(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas ECONOM�S EM BOM PORTUGU�S

O F�rum Econ�mico Mundial ignorou os il�citos fluxos de divisas

Dados s�o importantes por serem capazes de esconder - e em aparente contradi��o, revelar - os comportamentos humanos e das organiza��es


31/05/2022 06:00 - atualizado 31/05/2022 07:49

Fórum Econômico Mundial
'O evento de 2022 rompeu com uma hist�ria de glamour em meio � atmosfera mais sombria e �s expectativas menos otimistas' (foto: AFP)


O F�rum Econ�mico Mundial (WEF, sigla em ingl�s), realizado tradicionalmente em janeiro, em Davos, retornou presencialmente, em maio de 2022, ap�s dois anos. O evento de 2022 rompeu com uma hist�ria de glamour em meio � atmosfera mais sombria e �s expectativas menos otimistas. Continua despertando interesse e trazendo relevantes debates, no entanto, em meio a tantos desafios, n�o abordou um dos temas que d� base para discutir as principais quest�es de corre��o das disparidades sociais: os il�citos fluxos de divisas.




A falta de perspectiva do fim da guerra entre R�ssia e Ucr�nia, a crise energ�tica, a incerteza com as a��es do governo chin�s em rela��o �s restri��es das atividades econ�micas em Xangai, o desigual e inacabado combate ao Covid -19 ao redor do mundo, o aumento da fome e do n�mero de pessoas vivendo em condi��es de extrema pobreza, assim como as disparidades inter-regionais das perspectivas do futuro do trabalho deram o tom sombrio do evento. 
 
Dentre os debates que acompanhei e avalio como dos mais relevantes est�o as discuss�es sobre o futuro do emprego e a qualidade do trabalho - abordagens que n�o deixam mais d�vida de como o mundo corporativo vem tra�ando o futuro do trabalho. Se e como a mudan�a em curso promover� salto qualitativo e em que propor��o atingir� a todos � uma discuss�o que ultrapassa aquele privilegiado f�rum e que merece maiores reflex�es. Deixo como sugest�o o v�deo "The four-day week: necessity or luxury?", dispon�vel no canal youtube do evento, e o artigo "Jobs of tomorrow: the triple returns of social jobs in the economic recovery", acessado no site da institui��o. 
 

No encontro do WEF de 2018, o historiador e fil�sofo israelense Yuval Noah Harari, famoso por seu best-seller "Sapiens: uma breve hist�ria da humanidade" - confesso nunca ter lido! -, afirmou algo que o pseud�nimo George Orwell, em sua obra mais famosa, "1984", tratou com preciosismo ficcionista futurista inacredit�vel � �poca: os dados. Na palestra de Harari, em Davos, o historiador inicia dizendo que os dados s�o o ativo mais importante do mundo. 
 
Dados s�o importante por serem capazes de esconder - e em aparente contradi��o, revelar - os comportamentos humanos e das organiza��es. A diferen�a da perspectiva de Orwell e Horari reside, de forma simplista, no que podemos fazer com esse rastreamento de informa��es e ac�mulo de dados. Orwell preocupava-se com a manipula��o que as sociedades estariam expostas enquanto Harari buscava tra�ar o futuro da humanidade e o papel secund�rio que o homem poderia vir a ter nesse novo contexto. Para ambos autores, os dados coletados s�o o principal ativo de uma sociedade. 

Pouco menos de uma semana do �ltimo WEF, a Tax Justice Network (TJN - Rede de Justi�a Tribut�ria, em tradu��o livre) divulgou seu bianual �ndice de Sigilo Financeiro, que produz uma classifica��o das jurisdi��es mais c�mplices em ajudar indiv�duos e corpora��es a esconder suas finan�as. Em 2021, outro relat�rio da TJN estimou que o mundo perdia, anualmente, cerca de quatrocentos e oitenta e tr�s bilh�es de d�lares com il�citos tribut�rios, sendo 65% origin�rios das pr�ticas das multinacionais e 35% dos indiv�duos super ricos. 

O �ndice de Sigilo Financeiro indica quais s�o os principais pa�ses propiciadores de sigilo financeiro ao redor do mundo -o que parece invi�vel de ser constru�do, pois ao se tratar de sigilo, como pode ser classificado? O �ndice � uma composi��o de evid�ncias qualitativas (leis) e quantitativas (fluxos) que se cruzam nas trocas entre os pa�ses que permitem sigilo e prote��o de vultosos recursos financeiros ilicitamente n�o tributados.

