
Mas muitas vezes essa doen�a � silenciosa. Quase metade das pessoas com o tipo mais comum de diabetes nem sabe da presen�a dela, e quando descobre pode ser tarde demais.
- Obesidade e diabetes: o papel central do a��car
- 10 dicas de alimenta��o para sa�de do cora��o, segundo associa��o americana
Segundo a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia e a Sociedade Brasileira de Diabetes, um p�ncreas em condi��es normais produz horm�nios que regulam o n�vel de a��car no sangue. Essa taxa varia quando se ingere um alimento, por exemplo.
Mas no caso do diabetes mellitus, o corpo se torna incapaz de controlar esses n�veis de glicose no sangue por n�o ter o suficiente ou n�o conseguir usar direito o horm�nio que faz essa regula��o, a famosa insulina. Isso leva a diversos desdobramentos problem�ticos no corpo.
Mesmo comum, a doen�a � cercada de d�vidas. O que causa essa doen�a? Como trat�-la? Quais s�o os tipos? Posso comer isso ou aquilo se tiver diabetes? Vou precisar de inje��o de insulina? Posso evitar apesar do hist�rico familiar? Por que ela afeta cada vez mais gente? E afinal, quem e como descobriu isso tudo?
Em 2021, foi comemorado o centen�rio da descoberta da insulina, algo exaltado por todos os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, principalmente pela quantidade enorme de vidas salvas por causa desse achado premiado com o Pr�mio Nobel.
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"Antes de ser descoberta a insulina, as pessoas simplesmente morriam. N�o tinha o que fazer, n�o tinha tratamento." afirma Cesar Boguszewski, m�dico endocrinologista e presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, em entrevista � BBC News Brasil.
Ele ressalta a import�ncia de se conhecer os fatores de risco da doen�a (o principal � obesidade) e os benef�cios de detect�-la precocemente, mas antes de tudo ampliar a conscientiza��o para prevenir o diabetes com h�bitos e alimentos saud�veis.
Mesmo porque o n�mero de casos da doen�a tem aumentado ao redor do mundo, gra�as a diversos fatores socioecon�micos, ambientais, gen�ticos e demogr�ficos.
Mas a informa��o tamb�m � importante quando a doen�a j� foi diagnosticada.
"Uma das coisas mais importantes � a educa��o em diabetes. O paciente que tem diabetes tem que aprender o que � a doen�a dele. L�gico que isso n�o se faz em uma consulta. � um processo de seguimento, aprimorado a cada consulta. � uma doen�a que pede uma equipe multidisciplinar, com endocrinologista, nutricionista, profissional de educa��o f�sica, fisioterapeuta, dentista e por a� vai", diz Boguszewski.
A BBC News Brasil responde abaixo 16 perguntas entre as mais buscadas sobre a doen�a a partir de entrevistas com especialistas, informa��es oficiais do Minist�rio da Sa�de e de entidades dedicadas ao tema e estudos cient�ficos.
Antes de tudo: � poss�vel prevenir o diabetes?
"Tem como prevenir se os governos tiverem vergonha na cara e estimularem as pessoas a terem h�bitos e alimenta��o saud�vel", afirma Boguszewski, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.
Para o endocrinologista, as autoridades deveriam investir em campanhas de conscientiza��o, oferecer mais equipamentos de lazer e esporte e adotar medidas para reduzir o consumo de alimentos prejudiciais � sa�de, como a tributa��o de alimentos ultraprocessados e de bebidas a�ucaradas, que teve resultados positivos em pa�ses como o M�xico.
"As comidas ricas em a��car e em gordura s�o palat�veis. E a ind�stria aliment�cia sabe muito bem disso e sabe trabalhar para que as pessoas fiquem dependentes. H� estudos mostrando que o c�rebro fica viciado nesse tipo de alimento. Tudo isso junto faz essa pandemia de obesidade. N�o � s� no Brasil. Os EUA, por exemplo, l�der mundial disso, j� est� vendo diabetes do tipo 2 em adolescentes, algo que a gente s� via antigamente em adultos."
Segundo Boguszewski, os h�bitos e os alimentos saud�veis podem prevenir, adiar ou atenuar o surgimento dos dois principais tipos de diabetes, o 1 e o 2, mesmo quando h� fatores gen�ticos associados.
