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Estado de Minas ECONOMIA E ELEI��ES

� Bolsonaro quem deve explicar o que vai fazer depois de destruir o teto, diz economista Elena Landau

"Todo mundo cobrou [dos candidatos] qual vai ser a pol�tica fiscal, o ajuste fiscal. Mas ningu�m cobra isso de Guedes e do Bolsonaro -que destru�ram o teto"


16/10/2022 05:15 - atualizado 16/10/2022 08:56

Economista Elena Landau
Economista Elena Landau (foto: Flickr/Simone Tebet)
A economista e advogada Elena Landau mergulhou na campanha da candidata � Presid�ncia Simone Tebet (MDB) como coordenadora do programa econ�mico. Com a derrota no primeiro turno, esperou a sinaliza��o da emedebista para anunciar que agora votar� contra Jair Bolsonaro (PL). Falou assim, sem citar que isso significa votar em Luiz In�cio Lula da Silva (PT).

Elena conta que n�o foi uma decis�o pol�tica dif�cil, pois j� vinha defendendo o impeachment do presidente. "Aquela famosa reuni�o, gravada em 2020, � o suficiente. Falavam em mil�cia armada, em puni��o a prefeitos por causa de isolamento social, em passar a boiada na �rea ambiental. Mas as pessoas esquecem."

Agora, afirma ela, est�o esquecendo que Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, devem explica��es sobre a pol�tica fiscal.

"Todo mundo -mercado, jornalista, empres�rio- cobrou do Lula, da Simone, do Ciro Gomes, da Soraya Thronicke qual vai ser a �ncora fiscal, como fica a pol�tica fiscal, como fazer o ajuste fiscal. Mas ningu�m cobra isso de Guedes e do Bolsonaro -que destru�ram o teto."

No entanto, Elena admite que pessoalmente fica mexida em ter votar no PT. "Sofri muito na m�o da milit�ncia petista. Fui indevidamente atacada durante o processo de privatiza��o."

*

PERGUNTA - A sra. sempre se apresentou como uma economista liberal. No passado, ser liberal era ter preocupa��o com as contas p�blicas. Mas, na campanha, suas prioridades, e a de outros liberais, foram as agendas social e ambiental. Por que essa mudan�a?

ELENA LANDAU - � fato que n�o existe liberalismo sem uma agenda de mercado, mas o liberal n�o se preocupa apenas com a economia, defende tamb�m democracia e inclus�o social.

Tanto � assim que, l� atr�s, com FHC, t�nhamos privatiza��es, ajuste fiscal e reforma do Estado, mas tamb�m t�nhamos investimento em educa��o, t�nhamos pol�tica social, com vale-g�s e outras iniciativas.

� por isso que n�o d� para chamar de liberal um governo que defende a tortura. Quando Bolsonaro se coloca como um defensor de um Carlos Brilhante Ustra, a palavra liberal n�o lhe cabe.

A gente n�o mudou. A percep��o da sociedade � que mudou diante do que chamo de liberalismo sem alma da gest�o de Paulo Guedes.

 

P. - A sra. e Guedes tiveram uma discord�ncia p�blica, em que ele diz t�-la reprovado, quando foi seu professor, o que a sra. nega, por ter conclu�do o mestrado. De onde vem essa desaven�a de voc�s?

EL - Ele mentiu [sobre ter me reprovado]. Desde que ele foi meu professor no mestrado da PUC, em 1980, faltou na maioria das aulas. Foi p�ssimo professor. Eu coordenei um movimento para afast�-lo do curso de matem�tica.

 

P. - E qual o seu balan�o da agenda liberal de Guedes no governo?

EL - � muito ruim. Pelo lado da agenda social, n�o existe oportunidade de aumento da produtividade e de crescimento econ�mico sem uma agenda para a educa��o. O Guedes nem olhou para isso.

A gente esperava um aperfei�oamento do Bolsa Fam�lia, mas o que ele fez [com o Aux�lio Brasil] durante a campanha foi uma proposta eleitoreira, que desmanchou o programa social. N�o tem focaliza��o, ningu�m sabe se as crian�as foram vacinadas, se frequentam a escola, nem quantos filhos a fam�lia tem, qual o uso desse dinheiro.

Agora, vamos para a agenda econ�mica pura.

N�o tivemos inclus�o nas cadeias globais de produ��o, abertura comercial ou redu��o do protecionismo. Se quisessem uma integra��o internacional, n�o iam conseguir, por causa da quest�o ambiental. O pouco que se conseguiu fazer dentro do Mercosul foi uma redu��o m�nima na tarifa externa comum.

