(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas FILOSOFIA EXPLICADINHA

Guerra de Troia e as batalhas di�rias

O saber cl�ssico era constru�do a partir de uma escolha pedag�gica: ensinar ao homem uma forma de viver melhor


06/09/2023 17:04 - atualizado 06/09/2023 18:31
1515

O que a Guerra de Troia nos ensina?
O que a Guerra de Troia nos ensina? (foto: worldhistory.org/reprodu��o)
Vivemos um tempo de narrativas empobrecidas. Trocando as hist�rias pelos stories, afirmamos nossa incapacidade de compreender um fio de sentido diante dos ambientes que nos rodeiam. Estamos embrutecidos e emburrecidos.

 

L�gico que esse caldo de cultura nos chega pelas in�meras telas e dispositivos que carregamos em nossas m�os, bolsos e mochilas. Nenhum mal intr�nseco nesse tipo de entretenimento passivo. N�o h� problema em amar as redes sociais, m�sicas de trinta segundos e filmes hollywoodianos. O problema � ter s� isso como fonte de saber.  

 

Suspeito que, cada vez mais, ser� raro encontrar pessoas s�bias. Aquele tipo de gente capaz de analisar a vida a partir de uma sabedoria pr�tica. J� percebemos, ao nosso redor, a inaptid�o para as rela��es humanas, pois algoritmos n�o conseguem encontrar as melhores respostas para os v�rios dilemas �ticos que experimentamos todos os dias.

 

O que fazer ap�s um diagn�stico indigesto? Como continuar vivendo ap�s a perda de algu�m que amamos? Como conciliar a amizade com posi��es pol�ticas opostas? Viver uma vida longa e comum ou breve e extraordin�ria? Ceder aos pedidos do pai em estado terminal ou continuar seguindo as prescri��es m�dicas para o adiamento do inevit�vel? Como ser mais corajoso ou corajosa? O amor tudo suporta?

 

� por isso que os gregos s�o fundamentais, pois ainda nos ensinam muitas coisas. Sua narrativa mitol�gica n�o era vista, apenas, como forma de entretenimento ou “historinha”. O saber cl�ssico era constru�do a partir de uma escolha pedag�gica: ensinar ao homem uma forma de viver melhor.

 

 

 

Com todas as suas luzes e seus pontos cegos, as narrativas gregas tentavam imprimir na alma das pessoas uma esp�cie de sabedoria pr�tica, utilizada como orienta��o diante das trag�dias, quase sempre inevit�veis, presentes em qualquer hist�ria pessoal. Como diriam: o problema n�o � o destino injusto, mas a falta de dignidade para enfrent�-lo. O diferencial humano era visto como a possibilidade de manter a integridade, mesmo diante do universo tr�gico, que n�o era visto como uma m�quina pronta para satisfazer nossos caprichos individuais.

 

O interesse da educa��o cl�ssica n�o era informar as mentes, mas formar esp�ritos. N�o com grandes li��es edificantes e sistemas acabados para compreender a totalidade da realidade, mas com her�is e s�bios cheios de humanidades, v�cios e virtudes, diante de quest�es tipicamente humanas, auxiliando as pessoas comuns em suas batalhas di�rias.

 

Leia: Urg�ncia? S� no amor 

 

Em nosso tempo, mergulhados em pobres narrativas, come�amos a pautar nossa exist�ncia a partir de cancelamentos, lacra��es e marketing existencial barato, geralmente dividindo o mundo, de forma simplista, entre bonzinhos e malvados. Mas sabemos que a vida n�o t�o simples assim. O tecido social � constru�do de forma muito diferente.

 

Imposs�vel n�o se lembrar dos gregos e a narrativa da Il�ada, com sua refer�ncia � Guerra de Troia. De todos os textos cl�ssicos, confesso um apre�o especial por ele. Homero, aut�ntico grego, sabia que, do lado de l�, entre as muralhas troianas, existia um homem nobre: Heitor.

 

Leia: Foco, determina��o, resili�ncia e interna��o psiqui�trica 

 

O leitor despercebido pode n�o notar a beleza dessa escolha. Mas o texto n�o faz, apenas, elogios a Aquiles, her�i do ex�rcito grego. O poeta tamb�m � capaz de exaltar o “outro lado”. � como se ele disesse: olha, estamos guerreando com eles, mas sabemos que h� muita nobreza, coragem e virtude heroica entre as muralhas inimigas.

 

Quantos de n�s, nas quest�es pol�ticas, para usar de exemplo, somos capazes de pensar assim? Creio que poucos. Ainda nos pautamos pela narrativa hollywoodiana que limita nossa vis�o entre her�is e vil�es, como um t�pico filme da Marvel. Fomos (e somos) catequizados por uma vis�o rasteira sobre a realidade, atitude que nos trai e nos distrai. Somos incapazes de perceber que a humanidade � cheia de v�cios e virtudes, claridades e escurid�es, raz�es e loucuras. Nos constitu�mos na mistura de todas as emo��es tecidas ao longo de nossa hist�ria, como resultado de decis�es �ticas, certas e erradas.

 

Leia: Pedindo a Deus uma dose de burrice 

 

A aus�ncia de uma grande narrativa que nos d� sentido, como sociedade e sujeitos de cultura, contribui para o atrofiamento de nossa musculatura simb�lica e cognitiva. Assim, nos distanciamos da t�o sonhada sabedoria, nos afastando, tamb�m, desse grande agente civilizador: um bom texto.  

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)