconfid�ncia Mineira, que o faria ser exilado em Mo�ambique at� o fim da vida. Embora sua produ��o n�o seja vasta, publicou o conjunto de liras “Mar�lia de Dirceu” e a obra com poemas sat�ricos “Cartas chilenas”.

 

...e a musa. Na �poca da sua pris�o, o poeta Tom�s Ant�nio Gonzaga estava noivo de Maria Doroteia Joaquina de Seixas Brand�o, jovem pertencente a uma fam�lia abastada de Ouro Preto – eram dedicadas a ela as liras que mais tarde seriam reunidas em “Mar�lia de Dirceu”, cuja primeira parte foi publicada em Lisboa, pela Impress�o R�gia, em 1792. Gonzaga foi condenado a 10 anos de degredo em Mo�ambique, na �frica, onde viveu at� o fim de sua vida, em 1809. L�, casou-se com Juliana de Sousa Mascarenhas, com quem teve um casal de filhos. J� Maria Doroteia nunca se casal, vivendo reclusa em Ouro Preto, s� saindo de casa para ir � missa.

 

TRECHO DO LIVRO

 

“Eu, Mar�lia, n�o sou algum vaqueiro,

Que viva de guardar alheio gado,

De tosco trato, de express�es grosseiro,

Dos frios gelos, e dos s�is queimado.

Tenho pr�prio casal, e nele assisto;

D�-me vinho, legume, fruta, azeite,

Das brancas ovelhinhas tiro o leite,

E mais as finas l�s, de que me visto.

Gra�as, Mar�lia bela,

Gra�as � minha Estrela!

Eu vi o meu semblante numa fonte,

Dos anos inda n�o est� cortado:

Os Pastores, que habitam este monte,

Respeitam o poder do meu cajado.

Com tal destreza toco a sanfoninha,

Que inveja at� me tem o pr�prio Alceste:

Ao som dela concerto a voz celeste;

Nem canto letra que n�o seja minha.

Gra�as, Mar�lia bela,

Gra�as � minha Estrela!

 

Mas tendo tantos dotes da ventura,

S� apre�o lhes dou, gentil Pastora,

Depois que teu afeto me segura,

Que queres do que tenho ser Senhora.

� bom, minha Mar�lia, � bom ser dono

De um rebanho, que cubra monte, e prado;

Por�m, gentil Pastora, o teu agrado

Vale mais que um rebanho, e mais que um trono.

Gra�as, Mar�lia bela,

Gra�as � minha Estrela!

 

Os teus olhos espalham luz divina,

A quem a luz do Sol em v�o se atreve:

Papoula, ou rosa delicada, e fina,

Te cobre as faces, que s�o cor da neve.

Os teus cabelos s�o uns fios d’ouro;

Teu lindo corpo b�lsamos vapora.

Ah! n�o, n�o fez o C�u, gentil Pastora,

Para gl�ria de Amor igual Tesouro.

Gra�as, Mar�lia bela,

Gra�as � minha Estrela!

 

Leve-me a sementeira muito embora

O rio sobre os campos levantado:

Acabe, acabe a peste matadora,

Sem deixar uma r�s, o n�dio gado.

J� destes bens, Mar�lia, n�o preciso:

Nem me cega a paix�o, que o mundo arrasta,

Para viver feliz, Mar�lia, basta

Que os olhos movas, e me d�s um riso.

Gra�as, Mar�lia bela,

Gra�as � minha Estrela!

 

Ir�s a divertir-te na floresta,

Sustentada, Mar�lia, no meu bra�o;

Ali descansarei a quente sesta,

Dormindo um leve sono em teu rega�o:

Enquanto a luta jogam os Pastores,

E emparelhados correm nas campinas,

Toucarei teus cabelos de boninas,

Nos troncos gravarei os teus louvores.

Gra�as, Mar�lia bela,

Gra�as � minha Estrela!

 

Depois de nos ferir a m�o da Morte

Ou seja neste monte, ou noutra serra,

Nossos corpos ter�o, ter�o a sorte

De consumir os dois a mesma terra.

Na campa, rodeada de ciprestes,

Ler�o estas palavras os Pastores:

“Quem quiser ser feliz nos seus amores,

“Siga os exemplos, que nos deram estes.”

Gra�as, Mar�lia bela,

Gra�as � minha Estrela!

 

 

 


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