
A informalidade na cadeia produtiva do pequi foi objeto de estudo da bi�loga Sarah Alves de Melo Teixeira. Ao concluir o doutorado em ecologia, conserva��o e manejo da vida silvestre na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), ela elaborou a tese “Ecologia pol�tica e econ�mica do extrativismo do pequi (Caryocar brasiliense): bases para seu manejo sustent�vel em Minas Gerais”. Ao analisar dados da economia associada � ecologia, a pesquisadora concluiu que os registros dos Produtos Florestais N�o Madeireiros (PFNM) relativos ao pequi n�o refletem a realidade, o que significa preju�zo � valoriza��o do fruto e ao pr�prio cerrado.
A produ��o submestimada, de acordo com Sarah Teixeira, � um dos principais motivos que tornam invis�vel a economia dessas cadeias produtivas, principalmente para os gestores e quem toma as decis�es que interferem nesses mercados. “Essa invisibilidade econ�mica � um dos motivos pelos quais o cerrado se tornou o bioma mais desmatado do Brasil, apesar de ser uma das regi�es de maior sociobiodiversidade do mundo e o ber�o dos maiores rios do Brasil, por isso o cerrado � chamado de caixa d’�gua do Brasil”, explica.
Segundo maior bioma do Brasil, o cerrado perdeu 26,5 milh�es de hectares, equivalentes a 19,8% de sua �rea nativa, entre 1985 e 2020. A extens�o degradada � superior � do estado do Piau�, de acordo com levantamento feito pelo MapBiomas, projeto de mapeamento anual do uso e cobertura da terra no pa�s, que re�ne especialistas em rede colaborativa.
O pa�s tem uma grande e infeliz car�ncia da dados sobre toda a cadeia dos frutos nativos do cerrado. Segundo Sarah Teixeira, sabe-se que Minas lidera a produ��o de pequi, atributo que j� daria vantagem ao estado na guerra travada com Goi�s e Tocantins pelos feitos da �rvore. O pequi da esp�cie Caryocar brasiliense ocorre em toda a regi�o do cerrado no Brasil. A pesquisa “Produ��o da extra��o vegetal e da silvicultura”, do Instituto Brasileira de Geografia e Estat�stica (IBGE), aponta que, desde 2013, Minas det�m essa lideran�a. Em 2019, dos munic�pios que produziam e comercializavam o pequi, o estado detinha 115.
“Somente em minha pesquisa identifiquei mais de 175 munic�pios de Minas que apresentam a cultura do extrativismo e da comercializa��o do pequi. E reconhe�o que esses dados ainda est�o subestimados”, pontua a pesquisadora. Informa��es do escrit�rio de Montes Claros, no Norte do estado, da Empresa de Assist�ncia T�cnica e Extens�o Rural de Minas Gerais (Emater-MG) indicam grande influ�ncia da economia baseada no fruto para as comunidades de regi�o historicamente castigada pela seca. A safra do pequi 2020/2021 est� estimada em 90 mil toneladas, envolvendo 12 mil fam�lias, informa Sarah Teixeira.
A doutora em ecologia lembra, ainda, que a cidade de Japonvar, visitada pelo Estado de Minas, � exemplo da for�a do pequi em Minas. “Em Japonvar, a �ltima safra do pequi movimentou cerca de R$ 6 milh�es na economia local, n�meros muito expressivos para um munic�pio de apenas 8 mil habitantes”, avalia. Contudo, Sarah Teixeira lembra que praticamente nenhum munic�pio faz o registro da produ��o e comercializa��o do pequi, o que pode levar a grande perda tendo em vista que muitos caminh�es saem das cidades carregados com o fruto e as respectivas prefeituras nem sequer sabem a quantidade extra�da.
“Praticamente, nenhuma nota fiscal � emitida. No �mbito dos munic�pios, os prefeitos precisam se planejar para uma melhor organiza��o das safras do pequi e de outros frutos nativos tamb�m”, defende. Outra recomenda��o � para que os gestores municipais atuem no sentido de que os catadores de pequi e outros agroextrativistas tenham acesso � Pol�tica de Garantia de Pre�os M�nimos (PGPMB-BIO), da Uni�o, e emitam nota fiscal, sendo inclu�dos no cadastro da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Ainda no �mbito federal, a pesquisadora defende que o governo crie e fortale�a pol�ticas p�blicas voltadas para a estrutura��o das cadeias produtivas, elevando a renda das comunidades por meio de a��es como as do Programa Nacional de Alimenta��o Escolar (PNAE) e do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Na esfera estadual, devem ser incrementadas medidas previstas no Programa Pr�-Pequi e o Fundo Pr�-Pequi, e o desenvolvimento sustent�vel das cadeias produtivas dos frutos do cerrado.
