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Estado de Minas RAMIRO BATISTA

Comunica��o ficou mais importante que arma e dinheiro para tomar o poder

A m�o pesada de Alexandre de Moraes sobre o Telegram coincide com os v�deos de Volodymyr Zelensky e a ideia de que um celular pode ganhar elei��es e guerras


22/03/2022 06:00

Imagem de tela de celular mostra o aplicativo Telegram
Das armas para o dinheiro e depois para a comunica��o (foto: Kirill KUDRYAVTSEV / AFP)
A hist�ria da pol�tica e da guerra desde que o mundo � mundo � tamb�m o da evolu��o dos meios para tomada e manuten��o do poder. Das armas para o dinheiro e depois para a comunica��o.

O homem tomou territ�rios a pau, pedra e p�lvora. Depois descobriu que, ao inv�s de destruir o inimigo, era melhor explor�-lo. E, por fim, manipul�-lo.

Alexandre de Moraes que o diga. Ao descer sua m�o de ferro sobre o Telegram, sob o risco de explodir o direito de alguns milh�es para cercar meia d�zia de gatos pardos, passou recibo do quanto comunicar passou a ser determinante para vencer elei��es ou guerras.

N�o por coincid�ncia, nas circunst�ncias da guerra da R�ssia contra a Ucr�nia, definitivamente o �pice da express�o midi�tica como meio de destrui��o em massa. Em que um inimigo sem armas e dinheiro suficientes transforma o que seria um passeio do gigante opressor numa sequ�ncia de perdas desastrosas.

Com o gog� e um celular, Volodimir Zelensky jogou o mundo ocidental contra o detentor das ogivas nucleares que poderia dizim�-lo. Inspirou o bloqueio radical de todos os seus canais de respira��o com o mundo tecnol�gico, no grau de efici�ncia com que os antigos sufocavam o inimigo explodindo pontes, linhas de suprimento e radares.

Nossa hist�ria pol�tica come�ou na matan�a de �ndios e terminou no Telegram.

Matar �ndios foi o primeiro bom neg�cio dos portugueses, antes de explor�-los. O dinheiro mandou um bom tempo desde o Imp�rio e a chegada das urnas, na pol�tica dos coron�is. At� pelo menos 2014, na liquida��o de caixa dois rec�proco de Dilma Rousseff e A�cio Neves, que gastaram mais do que declararam.

� verdade que, desde Victor Hugo, se sabe na sua frase lapidar que "nada � mais forte do que uma ideia cuja hora � chegada". Entre n�s, tamb�m, sempre houve uma ideia por  tr�s das armas e da for�a da grana que ergue e destr�i coisas belas. 

Desde que se matavam advers�rios e se roubavam urnas na Rep�blica Velha, era necess�rio alguma for�a de convic��o que justificasse o assassinato e o roubo para a ascens�o ao poder.

- Get�lio Vargas vendia a tese de trai��o dos coron�is de S�o Paulo e Rio antes de suas armas e do dinheiro para compr�-las, claro.

- Em tempos de paz, Juscelino Kubitscheck prometia fazer "50 anos em cinco" como pano de fundo de um processo eleitoral sabidamente corrupto.

- Os militares de 64 retomaram o recurso das armas, mas com fuzis na m�o e uma ideia na cabe�a, a amea�a do comunismo.

Foi a partir da moderniza��o das t�cnicas de propaganda comercial para interpretar desejos, nos anos 70, que a mensagem passou a ser mais importante que o meio. A embalagem mais relevante que o conte�do viria a ter impactos profundos no marketing pol�tico a partir da�.

At� o final dos anos 80, da redemocratiza��o e da disputa hist�rica de Lula e Collor de Mello na elei��o de 1989, o embate eleitoral ainda se dava em torno de argumentos de raz�o pol�tica. Tanto que os debates eleitorais ainda eram o principal canal de conhecimento dos candidatos.

Foi nos anos 90, a partir de Collor, que come�aram a surgir por aqui as t�cnicas mais sofisticadas de manipula��o de imagem.

Pode-se tomar como marco relevante as patranhas de Duda Mendon�a para transformar o sombrio Paulo Maluf num candidato arejado de ternos claros e �culos finos, tutor do primeiro candidato brasileiro de laborat�rio, eleito o primeiro prefeito negro de S�o Paulo, Celso Pitta.

Ainda tempos em que m�quina partid�ria e ca�ambas de dinheiro, at� para pagar marqueteiros como Duda, eram mais determinantes que a propaganda. Um status quo que viria a perdurar at� disputa Dilma/A�cio, em constante evolu��o em termos de coopta��o partid�ria e volumes em caixa.

