(none) || (none)

Continue lendo os seus conte�dos favoritos.

Assine o Estado de Minas.

price

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Utilizamos tecnologia e seguran�a do Google para fazer a assinatura.

Assine agora o Estado de Minas por R$ 9,90/m�s. ASSINE AGORA >>

Publicidade

Estado de Minas COLUNA

Um mundo desolado em meio ao mal-estar da conviv�ncia humana

Sem nenhuma possibilidade conciliat�ria a vida em sociedade n�o melhora. Pois n�o basta somente a luta contra a pobreza se a riqueza n�o nos livra da tristeza


14/03/2021 04:00 - atualizado 14/03/2021 07:58

A pandemia de COVID-19 acentuou o abatimento do mundo diante dos mal-estar atual em todo o planeta(foto: Armando Babani/AFP %u2013 9/2/21)
A pandemia de COVID-19 acentuou o abatimento do mundo diante dos mal-estar atual em todo o planeta (foto: Armando Babani/AFP %u2013 9/2/21)

Tempos dif�ceis, mas arquive o desespero, mesmo o imposs�vel � tempor�rio. H� um mal-estar no mundo atual. Em v�rios pa�ses as pessoas acham que � algo s� com elas, mas � geral. Agravado pela pandemia n�o � coisa recente. E s�o diversas as formas como o abatimento do mundo se relaciona com o mal-estar da conviv�ncia humana. Uma das formas de se pensar a raz�o de tal inc�modo, meio oriundo de perplexidade ati�ada por quem abusa da sensibilidade das pessoas, tem a ver com a ideia de “normalidade” e a expectativa associada a ela.

As pessoas tendem a associar o senso de seguran�a com a capacidade de controlar o mundo que vivem. O controle vem de um esfor�o de classifica��o em que diferentes coisas se tornam normais, no sentido de esperar, querer e buscar. Mas tamb�m servem para estigmatizar e excluir o que fica �s margens da normaliza��o. Parte do mal-estar se d� por uma tens�o de controle.

De um lado for�as de emancipa��o empurram o mundo para formas mais abertas de coexist�ncia, mas nem sempre se organizam para predominar. Por outro lado, grupos organizados se especializaram em classificar pessoas para se beneficiar, controlar e lucrar com um mundo mais fechado e hierarquizado em termos de poder.

Roy Richard Grinker � autor de um livro lan�ado neste 2021 (mas ainda sem edi��o em portugu�s) que ajuda a entender algumas bases desse mal-estar. O t�tulo � “Ningu�m � normal: como a cultura criou o estigma do transtorno mental”. Grinker � um antrop�logo e professor de rela��es internacionais na Universidade George Washington.

Apesar do foco do livro se dar no preconceito e nos v�rios equ�vocos de tratamento que s�o oriundos dos estigmas em torno dos transtornos mentais, ele � na verdade uma hist�ria mais ampla sobre como a rever�ncia exagerada � conformidade faz com que pessoas sofram com estigmas. Sem perceber os segredos dentro dessa “normalidade” muita gente se desespera. Muitas vezes as pessoas sofrem n�o de doen�as, mas de sofrimentos causados pelo peso que se d� a elas.

Infelizmente as coisas funcionam assim: quando o paciente marca a consulta ele costuma ter uma doen�a (illness, em ingl�s); quando sai do consult�rio ele j� est� com outra doen�a(disease). E a doen�a definida pelo m�dico costuma ser pior do que a doen�a do paciente.

Grinker lembra que “alguma forma de estigma existe por todo lado no mundo, mas o que � estigmatizado sempre varia de acordo com o tempo e o lugar.” No contexto da competi��o econ�mica “as pessoas mais estigmatizadas tendem a ser aquelas que n�o conformam com o ideal do trabalhador moderno: aut�nomo e autossuficiente.” As diferentes sociedades sofrem mais � medida que produzem modelos de comportamentos estanques, o caminho para mais identidades desacreditadas.

Grinker recorda que o primeiro Diagn�stico e Estat�stica de Transtorno Mental – DSM1 – da psiquiatria norte-americana foi escrito por militares, publicado durante a guerra da Cor�ia, e � um “casamento entre experi�ncia militar com teoria psicanal�tica”. At� hoje suas vers�es s�o “manuais descritivos dedicados n�o a estabelecer causalidade, mas sim a catalogar sintomas.”

S� que sintomas variam de acordo com diferentes culturas e sociedades. Argumenta ele que “classifica��es cient�ficas podem �s vezes impedir nossos esfor�os de nos definir por n�s mesmos,” e cita como exemplo um caso estudado em S�o Paulo em que quando a linguagem do DSM � utilizada com pacientes colocando a enfermidade da pessoa na linguagem de doen�a, eles perdem a habilidade de expressar compreens�es mais positivas sobre suas pr�prias condi��es.

Logo, pa�ses diferentes deveriam criar seus pr�prios DSM. Copiar/colar revela pl�gio e pl�gio nunca foi um pilar da sabedoria. Esse � um sintoma, por assim dizer, do problema de no��es hier�rquicas nas rela��es internacionais. Elas facilitam a compreens�o e � compreens�vel que exista quem as deseje, mas elas s�o in�teis quando h� mais contradi��es do que coer�ncias dentro dos costumes.

Evidente que a vontade de restabelecer hierarquia e poder � grande, mas vai na contram�o de for�as emancipat�rias mais fortes que empurram o mundo para formas mais abertas de coexist�ncia.

O funcionamento da democracia e de uma paz real na pol�tica mundial surgem quando a “hierarquia pol�tica se tornou ultrapassada e uma forma de ‘apolaridade c�vica’ � finalmente estabelecida.” Em muitos pa�ses falta um ator de rosto sereno capaz de parar o entusiasmo com o �xtase da normalidade ruim e capaz de tocar a vida sem ver imperfei��o nos desolados. Sem nenhuma possibilidade conciliat�ria a vida em sociedade n�o melhora. Pois n�o basta somente a luta contra a pobreza se a riqueza n�o nos livra da tristeza. (Com Henrique Delgado)

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)