
“Esses dois meses pareceram um ano. Fui deportado, apenas com a roupa do corpo, depois que assinei um documento me comprometendo a n�o retornar aos Estados Unidos pelo prazo de 10 anos sob possibilidade de ser condenado a 25 anos de cadeia”, conta o homem, morador da pacata Fernandes Tourinho, cidade do Vale do Rio Doce com cerca de 3 mil habitantes. Desde que retornou � terra natal, em 2012, ele n�o conseguiu emprego com boa remunera��o: “Ganho R$ 40 di�rios com os bicos que fa�o na ro�a”.
Edmar, por�m, sonha em retornar aos Estados Unidos, onde conseguiu ser dono da pr�pria empresa. “Comecei como empregado na �rea de jardinagem. Depois, consegui montar a minha. Desde que voltei n�o consegui bom emprego. O que a gente faz com R$ 40 (da di�ria que ele ganha com bico)? Est� tudo caro no supermercado e falta emprego no Brasil.”
Para se ter ideia, dados divulgados na quinta-feira pelo Minist�rio do Trabalho e Emprego (MTE) mostram que o pa�s perdeu 97,8 mil vagas formais em abril, o pior resultado para o m�s desde 1992 (63,1 mil postos fechados). Em Minas Gerais, foram encerradas 6,9 mil vagas, no pior resultado para o m�s desde 2003 (10 mil postos fechados).
Edmar planeja aguardar o prazo de 10 anos a que se comprometeu com o governo americano para tentar retornar � Am�rica, mas dessa vez de forma legalizada. � o mesmo que far� a cabeleireira Cl�udia Helena Machado, de 43, tamb�m moradora de Fernandes Tourinho. Ela morou em Framingh, de 1993 a 2005, e tentou retornar, via M�xico, em dezembro passado.
Ela foi detida pela pol�cia poucas horas depois de cruzar a fronteira. “Fiquei dois meses detida. Havia outras 80 mulheres na mesma situa��o. Uma delas tem uma hist�ria triste. Foi violentada (pelo coiote) e engravidou”, recorda Cl�udia, que hoje � dona de um sal�o de beleza na terra natal.
A clientela elogia seus servi�os, mas seu rendimento nos Estados Unidos era bem superior ao que Cl�udia consegue em Fernandes Tourinho. “Quando cheguei na Am�rica, trabalhei arrumando casas. Depois de quatro anos, montei uma empresa (que prestava o mesmo servi�o). Tirava, em m�dia, US$ 600 (R$ 1,8 mil) por semana. No Brasil, tem vez que n�o consigo isso nem por m�s”, compara. Ela n�o descarta retornar � terra do Tio Sam, desde que legalizada. Para isso, ter� que esperar a car�ncia exigida pelo governo americano para quem foi deportado.
QUALIDADE DE VIDA Em Governador Valadares, a 60 quil�metros de Fernandes Tourinho, mora Geisiany Euriques, de 29. Ela morou sete anos nos Estados Unidos e retornou, em 2011, na companhia do marido. Desde ent�o, n�o conseguiu emprego com carteira assinada. Nos pr�ximos meses, planeja a jovem, tentar� o visto para voltar � Am�rica.
“Quero retornar por causa do d�lar, mas, principalmente, em raz�o da boa educa��o p�blica, do sistema de sa�de que funciona, da qualidade de vida”, justifica a valadarense, cujo irm�o mora nos Estados Unidos h� 13 anos.
MIGRA��O E ELEI��O As idas e vindas de moradores do Vale do Rio Doce aos Estados Unidos s�o tema que n�o interessa apenas � economia da regi�o. De 2008 a 2011, quando muitos valadarenses retornaram da Am�rica por causa da crise mundial, os pol�ticos da cidade ficaram atentos. Havia a expectativa de que 300 mil valadarenses moravam na terra do Tio Sam e o retorno em massa poderia mudar a estrat�gia para as elei��es municipais de 2012. Isso porque a legisla��o eleitoral determina o segundo turno no pleito para prefeitos nos munic�pios com mais de 200 mil eleitores em que o candidato mais votado n�o alcance 50% da prefer�ncia do eleitorado. Em Valadares, o eleitorado ficou em torno de 197 mil pessoas.
Rede de ilegalidade
Embora muitos moradores do Vale do Rio Doce que ganharam a vida nos Estados Unidos e retornaram � terra natal em raz�o da crise econ�mica de 2008 desejem voltar � Am�rica de forma legalizada, ainda h� quem fomente a rede comandada pelos coiotes. Quem assume o risco de cruzar a fronteira na companhia deles, desembolsa pelo menos R$ 15 mil. Boa parte do valor � pago antecipado. “Paguei na �poca US$ 10,5 mil. Cruzar a fronteira pelo M�xico � o mesmo que ir ao inferno. O perigo � grande. Estava num grupo de 40 pessoas. Levamos duas semanas para conseguir entrar nos Estados Unidos”, conta um rapaz que mora em Fernandes Tourinho e prefere o anonimato. A reportagem solicitou � Pol�cia Federal de Governador Valadares uma entrevista a respeito da emiss�o de passaporte e do combate � rede de coites, mas a institui��o n�o confirmou a entrevista at� o fechamento dessa edi��o.