
Pressionados por aumento de combust�veis e baixo valor de remunera��o nas corridas, motoristas de aplicativos perdem renda, deixam a atividade ou tentam se equilibrar assumindo outras fun��es paralelamente. Esses fatores, somados aos custos de manuten��o e, em muitos casos, de aluguel ou financiamento de ve�culos, tornaram a atividade, que j� foi considerada a salva��o diante do desemprego de mais de 14 milh�es de brasileiros, invi�vel para muitos. Na outra ponta, usu�rios reclamam de constantes cancelamentos de corridas, do custo das tarifas e do aumento do tempo de espera, conforme relatam os pr�prios condutores.
Alta da gasolina na Grande BH foi de 27,01% de janeiro a julho, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE), enquanto o �ndice de Pre�os ao Consumidor Amplo, que mede a infla��o para fam�lias com renda de at� 40 sal�rios m�nimos, ficou em 4,61%. A renda est� achatada at� mesmo para quem roda com g�s natural. Segundo o IBGE, o g�s veicular encareceu 27,50% neste ano no Brasil (n�o h� pesquisa do item na Grande BH). Pressionados, alguns tiveram que devolver carros ainda n�o quitados �s institui��es financeiras e apelam para o aluguel, provocando uma retomada de f�lego nas locadoras, em movimento nas locadoras inverso ao verificado durante os picos da pandemia, quando faltou espa�o nos estacionamentos para guardar os ve�culos devolvidos e sem uso (leia mais abaixo).
S�o muitas as reclama��es por parte dos motoristas quanto aos valores pagos por corrida, mas o temor de retalia��o, como suspens�o ou cancelamento de cadastro, faz com prefiram o anonimato ao falar sobre condi��o de trabalho e remunera��o. Muitos assumem que rejeitam as corridas curtas por n�o compensar – o que tem provocado irrita��o nos usu�rios – e que a jornada � excessiva para conseguir fechar as contas no final do m�s. Outros admitem que tentam fidelizar clientes fora do ambiente de aplicativos, "atitude proibida pelas plataformas”.
Um motorista residente em Belo Horizonte, que prefere o anonimato, narra o drama que vem enfrentando, um retrato das queixas de outros condutores. Ele trabalhava em categoria b�sica desde 2016. Em 2019, subiu de categoria no aplicativo em busca de melhor tarifa. Hoje dirige carro pr�prio com capacidade de 55 litros de combust�vel no tanque. "Quando comecei a trabalhar, o �lcool era R$ 2,10 o litro, gastava R$ 115 para encher o tanque. Ontem (10/8) gastei R$ 241. Ficamos nas m�os do aplicativo, que argumenta que se subir pre�o perde passageiro, s� que est�o perdendo motoristas."
Segundo o condutor, no in�cio, o aplicativo pagava R$3,60 a corrida inicial e o quil�metro rodado sa�a a R$ 1,16, valor hoje reduzido para R$ 0,99. "Tenho carro pr�prio. Na �poca em que alugava, pagava R$1.300. Hoje, o carro b�sico hoje seria R$ 1.800", calcula.
Jornada prolongada
Dados da Associa��o Frente de Apoio Nacional ao Motorista Aut�nomo (Afanma) indicam que 30% dos condutores que circulam nessa modalidade na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte usam ve�culos financiados, e 20%, carros pr�prios j� quitados. Metade da frota � de propriedade de locadoras. "Aqueles que financiaram seus carros encontram-se em situa��o complicad�ssima. S�o muitos os que devolveram o ve�culo �s institui��es e perderam o que j� tinham pago", conta Paulo Xavier, de 54 anos, presidente da entidade.
A associa��o produziu planilhas baseada no dia a dia da categoria e mostra que quem rodava de 6 a 8horas por dia, hoje trabalha at� 15 horas para conseguir uma m�dia di�ria de R$ 70. "O custo geral do motorista com combust�vel, manuten��o, pe�as, documentos, impostos, multas e deprecia��o � alt�ssimo. Sem contar que os carros chegam a rodar at� 100 mil quil�metros em um ano."
O dirigente da entidade calcula que quem circula 200 quil�metros por dia, j� sai de casa devendo R$ 100 de combust�vel e outros R$ 70 de di�ria (no caso dos alugados). "Se faturar R$ 200, ter� no final do dia R$ 30 livres, o que d� menos que um sal�rio m�nimo por m�s. Sem contar que a tarifa, que nunca foi reajustada nos sete anos de entrada de operadoras aqui, agora est� menor."
