
S� de se lembrar da menina, nascida h� 10 dias, os seios de Marcela se entumecem de leite. Ela fala da filha enquanto ajeita as roupinhas de beb� dispostas sobre uma colcha felpuda cor-de-rosa. Cheiram a talco e est�o incrivelmente limpas, em meio � imund�cie de um dos pontos de consumo de crack localizado h� anos atr�s da rodovi�ria de BH. “Vou visitar minha filha no hospital, mas n�o vou poder amamentar, porque usei crack hoje. Estava nervosa por n�o ter dinheiro para pagar o enxoval dela”, desabafa a m�e, que sonha em entregar o nen�m aos cuidados da sogra. O pai tamb�m � dependente de crack. A av� materna cuida dos tr�s filhos que Marcela deixou no Rio de Janeiro.
Na camisa que ela usava ontem, podia-se ler: “Drogas: este problema � nosso – abrace essa causa”. Apesar de apelos como esse, a reuni�o no Conselho Municipal dos Direitos da Crian�a e do Adolescente (CMDCA) ontem terminou em impasse em rela��o ao exame das Recomenda��es 05 e 06 da Promotoria de Justi�a da Inf�ncia e da Juventude de BH, que determinam a comunica��o imediata ao MP e ao Juizado sobre o nascimento de beb�s filhos de m�es com hist�rico de uso de crack.
“H� um impasse pelo fato de a retirada dos beb�s das m�es ser compuls�ria”, analisa a presidente do CMDCA, M�rcia Alves. Os conselheiros decidiram pedir mais tempo para aprofundar o estudo do tema e retomar a vota��o em reuni�o extraordin�ria, j� marcada para o pr�ximo dia 18. “Precisamos nos dedicar a essa quest�o com mais afinco. Quem sabe n�o � esta a oportunidade para todo mundo olhar para a crian�a como ser �nico, que precisa de prote��o, em vez de ficar cuidando da sua pr�pria caixinha? Essa mobiliza��o pode trazer bons frutos”, avalia.
Em of�cio encaminhado em outubro � Prefeitura de Belo Horizonte, as promotoras Matilde Fazendeiro Patente e Maria de Lurdes Santa Gema alertaram sobre o repasse de recursos do Minist�rio da Sa�de destinados � implanta��o de um projeto para o acolhimento institucional de m�es sob tratamento, na companhia de seus beb�s, a exemplo do que j� existe em outros estados. O projeto teria esbarrado, por�m, no artigo 19 do Estatuto da Crian�a e do Adolescente (ECA), que garante o “direito � crian�a de ser criada e educada em ambiente livre da presen�a de pessoas dependentes de subst�ncias entorpecentes”.

REGRA E EXCE��O Diante da posi��o do MP – de que a falta de pol�ticas p�blicas para oferecer tratamentos �s gestantes traz risco � vida de m�es e filhos, justificando o abrigamento –, a Secretaria Municipal de Sa�de sustenta que o encaminhamento de beb�s aos abrigos deve ser exce��o, depois de esgotadas todas as possibilidades de aten��o � fam�lia. Acrescenta ainda que a Procuradoria-Geral do Munic�pio estuda a melhor forma de intervir na quest�o.
Ao se manifestar sobre o assunto, a secretaria usa duas linhas para analisar a situa��o. Em primeiro lugar, sustenta que cada caso deve ser analisado de forma individual. “N�o deve haver generaliza��o da conduta a ser admitida na assist�ncia �s gestantes”, diz o texto. Por outro lado, a pasta acrescenta que o v�nculo entre os profissionais de sa�de e as pacientes deve ser fortalecido. “Dessa forma, os profissionais de sa�de devem privilegiar a assist�ncia em detrimento da dela��o, uma vez que (esse quadro) culmina pelo afastamento do usu�rio da rede”, diz a nota, referindo-se � obriga��o de o profissional notificar o MP sobre o nascimento de filhos de dependentes qu�micas.
Para a coordenadora da Comiss�o Perinatal da Secretaria Municipal de Sa�de, S�nia Lansky, esse cen�rio pode representar o afastamento das gestantes das maternidades, usando subterf�gios para terem seus beb�s ou at� mesmo indo para outros estados. “Tem gente pensando em entrar com habeas corpus preventivo para essas mulheres poderem ganhar seus beb�s sossegadas na maternidade”, afirma ela. S�nia diz ainda que a situa��o chamou a aten��o da Secretaria de Direitos Humanos da Presid�ncia da Rep�blica, que deve mandar representantes a Belo Horizonte amanh� para reuni�o sobre o assunto. A reportagem tentou contato com a secretaria em Bras�lia, mas n�o obteve retorno.