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Estado de Minas AMOR COMPARTILHADO

Cresce o n�mero de pedidos de guarda dos filhos pelos pais na Justi�a

Nova lei estimula homens a lutarem pela guarda e for�a o Judici�rio a reavaliar capacidade paterna e a quebrar o tradicional paradigma de que apenas a m�e sabe cuidar dos filhos


postado em 18/01/2015 07:00 / atualizado em 18/01/2015 07:48

Alexandre César de Souza Rosa, que convive com a filha, Luana, de 9 anos, sem disputa judicial com a mãe dela, Cynara Jácome(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
Alexandre C�sar de Souza Rosa, que convive com a filha, Luana, de 9 anos, sem disputa judicial com a m�e dela, Cynara J�come (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)

Faz tr�s meses que o seguran�a particular Alessandro Malaquias, de 37 anos, n�o tem not�cias do filho Felipe, de 8. N�o sabe onde o menino mora, se est� bem, se foi aprovado na escola. Se o garoto sente sua falta, ele tamb�m desconhece. Isso porque a ex-companheira, com quem teve um relacionamento por 12 anos, desapareceu com a crian�a sem deixar pistas. Eles se separaram h� um ano. Um m�s depois, foi impedido de v�-lo. Com muita insist�ncia, voltou a encontr�-lo, e o caminho para regularizar a situa��o, do pagamento de pens�o aliment�cia aos dias em que poderia estar com Felipe, foi a Justi�a. Diante de advogados, juiz e promotores, foi dado ao pai passe livre para se aproximar quando quisesse. Entre altos e baixos, ele conseguiu  visitar o filho com certa regularidade. O �ltimo contato foi antes do feriado do Dia das Crian�as, em outubro, quando a dona de casa de 47 anos disse que viajaria com a crian�a e n�o voltou. “Ela quis me afetar usando meu filho”, lembra.

Hist�rias como a de Alessandro engrossam o n�mero de a��es no F�rum Lafayette, em Belo Horizonte, depois da edi��o da Lei 13.058, no fim do ano passado, que determina a guarda compartilhada. S�o pais esperan�osos de rever os filhos e participar ativamente da vida deles. O modelo estava em vigor desde 2008, mas antes era aplicado apenas em casos de rela��es n�o conflituosas.

Embora fixada como obriga��o, a nova lei, a exemplo da anterior, credita aos ju�zes o arb�trio de conceder ou n�o a guarda. Na pr�tica, segundo juristas e especialistas do direito, muda o olhar do Judici�rio, que deve considerar essa rela��o, e dos pr�prios pais, que se veem encorajados a buscar o direito de conviver com os filhos.

Titular da 12ª Vara de Fam�lia e desembargadora convocada da 6ª C�mara C�vel, �ngela de Lourdes Rodrigues diz que n�o � poss�vel estimar quantos processos envolvem pedido de guarda compartilhada, mas garante que o n�mero aumentou. “Quando surge uma lei, as pessoas acham que o direito � imediato e, por isso, a demanda cresce. Mas temos que analisar caso a caso, para decidir pelo bem-estar e o melhor interesse da crian�a”, afirma. “Nas varas de Fam�lia, as audi�ncias priorizam as oitivas dos pais e dos filhos na tentativa de resolver a situa��o amigavelmente. A decis�o s� � transferida para o juiz quando as partes n�o d�o conta de encontrar em conjunto a solu��o do conflito.”


Pais como Alessandro Malaquias recorrem � Justi�a em busca dessa conviv�ncia: “Tive de contratar advogada para rever meu filho, que far� 9 anos em abril. Detesto brigas, mas por ele sou capaz de tudo nos meios legais. Quando soube que ele estava em outra escola e outra cidade, perdi a cabe�a. E se soubesse onde, pegava meu carro para ir atr�s”. O seguran�a teme que Felipe esteja sendo mal cuidado, como nas v�rias vezes em que o encontrou com unhas grandes e sujas e cabelo despenteado.