O Sistema de Sa�de P�blica do Reino Unido (NHS) recomenda um m�nimo de 30 minutos de exerc�cio pelo menos tr�s vezes por semana, reduzir consumo de �lcool, n�o fumar, ter alimenta��o saud�vel, com por��es di�rias de frutas e legumes e baixo teor de gorduras saturadas, sal e alimentos e bebidas com muito a��car.
Essas condi��es diab�ticas n�o surgem de uma hora para outra, e algumas vezes os pacientes ainda t�m chance de reverter o progresso da doen�a, como � o caso do est�gio pr�-diabetes.
O que � o pr�-diabetes e como diagnostic�-lo?
A maior parte das pessoas n�o sabe da exist�ncia do pr�-diabetes, considerado um est�gio de risco e de alerta. Afinal, estima-se que metade desses pacientes v�o desenvolver a doen�a ao longo do tempo, segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes.
O pr�-diabetes � caracterizado por n�veis de glicemia acima do normal, mas sem alcan�ar o patamar que define o diagn�stico de diabetes. Especialistas dizem que esta � uma fase tida como uma oportunidade para o paciente mudar o estilo de vida a fim de tentar reverter a evolu��o do quadro.
"Na fase do pr�-diabetes, o organismo come�a a produzir mais insulina no p�ncreas. A glicemia fica pouco elevada, mas n�o chega a causar problema. O paciente urina um pouco mais, acorda um pouco � noite para urinar, mas isso n�o incomoda e ele n�o procura atendimento. Por isso, muitas vezes quando ele chega para a consulta, j� est� inclusive com complica��es cr�nicas, vasculares, porque realmente n�o percebeu ou n�o procurou atendimento e j� chega com um quadro mais complicado", afirma Boguszewski, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.
A falta de sintomas dificulta a no��o da condi��o e do risco, mas em geral o pr�-diabetes est� bastante ligado ao excesso de peso e sedentarismo.
Por isso, � fundamental para esses pacientes a pr�tica de exerc�cios f�sicos e a perda de peso. Sair dessa faixa de risco pode retardar ou at� prevenir o aparecimento de diabetes.
E como � feito o diagn�stico? Isso pode ser feito, por exemplo, por meio de exames laboratoriais solicitados por um m�dico que medem a taxa de glicose no sangue, como o de glicemia de jejum, o qual mede a taxa de glicose no sangue num quadro de jejum de 8 a 12 horas, geralmente.
O quadro de pr�-diabetes tem como um dos sinais o n�vel de glicemia alterada nesse exame, ou seja, de 100 mg/dL e 125 mg/dL. Acima disso j� pode indicar um diagn�stico de diabetes.
H� outros testes que tamb�m podem ser solicitados para confirma��o de diagn�stico, como o teste de curva glic�mica (teste oral de toler�ncia � glicose - TOTG), que � feito com jejum de 10 a 12 horas.
Ele analisa primeiro a concentra��o de glicose no sangue em jejum, em seguida o paciente ingere um l�quido a�ucarado e, ap�s 2 horas, testa novamente e ent�o � analisada a concentra��o de glicose.
Se no resultado for identificado que o a��car chega de forma lenta ao sangue, a curva � considerada baixa. O oposto � a curva glic�mica alta, isto �, com chance para pr�-diabetes e diabetes.
Hoe em dia, este tipo de exame busca resultados mais individualizados, isto porque as refer�ncias dependem de outros fatores como a faixa et�ria. E tamb�m porque eles precisam ser analisados em conjunto com os resultados de outros exames.
Quem e como se descobriu o diabetes e a insulina?
A hist�ria do diabetes e da insulina foi constru�da por muitos personagens ao longo de muito tempo.
Em torno de 1.500 a.C, os antigos eg�pcios j� haviam notado pessoas que urinavam em excesso e perdiam peso. Mas foi o m�dico grego Aretaeus, que viveu de 80 a 138 d.C., que usou o termo diabetes mellitus. Em 1776, o m�dico e fisiologista ingl�s, Matthew Dobson, identificou o gosto adocicado na urina de um paciente com diabetes (o que na �poca era considerado um dist�rbio renal).
Quando a publica��o "The New England Journal of Medicine and Surgery" foi fundada em 1812, o diabetes virou entidade cl�nica reconhecida, porque at� ent�o ela n�o era bem documentada.
