
O julgamento come�ou em 2021 e foi retomado em diferentes sess�es desde junho deste ano. Nesta quinta, votaram os ministros Luiz Fux, C�rmen L�cia, Gilmar Mendes e a presidente da corte, Rosa Weber. Eles acompanharam o relator do caso, Edson Fachin, contra a tese, assim como haviam feito Dias Toffoli, Lu�s Roberto Barroso, Cristiano Zanin e Alexandre de Moraes.
Kassio Nunes Marques e Andr� Mendon�a foram os �nicos ministros que votaram a favor do marco.
A tese do marco temporal estabelece que a demarca��o dos territ�rios ind�genas deve respeitar a �rea ocupada pelos povos at� a promulga��o da Constitui��o Federal, em outubro de 1988.
O marco � criticado por advogados especializados em direitos dos povos ind�genas, pois segundo eles validaria invas�es e viol�ncias cometidas contra ind�genas antes da Constitui��o. J� ruralistas defendem que tal determina��o serviria para resolver disputas por terra e dar seguran�a jur�dica e econ�mica.
A decis�o do STF ter� repercuss�o geral, ou seja, valer� para casos semelhantes nas inst�ncias inferiores do Judici�rio. Por conta disso, na pr�xima quarta-feira (27/9), o STF ainda discutir� outros entendimentos dos ministros sobre o tema.
Como exemplo, est� uma poss�vel indeniza��o da Uni�o a produtores rurais que adquiriram terras ind�genas regularmente. Isso porque em alguns casos esses territ�rios foram regularizados por governos estaduais antes de qualquer reivindica��o ind�gena.
Nesta quinta, Fux afirmou, em seu voto, que as terras ind�genas devem ter prote��o do estado, ainda que n�o tenham sido demarcadas, e que essa � a interpreta��o mais correta da Constitui��o.
"O que se estabelece � que as �reas ocupadas pelos ind�genas, e que guardam alguma vincula��o com a ancestralidade e a tradi��o dos povos ind�genas, ainda que n�o estejam demarcadas, elas t�m a prote��o constitucional", disse.
Ele tamb�m defendeu que o que se analisa � a posse das terras pelos ind�genas, "n�o aquela posse imemorial"."� aquela posse que n�o h� mais esse estado f�tico, ent�o nem eu serei despejado, nem vossa excel�ncia ter� que trabalhar na rua, nem o Supremo vai para outro lugar", disse, dirigindo-se ao ministro Gilmar Mendes.
J� C�rmen afirmou que as terras mencionadas na Constitui��o, e que comporiam o acervo de bens reconhecidos e garantidos juridicamente aos ind�genas, n�o podem ser, a seu ver, "desmembradas do conjunto de direitos fundamentais que lhes s�o constitucionalmente assegurados".
Ela tamb�m afirmou que o tema cuida "da dignidade �tnica de um povo que foi dizimado e oprimido durante cinco s�culos de hist�ria" e que processos chegam ao STF "atestando a continuidade da luta dos ind�genas pela sua viv�ncia".
"Todos os que cuidaram da mat�ria do recurso analisado reconheceram a impag�vel d�vida que a sociedade brasileira com os povos origin�rios porque eles tiraram as terras, as matas, contaminaram seus rios, cobi�aram e buscaram, sem cessar, e ainda buscam hoje, as riquezas das paragens que constituem para eles, n�o apenas uma mat�ria sujeita a um pre�o, mas o seu pr�prio mundo, onde podem viver, segundo as sua vis�o de mundo e de vida", disse.
A ministra dos Povos Ind�genas, Sonia Guajajara, que est� nos Estados Unidos com a comitiva do governo federal que visita a ONU (Organiza��o das Na��es Unidas), tamb�m comemorou a maioria formada pelo Supremo.
"Seguimos agora comemorando, celebrando, sim, essa grande conquista. Foram tantos anos de muitas lutas, muitas mobiliza��es, muita apreens�o para este resultado. Porque � um resultado que define o futuro das demarca��es de terras ind�genas no Brasil", disse.
Do lado de fora o STF, como nos outros dias de vota��o, os movimentos ind�genas se reuniram para acompanhar a vota��o —e comemoraram, com cantos e dan�as, a forma��o da maioria contra a tese.
