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Estado de Minas GELEIA URBANA

Belo Horizonte inspirada por Paris e Washington? Conta outra...

E ent�o? Colocamos a 'm�o na massa' e passamos a simular, ou continuamos investindo em 'teses' furadas?


11/09/2023 06:00
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Vista aérea de Belo Horizonte
Vista a�rea de Belo Horizonte (foto: @estev4m/Esp. EM )
Belo Horizonte nasceu para ser a nova capital das Minas Gerais, desbancando Ouro Preto, ap�s s�culos de bons servi�os prestados. 
 
Dizem que foi concebida inspirada por Paris e Washington, mas eu duvido.
 
Duvido muito, porque Paris localiza-se nas terras baixas ao longo do Rio Sena, fonte de comida, �gua e transporte, num tra�ado espont�neo, e sem a dificuldade natural de morros e acidentes naturais a superar. 
 
Mesmo ap�s a grande remodela��o promovida pelo Bar�o Haussmann no s�culo XIX, Paris conserva, ainda hoje, um tra�ado predominantemente irregular, mas com visadas e perspectivas espetaculares. Mais importante, manteve um conjunto harm�nico, consistente e com grande qualidade urbana.
 
J� Washington, capital criada h� pouco mais de duzentos anos, apresenta aquele desenho urbano mais ortogonal, fruto da forte influ�ncia das cidades espanholas no urbanismo norte americano.
 
 
Apesar de separadas por muitos s�culos e um oceano, segue a mesma l�gica e o mesmo bom senso de Paris, com a escolha do s�tio recaindo - por �bvio - sobre as terras planas �s margens do Rio Potomac, naveg�vel, com o centro institucional e pr�dios mais importantes alinhados no eixo solar leste-oeste.
 
Estando l�, a gente percebe a inten��o do projeto atrav�s das visadas grandiosas e da perspectiva impactante que amplificam a institucionalidade. A l�gica e o bom senso reinam.
 
E quanto � nossa Belo Horizonte?  
 
Comecemos pelo s�tio escolhido, uma �rea com pouco menos de 8,8 milh�es de metros quadrados, delimitado ao norte por um rio de pequeno porte, n�o naveg�vel, e ao sul por uma serra, ensejando ruas com inclina��o pr�xima a 20% (as �reas suburbanas t�m uma topografia ainda pior).
 
A �rea escolhida poderia ter adotado o rio, mesmo t�mido, como eixo geogr�fico central, garantindo a totalidade dos 9 km2 em �reas planas, igualmente distribu�das ao norte e ao sul, e posicionado a centralidade institucional e os pr�dios mais importantes pr�ximos ao rio, cercado de parques e jardins, com a perspectiva adequada e imponente que requerem uma nova capital.
 
H� claro, como vencer terrenos de topografia desafiadora, menos "f�ceis", mas Aar�o Reis preferiu desafiar os morros com a malha ortogonal de influ�ncia hisp�nica, ao inv�s de superar, delicadamente, com ruas mais org�nicas e menos "duras".
 
Desafiando o bom senso, a cidade de costas para o rio, pr�dios institucionais pulverizados pelo territ�rio, pouqu�ssimas pra�as, ruas �ngremes, visadas pobres, perspectiva acanhada, n�o por acaso, caracter�sticas constantes em nossa administra��o municipal.
Aar�o Reis falava em ruas largas, boulevares, institucionalidade, qualidade e todo o repert�rio de atributos elevados que s� fazem evidenciar a enorme dist�ncia que pode haver entre "inspira��es" distantes e a dura realidade.
 
Mas Aar�o Reis fez o que sabia, e com o conhecimento que teve acesso e, por isso, figura em nossa hist�ria de forma elogiosa.
Se Aar�o Reis n�o teve acesso amplo ao conhecimento humano, recursos e tempo para fazer simula��es h� 130 anos atr�s, hoje isso j� n�o � desculpa, e a soma do conhecimento, das informa��es dispon�veis e dos sistemas computacionais nos permitem experimentar de forma virtual e simular propostas e respostas de forma quase imediata.
 
Simula��es s�o importantes, tanto quanto reveladoras do quanto boas ideias - muitas vezes suportadas por teses populares - podem gerar resultados totalmente imprevistos, quando n�o diametralmente opostos aos inicialmente previstos.
 
Mais do que importantes e reveladoras, as simula��es s�o imprescind�veis, j� que os erros, em se tratando de cidades, s�o praticamente irrevers�veis.
 
Nas cidades, um plano errado dificilmente ser� revertido, e potencialmente piorado com interven��es futuras. Vale para a infraestrutura (em especial a vi�ria), vale para os pr�dios.
Quando o primeiro Plano Diretor de Belo Horizonte veio em 1996, j� estavam dispon�veis dados, informa��es, equipes e sistemas computacionais para simular as propostas de mudan�a, antes que fossem efetivamente implementadas.
 
Concebido a partir de teses j� obsoletas nas metr�poles dos pa�ses desenvolvidos, preconizava o espalhamento de baixa densidade, e se notabilizou por "mudar a l�gica" e introduzir instrumentos e diretrizes restritivas que, em conjunto, iniciaram um processo de isolamento do pedestre das edifica��es que, recuadas, passaram a se isolar da cidade.
 
Para piorar, criaram uma cidade de "bandejas" suspensas ao obrigar o afastamento no pavimento t�rreo, mas permitindo estacionamentos nos pavimentos superiores. A "tese" de uma cidade de marquises para que o pedestre se protegesse da chuva redundou, de forma contundente, em quarteir�es degradados, pr�dios cegos para as ruas, sombra em excesso e um conjunto de uma falta de beleza e harmonia �mpares. 
 
Ao Plano de Diretor de 1996, seguiram-se outros ainda piores e, a cada um deles, mais restri��es, mais "teses" furadas, menor coeficiente de aproveitamento, menos densidade e mais est�mulo ao espalhamento.
 
Em comum, al�m das "teses" furadas, da redu��o da densidade e do est�mulo ao espalhamento, a paix�o por estacionamentos, por mais carros, mais ruas, viadutos e trincheiras.
 
Por �bvio, o custo da terra (lotes) cresceu numa velocidade muito maior do que o custo da constru��o e do crescimento da massa salarial.
 
E o maior vil�o pelo crescimento exagerado do custo dos im�veis novos �, sem sombra de d�vida, o custo da fra��o ideal, fun��o direta do custo dos terrenos.
 
Se o Plano Diretor aprovado em 2019 (11.181/19) tem o m�rito de apostar e incentivar as Fachadas Ativas, os conjuntos dos "v�cios" herdados de todos o outros Planos Diretores desde 1996 impossibilitaram que a cidade possa crescer e se regenerar de forma adequada, presa por amarras contraintuitivas e desconhecidas nas metr�poles europeias.
 
Mas n�o acredite em mim: ande por Belo Horizonte e veja voc� mesmo o estado em que a cidade se encontra, o quanto as zonas centrais est�o degradadas e vazias, constate o quanto a infraestrutura das zonas centrais permanece desperdi�ada e subutilizada (em oposi��o � escassez de infraestrutura nas zonas perif�ricas), o quanto a cidade se espalhou sem qualidade, constate a quase inexist�ncia de espa�o p�blicos de lazer e se d� conta do qu�o mal - e longe - vive a popula��o de baixa renda.
 
E ent�o? Colocamos a "m�o na massa" e passamos a simular, ou continuamos investindo em "teses" furadas?

(texto originalmente publicado no Caos Planejado)

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