O rastreamento e cruzamento dessas informa��es identificam os fluxos il�citos atrav�s de quatro canais: com�rcio internacional, posi��es banc�rias, investimento estrangeiro direto e portf�lio de investimento. Mas, como evidenciar o sigilo?

A metodologia busca evidenciar o sigilo atrav�s de medidas de vulnerabilidade a que os pa�ses est�o expostos e/ou que permitem gerar fluxos secretos.

Ilustrativamente, uma forma de capturar a vulnerabilidade � imaginar um pa�s cujo percentual expressivo de recursos recebidos sobre forma de investimento direto venha das ilhas Cayman; o pa�s receptor torna-se, a partir dessa evid�ncia, uma jurisdi��o com alta vulnerabilidade no quesito investimento direto estrangeiro. Outro componente do �ndice � a exposi��o a esse tipo de vulnerabilidade, medida pela intensidade do fluxo il�cito em rela��o ao Produto Interno Bruto (PIB) do pa�s receptor dos recursos.

Ap�s identificar o fluxo e quanto o pa�s contribui vulneravelmente para o il�cito fiscal, o �ndice tamb�m aponta os pa�ses parceiros que mais contribuem para essa pr�tica. Resultados extremamente interessantes indicam que o mundo corporativo e pol�tico � t�o assustador quanto o que revelou, h� alguns anos, a investiga��o jornal�stica internacional Panam� Papers. A diferen�a � que, enquanto o �ltimo apresenta a lista dos nomes e valores depositados em para�sos fiscais, o trabalho do TJN mostra qu�o secreto � cada pa�s e quem s�o seus principais pa�ses parceiros.

Para o ano de 2022, resultados surpreendentes apontam que, embora o Panam� seja uma jurisdi��o mais secreta que o Reino Unido, esse �ltimo � utilizado com mais frequ�ncia como destino de riquezas offshore, classificando-o, na pr�tica, como maior fornecedor de sigilo entre ambos - Reino Unido ficou em d�cimo primeiro lugar e Panam� em d�cimo oitavo. Isso talvez nos permita entender melhor a f�ria e audaciosa retalia��o do primeiro-ministro Boris Johnson contra os bilion�rios russos, assim que deflagrada a guerra contra a Ucr�nia.

Dentre os 141 pa�ses investigados/avaliados pelo �ndice de Sigilo Financeiro 2022, os Estados unidos passaram a liderar o ranking, respondendo por 25,78% dos saldos de il�citos fiscais do mundo. Em segundo lugar vem a Su��a e, surpreendentemente, em quinto e s�timo situam-se, respectivamente, Luxemburgo e Alemanha, contribuindo com 11,3% e 5,2% dos il�citos fiscais globais. Jap�o, em sexto lugar, � um dos pa�ses que mais contribui para os il�citos fiscais norte-americanos. 

O Brasil aparece em octog�simo terceiro lugar e com contribui��o inexpressiva (0,15%) no componente que mede o peso dos il�citos na escala global. As quest�es brasileiras de quantidade de fluxo de il�citos, bem como de falta de transpar�ncia parecem muito mais dom�sticas, sobretudo se considerarmos nosso perfil e estrutura econ�micos, bem como nossa baixa competitividade internacional nos setores industrial e de servi�os.

Enquanto especialistas se debru�am internacionalmente para decodificar a falta de transpar�ncia e as condutas que acabam por sustentar a concentra��o de riqueza e as perdas sociais geradas por pr�ticas ilegais e injustas, no Brasil de hoje, assistimos ao chamado Or�amento Secreto, em que parlamentares s�o blindados para fazerem usos de verbas p�blicas sem se identificarem - nova modalidade em vigor, desde 2020, denominada emendas do relator. 

Com ou sem or�amento secreto h� tamb�m os desvios de verbas da educa��o para eventos culturais - criamos, assim, os il�citos do gestor municipal. Meu desejo � que a pioneira Rede de Justi�a Tribut�ria seja inspira��o para os tribunais de contas regionais e da Uni�o, pois os il�citos n�o est�o somente nos fluxos internacionais, mas, no caso brasileiro, nos recursos dom�sticos carimbados. Prefiro nem pensar como est�o esses fluxos no Or�amento Secreto. 

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)