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Estado de Minas

Conhe�a transexual mineiro que inspirou Ivana, da novela A For�a do Querer

Aos 52 anos, Dor�, que nasceu Maria Dorothea e sempre se sentiu homem, toma horm�nios masculinos e tenta retificar nome na certid�o. Hist�ria ajudou a inspirar personagem da tev�


15/09/2017 06:00 - atualizado 15/09/2017 08:24

Dorí já tirou os seios para adequar o corpo à sua identidade de gênero: relato dele ajudou na construção da personagem Ivana, de A força do querer(foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
Dor� j� tirou os seios para adequar o corpo � sua identidade de g�nero: relato dele ajudou na constru��o da personagem Ivana, de A for�a do querer (foto: Beto Novaes/EM/DA Press)

Um nome que n�o condiz com o dono dele. Batizado de Maria Dorothea de Araujo Santos, Dor�, de 52 anos, come�ou um processo de retifica��o de seu nome social em setembro do ano passado com o apoio de um centro de exerc�cio jur�dico. Desde pequeno, na escola onde estudava, Dor� sempre foi do time dos meninos: cabelos curtos, cal�as largas e blusas compridas. Tudo que escondesse suas curvas. Preferia o inverno para se vestir com os moletons, j� que nas aulas de educa��o f�sica as meninas eram obrigadas a usar collant – uma pe�a justa ao corpo, que marcava detalhes. “Quando eu tinha que usar o collant era a morte. Tinha que correr, jogar v�lei, handebol e sempre na equipe feminina. Tive que me fechar para sofrer menos. Desde crian�a nunca me vi como mulher, mesmo nascendo mulher. Meu g�nero sempre foi masculino. N�o mudei, sempre fui deste jeito”, disse Dor�.

Hoje, o homem carrega v�rias tatuagens e pelos no rosto. Com o cabelo rente � cabe�a – como sempre gostou –, voz grave e bra�os com m�sculos definidos, Dor� passa n�o s� pela ansiedade de esperar a troca de nome, mas pelas mudan�as f�sicas devido �s doses de horm�nio que come�ou a tomar no ano passado. “Quando as pessoas me dizem que n�o sou homem porque n�o tenho p�nis, respondo: ‘tenho sim, comprei um’. Inclusive, fa�o xixi em p� e tenho rela��es sexuais com ele. Nasci sem p�nis, mas me sinto homem”, contou. Sobre a cirurgia de transgenitaliza��o, Dor� afirma que tem interesse em passar pelo procedimento. “Li em uma reportagem sobre uma cirurgia que faz um p�nis a partir do clit�ris. Mas, com os horm�nios, o �rg�o j� sofre altera��es”, contou.

A trama de Dor� tamb�m est� sendo representada em hor�rio nobre, e em canal aberto. Em qualquer mesa de bar, ou em discuss�es de fam�lia, Ivana, ou Ivan, da novela A For�a do Querer, de Gl�ria Perez, pauta as mais diversas rea��es. Afinal, o que faz uma mulher querer “virar” um homem? De acordo com dados da Organiza��o Mundial de Sa�de (OMS), uma em cada 100 pessoas s�o transg�neros. A atriz Carolina Duarte j� cortou as madeixas e tem incorporado caracter�sticas masculinas para representar o processo de transi��o de Ivana para Ivan. Dor� conta que foi um dos que serviu de inspira��o para a autora para a cria��o do personagem. Segundo ele, foi procurado h� dois anos pela equipe de produ��o da Rede Globo para contribuir com os relatos que embasariam a constru��o da narrativa.

V�rios dos dilemas retratados na novela se repetem na vida real. Diferentemente de muitos transexuais que s�o expulsos de casa e que s�o discriminados pela fam�lia, Dori sempre teve o apoio da m�e. “Ela me apoia de uma forma que voc� nem acredita. Desde o in�cio ela conversa comigo. Quando falei para ela que eu tiraria os seios, ela disse: ‘Ningu�m nunca viu que voc� tem seios mesmo. Voc� sempre foi assim.’ Minhas irm�s j� tiveram dificuldade. Mas, n�o posso exigir das pessoas que entendam que sou o Dor�. Mas elas me dizem que n�o conseguem me chamar com o pronome masculino. A mudan�a da fam�lia n�o me incomoda tanto assim”, afirmou.

O casal Dorí e Cristiane espera a certidão dele para oficializar a união com nomes de marido e mulher: 'Se não fosse ela, eu não seria eu', diz o homem(foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
O casal Dor� e Cristiane espera a certid�o dele para oficializar a uni�o com nomes de marido e mulher: 'Se n�o fosse ela, eu n�o seria eu', diz o homem (foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
Na contram�o da popula��o trans, que tem muita dificuldade em conseguir um emprego formal, Dor� se considera um cara de sorte. Quando buscou um trabalho fora de um escrit�rio administrativo, se encontrou em bares e boates LGBT+. Em um desses estabelecimentos, conheceu Cristiane Korossy, de 35, sua companheira. Em 2004, ela estava de casamento marcado e, quando o conheceu, n�o o identificou como mulher. O noivado foi cancelado e romance com Dor� engatou e, ap�s 3 meses, j� assumiram uma uni�o est�vel, pois aguardam a nova de identidade de Dori para formalizar o casamento e ter o nome dos doi em uma certid�o. “Quando nos unimos, �ramos considerados homossexuais”, contou Cristiane. “Se n�o fosse ela, eu n�o seria eu”, declarou Dori, com os olhos marejados. Ele conta que foi ela a grande respons�vel por todo o processo de transi��o, desde a retirada dos seios, as primeiras dosagens de horm�nio, at� o pontap� inicial da mudan�a de nome. “Eu n�o seria quem sou hoje.”

