Grande laço nas cores preto, vermelho e branco estendido em prédio

La�o exibido no pr�dio da prefeitura de S�o Paulo (SP) simboliza a conscientiza��o contra o HIV

Getty Images

Pela primeira vez desde 1981, quando foi confirmada a primeira infec��o por HIV, a cidade de S�o Paulo teve uma queda por cinco anos consecutivos no n�mero de novos infectados.

A cidade nunca havia registrado uma redu��o por mais de tr�s anos seguidos.

Esse per�odo tamb�m interrompeu uma tend�ncia de alta de novos casos que marcou o in�cio da d�cada passada.

A partir de 2017, os registros foram caindo ano a ano, at� atingirem o patamar mais baixo em dez anos (veja gr�fico abaixo).

A capital paulista registrou 2.351 novos casos de HIV em 2021, segundo o mais recente Boletim Epidemiol�gico da Secretaria Municipal da Sa�de (SMS).





Foram quase 1,5 mil a menos do que em 2016, quando houve 3.761 novos registros — uma redu��o de 37,5%.

A taxa � bem mais expressiva do que a do Estado de S�o Paulo no mesmo per�odo, que foi de 20,5%, de acordo com levantamento do governo federal.

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Tamb�m � mais do que o triplo da redu��o registrada no Brasil como um todo, que teve 11,7% novos casos a menos.

Com menos casos registrados, a capital paulista tamb�m teve uma queda na taxa de mortalidade devido ao HIV.

Entre 2016 e 2021, o �ndice passou de 6,3 �bitos por 100 mil habitantes para 4,3, por 100 mil, uma diminui��o de 31,7 %.

Uma maior rapidez no diagn�stico e no in�cio do tratamento, novos medicamentos e o acesso amplo e gratuito �s terapias de preven��o s�o apontados por especialistas como os motivos que tornaram S�o Paulo um exemplo no pa�s no combate ao HIV.


Gráfico de barras mostra registros de novas infecções na cidade por ano, de 2012 a 2021, com menor valor em 2021

Gr�fico de barras mostra registros de novas infec��es na cidade por ano, de 2012 a 2021, com menor valor em 2021

BBC

Os jovens de 19 a 24 anos, no entanto, ainda s�o a parcela da popula��o mais vulner�vel � contamina��o pela doen�a.

“Al�m dos jovens terem a vida sexual mais ativa, esse p�blico se considera invulner�vel, acham que nada vai atingi-los, � uma caracter�stica dos jovens”, diz �lvaro Furtado Costa, infectologista do Hospital das Cl�nicas de S�o Paulo.

Houve 4.167 novos casos entre esse p�blico na cidade de S�o Paulo entre 2016 e 2021. Foi a faixa et�ria em que foi registrado o maior n�mero de infec��es.

"Nem todos os jovens t�m espa�o para conversar sobre sexo e sexualidade de forma aberta ou autonomia para obter insumos de preven��o. Isto coloca esta popula��o em situa��o de maior vulnerabilidade", diz Adriano Queiroz, coordenador de preven��o da Coordenadoria de IST/Aids da SMS.

A boa not�cia � que a redu��o de novos casos neste p�blico entre 2016 e 2021, de 44,3%, foi ainda mais forte do que na popula��o em geral.

Esta foi a faixa et�ria com a segunda maior queda, atr�s apenas da faixa entre 15 a 19 anos, na qual as notifica��es ca�ram 55,7%.

Costa avalia ainda que a pandemia pode ter contribu�do duplamente para a queda das notifica��es.

"Nesse per�odo, as pessoas ficaram mais em casa, reduzindo o cont�gio, e tamb�m procuraram menos os servi�os de sa�de. Ent�o, pode ser que h� casos que ainda n�o foram notificados.”

'N�o � porque tenho HIV que transmito o v�rus'

Adriano Queiroz diz que a cidade de S�o Paulo conseguiu avan�os importantes no diagn�stico e tratamento contra o HIV.

Ele explica que, em 2016, uma pessoa diagnosticada com HIV levava em torno de 180 dias para iniciar a terapia antirretroviral. Hoje, come�a em tr�s dias.

“Levamos esse atendimento para mais perto da popula��o, em esta��es de metr�s, �nibus, em hor�rios estendidos e tamb�m aos s�bados e domingos. Hoje, � poss�vel fazer um teste r�pido nesses locais, e o resultado sai em 20 minutos”, diz Queiroz.

“Caso o resultado seja positivo, a pessoa j� � encaminhada para os servi�os de sa�de para tratamento.”

Costa acrescenta que outro fator relevante para a queda registrada foram os novos medicamentos, com menos efeitos colaterais.

“Com tratamentos mais eficazes e menos burocr�ticos, os pacientes tendem a abandonar menos o tratamento, contribuindo para a redu��o na transmissibilidade desse paciente”, diz o infectologista.

As medica��es podem ser retiradas de gra�a na rede municipal de sa�de. � pedida apenas uma receita m�dica.

Pessoas com HIV que fazem o tratamento corretamente e t�m uma carga viral indetect�vel h� mais de seis meses, sem outras infec��es sexualmente transmiss�veis, n�o transmitem o v�rus, segundo especialistas.

