Juliana Colares

Para o diretor de Defesa Profissional do Sindicato Nacional dos Analistas Tribut�rios da Receita Federal do Brasil (Sindireceita), Odair Ambr�sio, o tamanho da equipe de fiscaliza��o da cota parlamentar da C�mara � suficiente apenas para uma an�lise superficial. “Para verificar se o CNPJ corresponde � empresa, � s� acessar o site da Receita. Muitas vezes, no entanto, o CNPJ existe, mas a empresa, n�o. Para ligar para a empresa ou ir ao local e verificar se ela � fantasma ou n�o, uma equipe desse tamanho n�o � suficiente. Cada um n�o conseguiria analisar mais de 10 notas fiscais por dia, num ritmo de trabalho forte”, afirmou. Se cada funcion�rio verificasse 10 notas por dia, a C�mara precisaria de mais de 80 pessoas para dar conta de um volume de notas similar ao apresentado no ano passado, antes do reajuste.
A Casa, no entanto, se exime do trabalho e diz que cabe exclusivamente ao deputado a responsabilidade pela compatibilidade entre o objeto do gasto e a legisla��o. Segundo a assessoria de imprensa da C�mara, “n�o existe an�lise de m�rito nem fiscaliza��o in loco”. “No Brasil, em qualquer esquina � poss�vel comprar notas fiscais. � preciso haver controle interno eficiente, al�m de controle externo e social. Mas o controle interno � prec�rio, o externo � praticamente inexistente e o da sociedade tamb�m, uma vez que as notas fiscais n�o est�o dispon�veis na internet”, disse o fundador do Contas Abertas, Gil Castello Branco.
Em levantamento feito em parte das notas fiscais apresentadas pelos parlamentares no ano passado, a reportagem encontrou at� comprovantes com numera��o sequenciada e valores repetidos, relativos a gastos com alimenta��o do mesmo parlamentar, em dias diferentes. Mesmo diante do ind�cio de irregularidade, a C�mara respondeu que “a numera��o sequencial de nota fiscal por si s� n�o configura ilegalidade”. “N�o existe controle sobre o uso desses recursos. Boa parte � usada como complementa��o salarial ou divulga��o do mandato, que acaba servindo como propaganda do candidato. Conseguir nota fiscal n�o � problema para os deputados. Eles n�o precisam provar que a publica��o foi feita ou o servi�o, prestado. O sistema � viciado”, opinou o cientista pol�tico da Universidade de Bras�lia (UnB) Leonardo Barreto.
As notas fiscais t�m natureza p�blica, mas o acesso a elas n�o � f�cil e, n�o raro, com divulga��o apenas parcial, o que dificulta o controle social. A C�mara justifica que o volume de documentos � muito grande. Em fevereiro, a reportagem solicitou acesso �s notas fiscais de janeiro. O pedido n�o foi atendido. Por e-mail, a C�mara respondeu que “o novo sistema informatizado de gest�o da Cota para Exerc�cio da Atividade Parlamentar est� em fase de homologa��o e, em breve, estar� em funcionamento”. Informou, ainda, que a altera��o tem como objetivo principal possibilitar a inclus�o dos documentos de 2013 diretamente no portal. Na �ltima sexta-feira, a assessoria de imprensa da Casa disse, no entanto, que n�o h� nenhuma previs�o para divulga��o dessas notas na internet.
ERROS Primeiro-secret�rio da C�mara, M�rcio Bittar (PSDB-AC) afirma que � imposs�vel verificar a veracidade de todas as informa��es declaradas pelos parlamentares e pagas com dinheiro do contribuinte. “Vamos imaginar que os 513 deputados aluguem carros. A C�mara n�o tem como fiscalizar isso”, disse. “Todo mundo � inocente at� que se prove o contr�rio”, afirmou.
Em 2011 e 2012, a C�mara devolveu 3.155 notas fiscais aos deputados por “n�o preencherem os requisitos para liquida��o da despesa p�blica”. Entre as raz�es para a rejei��o est�o rasuras, documentos em nome de terceiros, informa��es incompletas sobre a empresa que prestou o servi�o e erros de preenchimento. Segundo a C�mara, todos os gastos da C�mara s�o alvo de auditoria por parte da Secretaria de Controle Interno da Casa e do Tribunal de Contas da Uni�o (TCU). As presta��es de contas da C�mara referentes aos anos de 2010 e 2011 ainda est�o em tramita��o no TCU e n�o h� delibera��es a respeito.
‘COT�O’ A cota parlamentar foi criada em 2009, quando, ap�s cr�ticas e den�ncias de mau uso, a pol�mica verba indenizat�ria deixou de existir oficialmente, sendo, na pr�tica, agregada aos gastos postais, telef�nicos e de passagens a�reas, sob o apelido de “cot�o”. Desde ent�o, nunca foi reajustada. Segundo o diretor-geral da C�mara, S�rgio Sampaio, os valores est�o defasados em aproximadamente 23% pelos �ndices inflacion�rios oficiais. Dois dos parlamentares que menos usam os recursos da cota, Reguffe (PDT-DF) e Miro Teixeira (PDT-RJ), s�o favor�veis � extin��o da parcela correspondente � verba indenizat�ria. “Me surpreendi quando soube do reajuste. � preciso reduzir esses artif�cios, que acabam significando outra fonte de remunera��o ao parlamentar”, disse o deputado fluminense. “Esse gasto excessivo � um desperd�cio de dinheiro p�blico e um desrespeito ao contribuinte”, afirmou Reguffe.
PROPOSTA Ex-deputado federal pelo PSDB de Minas Gerais, Rafael Guerra disse que em 2009, quando era primeiro secret�rio da C�mara, chegou a elaborar uma proposta que aproximaria a fiscaliza��o feita na C�mara da existente no parlamento americano. A ideia era de que cada gabinete funcionasse como uma unidade or�ament�ria e precisasse prestar contas trimestralmente, sob risco de n�o receber os recursos dos tr�s meses seguintes, caso n�o apresentasse a documenta��o ou tivesse as contas contestadas. “O parlamentar teria que ter contador e livro caixa para prestar contas com detalhes, como se fosse uma empresa. Mas, naquela �poca, uma proposta como essa n�o teria respaldo”, afirmou. A ideia nunca foi transformada em projeto de resolu��o e, portanto, nem sequer chegou a tramitar na Casa.