
� com frases assim, tiradas de milhares de relatos de millennials e de sua pr�pria experi�ncia pessoal, que a jornalista norte-americana Anne Helen Petersen descreve a experi�ncia do burnout, apontado por ela como o "estado permanente" da gera��o nascida entre 1981 e 1996 (segundo a defini��o do Pew Research Center dos EUA).
No livro N�o Aguento Mais N�o Aguentar Mais (HarperCollins Brasil), Petersen contesta a caracteriza��o geralmente jocosa dos millennials, que t�m atualmente entre 25 e 40 anos, como "pregui�osos", "ego�stas" e "fr�geis diante da dureza da vida". A descri��o era feita principalmente pela gera��o boomer (os norte-americanos nascidos ap�s a Segunda Guerra Mundial, cujas idades variam hoje entre 55 e 75 anos).
A jornalista, uma millennial de 40 anos que viralizou com um artigo no site BuzzFeed sobre o tema, tra�a uma linha hist�rica que chega at� o momento atual de empregos prec�rios, bombardeio de informa��o, d�vidas com educa��o para ter um n�vel maior de escolaridade e sa�de mental abalada.
Petersen estava com o livro praticamente pronto quando chegaram as primeiras not�cias sobre a covid-19. Ela afirma, no entanto, que a pandemia s� acentuou os efeitos em quem j� sofria de burnout.
Segundo a Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS), o burnout n�o � uma "condi��o m�dica", mas est� listada pela entidade, desde 2019, na Classifica��o Internacional de Doen�as (CID) como "fen�meno ligado ao trabalho".
Para a jornalista, a s�ndrome saiu do mundo profissional e invadiu outras esferas da vida.
"As caracter�sticas do burnout mudam conforme o tempo. Pessoas que trabalhavam ou ainda trabalham por muitas horas em f�bricas, sem tempo para elas mesmas, sofrem uma forma de burnout. Mas hoje isso se relaciona a todos os outros componentes da vida cotidiana. Tudo parece trabalho. Redes sociais podem parecer trabalho quando postar est� ligado � ideia de performance e de transformar o indiv�duo em uma marca. Criar filhos envolve uma press�o para n�o falhar e n�o comprometer o futuro financeiro das crian�as."

Petersen defende em Eu N�o Aguento Mais N�o Aguentar Mais que os millennials na verdade n�o tiveram vida f�cil e entraram na fase adulta quando se consolidou a transforma��o do mercado de emprego nos EUA e no mundo.
Aumento de corte de pessoal por efici�ncia empresarial, desregulamenta��o de leis trabalhistas e prefer�ncia posterior por empregados sem v�nculos resultaram em um ambiente de menos oportunidades e piores condi��es, mas onde ainda prevalece a ideia de que estudo e trabalho duro s�o garantia para alcan�ar sucesso.
"Fomos criados para acreditar que, se nos esfor��ssemos o suficiente, poder�amos ganhar no sistema - do capitalismo e da meritocracia americana", diz um trecho do livro. "Convencemos trabalhadores de que as p�ssimas condi��es s�o normais, de que se rebelar contra isso � sintoma de uma gera��o mimada."
O burnout, que � caracterizado por cansa�o extremo, sentimentos de negatividade ou dist�ncia em rela��o ao pr�prio trabalho e reduzida efic�cia profissional, representa na vis�o de Petersen uma "rea��o ao estado de precariedade".
"� uma forma diferente de desespero quando h� dificuldade para descrever o que voc� est� sentindo, aquela irrita��o ao fundo: por que existe essa raiva, por que n�o acho um caminho diferente?"
A jornalista credita esse sentimento difuso a um aumento da desigualdade social e � sensa��o nas pessoas de que a qualquer momento elas podem sair do patamar m�nimo de qualidade de vida.
Uma pesquisa com mais de 30 mil trabalhadores de 31 pa�ses, encomendada pela Microsoft para a s�rie The Work Trend Index e divulgada em mar�o de 2021, mostrou que:
- 54% dos entrevistados sentem que est�o trabalhando em excesso
- 39% relatam estado de exaust�o
- 41% pensam em pedir demiss�o
No Brasil, um levantamento da Universidade Federal do Rio Grande do Sul com 201 t�cnicos de enfermagem indicou que 70% relataram sintomas de burnout.
