'A maioria das pessoas, principalmente quando a gente fala de rede p�blica, n�o tem acesso �s terapias; � tudo muito escasso'
Ariene Pereira Menezes, de 36 anos, defende que o acesso � educa��o e a destina��o correta de recursos e profissionais para a r�pida inclus�o de pessoas com defici�ncia no ambiente escolar impactam diretamente no desenvolvimento de habilidades sociais, motoras, emocionais e intelectuais desses indiv�duos.
Vendedora e fundadora do Gappa (Grupo de Apoio a Pais e Profissionais de Pessoas com Autismo), ela � m�e de duas crian�as com transtorno do espectro autista (TEA) e recentemente foi diagnosticada com o transtorno.
De acordo com Ariene, seu filho mais velho, Chryslander, de 13 anos, foi o primeiro aluno com autismo a estudar na Escola Municipal �urea Bicalho, localizada na regi�o leste de Juiz de Fora, cidade da Zona da Mata de Minas Gerais.
Quando foi matriculado, aos seis anos de idade, a institui��o n�o tinha um professor de apoio para auxili�-lo. "Como na �poca ele era autista severo, grau tr�s, n�o tinha condi��o de ficar sem o professor de apoio", conta. Representantes da escola diziam � m�e que n�o tinham como receb�-lo, enquanto a Secretaria de Educa��o afirmava ser obriga��o da escola oferecer recursos de acessibilidade e inclus�o. "A� fiz minha primeira manifesta��o, com dez pessoas, em prol do direito dos alunos com defici�ncia de ter o professor de apoio", lembra.
Duas semanas depois, a escola conseguiu uma estagi�ria para acompanhar o aluno at� a chegada de um professor. Ela conta que os profissionais n�o sabiam como fazer a adapta��o curricular, mas ao longo dos anos desenvolveram o ensino voltado � inclus�o de pessoas com defici�ncia. "A escola sempre buscou incluir, mas as falhas acabaram acarretando alguns preju�zos para ele. Por exemplo, eu achava que ele tinha uma discalculia, porque ele � superinteligente, mas n�o flu�a na matem�tica", afirma. Hoje ela acredita que ele n�o foi incentivado da forma correta � �poca.
No ano passado, o aluno teve professora de apoio maravilhosa, diz. "Ela estava disposta a ensinar da forma que ele entendesse, e o menino come�ou a aprender matem�tica." Ariene guardou o caderno para mostrar � professora deste ano, pedindo que desse continuidade ao trabalho iniciado na s�rie anterior.
O diagn�stico de Chrys foi confirmado aos dois anos. Ele come�ou a tomar medicamentos � base de canabidiol aos sete e, junto com as terapias e a escola, foi do autismo severo para o moderado.
J� Khyara, de 6 anos, come�ou a estudar na creche com pouco mais de um ano. Na �poca, sua m�e recebia reclama��es sobre a beb� ser muito sens�vel.
"Se o coleguinha esbarrava sem querer, ela chorava muito. Tinha muita seletividade alimentar. Como j� tinha o hist�rico do irm�o, eu j� fazia estimula��o sensorial em casa com ela."
Depois da pandemia, a pequena foi direto para a escola, aos quatro anos, no mesmo per�odo em que recebeu o diagn�stico. Ela j� fazia terapias e tratamento com canabidiol desde os dois anos de vida.
O primeiro per�odo foi dif�cil. Eram quatro crian�as com autismo na mesma sala, com apenas uma professora de apoio. "Eu sabia que ela n�o ia conseguir dar aten��o que Khyara precisava, mas pedia para n�o deixar passar despercebidas as dificuldades dela, porque a� eu conseguiria pedir �s terapeutas que trabalhassem isso."
Neste ano, a escola abriu mais turmas e conseguiu distribuir melhor os alunos. O ca�ula, Ben�cio, de um ano e oito meses, est� em processo de avalia��o, mas j� tem acesso a terapias e est�mulos para seu desenvolvimento motor e social. Ele frequenta a Creche Comunit�ria Doutor Ivan Gaudereto de Abreu. Antes de come�ar, Ariene conversou com os professores sobre o hist�rico da fam�lia.
"A gente sempre tem essa conversa, para ver o que ele j� est� fazendo, o que n�o est�, como est�o os comportamentos dele... Na terapia tamb�m. Fazemos um trabalho interdisciplinar, que faz diferen�a no desenvolvimento do aluno", afirma. "Isso tudo � muito legal, muito bonito, na situa��o que meus filhos t�m hoje, com acesso � terapia. Eles s� fazem terapia por causa do plano de sa�de do meu trabalho. A maioria das pessoas, principalmente quando a gente fala de rede p�blica, n�o tem acesso �s terapias. � tudo muito escasso", afirma.
Leia tamb�m: TEA: voc� sabe as diferen�as entre os graus de autismo?
Ela mesma teve um diagn�stico tardio e nunca recebeu suporte. Conforme estudava sobre o TEA para cuidar dos filhos, Ariene passou a perceber que algumas de suas caracter�sticas se assemelhavam a comportamentos t�picos de pessoas com autismo. "Sempre fui dita como muito seca, muito grossa, explosiva. Tem umas coisas que tenho uma paci�ncia imensa e tem outras que vou do zero a cem muito r�pido. Tenho dificuldade com toque, com carinho no cabelo, passar a m�o leve. S�o coisas que me afetam muito por conta da sensibilidade que eu tenho", diz.
Por ter tido uma educa��o r�gida na inf�ncia, ela era obrigada a seguir padr�es comportamentais como olhar nos olhos, para n�o apanhar. Isso a fez mascarar seu comportamento ao longo dos anos.
Ela teve dois casamentos, um com o pai do filho mais velho, que durou dez anos, e outro com o pai dos mais novos, que terminou depois de sete anos. Agora, com acesso a terapia e medica��o, ela diz que considera voltar a se relacionar.
Al�m do diagn�stico de TEA, ela descobriu que estava com ansiedade generalizada e depress�o e, por esse motivo, est� afastada de seu trabalho em um shopping.
Falar no autismo adulto de alto funcionamento � complicado, afirma. "V�rias vezes eu sou questionada por pessoas que acreditam que eu n�o seja autista. Por isso mesmo eu fiz uma avalia��o minuciosa, mas desde crian�a eu ia ao psiquiatra, fazia exame a pedido de neurologistas, s� que nunca havia um diagn�stico."
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