"Detesto brigas e discuss�es, mas por ele, sou capaz de tudo nos meios legais" - Alessandro Malaquias, que busca a guarda do filho, Felipe, de oito anos (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)


Uma de suas principais testemunhas � o antigo marido da ex-companheira, com quem ela viveu por 20 anos e tem um filho de 19 anos e outro de 14. Ele tamb�m vai entrar na Justi�a para requerer a guarda do ca�ula, levado nas mesmas circunst�ncias que Felipe. A reportagem entrou em contato com a mulher duas vezes por telefone. Na primeira, ela alegou que estava fora de Minas e n�o poderia falar. Na segunda n�o atendeu.

BOM EXEMPLO Na contram�o de embates judiciais, o engenheiro Alexandre C�sar de Souza Rosa, de 46, conseguiu resolver com a ex-mulher, a artista pl�stica Cynara J�come, de 42, a guarda compartilhada da filha Luana, de 9. A menina tem duas casas: a do pai e a da m�e. Para facilitar, inclusive o acesso � escola, os dois resolveram morar perto um do outro. Ela no Bairro Santa In�s e ele no Sagrada Fam�lia, ambos na Regi�o Leste de BH. �s segundas e quartas-feiras, Luana fica com a m�e, e �s ter�as e quintas, com o pai. Os fins de semana, incluindo as sextas, s�o alternados. “Preferimos definir para programar o restante das atividades e, nos dias em que estou com ela, dou aten��o integral”, conta Alexandre.


Antes, Cynara tinha a chave da casa dele para ter livre acesso � menina e, agora, embora ela seja casada e tenha outro filho, � Alexandre quem tem a da dela, para facilitar no momento de buscar e entregar a crian�a. “Uma coisa � nossa rela��o com a Luana e a outra � a nossa pessoal. Exige que abdiquemos de orgulho e de v�rios outros aspectos para pensar no bem-estar da crian�a. N�o vimos outra forma saud�vel de lidar com isso”, diz Alexandre.

Cynara ressalta que n�o se trata de aproxima��o, mas de respeito, para que a filha sempre tenha o direito de conviver com os pais. “N�o � f�cil nem o ideal, mas � o poss�vel. Tentamos fazer da melhor maneira, facilitando essa mudan�a e eterna adapta��o �s duas casas”, afirma a artista pl�stica.

 

 

O que diz a lei

A Lei 13.058, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em 23 de dezembro de 2014, altera o C�digo Civil (Lei 10.406/02), cuja reda��o aplicava a guarda compartilhada “sempre que poss�vel”. Em geral, resultava na determina��o desse modelo apenas nos casos em que h� boas rela��es entre os pais depois do fim da uni�o. Agora, esse tipo de decis�o se estende tamb�m a casos de separa��es conflituosas. A ideia � garantir uma divis�o equilibrada do tempo de conviv�ncia com pai e m�e, possibilitando a supervis�o compartilhada dos interesses do filho.

DIREITO DE SER UM BOM PAI


O que antes era sacramentado, filho s� fica com a m�e em caso de separa��o, est� mudando. Cada vez mais, a guarda est� sendo concedida tamb�m ao pai, afirma a ju�za titular da 12ª Vara de Fam�lia e desembargadora convocada da 6ª C�mara C�vel, �ngela de Lourdes Rodrigues. Segundo ela, mudan�as de paradigmas levaram os homens a lutarem pelo direito de ficar com os filhos. A decis�o, impulsionada pela Lei 13.058/14, que determina a guarda compartilhada, leva em conta uma s�rie de pr�-requisitos. “Precisamos analisar se este pai tem familiaridade com o filho, se a crian�a se sente � vontade, se � uma pessoa mais distante ou presente”, diz a magistrada.

Como se trata da fase de forma��o da crian�a, � preciso cuidado redobrado. “Estamos direcionando quem ela ser� amanh�. Por isso, a decis�o n�o parte do aspecto social ou financeiro. � mais que isso”, destaca a ju�za. Na guarda compartilhada, parte-se do pressuposto de que pai e m�e decidir�o juntos as quest�es do filho – da escola ao dentista. Os dias de visitas de um e outro, normalmente, n�o s�o estabelecidos em ju�zo, ficando a cargo dos respons�veis a administra��o amig�vel da situa��o. Qualquer decis�o, s� depois de relat�rio das equipes de psicologia e assist�ncia social. A manuten��o de rotina e uma vida estruturada da crian�a tamb�m s�o aspectos considerados.

