Benjamin Constant, Tabatinga (AM) e S�o Miguel do Igua�u (PR) – �ndios paraguaios, colombianos e peruanos n�o preenchem um requisito b�sico para receber o principal programa social do governo, o Bolsa-Fam�lia: ser brasileiro. Mas diante da fr�gil estrutura da Funda��o Nacional do �ndio (Funai), burlam a legisla��o e se nacionalizam rapidamente, ficando aptos a ganhar o benef�cio mensal. O Estado de Minas percorreu aldeias nas fronteiras das regi�es Sul e Norte do Brasil e detalha como funciona a fraude. A nacionaliza��o – que al�m do recebimento do Bolsa-Fam�lia visa tamb�m � aposentadoria especial para trabalhador rural e o aux�lio-maternidade – � poss�vel gra�as ao Registro Administrativo de Nascimento Ind�gena (Rani), uma certid�o de nascimento especial para os �ndios. No documento reconhecido por um funcion�rio da Funai e assinado por duas testemunhas – quase sempre ind�genas da aldeia em que o estrangeiro chega –, fica registrado que o migrante nasceu em territ�rio brasileiro.
Com o Rani em m�os o �ndio estrangeiro vai ao cart�rio de registro civil e consegue a certid�o de nascimento tradicional. A partir da� todos os documentos se tornam poss�veis, pois o Rani atesta que ele nasceu no Brasil. Foi o caminho percorrido pelo casal paraguaio Eug�nio Ocampo e Silvina Benitez
(foto acima). Com seis filhos, eles recebem mensalmente R$ 230 do Bolsa-Fam�lia. Desde que sa�ram do Paraguai, vivem em uma casa simples na aldeia Ocoy, na Reserva Ind�gena Av�-Guarani, em S�o Miguel do Igua�u, no Paran�, na fronteira com o Paraguai. Ambos falam muito pouco o portugu�s, se comunicam no idioma guarani e usam um pouco o “portunhol”.
M�todo Na aldeia Bom Caminho, em Benjamin Constant, no extremo oeste do Amazonas, na fronteira com o Peru e a Col�mbia, vinte fam�lias de �ndios peruanos e colombianos, integram a comunidade com pouco mais de 800 �ndios tikunas. Eles s�o a maior etnia ind�gena do pa�s: 36 mil. Tamb�m est�o na Col�mbia (8 mil) e Peru (7 mil). O cacique Am�rico Ferreira diz que s� aceita na aldeia �ndios tikuna e que os “brancos” colombianos, que tentaram se instalar em Bom Caminho tiveram que retornar. “Fa�o uma reuni�o com a comunidade, pergunto se podemos aceit�-los, para saber se eles n�o est�o fugindo de algum crime e se eles querem ficar e morar. S� assim permitimos”, explica o cacique, que detalha ainda a como os �ndios passam a receber os benef�cios: “Tiramos o documento (Rani) dos pais primeiro e depois dos filhos”.
Um dos beneficiados � o tio do cacique, Miguel Gomes Perez, que nasceu e viveu a maior parte dos 62 anos na Col�mbia. De acordo com Am�rico, o tio se mudou para o Brasil quando a mulher o largou. Em poucos anos, escolheu a via mais f�cil para se naturalizar. Fez o primeiro registro como brasileiro e conseguiu a aposentadoria especial para trabalhador rural, que � concedido ap�s os 60 anos mesmo a quem n�o contribuiu com a Previd�ncia Social. Miguel vive sozinho em uma casa de madeira na aldeia Bom Caminho. Antes morava em Barrelio, comunidade ind�gena de Let�cia, na Col�mbia. Para complementar o sal�rio m�nimo que recebe de aposentadoria, faz artesanato. N�o fala portugu�s e se comunica com os ind�genas em tikuna.
Em Bom Caminho tamb�m mora a fam�lia do casal peruano Ortega Pereira Torres e Jurandina Parente Adan. Jurandina diz que os R$ 166 que recebe do Bolsa-Fam�lia s�o fundamentais para a sobreviv�ncia. O casal tem seis filhos e sem o benef�cio dado pelo governo brasileiro n�o poderia comprar itens de primeira necessidade, como leite, caf� e frango, al�m de sapatos e cadernos para as crian�as frequentarem as aulas. O r�pido processo de nacionaliza��o foi conseguido gra�as ao Rani forjado.
No Sul do Brasil, na aldeia Ocoy, a realidade n�o � diferente. O cacique Daniel Maraka Lopes diz que quase metade da aldeia � formada por paraguaios. Em Ocoy vivem 690 �ndios guaranis, sendo cerca de 70 fam�lias brasileiras e 70 paraguaias. Por�m, a origem n�o impede que os estrangeiros recebam o benef�cio. “Quem n�o tem o documento brasileiro est� fazendo de tudo para conseguir”, afirma o cacique. H� cinco anos a aldeia tinha 560 �ndios, o que representa um crescimento populacional de 23%. A fronteira mais pr�xima com o Paraguai � em Foz do Igua�u, distante 60 quil�metros da aldeia. Entretanto, basta atravessar o lago formado pela hidrel�trica de Itaipu que na outra margem � o Paraguai. “Somos todos parentes. Al�m disso, quando aconteceu a inunda��o (em 1983) muitos foram para o Paraguai e ficou tudo misturado”, justifica o cacique.