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Estado de Minas ARTIGO

As regras s�o claras, clar�ssimas

'Quando algu�m � racista, toda pessoa negra tem que entender que essa nunca foi a inten��o'


04/05/2023 10:00 - atualizado 04/05/2023 11:29
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Desenho de uma pessoa negra agachada com o rosto apoiado nos joelhos enquanto mãos brancas gigantes apontam para ela
(foto: Reprodu��o)

Considere que os tempos agora s�o outros e, portanto, desnecess�rio falar de ra�a, j� que, para muitos que nunca foram alvos de opress�es racistas, esse � um tema que deve ser mantido em um passado remoto. Um tema que gera desconforto quando abordado e, em nome do bom conv�vio, melhor fingir que est� tudo bem. At� porque quando algu�m � racista, toda pessoa negra tem que entender que essa nunca foi a inten��o. Por esse motivo, a v�tima dessa viol�ncia deve relevar sem problematizar para que o ambiente de conv�vio permane�a leve. Isso mesmo, o ambiente n�o � t�xico devido ao racismo, e muito menos devido ao racista. Fica chato somente quando a pessoa negra reage, pontua, interpela, n�o larga para l�, n�o tem senso de humor o suficiente para entender que era s� uma piada, racista, mas s� uma piada. O problema deixa de ser novamente o racismo e se torna quem o denuncia e elenca o seu potencial b�lico, que torna os espa�os sociais que sempre foram insalubres para quem tem a pele preta em espa�os desconfort�veis para quem, at� ent�o, se via como universal e se assusta, ou at� se ofende, ao ser chamado de branco. 

Esse � um n�o dito, presente em todos os ambientes em que pessoas negras s�o toleradas, ou seja, lugares em que n�o est�o para servir, e a princ�pio est�o de igual para igual com seu interlocutor. � verdade que isso n�o consta em nenhum manual de boas maneiras, mas se a pessoa negra conseguiu ultrapassar diversas barreiras institucionais  ou estruturais e se encontra nesse espa�o, � o m�nimo que se espera dela.  Onde j� se viu uma mulher preta se negar a despachar a mala? Pior, onde j� se viu uma mulher preta interpelar o motivo pelo qual est� sendo retirada por tr�s policiais federais contra sua vontade de um avi�o em que ela j� havia alocado sua bagagem no bagageiro? Era s� n�o se posicionar, despachar a bagagem de m�o mesmo sem nenhuma garantia de que seu notebook e outros pertences retornem para suas m�os em perfeito estado. Onde j� se viu? Em uma aeronave da companhia a�rea GOL.

O racista se encontra bem mais elaborado, hostil, inteligente, sarc�stico e perspicaz do que antes. Ele j� sabe que est� sendo filmado e, por isso, ele sorri para sua v�tima ao recepcion�-la ainda na porta da loja com um “posso ajudar?”. Ao mesmo tempo que te coage a pegar uma sacola ou cesto de compras que, de brinde, vem aquela express�o facial de “estou de olho, sei que voc� n�o veio aqui comprar”. O Eduardo Bonilla chama isso de racismo sorridente e alerta que s�o limitados os meios para se reagir. O jeito � fingir dem�ncia, sorrir de volta e fazer de conta que � um atendimento, e n�o uma tentativa de barrar a sua circula��o no ambiente comercial ou te informar que est� sendo monitorada.

Em uma das tantas entrevistas que a jornalista Gl�ria Maria concedeu, ela disse que mesmo depois de famosa sofria racismo, mas um racismo elaborado, at� porque ela era uma pessoa mais elaborada. Agora, imagina o que � lidar com o racista elaborado? O racista que n�o se declara como tal e que, assim como alguns machistas se autodeclaram feministas, esses se declaram antirracistas, mas vira e mexe deixam o inconsciente vazar pela boca, seja na reuni�o de trabalho, na aula da p�s, ou no grupo de WhatsApp. Imaginou? Agora, imagina se um diretor, uma doutoranda, uma passageira de avi�o vira para esse cidad�o elaborado e diz que ele foi racista? Essas pessoas deixam de ser cidad�s de direito e passam a ser tratadas como perturbadoras da ordem social, n�o s� por quem praticou o racismo, mas por todos em volta que aprenderam que essa � a melhor estrat�gia para defender os interesses coletivos, a perpetua��o do privil�gio branco sist�mico, taxando essas pessoas que ousaram abrir a boca como dif�ceis de lidar e que n�o possuem perfil para estarem em determinados ambientes em que, mesmo n�o ditas, as regras s�o claras, clar�ssimas. 

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