Gera��o Z x Millennials

Nascida depois dos millennials, a Gera��o Z (de 1995 a 2010) se divide entre os que s�o cr�ticos dos mais velhos e os que sentem empatia por tamb�m viverem a sensa��o de "burnout permanente".
"Eu vejo duas correntes nas novas gera��es. Uma que critica os millennials e diz que eles s�o pregui�osos e questionam 'por que eles reclamam o tempo inteiro?
A gente vai mostrar como se faz'. E tem outra que j� experimenta um burnout no ensino m�dio ou na faculdade e se pergunta 'bom, se agora � assim, como vai ser o resto da minha vida'? Mas a nova gera��o tamb�m est� indo para cima, contestando as ideias sobre o que define sucesso, o que define uma carreira ou como a vida deve ser. Eu n�o sei o que vai sair disso, mas j� me d� esperan�a".
Ambas as gera��es t�m uma rela��o particular e muito forte com o celular e as redes sociais - e pesquisas apontam que isso pode ser um problema.
De um lado, h� a necessidade de consumir esse conte�do compulsivamente (millennials olham o celular 150 vezes por dia, segundo um estudo de 2013) e do outro se desenvolve uma sensa��o de cansa�o e esgotamento (o consumo de celular em 2016 nessa faixa et�ria j� ultrapassava 6 horas por dia).
Ela narra no livro sua pr�pria experi�ncia scrollando (deslizando a tela) pelo Instagram em que se pega por vezes "menos interessada em ver o que os outros postaram e mais em saber quantas pessoas curtiram a foto que eu postei na noite anterior" e "a considerar experi�ncias, enquanto estamos tendo essa experi�ncia, a partir de legendas futuras [dos posts] e a pensar em viagens como v�lidas somente quando documentadas para consumo p�blico".
Essa mistura de preocupa��o com imagem e performance potencializada por um mecanismo - os algoritmos das redes sociais - cada vez mais comparado ao v�cio em drogas tem cobrado um pre�o sobre a sa�de mental das pessoas.
"As pessoas que me disseram ter uma rela��o mais saud�vel com as redes tiram 'sab�ticos' das m�dias sociais de tempos em tempos, deletando os apps do celular por esse per�odo. Eu n�o tenho Facebook no meu telefone, mas eu tenho Instagram, porque � o jeito padr�o de usar a plataforma. Talvez o jeito seja tratar as redes sociais n�o como um h�bito, mas um ritmo em que voc� quebra de vez em quando. Mas, de novo, eu ainda n�o consegui fazer isso", admite.
Primeiro passo para combater o burnout
Anne Helen Petersen diz que n�o h� uma receita para curar o burnout, nem com "apps de produtividade" e "life hacks" (dicas espertas para facilitar a vida), pois o problema � estrutural. Mas ela oferece um primeiro passo para encarar o problema:
"As pessoas est�o lidando com um burnout de longo prazo nessa fase da pandemia. Elas est�o lidando com situa��es que talvez nunca fossem identificadas como burnout. E isso tem a ver com medo e com a sensa��o de estar no limite, n�o � mesmo? Ent�o acho que o primeiro passo � dizer em alto e bom som e identificar o que est� acontecendo. � a falta de limites em rela��o ao meu trabalho? �s vezes as pessoas precisam ser realmente honestas e perguntar se '� assim mesmo a carreira que eu quero?' ou tomar uma decis�o crucial de vida e mudar o seu rumo."
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A jornalista termina o livro com uma esp�cie de amea�a vinda dos millennials e das novas gera��es: "Subestime-nos por sua conta e risco: temos muito, muito pouco a perder".
Ela explica a �ltima frase dizendo que � sua esperan�a de que "as pessoas sintam que vale a pena viver, que o futuro vale a pena e que elas querem lutar para mudar as coisas".
"�s vezes acho que as pessoas nem esperam tanto da vida em termos de conquistas, sucesso e ter bens. Elas querem se sentir ok todos os dias".
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