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Estado de Minas VITALidade

O retrato de Dorian Gray e como encaramos o envelhecimento

Passagem do tempo passou a ser vista como algo que mortifica e conduz ao morrer cont�nuo, unicamente com a preocupa��o de mitigar os efeitos da velhice


18/07/2022 09:12

Cena do filme Retrato de Dorian Gray
Cena do filme Retrato de Dorian Gray (foto: Ealing Studios, Alliance Films, Fragile Films/Divulga��o)
No livro O Retrato de Dorian Gray, o autor Oscar Wilde nos d� um bel�ssimo exemplo sobre o insaci�vel desejo de se manter jovem para sempre e a qualquer custo, deixando de lado, muitas vezes, a necess�ria evolu��o espiritual. Dorian � algu�m que se apaixona perdidamente por si mesmo e por seus atributos f�sicos, intelectuais e existenciais, n�o medindo esfor�os para alcan�ar tudo aquilo que deseja.

Neste processo de constru��o de si mesmo, o protagonista n�o envelhece, mas t�o somente o quadro que cont�m o seu retrato, que deixa transparecer em suas tintas a falta de cores da exist�ncia de um Dorian que n�o busca nada al�m da satisfa��o sensorial. 
 
Nossa modernidade l�quida, na express�o de Bauman, nos convida todo o tempo a sermos jovens, apraz�veis e, para sempre consum�veis. Todos os aspectos ligados ao envelhecimento s�o tidos como menores, indesej�veis e dignos de serem camuflados ou at� mesmo eliminados, como se a velhice fosse um mal a ser combatido pela Medicina.

A passagem do tempo passou a ser vista como algo que mortifica e nos conduz � dolorosa experi�ncia do morrer cont�nuo. � como se, a partir de certa idade, nossa grande preocupa��o devesse ser a de mitigar os efeitos do tempo sobre nosso corpo e nosso esp�rito.
 
Somos compelidos a manter a infantil ilus�o de que nascimento, envelhecimento e morte n�o s�o parte natural do processo humano, como os deuses da antiguidade, que j� nasciam adultos e assim permaneciam para todo o sempre. Alimentamos a falsa impress�o de que podemos alcan�ar a vit�ria contra o tempo; e, nesse af�, n�o � incomum que a melhor parte de n�s mesmos seja ignorada durante o processo.
 
Envelhecer pode ser visto sob a �tica das perdas, que necessariamente acontecem, e n�o ser�amos ing�nuos de as negar; mas tamb�m pode nos convidar a navegar em um mar de incertezas, que, no dizer de Russel, nos colocam entre esperan�as vivas e receios provocadores. Aprender a viver sem certezas – e n�o ser paralisado por elas - talvez seja um dos maiores desafios da velhice.


 
Aceitar a passagem do tempo – e os efeitos dela decorrentes - como algo natural � imperioso para a manuten��o da qualidade de vida na velhice. N�o recriminamos quem pinta os cabelos, aplica botox ou se preocupa de modo saud�vel com a apar�ncia - ao contr�rio, incentivamos isto entre os pacientes que assim desejam faz�-lo. As vezes tais a��es se mostram como indicativos de qualidade de vida para alguns pacientes. O que n�o � recomend�vel � fazer tais coisas porque a sociedade n�o aceita que estamos admitindo com coragem a nossa passagem pelo tempo.
 
Muitas vezes fazer um retiro de ioga, passar o final de semana junto � natureza ou viajar para um lugar desconhecido pode ser t�o ben�fico para a manuten��o do vi�o da pele quanto uma tarde no dermatologista ou uma interven��o cir�rgica. As vezes o que nos falta n�o � mais juventude, mas compreens�o sobre quem somos e aquilo que ainda desejamos ser: somos humanos e, enquanto tais, sujeitos ao tempo, tanto em suas vicissitudes quanto em suas benesses. 
 
O que pode ser mais gostoso para os apreciadores do que um vinho safra antiga? O que dizer dos relacionamentos longos, cheios de cumplicidade e afeto? Isso para n�o dizer da alegria de partilharmos nosso tempo com nossos av�s que, j� repletos de sabedoria, podem nos aconselhar de modo muito mais amoroso que vinte amigos juntos.
 
� necess�rio que aprendamos o mais breve poss�vel que belas n�o s�o apenas as formas f�sicas da juventude. Elas, sem d�vida s�o belas. Mas, em nossa opini�o, h� mais beleza em um rosto enrugado s�bio do que em uma classe inteira do colegial. N�o h� nada mais belo que um rosto s�bio!
 
A hist�ria que come�amos a contar no in�cio termina com o protagonista destruindo o quadro que lhe garantia a juventude eterna. Ele compreende que muitas das dores que havia sofrido eram decorrentes daquele presente que, ao final, se mostrou uma maldi��o. Manter a juventude a qualquer pre�o � maldi��o e n�o aceitarmos a passagem do tempo pode ser nossa ru�na rumo � constru��o de n�s mesmos. 

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