Nas �ltimas semanas da novela, Ivan deu a oportunidade para que a m�e o rebatizasse. Por�m, enfrentou mais um epis�dio de conflito com os pais, que n�o aceitam a nova imagem que ele representa. Assim, com a ajuda de uma amiga, o nome Ivan foi escolhido, porque simbolizava o desejo da m�e. No entanto, o personagem ainda n�o conseguiu a retifica��o do nome social para retirar os novos documentos. Da fic��o para a realidade, Dori tamb�m aguarda a nova identidade. *Estagi�rio sob supervis�o do editor Roney Garcia

 

B�-�-b� da identidade de g�nero


Cisg�nero – Toda pessoa que se identifica com as caracter�sticas do g�nero designado a ela no nascimento. Em termos de orienta��o sexual podem ser heterossexuais, homossexuais ou bissexuais.

Transg�nero – Toda pessoa que n�o se identifica com as caracter�sticas do g�nero designado a ela no nascimento. Nesse caso, podemos dividir entre o grupo denominado “dimens�o identit�ria” (travesti, mulher transexual e homem transexual) e “dimens�o funcional” (crossdressers, dragqueens, dragkings e transformistas). Em termos de orienta��o sexual, tamb�m podem ser heterossexuais, homossexuais ou bissexuais.

Identidade n�o bin�ria ou Genderqueer – Termo “guarda-chuva” para identidades de g�nero que n�o sejam exclusivamente homem nem mulher, estando, portanto, fora do binarismo de g�nero masculino e feminino e da cisnormatividade.

Constrangimento e espera por decis�o


No ano passado, Dor� Araujo entrou com um processo de mudan�a do nome social, com o apoio do Centro de Exerc�cio Jur�dico da Newton Paiva. Mas ainda vem passando por constrangimentos por oficialmente ainda se chamar Maria Dorothea. “H� pouco tempo, fizeram um crach� no trabalho com meu nome civil. Falei: ‘N�o vou usar esse crach�, vai me constranger horrores. Fiquei chorando tr�s horas no balc�o com a situa��o’”, contou Dor�. Dias depois, seu crach� foi reformulado e agora, na frente, seu nome estampa a identifica��o escolhida. Dor� se orgulha ao ser chamado pelo pronome masculino: “No bar onde trabalho, quando me chamam de ‘ele’, ‘ele’, ‘ele’, isso soa como se fosse m�sica ao meu ouvido.” Agora, o que Dor� deseja com a formaliza��o do seu nome social vai al�m de um papel. Ele quer evitar constrangimentos de qualquer tipo e ser visto n�o como um homem transexual mas como um homem comum. “S� quero ser mais um na multid�o. Mais um homem”.

A retifica��o consiste em trocar o nome e o sexo biol�gico de documentos oficiais pela identifica��o e g�nero escolhidos. A professora mestre em Direito e Institui��es Pol�ticas Tatiana Maria Oliveira Prates Motta foi a que se prontificou a ajudar Dor� a mudar os documentos. “O procedimento proposto foi uma a��o de retifica��o de registro civil. No que diz respeito aos transg�neros e, em especial, ao nosso constituinte, a a��o visa � efetiva��o de direitos fundamentais, previstos na Constitui��o Federal”, afirma a advogada.

Dalcira Ferr�o, psic�loga, conselheira do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais e militante LGBT , esclarece sobre o relat�rio psicol�gico solicitado pelo juiz para a realiza��o da retifica��o. “A proposta n�o �, de forma alguma, atestar a transexualidade de algu�m nem muito menos diagnosticar ou patologizar a identidade travesti e trans e sim apresentar uma an�lise psicossocial da hist�ria, da trajet�ria da pessoa.” Ainda de acordo com ela, o relat�rio serve para apontar rela��es sociais e constrangimento que a utiliza��o do nome civil pode ocasionar aos transexuais.

Ap�s a an�lise jur�dica da quest�o, o caso foi prontamente recebido pelo Centro de Exerc�cio Jur�dico da Newton Paiva, que oferece gratuitamente servi�os de cunho jur�dico nas �reas c�vel, criminal, familiar e previdenci�ria. A a��o foi proposta e tem tr�mite perante o ju�zo da 10ª Vara de Fam�lia de BH. Segundo ela, os casos est�o suspensos no Supremo Tribunal Federal aguardando uma decis�o, j� que est� tramitando a mudan�a para o nome social para pessoas trans que n�o fizeram a cirurgia de transgenitaliza��o. “Infelizmente, � temer�rio dizer qual o prazo de dura��o do julgamento da quest�o pelo STF”, afirma.


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