Pouco antes da virada do s�culo 19 para o 20, os cientistas alem�es Oskar Minkowski e Joseph von Mering, da Universidade de Estrasburgo (Fran�a), estavam interessados no funcionamento do p�ncreas e em como a digest�o de gordura era feita. Eles removeram esse �rg�o de um cachorro, que n�o morreu, mas passou a ter grande quantidade de a��car na urina.
Isso serviu de base para a ideia de que o p�ncreas possui alguma subst�ncia que controlava o a��car. O animal acabou morrendo porque a dupla de pesquisadores n�o conseguiu reverter o quadro de descontrole da taxa de glicemia.
Em 1910, o fisiologista ingl�s Edward Sharpey-Schafer percebeu que uma subst�ncia qu�mica produzida pelas Ilhotas de Langerhans (localizadas no p�ncreas, respons�veis pela secre��o de alguns horm�nios, entre eles a insulina) estava por tr�s da doen�a diabetes.
A subst�ncia (insulina) s� seria isolada em 1921 pelos canadenses Frederick Grant Banting e John James Richard Macleod, da Universidade de Toronto. A descoberta renderia a eles o Pr�mio Nobel em 1923.
E como eles fizeram isso?
A dupla retirou do p�ncreas de c�es saud�veis c�lulas das Ilhotas de Langerhans e aplicou em cachorros com diabetes por meio de inje��es. A t�cnica levou � regress�o do diabetes. Depois, eles conseguiram purificar a insulina bovina e aplicar em humanos.
O pioneiro da inje��o de insulina foi o jovem canadense Leonard Thompson, de 14 anos. Ele estava internado com um quadro grave de diabetes tipo 1. Naquela �poca, o tratamento para esse quadro era deixar o corpo sem a��car, mas essa abordagem deixava as crian�as muito magras.
"Naquela �poca as crian�as morriam ap�s meses de desnutri��o. Elas tinham que fazer uma dieta rigorosa de glicose e carboidrato e ficavam com 20kg/30kg", conta a endocrinologista e coordenadora do departamento de campanhas da Sociedade Brasileira de Diabetes, Dhianah Santini de Oliveira, em entrevista � BBC News Brasil.
Mas por causa da inje��o de insulina, Thompson p�de viver por mais 13 anos.
Ent�o depois da descoberta da insulina, os pacientes que antes morriam em decorr�ncia do diabetes n�o perdiam mais suas vidas, pelo contr�rio, sobreviviam e viviam por muitos anos.
Cesar Boguszewski, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, explica � BBC News Brasil que inicialmente a insulina era bovina, e ao longo do tempo foram sendo testados os horm�nios de outros animais, at� chegar � pr�pria insulina humana, usada at� hoje. "Depois de muita pesquisa, foi descoberta a insulina que a gente chama de NPH, por volta das d�cadas de 40, 50. Isso permitiu que j� se fizessem insulinas mais prolongadas. As pessoas passaram a receber 1 ou 2 inje��es por dia."
A evolu��o da insulina obviamente n�o parou ali. No in�cio da d�cada de 1980, a insulina biossint�tica produzida por t�cnica recombinante foi criada por uma empresa de biotecnologia que conquistou o feito introduzindo o gene humano do horm�nio em uma cepa de bact�ria. Isso reduziu as possibilidades de complica��es ao sistema imune do paciente. Foi o primeiro rem�dio feito por t�cnica recombinante.
Hoje, h� insulinas r�pidas, ultra r�pidas, lentas, ultra lentas com a��es prolongadas. E mais recentemente surgiram os an�logos de insulina humana e a insulina inal�vel, por exemplo.
Uma ainda em fase de aprova��o � a insulina icodec, que � de a��o prolongada e uma aplica��o por semana, apenas, diferente das usadas hoje em dia, com aplica��o di�ria.
H� tamb�m uma abordagem, que chegou ao Brasil e � mais comum nos Estados Unidos, chamada de p�ncreas artificial. "Ele � uma bomba que tenta imitar a secre��o fisiol�gica desses dois horm�nios, a insulina e o glucagon, que regulam a glicose pelo p�ncreas.", explica Oliveira, da Sociedade Brasileira de Diabetes.