Renovaram a desonera��o industrial de forma discricion�ria, algo nada liberal. A reforma tribut�ria at� ficou pronta, mas o Guedes atrapalhou com a quest�o da CPMF. O pa�s estava maduro para discutir uma reforma do IR [Imposto de Renda] que melhorasse a progressividade, mas n�o veio tamb�m.

A privatiza��o foi um fiasco. S� fizeram a da Eletrobras, e muito malfeita. Ela foi entregue para o Congresso. O resultado destruiu o planejamento no setor el�trico. O Salim Mattar saiu da Secretaria de Desestatiza��o, criada por Guedes, sem entregar nada.

OK, tivemos alguns marcos de regula��o, como o de ferrovias, e uma lei de liberdade econ�mica com algumas coisas boas, por�m muito fraca. O marco de saneamento veio porque estava bem avan�ado nas m�os de Tasso [Jereissati, senador que foi relator do texto], e a reforma da Previd�ncia saiu por causa do Rodrigo Maia [na �poca da vota��o, presidente da C�mara].

 

P. - Ent�o eu pergunto: que agenda liberal foi essa?

EL - Para completar, de um ano e meio para c�, veio uma agenda populista. Se um marciano chega ao Brasil agora, n�o vai saber se a gest�o est� com Dilma ou Bolsonaro, com Guido Mantega ou Paulo Guedes.

Dentro disso tudo, a melhor agenda foi a do BNDES. Atua como banco de servi�os, de investimentos, sem subs�dios.

 

P. - Mas e os resultados fiscais? Os economistas apontam melhora, e o pr�prio Guedes fala de como arrumou a casa.

EL - Foi tudo tempor�rio. Voc� vai segurar aumento de servidor para sempre? Voc� pode comemorar que teve melhoria das contas p�blicas � custa do aumento da infla��o, que pega principalmente a popula��o de baixa renda? Vai comemorar a transfer�ncia de renda que estamos vendo? Vai continuar baixando pre�o do combust�vel na marra? N�s que vivemos o imposto inflacion�rio nos anos 1980 ainda lembramos como era bom [a infla��o para as contas p�blicas]. Mas � gol de m�o.

Nada disso � sustent�vel.

 

P. - E como fica a heran�a do Guedes para o ano que vem? De onde vai sair o aumento do Aux�lio Brasil que eles inventaram?

EL - A lei or�ament�ria � escandalosa. Todo mundo sabe que esse Or�amento n�o para de p� e vai ser revisto. Tem um rombo dentro da promessa de campanha do pr�prio Bolsonaro.

Essa � uma coisa interessante. Todo mundo -mercado, jornalista, empres�rio- cobra do Lula, da Simone, do Ciro Gomes, da Soraya Thronicke qual vai ser a �ncora fiscal, como fica a pol�tica fiscal, como fazer o ajuste fiscal, mas ningu�m cobra isso de Guedes e do Bolsonaro -e foram eles que destru�ram o teto.

Vamos l�. N�o foi a esquerda nem o centro democr�tico que destru�ram o teto, foi a direita. Quem est� deixando a heran�a de d�ficit prim�rio para o ano que vem n�o � a esquerda, � a direita. � o Paulo Guedes, � o Bolsonaro.

Quero ver � o que o Guedes vai fazer para resolver esse fiscal se Bolsonaro -que Deus nos livre- ganhar a elei��o. Mas ningu�m cobra isso do Bolsonaro. Ele � candidato, precisa se explicar.

 

P. - Sua primeira rea��o ap�s Tebet apoiar Lula foi dizer que votaria contra Bolsonaro. S� depois abriu o voto em Lula. Por que � t�o dif�cil votar no PT?

EL - Eu fui petista. Usei a estrelinha vermelha do PT como alfinete de fralda do meu filho. Eu tinha p�ster do Lula no meu quarto no in�cio dos anos 1980. Comecei a me afastar do PT quando vi a falta de concilia��o entre pol�tica fiscal e seus objetivos. Quando conheci o Mario Covas, veio uma luz sobre como eu queria fazer as coisas. Tem que ter pol�tica fiscal respons�vel para manter uma agenda social. Para mim, � isso.

A minha dificuldade � de cunho absolutamente personalista. Sofri muito na m�o da milit�ncia petista. Fui indevidamente atacada durante o processo de privatiza��o. Mas, para abrir meu voto, eu tamb�m tive de esperar as negocia��es da Simone.

