M�e aos 17 anos, Sofia Martini saiu da escola para cuidar das filhas rec�m-nascidas, as g�meas Alice e Al�xia. Hoje, nove anos depois, a doceira � casada com o pai das garotas, se tornou m�e tamb�m de Henrik, de 3, e vive no Bairro Eldoradinho, em Contagem, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. Desde a primeira gravidez, Sofia tenta voltar aos estudos, que abandonou ainda no ensino m�dio, mas a rotina com os filhos tem adiado esse sonho.
O Estado de Minas publica a partir de hoje a s�rie de reportagens "Antes da hora", sobre gravidez na adolesc�ncia, e mostra solu��es vi�veis para esse grave problema social, que afeta o presente e o futuro de milhares de jovens e de seus filhos. Projetos que poderiam ter ajudado Sofia a retomar os planos de concluir os estudos, sem perder a conviv�ncia com os filhos.

"A gravidez de adolescentes custa R$ 4,1 bilh�es por ano ao Brasil. Isso ningu�m aborda: corresponde a 10% do PIB. Enquanto que para outros pa�ses, como Estados Unidos, Noruega, Su�cia e China, custa 1% do Produto Interno Bruto", afirma a m�dica ginecologista Albertina Duarte, coordenadora do projeto Casa do Adolescente, em S�o Paulo. A iniciativa ajuda jovens a construir uma perspectiva de vida, um dos pilares para reduzir os n�meros de crian�as e adolescentes gr�vidas no Brasil, ao lado de promover a autoestima e trabalhar aspectos culturais, segundo especialistas.
"A gente teve em 2021 quase 20 mil nascidos vivos filhos de m�es de 10 a 14 anos. Estou falando de crian�as tendo crian�as. Nem sequer estou entrando na adolesc�ncia ainda"
J�nia Quiroga, representante auxiliar da ONU no Brasil do Fundo de Popula��o
Na Am�rica Latina, 36% dos casos de evas�o escolar de garotas podem estar relacionados � maternidade ou a gravidez na adolesc�ncia, conforme estudo da Corporaci�n Andina de Fomento (CAF), institui��o que investe em pesquisas e projetos para desenvolver a Am�rica Latina. A cerca de uma hora de Aracaju, uma escola sergipana se tornou refer�ncia nacional ao criar, h� mais de uma d�cada, um modelo de ensino que concilia li��es de planejamento de vida para adolescentes, ao mesmo tempo em que acolhe jovens que foram m�es antes da hora.
O projeto Beb� a Bordo
Para aumentar a sensa��o de pertencimento das m�es na escola e evitar a evas�o escolar, o Centro de Excel�ncia Dr. Ed�lzio Vieira de Melo, localizado no munic�pio de Santa Rosa de Lima, aprovou o projeto Beb� a Bordo, criado pela professora Gleide Leandro. A iniciativa ensina as m�es a cuidarem dos beb�s, como primeiros socorros e a massagem shantala, e complementa o trabalho diferencial que a escola faz ao aceitar estudantes e seus filhos.
A decis�o de aceitar rec�m-nascidos e crian�as na sala de aula surgiu a partir de um pedido feito por uma aluna ao diretor do centro, Almir Pinto. "Isso de crian�a na escola era muito barulho, eu ficava azedo. At� mandei uma menina ir para casa porque ela estava com o beb� chorando. Mas ela foi at� a minha sala e falou: 'Professor Almir, eu n�o tenho com quem deixar minha filha. Eu quero ser algu�m na vida, o senhor n�o j� �? Eu quero estudar, n�o quero abandonar'", relembra.
"A gravidez de adolescentes custa R$ 4,1 bilh�es por ano ao Brasil. Isso ningu�m aborda"
Albertina Duarte, m�dica e coordenadora do projeto Casa do Adolescente (SP)
O desejo de melhorar sua condi��o de vida por meio da escola tamb�m � uma realidade na vida de Joana Santos, de 19, m�e de Murilo Joaquim, de 1, e aluna do segundo ano na Dr. Ed�lzio Vieira de Melo. A estudante, que sonha em ser enfermeira, conta com a ajuda do col�gio para manter os estudos em dia e cuidar do filho. "Tudo o que eu fa�o � para mim e para ele", afirma a jovem, que cria o filho sem o apoio do pai da crian�a.