Mas nem todos os tipos de diabetes demandam obrigatoriamente inje��es de insulina.
Quais s�o os tipos de diabetes e seus sintomas?
H� principalmente dois tipos de diabetes: 1 e 2. Ambos podem dar bastante sede e vontade de urinar e n�o a priori h� um tipo mais grave que o outro. Mas o tipo 2, por ser descoberto tardiamente muitas vezes, pode resultar em mais complica��es de sa�de. Mas cada caso � um caso e o n�vel de glicose no sangue n�o � a �nica forma de diagn�stico.
Entenda as diferen�as dos dois principais tipos abaixo.
- Tipo 1: atinge de 5% a 10% das pessoas com diabetes
Geralmente o tipo 1 � diagnosticado de forma mais "f�cil" porque os sintomas podem aparecer r�pido, como sede e fome constantes, vontade frequente de urinar, cansa�o, fraqueza, perda de peso e mudan�a de humor.
Esse tipo costuma ser diagnosticado em crian�as e adolescentes, mas pode ser tamb�m detectado em adultos. Um dos sinais � a presen�a de corpos cet�nicos na urina como compensa��o do corpo ao usar gordura em vez da glicose para obter energia. O tipo 1 n�o est� associado ao excesso de peso.
H� uma predisposi��o gen�tica familiar relacionada ao diabetes tipo 1. No entanto, � um consenso entre os m�dicos que um paciente com hist�rico familiar pode retardar, atenuar ou mesmo evitar esse quadro caso ele se alimente adequadamente (com pouca gordura e carboidrato), fa�a exerc�cios f�sicos regularmente e n�o tenha excesso de peso.
Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, o diabetes tipo 1 � caracterizado principalmente por um ataque do sistema imunol�gico contra o pr�prio corpo, mais especificamente de anticorpos contra c�lulas beta respons�veis pela produ��o de insulina no p�ncreas, fazendo com que pouca ou nenhuma insulina seja liberada para o corpo.
Sem ser metabolizada adequadamente, a glicose ent�o permanece em altas doses no sangue (hiperglicemia) em vez de ser usada como energia, por exemplo. Uma das complica��es geradas por esse ac�mulo excessivo � a les�o de c�lulas e vasos sangu�neos. Al�m disso, grande parte dessa glicose acaba eliminada na urina, que carrega tamb�m �gua, podendo causar desidrata��o.
� no tipo 1 que o paciente precisa obrigatoriamente de doses de insulina, em geral administradas via inje��es.
- Tipo 2: atinge de 90% a 95% das pessoas com diabetes
� um quadro bem diferente do que ocorre com o tipo 1, que tem poucos sintomas ou at� nenhum e se caracteriza geralmente por um surgimento mais lento e gradual.
Geralmente � diagnosticada a partir dos 40 anos, mas tem havido um aumento de casos em crian�as e jovens tanto por fatores gen�ticos quanto por ambientais, como alimenta��o inadequada e sedentarismo. O tipo 2 � associado a excesso de peso, hipertens�o e altos n�veis de colesterol.
"A grande causa do diabetes �, na verdade, a obesidade. E ela � preven�vel. Ou seria preven�vel. Esse diabetes est� aumentando dessa maneira e vai aumentar ainda mais. As perspectivas s�o piores porque o que est� aumentando � a obesidade. E essa obesidade traz junto dela o diabetes. Essas duas coisas est�o fortemente relacionadas", explica Boguszewski, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.
Estima-se, inclusive, que metade das pessoas com diabetes tipo 2 vivam suas vidas sem saber da doen�a quase silenciosa. O diagn�stico acaba ocorrendo, dessa forma, por meio de exames laboratoriais ou complica��es que surgem. Os sinais mais comuns desta condi��o s�o sede e fome constantes, infec��es frequentes, vis�o emba�ada e formigamento dos p�s e das m�os.
Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, o tipo 2 � caracterizado por dificuldades do organismo em usar a insulina que produziu ou por problemas na produ��o de quantidades adequadas desse horm�nio para controlar a taxa de glicose no sangue. � o que se chama de resist�ncia � insulina.
Nesse tipo, o paciente pode receber inje��es de insulina ou rem�dios que melhoram a a��o da insulina ou estimulam o p�ncreas a aumentar a secre��o de insulina. A depender do paciente, planejamento alimentar e atividade f�sica s�o suficientes.