Processamento Cerca de 90% dos comerciantes de pequi s�o agricultores familiares. Al�m de constituir pr�tica cultural, muitas vezes a atividade equilibra a renda das fam�lias que dela dependem, principalmente no Norte de Minas, onde a seca tem causado grande perda � colheita. De acordo com a pesquisadora Sarah Teixeira, o apoio de institui��es de pesquisa ao processamento do pequi contribuiu para elevar a renda das comunidades e estruturar a cadeia produtiva do fruto s�mbolo do cerrado.
“Al�m da polpa em conserva ou congelada, do �leo e licor, que j� s�o tradicionalmente produzidos pelas comunidades, outros derivados tamb�m est�o ganhando mercado, como, por exemplo, pastas, cremes, molhos, sorvetes e castanha. Agora, temos o azeite do pequi, que � extra�do de um processo prensado a frio que garante maior qualidade e sabor ao produto e tamb�m tem se destacado como nutrac�utico (esp�cie de suplemento alimentar) para atletas”, afirma a pesquisadora.
Terap�utico

ENGRENAGEM
175
� o n�mero de munic�pios produtores no estado
90 mil
toneladas
Safra estimada em 2021
12 mil
Universo de fam�lias envolvidas na coleta do fruto e produ��o de derivados

Da safra nada se perde
As associa��es comunit�rias de localidades que trabalham com o extrativismo do pequi no Norte de Minas decidiram se reunir para buscar mais efici�ncia no aproveitamento e comercializa��o do pequi. Foi criado o N�cleo do Pequi, uma rede formada por 18 associa��es e co- operativas agroextrativistas, que contam com institui��es de apoio. A iniciativa visa � gest�o da cadeia produtiva do pequi e de outros frutos do cerrado, focada no est�mulo � comercializa��o, articula��o e proposi��o de pol�ticas p�blicas, de modo a contribuir para o desenvolvimento sustent�vel em sua �rea de atua��o.
A rede foi constitu�da por meio do Plano Nacional da Sociobiodiversidade, do governo federal, que promoveu a oficina de planejamento participativo da cadeia produtiva do pequi no Norte de Minas Gerais. Uma das entidades integrantes do N�cleo do Pequi � a Cooperativa Grande Sert�o, sediada em Montes Claros, que conta com 270 cooperados e envolve cerca de 1.200 fam�lias de pequenos agricultores da regi�o. Neste ano, a cooperativa beneficiou cerca de 157 toneladas de pequi, produzindo e comercializando �leo e pequi congelados e polpa do fruto congelada e embalada a v�cuo.
O presidente da Grande Sert�o, Wagner Pereira Santos, destaca que a entidade atua na organiza��o da cadeia produtiva do pequi na regi�o. “Contribuimos diretamente com a assessoria t�cnica das fam�lias extrativistas visando �s melhores pr�ticas e manejo sustent�vel para a produ��o dos derivados do pequi. Temos como foco a gera��o de oportunidade de trabalho e renda para essas fam�lias envolvidas com a venda dos produtos para os diferentes canais de comercializa��o acessados pela cooperativa”, afirma Santos. Entre as principais �reas de atua��o da cooperativa est� o esfor�o de garantir o aproveitamento de maior volume de frutos na �poca da safra e a realiza��o dos processos de beneficiamento, estocagem e comercializa��o fora do per�odo da temporada. (LR)
Reconhecimento
Minas � o �nico estado que tem uma lei de incentivo � cadeia produtiva do pequi e outros frutos do cerrado (Lei 13.965, de 27 de julho de 2001), que cria o programa mineiro de incentivo ao cultivo, � extra��o, ao consumo, � comercializa��o e � transforma��o do pequi e demais frutos e produtos nativos do cerrado, o Pr�-Pequi.