Na expectativa de ser beneficiado por esses novos paradigmas est� o c�nsul honor�rio do Senegal em Belo Horizonte, Ibrahima Gaye. Morando h� 16 anos na capital, ele teve uma filha com uma brasileira e hoje mant�m a��o judicial pela guarda da menina, de 1 ano e 6 meses. A ex-companheira alegou no processo temer que o senegal�s fuja com a crian�a, al�m de p�r em xeque aspectos da cultura deles, que nem sequer fazem parte do Senegal, como a incis�o clitoriana.

O c�nsul, que � ativista dos direitos humanos e respons�vel em BH pelo Centro Cultural Casa �frica, s� pode ver a menina dentro do f�rum de Lagoa Santa, na Grande BH, uma vez por semana, sob supervis�o de assistente social. Ele n�o conseguiu nem mesmo o direito de apresentar a filha � fam�lia, que veio ao Brasil no ano passado. Em dezembro, ele entrou com representa��o na Casa de Direitos Humanos, em BH, pois acredita estar sendo impedido de conviver com a menina por quest�es raciais e religiosas. “O Judici�rio toma decis�es sem averiguar. N�o h� nada que me desabone como pai. � um direito meu estar com minha filha”, diz.

A advogada dele, Marcela Menezes M�ximo, critica a postura dos tribunais at� a edi��o da lei: “O grande problema � que os ju�zes partem do pressuposto de que a m�e � a �nica capaz de criar os filhos. Temo que a nova lei seja uma ‘pedra no sapato’ dos ju�zes, que s�o extremamente conservadores”. Para ela, a Lei 13.058/14 d� esperan�a ao pai de participar integralmente da vida dos filhos. As advogadas da ex-companheira de Ibrahima n�o retornaram as liga��es da reportagem para o escrit�rio.

Para o presidente do Instituto Brasileiro do Direito de Fam�lia (IBDFAM), Rodrigo da Cunha, a lei d� um passo adiante no pr�prio Judici�rio. “Antigamente, n�o se aceitava guarda compartilhada nos tribunais. Depois, ela come�ou a ser aferida aos poucos, porque os ju�zes n�o acreditavam que era poss�vel. Agora, eles ter�o de se adaptar.”

MAIS PROTE��O  A magistrada �ngela Rodrigues ressalta que a guarda compartilhada n�o precisa de homologa��o judicial e o ideal � que as fam�lias consigam resolver sozinhas. Caso do m�sico Ruy Montenegro, de 56, e da vendedora Fabiane Capistrano, de 36. Para garantir o bem-estar da filha Maria Lu�za, de 11, deixaram as diferen�as pessoais de lado para dar � menina  o direito de ter pai e m�e presentes na sua vida. “A guarda compartilhada protege a crian�a de um desgaste maior, porque a inseguran�a existe, independentemente de ser div�rcio amig�vel ou litigioso ”, afirma Ruy.

Tudo foi decidido pelo casal, com orienta��o de advogados, mas sem homologa��o judicial. “N�o escondemos que nossa rela��o � dif�cil e mostramos que, convivendo juntos, ela estaria em meio de conflitos. Ensinamos que continua tendo pai e m�e e zelamos por ela”, conta. O esfor�o por Maria Lu�za acabou aproximando Ruy e Fabiane, que, segundo ele, se tornaram mais amigos do que quando casados.

“A guarda compartilhada serviu para os filhos n�o serem mais usados como pretexto ou chantagem. Antigamente, como a posse era s� de um, acabavam sendo usados para tirar proveito de uma situa��o e at� como chantagem”, afirma Ruy. Fabiane concorda: “Por amor a Maria Lu�za, trouxe para a minha realidade que ela precisa tanto do pai quanto de mim”. Ela mora em Contagem, na Grande BH, e Ruy na capital. Mas a menina nunca ficou mais de 15 dias sem v�-lo. “A chave da guarda compartilhada � o amor dos dois pelo filho e a busca conjunta do que � melhor para a crian�a, e n�o a picuinha dos adultos.”


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