sofrem duplamente preconceito e viol�ncia e n�o h� outra forma sen�o na educa��o. Deixemos que as crian�as novinhas saibam, cres�am sabendo da realidade, deixemos que os adolescentes manifestem sua ess�ncia sexual, e para os adultos machistas e violentos, puni��o! N�o h� outra sa�da: puni��o sem perd�o”
Leida Reis
Escritora e editora
“Disse que seria a mulher do desejo dele. A mulher que desejasse eu seria. Com certeza. A� ele falou baixinho: 'Meus amigos n�o podem saber, eles n�o podem saber de nada ou v�o me chamar de boiola, isso tem que ficar entre n�s, entre voc� e eu e vamos arrumar um lugar para a gente se encontrar para se divertir? E vou fazer de voc� uma mulher de verdade'”. Assim, a protagonista de “Mulheres arco-�ris”, o terceiro romance da escritora e jornalista mineira Leida Reis, que ser� lan�ado hoje em Belo Horizonte, desmascara uma das faces do preconceito que sufoca mulheres trans ao relatar seu romance com um funcion�rio de uma mineradora.
A obra mostra tamb�m que a discrimina��o vai muito al�m do machismo, oprime tamb�m todas as mulheres, come�a na fam�lia, dentro de casa. “Eu n�o sabia como ela ia reagir ao saber que al�m da primeira filha tinha mais uma e que era eu e eu poderia dizer a ela que n�o do�a, se ela se importasse ent�o em saber que n�o do�a ao contr�rio o que do�a era ficar para sempre no corpo de homem que ela certamente achava que era o meu”, reflete a protagonista, que tem sua sexualidade feminina aprisionada em um corpo masculino.
Em “Mulheres arco-�ris”, Leida Reis abre o leque da diversidade feminina. A personagem principal ainda procura um nome – se apresenta na primeira pessoa como narradora de sua pr�pria sina e tem o leitor como confidente. Nascida menino, cresce e se reconhece mulher presa num corpo de homem. Mas tem dificuldade para encontrar um nome feminino (“Eu, afinal, tinha tudo. S� n�o tinha um nome”) porque o seu de batismo n�o lhe serve mais. A diversidade de “Mulheres arco-�ris” conta tamb�m com C�ssia, Alice e Carmen – apresentadas na terceira pessoa. Com narrativa �gil e econ�mica de palavras, sem divaga��es filos�ficas ou existenciais, Leida Reis abre m�o da pontua��o formal da l�ngua para emendar e intercalar a��es e reflex�es a fim de desnudar a crua realidade de cada personagem.
“O meu romance come�a com a personagem trans porque ela se mostrou a mim, eu posso dizer isso: ela foi o ponto de partida. A princ�pio seria s� a hist�ria dela, mas como eu costumo amarrar v�rias hist�rias e as personagens povoam com abund�ncia minha mente, outras mulheres se mostraram com suas buscas pela liberdade e pela felicidade. Quando comecei a escrever, pensei em fugir de estere�tipos, por isso a protagonista tem apoio da av� e dos irm�os, mas � como se a escrita se fizesse por si mesma e foi imposs�vel n�o deparar com essa m�e, o primo, a tia e o tio que n�o aceitam nem sequer a homossexualidade”, conta Leida.
As mulheres do livro vivem em duas esp�cies de pris�o, a do corpo masculino e a da opress�o moral da sociedade. S�o duas lutas simult�neas pela supera��o e pela liberta��o. O enfrentamento desses preconceitos n�o � apenas di�rio, � a cada hora, a cada minuto, a cada segundo, o tempo todo, uma guerra permanente pelo reconhecimento e pela pr�pria sobreviv�ncia. A protagonista cita a m�e novamente: “L� estava minha m�e e ela n�o sabia que eu era uma mulher, uma mulher como ela, mas eu sentia uma esp�cie de tontura porque n�o sabia que queria que ela soubesse da verdade eu n�o sabia como ela ia reagir ao saber que al�m da primeira filha tinha mais uma e que era eu e eu poderia dizer a ela que n�o do�a, se ela se importasse ent�o em saber que n�o do�a ao contr�rio o que do�a era ficar para sempre no corpo de homem que ela certamente achava que era o meu”.
Mais consci�ncia
Menos mal quando se pensa que, apesar de toda a opress�o ainda persistente, as mulheres agora est�o atentas. “Hoje temos mais consci�ncia do quanto a mulher � discriminada, do quanto sofre de preconceito e viol�ncia em suas modalidades f�sica, moral, psicol�gica. N�o que a viol�ncia tenha diminu�do, mas as redes sociais ajudam na dissemina��o das informa��es. A luta pela supera��o � eterna e bastante injusta para n�s, mulheres. J� � tempo de n�o termos mais que provar ser melhores que os homens porque, na verdade, somos igualmente competentes no que fazemos. N�o precisamos provar. Mas isso nos � cobrado sim, especialmente das mais jovens, em constru��o de carreira e de lugar no mundo. Eu n�o tinha clareza dessa situa��o ao come�ar a escrita porque escrevo sem planejamento. Deixo fluir a escrita. Ent�o, isso veio da minha pr�pria vis�o da vida, porque o escritor de fic��o n�o foge das suas experi�ncias”, diz a escritora.
Em geral, salvo exce��es de poucos familiares e amigxs, o enfrentamento desse mundo hostil para mulheres passa por educa��o e puni��o. “As mulheres LGBTQAPIN sofrem duplamente preconceito e viol�ncia e n�o h� outra forma sen�o na educa��o. Deixemos que as crian�as novinhas saibam, cres�am sabendo da realidade, deixemos que os adolescentes manifestem sua ess�ncia sexual, e para os adultos machistas e violentos, puni��o! N�o h� outra sa�da: puni��o sem perd�o”, avalia Leida Reis.