Por cima e por baixo dos panos. A hist�ria das elei��es dos �ltimos 50 anos � tamb�m da evolu��o dos mecanismos de corrup��o para produ��o de caixa dois — da propina direta �s empresas de fachada, que chegaram � sofistica��o do Mensal�o e do Petrol�o. Como tamb�m, last but not least, da ascens�o dos marqueteiros pop star, t�o caros quanto todo o restante das estruturas de campanha.

O triunfo definitivo da mensagem sobre os recursos materiais pode ser determinado pela vota��o do Brexit e a elei��o de Donald Trump, que impulsionou a onda conservadora que elegeu outros populistas pelo mundo, incluindo Jair Bolsonaro.

Uma arsenal de recursos tecnol�gicos e manipula��o diab�lica de dados em redes sociais, para, mais que fazer a mensagem chegar ao eleitor, criar p�blicos, conflitos e necessidades psicol�gicas que tornassem o candidato objeto de desejo e o advers�rio, de �dio.


� sintom�tico que Donald Trump n�o tenha gasto um tost�o pr�prio e Jair Bolsonaro tenha feito a campanha mais barata desde que dinheiro ficou mais importante que armas na pol�tica brasileira. 

Foi tocada em fam�lia sob a lideran�a de um filho esperto (Carlos) que importou as mandingas do g�nio do Brexit e do Trump, Steve Bannon, movimentando mais verbo — desejo e �dio espont�neos — que verba. Digno de registro que a campanha tenha mobilizado instintos primitivos do ser humano de ter poder pessoal pelo uso de… armas.

A ideia cuja hora era chegada e nenhum outro candidato ousou — a destrui��o do PT —  encontrou os meios eletr�nicos dispon�veis em sua melhor hora. Tornou irrelevantes a compra do voto e a arma poderosa da estrutura partid�ria, at� ent�o determinantes.

N�o se tem not�cia na hist�ria das campanhas eleitorais da era moderna de tanto an�nimo eleito deputado com at� milh�es de votos (Joyce Hasselmann, Jana�na Paschoal) montado num celular e nessa ideia for�a na cabe�a. Do zero, sem partido e alian�as, um vice monocrom�tico militar, Bolsonaro elegeu os governadores das principais capitais e formou a maior bancada do Congresso.

Pode se discutir hoje que 2018 tenha sido um ponto fora da curva a n�o se repetir, dado o fiasco do apoio de Bolsonaro aos candidatos nas elei��es municipais de 2020 e a cadeia de erros que desmoralizaram a mensagem e ressuscitaram seus alvos (Lula e o PT).

Superada e gasta a ideia de erradica��o dos dois, ele parece n�o ter outra para colocar em seu lugar e precisar� mais do que uma boa mensagem para disputar com alguma chance a pr�xima elei��o. Sem contar que seus concorrentes aprenderam o caminho das pedras, no conte�do e nos meios.

"Erradicar Lula e o PT" ficou do mesmo tamanho de outra ideia agora t�o ou mais poderosa, a de "erradicar Bolsonaro da face da terra". E ambas em disputa com uma terceira, proporcionalmente arrasadora: "nem um, nem outro". Como j� diz Diogo Mainardi, "o voto nulo � lindo".

N�o � toa, h� bom tempo Bolsonaro vem tratando de ressuscitar, renovar e aprimorar os mecanismos de compra de apoio das bancadas parlamentares e do voto que elas arrancam nos grot�es. Depois, diga-se, de tentar manter seu poder pelo meio antigo, as armas, nas tenta��es de golpe que ensaiou.

No que � de longe seu maior acerto, por�m, em nenhum momento descuidou de sua rede de comunica��o, a mais poderosa no cen�rio. Em provoca��o diuturna e capilaridade tentacular, est� a alguns n�meros e anos luz � frente da de seus advers�rios. Era, at� Zelensky, o l�der mundial de maior presen�a no Telegram.

� ela que o mant�m de p�, muito mais resistente e vi�vel eleitoralmente do que deveria depois de tantos erros. � ela que tira o sono de Alexandre de Moraes, atrai e dribla sua m�o pesada, desde a instala��o do inqu�rito escabroso das fake news que acabou resultando no cancelamento do Telegram.

Que outra melhor prova de que 2018 n�o foi s� um trope�o ocasional no avan�o das armas da comunica��o sobre todas as outras nos arsenais de conquista e manuten��o do poder?

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