Agora, o que me preocupa de verdade � o pa�s dar um segundo mandado para um presidente que deveria ter sofrido impeachment desde 2020. Eu defendo isso desde l�.

 

P. - Por qu�?

EL - Bolsonaro cometeu in�meros crimes de responsabilidade. O que foi a gest�o dele na pandemia? Aquela famosa reuni�o, gravada em 2020, � o suficiente. Basta prestar aten��o no que foi dito ali. Falavam em mil�cia armada, em puni��o a prefeitos por causa de isolamento social, em passar a boiada na �rea ambiental. Mas as pessoas esquecem. A elei��o de Eduardo Pazuello [ex-ministro da Sa�de, questionado pela lentid�o na compra de vacinas] est� a� para mostrar isso.

 

P. - A sra. foi coordenadora econ�mica de uma campanha presidencial de uma candidata, que tamb�m teve uma vice mulher. Uma chapa puro-sangue. Como lhe pareceu o ambiente da pol�tica para as mulheres na campanha?

EL - Essa pergunta � muito dif�cil para mim. Participo da pol�tica, atrav�s do Tasso, desde 1991, de uma forma indireta. Eu j� era minoria entre homens. A minha experi�ncia pessoal � muito diferente da experi�ncia que a Simone relata.

O que vi na campanha foi uma press�o absurda para ela desistir da candidatura. N�o sei se um homem teria tanta determina��o para avan�ar como ela fez.

 

P. - O engra�ado � que eu n�o tinha encontrado pessoalmente com a Simone at� ent�o. Tinha a visto tr�s outras vezes. O nome dela sempre era levantado como vice. Nessas duas, eu lembro que disse: "Se gostam tanto dela, por que n�o pode ser cabe�a de chapa?".

EL - Quando ela me convidou, foi direta. Mandou uma mensagem de WhatsApp perguntando se eu podia falar, e j� ligou: "Eu quero uma porta-voz feminina na minha campanha, feito a sua, liberal, com olhar social, que tenha capacidade de comunicar o que � a economia". Tinha esse combo.

 

P. - Teve aquele momento em que, durante o lan�amento do nome da vice, a Mara Gabrilli, foi um festival de frases machistas dita por seus antigos colegas de PSDB. Aquilo a incomodou?

EL - A� voc� precisa descontar. Alguns falam besteiras sobre mulheres desde sempre. Mas o Tasso e eu temos uma rela��o de confian�a na pol�tica h� 31 anos. Tem proximidade e brincadeira. Quando ele fala que eu sou rebelde, na cabe�a dele, � um elogio, porque estou sempre inquieta, levantando o debate. O que ficou ruim foi ele dizer depois "que a gente d� um jeito", porque ele sabe que n�o tem isso de me controlar.

� �bvio que pesa o fato de a gente ser de outra gera��o, e ter levado como piadinha certos coment�rios que hoje s�o inaceit�veis. O que eu achava engra�ado l� atr�s, que entrava por um ouvido e sa�a pelo outro, a gera��o atual n�o permite.

Posso dizer que tive um aprendizado em rela��o a isso. Se voc� me perguntasse h� dez anos se eu sofria alguma discrimina��o, eu diria peremptoriamente que nenhuma. Eu n�o comemorava o Dia Internacional da Mulher. N�o queria ser destaque por ser mulher. Achava que a gente tinha apenas que ser tratada igual aos homens.

Mas depois, com o tempo passando, eu fui percebendo que certas diferen�as de tratamento n�o faziam sentido como supunha.

Uma vez, depois de uma longa reuni�o, foi todo mundo jantar. Era s� eu de mulher. Na hora de anotar as bebidas, iam pedindo u�sque, e o gar�om me pulou. Reclamei: "E eu?"Todo mundo me olhou com cara de espanto. Ficou claro que n�o entendiam como eu tinha coragem de beber u�sque no meio de dez homens. Um pol�tico, n�o vou dizer o nome, ainda perguntou: "Mas voc� bebe u�sque?".

Hoje entendo que a minha trajet�ria tem um significado, e quem consegue furar a bolha precisa se manifestar. Precisamos discutir, sim, paridade de g�nero, inclus�o, as diferen�as salariais e educacionais. Minha cabe�a mudou muito.

Hoje, eu diria que sou feminista -uso essa palavra que n�o sairia da minha boca no passado.


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