
VIADUTO SANTA TEREZA
(EM “O ENCONTRO MARCADO”, 1956)
“— “MUNDO, mundo, vasto mundo”!
— “Grito imperioso de brancura em mim”!
— “Meu carnaval sem nenhuma alegria”!
De s�bito, um deles sugeriu:
— Vamos subir no Viaduto?
Hugo era o mais �gil: galgava o parapeito com presteza, corria sobre a estreita fita de cimento, a trinta metros do solo, como se andasse em cima de um muro. Curvado, subia o grande arco que se elevava, abrupto, sobre a pr�pria amurada. Eduardo subia do outro lado. L� em cima se encontravam, equilibristas de circo, passavam um pelo outro, vacilavam, amea�avam cair. Mauro ainda n�o tivera coragem; os dois se sentavam na viga de cimento armado suspensa no espa�o, balan�avam as pernas no ar, gritavam para ele:
— Sobe, carcamano!
— “Mijemos em comum numa festa de espuma”!
Naquela noite Mauro se animou a subir. Quando se viu largado no vazio, tendo sob os p�s apenas meio metro de cimento e l� embaixo, muito embaixo, os trilhos da estrada de ferro a brilhar, um trem passando exatamente naquele instante, n�o resistiu � vertigem. Deitou-se de bru�os, agarrou-se com for�a, dilacerando as unhas na superf�cie �spera, p�s-se a chorar:
— N�o des�o mais. Pelo amor de Deus me tirem daqui. Chamem o Corpo de Bombeiros!
Era extraordin�rio que a brincadeira imprudente n�o terminasse em trag�dia. E se repetia porque (rezava a tradi��o) um poeta (um grande poeta) havia feito aquilo antes, para se divertir. Anos mais tarde Eduardo lhe perguntaria se era verdade e o poeta haveria de confirmar:
— Parece dif�cil, mas n�o � tanto, voc� n�o acha?
No seu tempo, subia �s tr�s da tarde, depois de tomar apenas um copo de leite, pour �pater les bourgeois. A nova gera��o procurava imit�-lo nos versos e nas proezas, mas precisavam beber para criar coragem.
Algu�m soltou um berro. Era Zaratustra:
— “� preciso um grande caos interior para parir uma estrela dan�arina”!
— Que Nietzsche, que nada!
— E da�? S� porque voc� n�o leu?
— Ent�o soletra ao menos o nome dele, se voc� � capaz.
— Nietzsche tamb�m nunca leu Nietzsche.
Encharcados de literatura, pelas ruas da cidade.”
ESCOLAS
(NA CR�NICA “BH – ONTEM, HOJE E SEMPRE”, PUBLICADA EM 24 DE DEZEMBRO DE 2001 NO CADERNO DE CULTURA DO ESTADO DE MINAS)
“Finalmente, a Avenida Para�na do meu tempo (hoje Get�lio Vargas), com o antigo Grupo Escolar Bar�o do Rio Branco, onde minha m�e era professora. E em frente...
Bem, em frente, nada menos que o meu Jardim da Inf�ncia Bueno Brand�o, tal como era antigamente! Aqui encontrei pela primeira vez um menino de 6 anos chamado H�lio Pellegrino, escondido numa cabana de madeira no p�tio do recreio.
Pois s� a cabana n�o existe mais (o H�lio continua vivo no meu cora��o).”
BAR DO PONTO (ATUAL OTHON), PRA�A DA ESTA��O, RUA DA BAHIA
(DA CR�NICA “BELO HORIZONTE DO MEU TEMPO”, PUBLICADA NO “JORNAL DO BRASIL”, EM 31 DE OUTUBRO DE 1972)“Bar do Ponto. Havia aqui um abrigo de bondes com uma venda em cada canto, onde se barganhavam figurinhas de balas holandesas. E o Bar do Ponto propriamente dito, ao lado da Oliveira & Costa e da Sapataria Para Todos, onde Erm�lio Curtiss Lima tinha sempre um sorriso para todos. E o Caf� �ris, de saudosa mem�ria.
Se quisermos ir � Pra�a da Esta��o, evitemos a Avenida, ou n�o chegaremos nunca. Continuemos na Rua da Bahia, como se f�ssemos � Floresta, a vida � esta: subir Bahia e descer Floresta. Mas para que irmos � Pra�a da Esta��o, se ningu�m vai chegar pelo R�pido? Fiquemos por aqui mesmo, no Bar do Ponto. � poss�vel que apare�a algu�m da turma do Di�rio, como o Edgar, o Etienne ou o Milton Amado. Ou algu�m de outro tempo, como o Jo�o Dornas ou o Em�lio Moura, figuras nascidas apenas da lembran�a, feitas de ar e imagina��o.”

MINAS T�NIS CLUBE
(EM “O MENINO NO ESPELHO”, 1982)
“Um dos sonhos da minha vida era ter em casa uma piscina. Tinha aprendido a nadar, j� havia disputado mesmo uma competi��o na piscina do Minas T�nis Clube, categoria de petiz, pretendia me tornar campe�o, nadando no m�nimo t�o bem como Tarz�.”
ACADEMIA MINEIRA DE LETRAS
(NA CR�NICA “MINAS ENIGMA”, DO LIVRO “A INGLESA DESLUMBRADA”, 1967)
“Mais vale um p�ssaro na m�o. A Academia Mineira, h� tempos, pagava um jeton rid�culo: duzentos cruzeiros — antigos, � l�gico. Um dos imortais, indignado, discursava o seu protesto:
— Precisamos dar um jeito nisso! Duzentos cruzeiros � uma vergonha! Ou quinhentos cruzeiros, ou nada!
Ao que um colega prudentemente aparteou:
— Pera l�: ou quinhentos cruzeiros, ou duzentos mesmo.”