Erika Oliveira, de 22, concluiu os estudos no col�gio sergipano com a ajuda do Beb� a Bordo. Ela � m�e de B�rbara Helen, de 4, e Bernardo, de 3, e � casada com o pai das crian�as. "Foi um projeto muito acolhedor e necess�rio do col�gio para n�s, m�es na flor da idade. Conseguiu nos trazer de volta para os estudos e nos conectar melhor tamb�m com a escola", afirma Erika, que planeja fazer um curso superior ou profissionalizante.
Dif�cil concilia��o dentro de casa
Uma realidade bem diferente da enfrentada na Grande BH por Sofia. Ap�s o nascimento das g�meas, ela come�ou a fazer bolos de pote para vender. A fonte de renda foi uma solu��o tamb�m para continuar ao lado das filhas, sem ter de deixar Alice e Al�xia na casa de terceiros enquanto trabalhava. Atualmente, ela est� empregada como assistente administrativa, com carteira assinada, o que por muito tempo foi dif�cil conciliar com a rotina de m�e.
"N�o conseguia ficar tr�s meses em um emprego e tinha problema por conta do hor�rio. Ou leva em bab� ou leva na escolinha. Tem um clich� que filho � de m�e, pai s� ajuda. Para o pai conseguir um emprego, ele precisa s� do trabalho. J� uma m�e precisa de um trabalho, hor�rio flex�vel e uma pessoa de confian�a", comenta Sofia.
"Estou falando de crian�as tendo crian�as"
Um dos objetivos do col�gio e do projeto � quebrar o ciclo da pobreza e promover melhores oportunidades de futuro para as alunas e seus beb�s. Tecnicamente, o ciclo da pobreza ocorre quando os pais n�o conseguem dar condi��es para o filho ascender socialmente e, assim, se estabelece um movimento circular, explica a professora Danielle Cireno Fernandes, do Departamento de Demografia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
"Existe hoje uma diferen�a na idade de ter o primeiro filho, que � muito clara entre as classes sociais. De uma maneira geral, o Brasil est� acompanhando bastante esse comportamento. M�es de classes menos favorecidas tomam uma, digamos assim, decis�o de antecipar o filho – �s vezes, � um evento que n�o � totalmente controlado, em especial no pa�s onde o aborto n�o � permitido – para, a partir dali, ela se inserir no mercado de trabalho", explica.
Nesse contexto, essas jovens m�es de classes sociais mais baixas tendem a deixar os estudos para cuidar do filho e acabam tendo menos oportunidades no mercado de trabalho. Ela possivelmente ter� um emprego que precise de baixa escolariza��o e tenha baixa remunera��o, sem possibilidade de crescer profissionalmente.
Apesar de a gravidez na adolesc�ncia ocorrer em todas as classes sociais, a maior parte dos nascidos vivos de m�es jovens est� concentrada em regi�es brasileiras com maiores taxas de pobreza. Ou seja, a gravidez na adolesc�ncia est� relacionada a outros �ndices socioecon�micos, como o �ndice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Em 2021, a m�dia de nascimentos de m�es de at� 19 anos em S�o Paulo foi de 9,35%. Em Minas Gerais, a taxa foi de 10,96%. Enquanto isso, em Sergipe, foi de 15,73%, acima da m�dia brasileira, de 13,62%. Esses dados s�o do Fundo de Popula��o das Na��es Unidas. "A gente teve, em 2021, quase 20 mil nascidos vivos filhos de m�es de 10 a 14 anos. Num pa�s de dimens�es continentais, nascem em m�dia 3 milh�es de crian�as por ano, mas estou falando de um grupo de 14 anos. Estou falando de crian�as tendo crian�as. Nem sequer estou entrando na adolesc�ncia ainda", alerta J�nia Quiroga, representante auxiliar da ONU no Brasil do Fundo de Popula��o.
