
Bras�lia – O Brasil tem uma das maiores cargas tribut�rias do mundo e um dos sistemas mais perversos e injustos de recolher impostos. Como se n�o bastasse cobrar demais pelo que n�o entrega, exige maior contribui��o justamente da parcela da popula��o que tem a menor renda e que mais precisa dos p�ssimos servi�os p�blicos oferecidos pelo governo com o dinheiro dos contribuintes. Em outras palavras, paga mais quem ganha menos. A classe m�dia tamb�m � penalizada, porque, al�m de ser fortemente taxada, gasta com servi�os privados de sa�de, educa��o e seguran�a para n�o depender de escolas de baix�ssima qualidade, hospitais prec�rios e um sistema de prote��o ineficaz e perigoso.
O Instituto Brasileiro de Planejamento Tribut�rio (IBPT) calcula que o brasileiro precisou trabalhar cinco meses em 2014 apenas para pagar impostos, o dobro do tempo que gastava na d�cada de 1970. Seguramente, os servi�os p�blicos n�o avan�aram nessa propor��o. Para o presidente do IBPT, Jo�o Eloi Olenike, o problema mais grave do modelo brasileiro de tributa��o � a concentra��o dos impostos sobre consumo e produ��o. “Cerca de 70% da arrecada��o � em cima de consumo, o que torna o sistema regressivo, ou seja, todos pagam a mesma coisa, mas a press�o sobre a renda dos pobres � maior”, diz.
O especialista destaca que, quando se prioriza o imposto do consumo, �s vezes as pessoas nem sabem que est�o pagando tributos. � o que ocorre com Wilson Teixeira dos Santos, de 46 anos, que n�o tem consci�ncia de quanto compromete de sua renda em impostos. Sem emprego fixo, ele faz bicos, como entregar frutas para lanchonetes, trabalho que garante uma renda mensal de apenas R$ 480. “Meus gastos s�o com comida, aluguel, luz e �gua, mas n�o fa�o ideia de quanto pago de imposto”, diz. Sem saber, ele paga 48,28% de tributos na conta de luz e 37,88% na de �gua.
Olenike, do IBPT, explica que os impostos sobre consumo t�m efeito cascata, porque os que incidem sobre a produ��o, como IPI, PIS e Cofins, acabam sendo repassados para o consumidor, inseridos no pre�o final dos produtos. “Al�m disso, a maior arrecada��o � do ICMS, que est� em todos produtos e servi�os”, observa. O especialista detalha que, na maioria dos pa�ses desenvolvidos, o sistema � progressivo, sobrecarregando as pessoas de alta renda. “No Brasil, 70% dos tributos s�o sobre consumo, 25% sobre renda e somente 5% sobre patrim�nio. Isso provoca uma distribui��o de renda ao contr�rio, que pune pobres e beneficia ricos”, avalia.
DISTOR��ES A tributarista e s�cia do escrit�rio Miguel Neto Advogados Val�ria Zotelli alerta para a perversidade do modelo brasileiro. Mesmo no caso do Imposto de Renda (IR), que � progressivo, h� graves distor��es. “Deveria haver mais al�quotas porque a classe m�dia, que ganha ligeiramente acima de R$ 4,6 mil, paga 27,5% de IR, o mesmo percentual de ricos que ganham R$ 1 milh�o. � preciso ampliar as faixas”, diz.
Valeria sustenta que certos produtos tamb�m deveriam ter diferencia��o, como rem�dios. “Os pobres pagarem a mesma coisa que ricos e at� classe m�dia � uma vergonha. O pa�s n�o leva em conta a capacidade contributiva”, diz. Medicamentos t�m uma carga tribut�ria de mais de 33%. Outro exemplo de como os pobres s�o mais penalizados � a tributa��o de bebidas alco�licas. A cacha�a � taxada em mais de 80%, quando a carga tribut�ria das outras bebidas varia de 59% a 61%, respectivamente (veja a cesta de impostos por classe social ao lado).
Para Anderson Cardoso, o problema mais grave � a falta de retorno para os contribuintes. “Os pobres s�o obrigados a aceitar servi�os p�blicos ruins. J� a classe m�dia precisa contratar servi�os privados, como escola particular, planos de sa�de e seguros”, lembra. O fisioterapeuta aposentado Vantuil Lima Alves, de 70, � um exemplo disso. Com tr�s filhos, Alves pagou escola particular para dois deles e o terceiro escolheu o Col�gio Militar. Tamb�m gasta com plano de sa�de e tem o carro e a casa segurados porque n�o confia na seguran�a p�blica. “O contribuinte trabalha metade do ano para pagar impostos e o retorno � muito ruim”, reclama.
Apesar de serem os maiores beneficiados pelo modelo brasileiro de tributa��o, os contribuintes de alta renda tamb�m n�o se sentem confort�veis. O economista e servidor p�blico Marco Aur�lio Pacheco de Brito, de 68, lamenta as distor��es tribut�rias do Brasil. “Hoje nossa carga � de quase 40% do PIB (Produto Interno Bruto). Existem pa�ses em que at� � mais alta, mas eles t�m resposta dos governos em termos de servi�os p�blicos. Isso n�o ocorre no Brasil, que deveria promover desonera��es para as classes mais desfavorecidas”, afirma.