A defini��o do tratamento caber� ao profissional de sa�de respons�vel pelo diagn�stico e monitoramento.
O que � diabetes gestacional e por que ela ocorre?
H� um outro tipo de diabetes chamado diabetes gestacional, que pode se desenvolver em 1 em cada 20 gr�vidas.
Normalmente, em meio a mudan�as hormonais, a pr�pria placenta afeta a a��o da insulina no corpo, levando a um aumento da produ��o desse horm�nio no segundo ou terceiro trimestre de gravidez. Quando essa alta n�o ocorre, � desenvolvido um quadro de diabetes gestacional com aumento de glicose no sangue.
O tratamento em geral consiste em mudan�as na alimenta��o e exerc�cios f�sicos adequados ao per�odo gestacional. Em casos raros, a gestante demanda inje��es de insulina para evitar preju�zos a ela e ao feto.
O diabetes desse e de outros tipos envolve riscos para a gestante e para o feto, por isso � essencial que ambos sejam acompanhados por profissionais especializados durante o pr�-natal.
Ap�s o parto, se o diabetes � do tipo gestacional, a princ�pio o quadro some naturalmente. Embora ele possa voltar a ocorrer anos mais tarde.
Por isso � muito importante que a gestante volte a realizar, com acompanhamento especializado, medi��es da taxa de glicemia no sangue.
O diabetes � considerado uma doen�a vascular?
Segundo o estudo Estat�stica Cardiovascular Brasil, da Sociedade Brasileira de Cardiologia, as doen�as cardiovasculares s�o a principal causa de morte no Brasil e uma das complica��es mais graves do diabetes. Mais da metade das pessoas com doen�a card�aca tamb�m t�m transtornos relacionados � glicose no corpo.
"Quanto mais tempo de diabetes, quanto pior o controle, maior a chance de ele desenvolver a doen�a cardiovascular", explica a endocrinologista e coordenadora do departamento de campanhas da Sociedade Brasileira de Diabetes, Dhianah Santini de Oliveira, em entrevista � BBC News Brasil.
Mais de dois ter�os dos que morrem por problemas card�acos t�m diabetes e mais de 80% das mortes relacionadas ao diabetes s�o associadas a problemas vasculares, afirma a Sociedade Brasileira de Diabetes.
O diabetes � muito mais prevalente do que outras doen�as e leva a uma redu��o de tempo de vida em torno de 6 a 10 anos, comparado a quem n�o tem diabetes.
Mas o risco de morte n�o est� associado � diabetes em si, caso o metabolismo esteja sob controle. O quadro com potencial fatal est� ligado a complica��es do diabetes com controle inadequado, mais especificamente as doen�as vasculares.
Isso ocorre, segundo ela, porque a alta taxa de glicose pode come�ar a danificar os vasos sangu�neos. "A glicose tem que entrar na c�lula para gerar energia para a c�lula funcionar. No caso de um paciente com diabetes, a glicose n�o entra direito e essas c�lulas come�am a se estressar e v�o inflamando, produzindo radicais livres. Isso tudo vai danificando a c�lula."
Oliveira explica que esse comprometimento vascular pode ser cumulativo ao longo do tempo (por isso a dura��o do quadro de diabetes � um fator relevante).
Especialistas ressaltam a import�ncia do acompanhamento de profissionais especializados, que podem, por exemplo, requisitar exames preventivos sobre altera��es vasculares, muitas vezes silenciosas.
"A preven��o do diabetes � a preven��o do infarto, do AVC, da doen�a renal, da cegueira", afirma Oliveira.
Por que o diabetes pode levar a amputa��es e cegueira?
Como explicado acima, o diabetes pode levar a diversos desdobramentos prejudiciais ao corpo humano. Dois dos mais conhecidos e preocupantes s�o as amputa��es e a cegueira.
"O diabetes � a principal causa de amputa��o no mundo. Isso ocorre por causa da doen�a vascular, com um comprometimento de irriga��o nos p�s, de nutri��o. �s vezes uma pessoa tem uma feridinha de uma topada e aquilo vai evoluindo, evoluindo at� ter que amputar o dedo", explica Oliveira, da Sociedade Brasileira de Diabetes.
