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Estado de Minas ENTREVISTA

Mito da 'cura gay' causa danos psicol�gicos profundos, diz documentarista

Kristine Stolakis, autora do document�rio Pray Away, que investigou as chamadas terapias de reorienta��o sexual, conversou com o Correio Braziliense


19/06/2023 11:09 - atualizado 19/06/2023 14:41
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Kristine é uma mulher branca de cabelos castanhos. Ela usa uma regata cor de vinho e está sentada em uma poltrona
Kristine Stolakis, afirma que as "terapias de convers�o" existem e continuar�o a existir enquanto houver uma cultura de homofobia e transfobia (foto: RJ Losada/Divulga��o)

A chamada "cura gay", pr�tica nociva que tenta fazer com que pessoas LGBTQIA+ se conformem � heterossexualidade, n�o � um problema apenas no Brasil. Em entrevista ao Correio, a diretora do document�rio Pray Away, Kristine Stolakis, conta que as chamadas terapias de reorienta��o sexual, ou terapias de convers�o, existem e continuar�o a existir enquanto houver uma cultura de homofobia e transfobia no mundo. Lan�ado em 2020, o filme aborda a hist�ria de pessoas LGBTQIA+  que passaram por esse processo, bem como antigas lideran�as de organiza��es que ofereciam a pr�tica.

Kristine alerta que a "cura gay" ainda � muito presente dentro de organiza��es religiosas, embora a pr�tica da terapia por psic�logos registrados tenha sido proibida em muitos lugares do mundo, inclusive no Brasil. Os danos da terapia de reorienta��o sexual s�o fartamente documentados, incluindo efeitos severos na sa�de mental de pessoas que passaram por isso. Para a diretora, � preciso combater a homofobia e a transfobia tamb�m a n�vel cultural, e cobrar que institui��es religiosas se posicionem vocalmente contra a pr�tica.

Kristine est� em Bras�lia e participa hoje, �s 19h, da exibi��o e discuss�o do document�rio, organizada pela Embaixada dos Estados Unidos do Brasil e sediado na Casa Thomas Jefferson da Asa Sul.

Por que voc� decidiu produzir um document�rio sobre o tema?
 
Eu decidi dirigir este filme porque tive um tio, infelizmente j� falecido, que passou pela terapia de convers�o ap�s se descobrir trans ainda crian�a. Ele passou por isso em uma �poca muito diferente, quando todos os psic�logos registrados e ativos eram, essencialmente, terapeutas de convers�o. Eu tive dificuldades para entender, o qu�o profunda era a esperan�a dele de que a mudan�a estava logo ao seu alcance, que mudar de trans para cis, ou de gay para h�tero, era poss�vel. E, claro, sua devasta��o e o caminho muito duro que ele acabou percorrendo por causa de sua sa�de mental, isso resultou que, por toda a vida, ele acreditou que essa mudan�a era poss�vel.

Para mim, criar um document�rio que explora como o poder funciona nesse mundo, onde a homofobia e a transfobia est�o internalizadas e externalizadas de uma forma muito perigosa, me interessou. Por que isso � t�o poderoso? Por que continua a existir? Eu passei quatro anos, do come�o ao fim, produzindo o document�rio e gravando com antigos l�deres do movimento, com pessoas que disseram que conseguiram se "curar", que lideraram o que foi a maior organiza��o de terapia de convers�o do mundo, a Exodus International, e n�s gravamos com pessoas que deixaram esse movimento e depois se declararam LGBTQIA+.

O que motiva as pessoas LGBTQIA a procurarem essa chamada "cura"?
 
Uma frase no final do nosso filme responde a essa pergunta. "Enquanto existirem homofobia e transfobia, algo parecido com o movimento da terapia de convers�o vai continuar". Se voc� ensina as pessoas que ser LGBTQIA+, de alguma forma, � uma doen�a psicol�gica, ou um pecado espiritual, elas v�o se sentir motivadas a "se corrigirem", apesar de sabermos que n�o h� nada para consertar. As pessoas que passaram pela terapia de convers�o t�m duas vezes mais probabilidade de tentar suic�dio.

Mas, voc� pode pensar que esse movimento oferece a promessa de pertencimento. De pertencer � sua comunidade espiritual, � sua fam�lia, ao seu pa�s. Se voc� est� cercado de uma ret�rica odiosa sobre quem voc� �, e voc� ouve que est� doente de alguma forma e n�o tem o direito de fazer parte dessa comunidade que voc� ama, voc� pode entender porque as pessoas s�o tentadas a mudar.

Eu digo que esse movimento das pessoas que se declaram "ex-LGBTQIA+" e o olhar que n�s trouxemos no filme � um estudo sobre o lado escuro da necessidade — extremamente humana — de pertencimento. Quando voc� n�o sente que pertence, voc� faz muitas coisas para tentar mudar isso, mesmo que isso te machuque ou machuque outras pessoas. Essa � uma parte muito triste e complexa desse movimento.

A pr�tica � proibida no Brasil e em outros pa�ses. Isso n�o foi o suficiente para frear o movimento?
 
Voc� pode fechar uma organiza��o na sua rua, voc� pode impedir que um pastor pare de fazer uma pseudoterapia em seu escrit�rio uma vez por semana, mas voc� tamb�m precisa lidar com o problema maior da cultura de homofobia e de transfobia. Nos Estados Unidos, pelo menos, � normalizado pensar que ser uma pessoa trans � algum tipo de doen�a psicol�gica, ou que � um pecado. E, novamente, n�o � nada disso, e dizer isso fere pessoas trans extremamente vulner�veis que est�o tentando apenas se encaixar nesse mundo.

Atualmente, a maioria das terapias de convers�o ocorrem dentro de institui��es religiosas. Ent�o, h� um pastor atuando como conselheiro, oferecendo para se reunir com seu filho, que pode ser gay, uma vez por semana. Infelizmente, nos Estados Unidos, temos prote��es � liberdade religiosa e n�o podemos proibir essas pr�ticas em ambientes religiosos. N�o � f�cil fechar uma igreja. Houve um forte movimento no mundo para proibir que psic�logos e profissionais registrados aplicassem a terapia de convers�o, e voc� pode fazer isso com leis, mas � algo dif�cil de parar. � preciso haver uma mudan�a n�o somente legislativa, mas tamb�m cultural.

Ent�o, a n�vel cultural, o que pode ser feito?
 
Na pesquisa para o document�rio, muitas pessoas compartilharam comigo que a vontade que tiveram de buscar essa "cura" come�ou ap�s ouvir um coment�rio de um parente, ou de um pastor, de um l�der do governo, e isso deu a eles uma "pista", completamente prejudicial, que algo neles estava errado. Uma coisa que eu diria para pessoas que n�o s�o LGBTQIA+  � que tomem cuidado e combatam os pequenos coment�rios e a��es que podem ocorrer na sua comunidade.

Como ajudar as pessoas que passaram por essas terapias de convers�o?
 
Para pessoas que passaram pela terapia de convers�o, � uma quest�o complicada. Eu ouvi de muitos sobreviventes a necessidade de haver uma justi�a restaurativa forte e local. Que l�deres locais, inclusive de entidades religiosas, se pronunciem contra essa pr�tica. A maioria das institui��es j� n�o acredita nisso, internamente, mas pouqu�ssimas se manifestaram publicamente. E elas precisam fazer isso. O poder de institui��es religiosas condenando essa "cura" n�o pode ser subestimado. E essa � quest�o � muito ampla, porque a dor � muito grande. Eu n�o tenho a resposta para melhorar isso no curto prazo, � uma estrada longa.
 

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