A presidente da Funai (Funda��o Nacional dos Povos Ind�genas), Joenia Wapichana, afirmou que � "dia de comemorar a vit�ria".
"[A maioria] enterra de vez essa tese absurda, por inconstitucionalidade, em rela��o ao marco temporal", afirmou. Segundo Joenia, ainda h� diversas frentes de perigo contra os direitos dos povos, mas o julgamento no STF, em sua avalia��o, era uma das mais importantes.
"Uma luta a cada dia, uma vit�ria a cada dia", completou.
"A decis�o de hoje fortalece a democracia e p�e fim a uma das mais s�rdidas tentativas de inviabilizar os direitos ind�genas desde a redemocratiza��o do pa�s", acrescentou a advogada Juliana de Paula Batista, do Instituto Socioambiental (ISA).
OUTROS VOTOS
O julgamento havia sido paralisado em 31 de agosto, ap�s o voto do ministro Lu�s Roberto Barroso.
"Estamos a julgar a pacifica��o de uma situa��o hist�rica. N�o estamos a julgar situa��es concretas, estamos aqui julgando o destino dos povos origin�rios do nosso pa�s. � disto que se trata", disse Toffoli na quarta.
"A prote��o constitucional aos direitos origin�rios sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da exist�ncia de um marco temporal em 5 de outubro de 1988 ou da configura��o do remitente esbulho [usurpa��o da posse]", acrescentou.
O primeiro a votar e a refutar a tese do marco temporal foi o relator Edson Fachin, ainda em 2021. Ele disse que a teoria desconsidera a classifica��o dos direitos ind�genas como fundamentais, ou seja, cl�usulas p�treas que n�o podem ser suprimidas por emendas � Constitui��o.
Para o ministro, a prote��o constitucional aos "direitos origin�rios sobre as terras que tradicionalmente ocupam" n�o depende da exist�ncia de um marco.
Tamb�m naquele ano, Kassio Nunes Marques reafirmou o marco temporal. Ele defendeu que a Constitui��o de 1988 reconheceu aos ind�genas os direitos origin�rios sobre as terras que tradicionalmente ocupam, mas essa prote��o constitucional depende exatamente de um marco temporal.
Em junho deste ano, Alexandre de Moraes votou contra a tese, mas prop�s mudan�as em rela��o � indeniza��o que deve ser paga pela Uni�o a propriet�rios de terrenos em locais ocupados tradicionalmente por ind�genas.
Segundo Moraes, se n�o houver esbulho (usurpa��o da posse), conflito f�sico ou controv�rsia judicial na data da promulga��o da Constitui��o, a Uni�o deve indenizar previamente o propriet�rio de terra localizada em ocupa��o tradicional ind�gena, em dinheiro ou em t�tulos da d�vida agr�ria.
Al�m disso, caso a desapropria��o dessas pessoas seja contr�ria ao interesse p�blico e "buscando a paz social", a Uni�o "poder� realizar a compensa��o �s comunidades ind�genas, concedendo-lhes terras equivalentes �s tradicionalmente ocupadas, desde que haja expressa concord�ncia".
Em agosto, na retomada do julgamento, Andr� Mendon�a fez uma longa retrospectiva hist�rica sobre os locais ocupados pelos ind�genas desde o s�culo 16 e disse que caso o marco temporal seja derrubado "descortina-se a possibilidade de revolvimento de quest�es potencialmente relacionadas a tempos imemori�veis".
"Essa hip�tese, que por si s� j� me parece demasiadamente insegura, � ainda mais problem�tica na quest�o atual, no campo de uma viragem jurisprudencial", acrescentou.
Para ele, caso o marco temporal n�o exista, haveria preju�zo � sociedade, porque retiraria "qualquer perspectiva de seguran�a jur�dica" a respeito das demarca��es.
Em seguida, Zanin disse que � imposs�vel impor qualquer tipo de marco temporal em desfavor dos povos ind�genas. J� Barroso afirmou que extraiu do caso da Raposa Serra do Sol a vis�o de que n�o existe um marco temporal fixo e inexor�vel para as demarca��es.