� o caso do personal trainer Diego Alberti Moi, de 40 anos, que descobriu a infec��o em outubro de 2019.

Na �poca, ele estava em um relacionamento est�vel h� dois anos e n�o sabia que estava vulner�vel ao v�rus, mas sua namorada era soropositiva. Diego s� descobriu a doen�a ao ser internado.

“Comecei a ter sintomas como coceira, alergia e queda no sistema imunol�gico, mas tomava um rem�dio e melhorava. Na �poca, estava muito focado no trabalho, vivendo um relacionamento abusivo e n�o busquei atendimento m�dico”, conta.


Diego posando para foto em sala, com feição entre o sério e o sorrindo

'Foi um choque, mas eu busquei me informar e focar em como faria para viver bem com o v�rus', lembra Diego Alberti Moi de seu diagn�stico

Arquivo pessoal

Ap�s ficar duas semanas de cama, com febre alta e dificuldades para respirar, ele decidiu ir at� uma emerg�ncia. Ele conta que ficou no hospital por 15 dias e perdeu cerca de 25 quilos.

“Fiz diversos exames e, ent�o, os m�dicos me deram o diagn�stico. Foi um choque, mas eu busquei me informar e focar em como faria para viver bem com o v�rus”, diz.

Desde o diagn�stico, Diego � acompanhado por um m�dico regularmente, toma a medica��o indicada e mant�m uma alimenta��o saud�vel aliada a atividades f�sicas. H� tr�s anos, ele est� intransmiss�vel.

“Hoje, sou casado, tenho uma filha de tr�s meses e levo uma vida normal. Fa�o todos os exames a cada seis meses e sou bem met�dico com os cuidados com a sa�de. Minha mulher e minha filha n�o t�m o v�rus”, diz.

“� preciso desmistificar o HIV, � poss�vel conviver com o v�rus e ter uma vida normal. Eu, por exemplo, tomo menos medicamentos que meu pai com diabete e press�o alta.”

Preven��o com PrEP e PEP

Essa tend�ncia de queda n�o era a realidade na cidade de S�o Paulo at� meados da d�cada passada.

Desde 2012, os casos vinham aumentando, mas, em 2016, com a chegada de novos medicamentos que previnem a infec��o pelo v�rus, houve um ponto de virada na epidemia de HIV na cidade.

As profilaxias pr�-exposi��o (PrEP) e p�s-exposi��o (PEP), m�todos preventivos que impedem a contamina��o pelo HIV mesmo se houver contato com o v�rus, t�m contribu�do para a redu��o nos n�meros de novos infectados pela doen�a.

A PrEP deve ser tomada regularmente para evitar o cont�gio em situa��es de risco.

A PEP deve ser iniciada em no m�ximo 72 horas ap�s a exposi��o, se poss�vel nas primeiras horas, e o tratamento dura 28 dias.

As profilaxias n�o s�o um m�todo novo. Foram aprovadas em 2012 pela Organiza��o Mundial de Sa�de, mas eram inicialmente obtidas apenas na rede particular no Brasil.

Naquele ano, uma caixa do medicamento custava em torno de R$ 2 mil. O valor foi caindo gradativamente e, hoje, pode ser encontrado nas farm�cias por R$ 50.

H� cinco anos, tamb�m passou a ser oferecido gratuitamente pelo Sistema �nico de Sa�de e pode ser encontrada nas unidades de sa�de municipais.


Dennis fazendo selfie com feição séria

Dennis Sloboda compara a rotina de uso do PrEP a um anticoncepcional

Arquivo pessoal

Atualmente, cerca de 30 mil pessoas j� fazem uso da PrEP em S�o Paulo, segundo a SMS.

�lvaro Costa avalia que a oferta da PrEP na rede p�blica contribuiu para a grande redu��o de novos casos entre pessoas com 20 a 24 anos.

"� um p�blico que est� mais familiarizado com o uso da PrEP do que outras faixas et�rias, como de 30 anos, por exemplo, e tem sido a faixa que busca esse medicamento”, diz o infectologista.

Adriano Queiroz acrescenta que estas profilaxias em geral t�m se provado aliadas valiosas no controle do HIV na popula��o em geral.

“Acreditamos que, com elas, conseguiremos dar fim � transmiss�o horizontal do v�rus”, diz Queiroz.

A transmiss�o horizontal � aquela que acontece devido ao contato entre uma pessoa infectada e uma que n�o tem o v�rus. No caso do HIV, ela ocorre principalmente por meio de uma rela��o sexual.

Para facilitar o acesso a estes medicamentos em S�o Paulo, a Prefeitura criou o SPrEP, um servi�o de consultas m�dicas digitais.

Ap�s o atendimento, o paciente recebe uma receita e pode retirar os medicamentos em postos de sa�de e outros locais.

O cabeleireiro e influenciador digital Dennis Sloboda, de 32 anos, usa PrEP h� cinco meses.

“Eu me informei sobre os pr�s e contras e vi que � muito eficaz e decidi usar. � uma forma segura de preven��o”, diz.

Dennis conta que a profilaxia � muito semelhante ao uso de um anticoncepcional: basta um comprimido ao dia, todos os dias.

“Precisamos acabar com o preconceito e o tabu.”