"O grupo da adolesc�ncia tamb�m tem uma fecundidade bastante alta: 13,1% dos nascidos vivos no Brasil em 2021 eram filhos de m�es de 15 a 19 anos. No total, entre 10 a 14 e 15 a 19, a gente tem a� 14% dos nascidos vivos. Ent�o, a gente tem n�o s� crian�as tendo crian�as, como a gente tem adolescentes tendo crian�as", explica J�nia.
"Existe hoje uma diferen�a na idade de ter o primeiro filho, que � muito clara entre as classes sociais. De uma maneira geral, o Brasil est� acompanhando bastante esse comportamento. M�es de classes menos favorecidas tomam uma, digamos assim, decis�o de antecipar o filho – �s vezes, � um evento que n�o � totalmente controlado, em especial no pa�s onde o aborto n�o � permitido – para, a partir dali, ela se inserir no mercado de trabalho", explica.
"Para o pai conseguir um emprego, ele precisa s� do trabalho. J� uma m�e precisa de um trabalho, hor�rio flex�vel e uma pessoa de confian�a"
Sofia Martini, assistente administrativa, que foi m�e aos 17 anos
Nesse contexto, essas jovens m�es de classes sociais mais baixas tendem a deixar os estudos para cuidar do filho e acabam tendo menos oportunidades no mercado de trabalho. Ela possivelmente ter� um emprego que precise de baixa escolariza��o e tenha baixa remunera��o, sem possibilidade de crescer profissionalmente.
Apesar de a gravidez na adolesc�ncia ocorrer em todas as classes sociais, a maior parte dos nascidos vivos de m�es jovens est� concentrada em regi�es brasileiras com maiores taxas de pobreza. Ou seja, a gravidez na adolesc�ncia est� relacionada a outros �ndices socioecon�micos, como o �ndice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Em 2021, a m�dia de nascimentos de m�es de at� 19 anos em S�o Paulo foi de 9,35%. Em Minas Gerais, a taxa foi de 10,96%. Enquanto isso, em Sergipe, foi de 15,73%, acima da m�dia brasileira, de 13,62%. Esses dados s�o do Fundo de Popula��o das Na��es Unidas. "A gente teve, em 2021, quase 20 mil nascidos vivos filhos de m�es de 10 a 14 anos. Num pa�s de dimens�es continentais, nascem em m�dia 3 milh�es de crian�as por ano, mas estou falando de um grupo de 14 anos. Estou falando de crian�as tendo crian�as. Nem sequer estou entrando na adolesc�ncia ainda", alerta J�nia Quiroga, representante auxiliar da ONU no Brasil do Fundo de Popula��o.
"O grupo da adolesc�ncia tamb�m tem uma fecundidade bastante alta: 13,1% dos nascidos vivos no Brasil em 2021 eram filhos de m�es de 15 a 19 anos. No total, entre 10 a 14 e 15 a 19, a gente tem a� 14% dos nascidos vivos. Ent�o, a gente tem n�o s� crian�as tendo crian�as, como a gente tem adolescentes tendo crian�as", explica J�nia.
O especial "Antes da Hora"
A s�rie "Antes da Hora" para o podcast DiversEM conta com o apoio do programa Early Childhood Reporting Fellowship: Desigualdade no Brasil e no restante da Am�rica do Sul, do Dart Center for Journalism and Trauma, da Universidade de Columbia (EUA) e da Funda��o Maria Cecilia Souto Vidigal. O especial com cinco epis�dios � publicado semanalmente nas vers�es impressa e digital do Estado de Minas.
O podcast DiversEM � uma produ��o quinzenal dedicada ao debate plural, aberto, com diferentes vozes e que convida o ouvinte para pensar al�m do convencional. Cada epis�dio � uma oportunidade para conhecer novos temas ou se aprofundar em assuntos relevantes, sempre com o olhar �nico e apurado de nossos convidados.
Ou�a e acompanhe as edi��es do podcast DiversEM
O podcast DiversEM � uma produ��o quinzenal dedicada ao debate plural, aberto, com diferentes vozes e que convida o ouvinte para pensar al�m do convencional. Cada epis�dio � uma oportunidade para conhecer novos temas ou se aprofundar em assuntos relevantes, sempre com o olhar �nico e apurado de nossos convidados.