Perdas
Veron Guilherme, de 49,, n�o conseguiu garantir o pagamento em dia das presta��es do financiamento e devolveu o carro � financeira. "Eu tinha um carro 2008, que pelo ano de fabrica��o estava impedido de rodar no aplicativo. Comprei um 2018, com presta��es mensais de R$1.175, dando o antigo, calculado em R$ 12 mil, de entrada". Mas n�o deu certo. Ele chegou a pagar 18 presta��es, mas as contas n�o fechavam mais. "N�o tive alternativa, precisava priorizar a sobreviv�ncia e a sa�da foi devolver o ve�culo".
A�ougueiro, Veron faz trabalhos eventuais em estabelecimentos de Contagem, onde mora. "As operadoras n�o se preocupam com motoristas, mas com o mercado e o lado do usu�rio. A taxa cobrada poderia ter valor mais justo nas corridas. O carro dava oito quil�metros por litro, com pre�o de gasolina a R$ 6, tinha dia que recebia R$ 1,20 por corrida."
Morador de uma cidade da Grande BH, pai de dois filhos, outro motorista fala das dificuldades, mas teme revelar sua identidade. "A situa��o est� muito dif�cil e se me suspenderem n�o saberia mais o que fazer." Entre as dificuldades, cita a tens�o no tr�nsito para atingir um faturamento suficiente para arcar com as despesas. S�o de 10 a 12 horas, todos os dias da semana, para uma receita em torno de R$ 4 mil no fim do m�s. "� preciso cabe�a fresca para lidar com situa��es diversas. Ficamos muito vulner�veis. �s vezes, passageiro n�o aparece e n�o recebemos a taxa de retorno. H� um excesso de regras. Tem momentos em que preciso fazer tr�s corridas para compensar uma perdida. Em corridas de sete quil�metros recebemos R$ 1."
Ele conta que tomou suspens�o de 12 horas porque uma passageira n�o apareceu. Era corrida compartilhada. O aplicativo informou que n�o tinha como cancelar porque j� havia anunciado embarque. "S�o situa��es em que, se a pessoa n�o precisar muito, acaba abandonando. Tem sido comum ouvir de passageiros sobre outros cancelamentos, que esperaram at� tr�s chamadas. A cada tr�s passageiros que embarcam no meu carro, um relata cancelamento."
O motorista afirma que n�o h� apoio por parte da operadora do aplicativo. Ao contr�rio. "No fim do ano passado, em pleno pico da pandemia, a atitude foi aumentar a tarifa cobrada dos motoristas, enquanto as despesas aumentavam”, relata. Segundo ele, a taxa imposta chega a at� 35% do valor da corrida. “Fica muito puxado. Aperta o nosso or�amento. Nos obriga a fazer sele��o de corrida, uma autonomia de deslocamento menor".
Em situa��es como perda de corrida, cancelamentos ou pessoas que n�o aparecem, fica dif�cil explicar � operadora, sustenta. "Parece que s� tem rob�s no atendimento." Ele acredita que as pessoas que entraram no in�cio do sistema chegaram a ganhar dinheiro consider�vel, mas "s�o os que est�o abandonando neste momento”.

Sele��o de hor�rio
Jullianny B�rbara, resolveu assumir a dire��o de um ve�culo de aplicativo ao ficar desempregada no ano passado. "Foi bom, consegui pagar as contas. Mas neste ano, com o fechamento da cidade, acabei parando por dois meses e os boletos voltaram a se acumular. A� voltei, com a flexibiliza��o gradativa de abertura de BH."
Por ter outra fonte, gerenciando redes sociais, ela n�o trabalha o dia todo com as corridas, buscando equilibrar as horas destinadas a cada atividade para n�o ficar no preju�zo. "O aplicativo tem muitas vari�veis que pegam, mas, querendo ou n�o, ainda d� uma flexibilidade de hor�rio. Mas tenho consci�ncia que preciso rodar em hor�rios espec�ficos, como os de pico, para fazer mais dinheiro. N�o fico o dia todo. Saio de manh� e fa�o at� pouco ap�s o almo�o. Ou saio depois do almo�o, at� umas 22h, que � meu limite.” O carro de B�rbara � alugado e � pago semanalmente. Isso faz com que as constantes altas dos combust�veis pesem.
Para plataformas, hora � de ganhos
