
A coordenadora da organiza��o n�o governamental Cepia, Leila Linhares Basterd, avalia que n�o basta que a Lei Maria da Penha seja enfocada nos aspectos de seguran�a p�blica e justi�a. "Todos os primeiros artigos da lei s�o artigos voltados para a necessidade da preven��o", lembra. "A gente se pergunta por que t�o baixo investimento em preven��o? Preven��o que significa articula��o da viol�ncia com a �rea da educa��o, com a forma��o dos agentes p�blicos e com a mudan�a de mentalidade".
A advogada elogia a retomada do Pacto Nacional pelo Enfrentamento � Viol�ncia contra as Mulheres pelo governo federal e afirma que os dados atuais de feminic�dio e outros crimes desse tipo revelam a necessidade de refor�ar o trabalho de preven��o.
"Hoje em dia se retoma esse pacto como um pacto de enfrentamento contra o feminic�dio. E o que o pacto apresenta talvez seja o que n�o foi feito e o que se revela nesses n�meros. O investimento na preven��o da viol�ncia contra as mulheres".
Or�amento p�blico
A deputada estadual Renata Souza (PSOL-RJ) enfatiza que somente no estado do Rio de Janeiro houve 293 tentativas de feminic�dio e 283 mulheres efetivamente assassinadas em 2022, enquanto o or�amento para a prote��o �s mulheres n�o foi efetivamente cumprido.
"Prioridade pol�tica � or�amento, � dinheiro para a execu��o de uma determinada pol�tica", afirma ela, que defende que essas a��es s�o necess�rias principalmente em territ�rios mais empobrecidos.
A deputada destaca que, mesmo ap�s 90 anos de sufr�gio universal, � escandaloso que mulheres sejam apenas 15% dos parlamentares no Brasil e afirmou que esse percentual tamb�m fala sobre a falta de pol�ticas p�blicas para que mulheres se sintam seguras ao exercer a pol�tica.
"N�o estou falando s� da pol�tica institucional, estou falando tamb�m de mulheres como a M�e Bernardete, que foi assassinada. Uma mulher quilombola, de ax�, que foi assassinada lutando pelo reconhecimento da terra quilombola", lembrou. "A gente teve um avan�o com a Lei Maria da Penha, que fez 17 anos, mas � evidente que todas as prerrogativas colocadas em rela��o � preven��o aos feminic�dios n�o s�o obedecidas concretamente. A Lei Maria da Penha s� � executada muitas vezes do ponto de vista punitivista do autor do feminic�dio, e n�o na preven��o para a mulher. Isso � um problema, porque depois que essas mulheres foram assassinadas, o preju�zo j� foi feito".
Ressocializa��o
Procuradora estadual do Rio de Janeiro, Leonor Nunes de Paiva destaca que a lei � de grande import�ncia tamb�m por definir as formas de viol�ncia, como a sexual, patrimonial, moral, prevendo tamb�m como prevenir o crime e ressocializar o agressor.
"A Lei Maria da Penha tem artigos dizendo a participa��o da m�dia, com campanhas apontando a viol�ncia, e tamb�m a participa��o das escolas, da educa��o. � fundamental o papel das escolas", cita.
"No entanto, nada disso foi feito. Essa reincid�ncia, com que dizem que a lei n�o conseguiu acabar, � porque n�o foi implementada. Essa � a quest�o. N�o se pode ter s� o aspecto punitivo, e n�o ter tamb�m o aspecto preventivo e regenerador".
Para a militante feminista Ligia Coelho de Souza, que foi integrante da Comiss�o Viol�ncia contra a Mulher e do SOS-Mulher-RJ, h� um paradoxo nos avan�os da luta contra a viol�ncia � mulher no Brasil.
"O progresso na legisla��o � enorme. Realmente, a legisla��o brasileira em rela��o � viol�ncia contra a mulher � extremamente avan�ada. No entanto, me parece que a ideologia patriarcal saiu ilesa at� agora".
Mem�ria
O evento organizado na ABI celebra os 48 anos do semin�rio sediado pela associa��o em 1975. A �poca ainda era de violenta repress�o pol�tica, e a organiza��o conseguiu reunir 600 pessoas para discutir o papel e o comportamento da mulher brasileira. Entre as organizadoras estava a feminista Mariska Ribeiro, lembrada como uma das respons�veis por trazer o apoio da Organiza��o das Na��es Unidas ao evento, considerado essencial para garantir sua realiza��o.
A diretora da ABI Mulheres e LGBTQIA+, Gl�ria Alvarez, conta que o semin�rio foi um pontap� inicial da segunda onda do feminismo no Brasil e marcou uma gera��o de militantes feministas que participaram das lutas que obtiveram a inclus�o da igualdade de g�nero na constitui��o de 1988. A proposta de discutir os ecos desse movimento est� tamb�m em discutir problemas contra a viol�ncia contra a mulher, que, na avalia��o dela, n�o diminuiu e tem como v�timas principalmente mulheres negras e jovens de baixa escolaridade.
Ousadia e coragem
Deputada federal constituinte e ju�za aposentada, Comba Marques Porto foi uma das mulheres que esteve presente no semin�rio em 1975. Ela considera que o evento foi um dos encontros mais importantes de sua vida, tendo provocado sua identifica��o com o movimento feminista.
"N�o s� mudou a minha vida, como acho que mudou a vida de muitas jovens daquela gera��o que v�nhamos da experi�ncia do ativismo de esquerda. E eu abracei o ativismo feminista. Me considero uma mulher de esquerda, mas foi na pr�tica feminista iniciada nessa casa hist�rica que me senti uma cidad� completa, uma cidad� mulher, com aquele enredo todo da vida de mulher", exalta ela. "Fomos ousadas, fomos corajosas, porque ainda est�vamos sob a �gide de um regime ditatorial".
Soci�loga ex-presidente do Conselho Nacional pelos Direitos da Mulher, Jaqueline Pitanguy tamb�m estava presente no semin�rio e acrescenta que a partir dele foi poss�vel aglutinar tens�es e esperan�as e qualificar a luta pela democracia. A partir do semin�rio, tamb�m foi criado o Centro da Mulher Brasileira, reconhecida como a primeira institui��o feminista do Brasil.
"Democracia, sim, mas tamb�m nas rela��es entre homens e mulheres. Foi muito ousado trazer a igualdade entre homens e mulheres como um elemento central da democracia. Isso respondeu a um anseio, e � por isso que essa casa estava cheia".