O chamado p� diab�tico envolve todas essas mudan�as causadas pela doen�a no membro, como formigamento, perda de sensibilidade, �lceras, problemas de circula��o e dificuldade de cicatriza��o.
Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, pacientes com diabetes mellitus podem ter problemas de cicatriza��o por causa do desequil�brio da resposta inflamat�ria, com situa��es como um ac�mulo prolongado de c�lulas inflamat�rias, um menor fluxo sangu�neo nos membros inferiores ou o impacto negativo do excesso de a��car na efic�cia das c�lulas de defesa. Esse quadro � agravado quando o n�vel de a��car no sangue n�o est� controlado.
Estima-se que 1 a cada 4 pessoas com diabetes mellitus ter� les�es no p� que podem n�o ser percebidas. Caso a ferida n�o seja tratada, pode levar � amputa��o de parte e a totalidade do dedo, do p� ou da perna. Isso acomete principalmente a popula��o de baixa renda, que vive em piores condi��es de sa�de e com menos acesso a unidades de sa�de.
Cerca de 20% das interna��es de pacientes com diabetes est�o relacionadas a complica��es nos membros inferiores. Segundo o Minist�rio da Sa�de, as complica��es do p� diab�tico correspondem de 40% a 70% de todas as amputa��es n�o realizadas por traumas na popula��o inteira.
Outra complica��o preocupante do diabetes � a retinopatia diab�tica, que pode ocorrer com o descontrole da glicemia e o tempo do diabetes, lesionando os pequenos vasos da retina (camada localizada no fundo do olho que ret�m as imagens). O resultado mais grave pode ser a cegueira, explica Oliveira, da Sociedade Brasileira de Diabetes.
Por essas e outras consequ�ncias � que se mostra muito importante o acompanhamento das pessoas diagnosticadas com diabetes por profissionais de sa�de especializados.
Por que algu�m com diabetes n�o pode doar sangue?
A Funda��o Pr�-Sangue, do governo de S�o Paulo, explica que uma pessoa com diabetes que n�o pode doar sangue � "aquela que chamamos de insulino-dependente; ou seja, aquela que necessita de insulina para manter seu metabolismo de a��car pr�ximo da normalidade. Esses pacientes t�m importantes altera��es do sistema cardiovascular e, em consequ�ncia disto, durante ou logo ap�s a doa��o de sangue, podem apresentar alguma rea��o que agrave seu estado de sa�de".
Segundo o Instituto Nacional de C�ncer (Inca), ligado ao Minist�rio da Sa�de, "se a pessoa que tenha diabetes estiver controlando apenas com alimenta��o ou hipoglicemiantes orais e n�o apresente altera��es vasculares, poder� doar sangue. Caso ela j� tenha utilizado insulina, n�o poder� doar".
Diabetes engorda ou emagrece?
Segundo especialistas, o diabetes do tipo 1 costuma levar ao emagrecimento quando h� um desequil�brio (diabetes desequilibrada) no tratamento ou quando ele n�o � feito. � uma complica��o do diabetes que acontece quando os n�veis de glicose est�o muito altos, o que pode resultar em uma perda de peso inesperada. Normalmente ocorre com pessoas que n�o est�o cumprindo o tratamento corretamente ou se o paciente ainda n�o tem o diagn�stico de diabetes.
Al�m da perda de peso inesperada, outros sintomas desse desequil�brio s�o sede excessiva, vontade frequente de urinar e aumento do apetite.
Para que isso n�o aconte�a o paciente precisa seguir o tratamento indicado, baseado em uma dieta alimentar saud�vel, combinada com a pr�tica de exerc�cios f�sicos e, se ele j� tem o diagn�stico de diabetes, fazer o automonitoramento glic�mico com o glicos�metro (aparelho que mede os n�veis de glicose no sangue).
O diabetes do tipo 2 � amplamente associado ao excesso de peso, como explicado acima no texto, e com resist�ncia insul�nica (s�ndrome metab�lica). Mas quando o paciente segue o tratamento corretamente aliado � pr�tica de exerc�cio f�sico, ele tende a perder esse excesso de peso adquirido previamente.
Essa s�ndrome metab�lica inclui altera��es no corpo decorrentes do excesso de peso. Para a Federa��o Internacional de Diabetes, a s�ndrome metab�lica � definida pelo excesso de gordura abdominal, combinada com n�vel de triglic�rides alto, colesterol HDL (colesterol bom) abaixo de 40 mg/dL, hipertens�o, glicemia de jejum maior ou igual a 100 mg/dL ou diagn�stico anterior de diabetes.
S�o condi��es que, quando unidas, aumentam as chances de desenvolvimento de doen�as card�acas e diabetes. Segundo o Minist�rio da Sa�de, ela � resultado de alimenta��o inadequada e sedentarismo, e por isso pode ser prevenida e curada.
A base da s�ndrome metab�lica � a resist�ncia � a��o da insulina, que � a resist�ncia insul�nica (ou s�ndrome de resist�ncia � insulina). A resist�ncia insul�nica � uma altera��o do funcionamento da insulina que vem do ganho de peso progressivo. Nela, a insulina encontra dificuldade em fazer o seu trabalho e seu desempenho cai.
"E ent�o ele precisa produzir cada vez mais insulina porque quanto mais ele come, mais ele precisa de insulina. E a� vai chegando uma hora que o p�ncreas est� intoxicado de tanta glicose, de tanta gordura, de tanta energia, que ele come�a a falhar. Ent�o a glicose sobe e vem o diabetes", explica Oliveira, da Sociedade Brasileira de Diabetes.
O exerc�cio f�sico � essencial para melhorar a resist�ncia insul�nica e evitar, adiar ou atenuar esse caminho em dire��o ao diabetes.
O que se pode comer no diabetes?
Pessoas com diabetes precisam seguir uma alimenta��o equilibrada e saud�vel, assim como se recomenda a todas as pessoas. Especialistas ressaltam a import�ncia da variedade de alimentos no prato, de evitar excesso de a��car, sal e gordura e de n�o pular refei��es. Em geral, n�o h� o que n�o se possa comer para a popula��o em geral, a quest�o � a quantidade.
Mas a dieta para quem tem diabetes pode se preocupar mais em manter o controle do n�vel de glicose no sangue, a fim de evitar desequil�brios, como a hiperglicemia, causada pelo excesso de a��car, e hipoglicemia, consequ�ncia da queda brusca de a��car no sangue.
Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, essa dieta pode exigir mais planejamento e organiza��o dos h�bitos alimentares, pois � preciso escolher melhor quais alimentos consumir e em quais quantidades e em que momento do dia.
A entidade recomenda, por exemplo, que os alimentos sejam distribu�dos em 5 a 6 refei��es ao dia; na hora dos lanches, dar prefer�ncia ao consumo de frutas (e n�o ao suco); metade do prato deve ser composto por vegetais coloridos; evitar a��cares e alimentos a�ucarados; priorizar pequenas por��es de carnes magras e intercalar o consumo de carne branca e vermelha com ovo; preferir alimentos menos processados.
Como se controla o n�vel de a��car no sangue? Com contagem de carboidratos?
A escolha dos tipos de alimentos, bem como a quantidade a ser ingerida depende da idade, de qu�o ativo fisicamente � cada pessoa e do n�vel de glicose no sangue.
H� diversas buscas no Google, por exemplo, sobre alimentos espec�ficos, como tapioca, melancia, cerveja, batata doce, cuscuz e beterraba.
O Manual Oficial de Contagem de Carboidratos, criado e atualizado pela Sociedade Brasileira de Diabetes, � uma fonte segura de informa��o aos pacientes com diabetes a respeito do que se pode ou n�o comer.
A contagem de carboidratos � uma estrat�gia nutricional que oferece � pessoa com diabetes maior flexibilidade em sua alimenta��o.
O foco � no carboidrato, nutriente com maior efeito sobre a glicemia, pois 100% do carboidrato ingerido se transforma em glicose. Por outro lado, de 30% a 60% da prote�na podem resultar em glicose e, no caso da gordura, somente 10%.
A fim de controlar os n�veis de a��car no sangue, o m�todo busca um equil�brio entre a glicemia, a quantidade de carboidratos ingerida e a quantidade de insulina necess�ria de cada paciente.
Essa contagem � uma t�cnica utilizada geralmente por pacientes com diabetes do tipo 1, mas todos com diabetes podem pratic�-la. Costuma exigir bastante aten��o e disciplina no come�o, mas se torna menos custoso quando se adquire o h�bito.
Toda essa abordagem deve ser feita com acompanhamento de um nutricionista, que definir� para cada paciente a quantidade de calorias e de carboidratos a ser ingerida em cada refei��o.
Alguns pacientes anotam e calculam o que se p�e no prato, com blocos de notas ou aplicativos.
No Brasil, quem tem direito a inje��es de insulina, rem�dios e novos aparelhos para controlar e tratar o diabetes? O SUS oferece tudo isso?
O tratamento e o monitoramento de pacientes com diabetes inclui geralmente uma s�rie de medicamentos, consultas com profissionais especializados e equipamentos para controlar os n�veis de a��car no sangue.
"Hoje, temos aparelhos para medir a glicose que se coloca no bra�o, sem precisar mais ficar furando o dedo. Voc� pode at� monitorar a glicose pelo celular, passando perto do bra�o", diz Oliveira, da Sociedade Brasileira de Diabetes.
Mas novidades como essa, dispon�veis no setor privado, nem sempre s�o oferecidas pelo SUS.
No sistema de sa�de p�blico brasileiro, h� basicamente 2 tipos de insulinas dispon�veis no SUS: a de a��o prolongada - insulina humana NPH e a de a��o r�pida - insulina humana regular.
No tratamento padr�o para quem tem diabetes tipo 1 (pessoas com defici�ncia absoluta de insulina), s�o necess�rias v�rias inje��es de insulina ao longo do dia, assim como diversas medidas de glicose durante o dia.
O SUS oferece ainda medicamentos, equipamentos para monitorar glicemia e consultas com profissionais de sa�de, mas nem sempre tudo isso est� dispon�vel para todos.
Boguszewski elogia os tratamentos oferecidos pelo SUS, com a entrada gradativa de novos medicamentos para alguns pacientes, apesar das limita��es or�ament�rias impostas pela quantidade de pessoas com a doen�a no pa�s.
"Uma medica��o bastante efetiva que temos hoje pode custar R$ 500, R$ 600 por m�s. Se voc� multiplicar isso por 10 milh�es de pessoas, ter� ideia do impacto no sistema de sa�de. E o governo n�o tem que comprar rem�dio s� para diabetes."
Segundo ele, obst�culos ainda maiores existem para equipamentos de monitoramento e controle da glicemia e novos medicamentos mais eficazes. "J� dispomos no mercado de in�meras medica��es extremamente boas e efetivas, mas se somarmos tudo isso, o custo de um tratamento mensal de diabetes ser� extremamente elevado, quase R$ 2.000 por m�s em dieta adequada, aparelhinho, compra de rem�dios etc."
Em pa�ses sem sistema p�blico de sa�de universal como os EUA, por exemplo, muitas pessoas n�o t�m condi��es financeiras de acessar o tratamento b�sico de insulina. O mercado americano � controlado por poucas farmac�uticas e a insulina chega a custar milhares de d�lares por ano.
Controle e tratamento
No Brasil, al�m do SUS, h� uma lei espec�fica para garantir o acesso que � a lei federal nº 11.347, de 2006, a qual d� direito aos portadores de diabetes mellitus brasileiros de receber medicamentos e insumos pelo Sistema �nico de Sa�de (SUS), como insulina humana NPH (a��o prolongada) e insulina humana regular (a��o r�pida), medicamentos antidiab�ticos (hipoglicemiante: reduz/controla a concentra��o de a��car no sangue) como Glibenclamida, Cloridrato de Metformina, Glicazida e insumos como seringas com agulha, tiras reagentes de medida de glicemia capilar, lancetas para pun��o digital (estes somente aos pacientes insulino-dependentes que estejam cadastrados no cart�o SUS e/ou no Programa de Hipertens�o e Diabetes - Hiperdia)
Os pacientes que quiserem retirar medicamentos e insumos precisam ter cadastro como paciente com diabetes no SUS ou Hiperdia (Programa de Hipertens�o e Diabetes). Para ent�o ir ao posto de sa�de mais pr�ximo da sua casa e apresentar a receita m�dica prescrita pelo m�dico.
*O texto foi publicado originalmente em 18/11/2021 e foi republicado pela ocasi�o do Dia Mundial do Diabetes.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/geral-59290134
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