
Uma popula��o que pode chegar a 40 mil mineiros vive sob a amea�a mais grave de barragens de minera��o no estado. Um contingente superior � quantidade de habitantes presentes em 745 das cidades mineiras individualmente, como S�o Sebasti�o do Para�so (39.969 em 2020, segundo o IBGE).
Segundo dados da Ag�ncia Nacional de Minera��o (ANM) reunidos pela reportagem do Estado de Minas, esse � o total de pessoas que moram ou trabalham sob reservat�rios de conten��o de rejeitos e sedimentos que n�o comprovaram sua estabilidade estrutural neste ano.
Do total de 203 barramentos mineiros, 28 (14%) t�m problemas com as Declara��es de Condi��o de Estabilidade (DCE), que a ANM considera “o documento mais importante do processo de seguran�a de barragens de minera��o”. Dessas, 25 n�o t�m um quadro de solidez suficiente para que t�cnicos emitam atestados favor�veis, enquanto outras tr�s sequer se manifestaram.
Com as lembran�as tr�gicas dos rompimentos de barragens em (2015) e Brumadinho (2019), essa inseguran�a s� intensifica a agonia de quem vive abaixo de estruturas como a Barragem de Rejeitos de Serra Azul, em Itatiaiu�u (Grande BH) – que s� pode come�ar a ser descaracterizado ap�s 2025.
Barreira essencial para desmanche
Esse � o tempo estimado para que seja conclu�da uma constru��o de a�o e pedras chamada Estrutura de Conten��o de Jusante (ECJ), que deve ser capaz de reter os rejeitos em caso de rompimento do reservat�rio. Portanto, uma barreira essencial para possibilitar o desmanche do reservat�rio. A mineradora afirma que a constru��o � priorit�ria e que a escolha de um local mais seguro para ela trouxe desafios construtivos que ser�o compensados.
Na edi��o de domingo (30/4), o EM mostrou que o Minist�rio P�blico de Minas Gerais deve lan�ar em meados de maio a vers�o com consulta p�blica do Centro Integrado de Gest�o Ambiental (CIGA), que possibilitar� o acompanhamento das estruturas e processos como esse, de mineradoras com barragens em Minas Gerais.

Operado pela ArcelorMittal, Serra Azul � uma dos tr�s barramentos em pior estado de estabilidade do Brasil, ao lado das mineiras Sul Superior (Bar�o de Cocais) e Forquilha 3 (Ouro Preto), mas sendo a �nica barragem em n�vel 3 de instabilidade (o mais cr�tico) que ainda n�o tem uma estrutura de conten��o.
N�vel mais cr�tico de seguran�a
Vistoriada por fiscais da ANM em 7 de abril de 2023, a entrada da barragem no n�vel mais cr�tico de seguran�a foi revelada por reportagem do EM. Entre os par�metros de deteriora��o dos taludes (encostas da estrutura), a inspe��o encontrou “falhas na prote��o e presen�a de vegeta��o arbustiva” enraizada e crescendo nas paredes.
Detalhes t�cnicos da Barragem Serra Azul (AcerlorMittal)
- Tipo: Barragem de Rejeitos
- Operadora: ArcelorMittal Brasil S.A.
- Localiza��o: Mina Serra Azul (Itatiaiu�u-MG)
- Instala��o: 9/01/1987
- Situa��o: Inativa desde 2012
- Alerta: N�vel 3
- (risco iminente de rompimento)
- Altura: 85 metros
- Comprimento: 760 metros
- Volume contido: 5 milh�es de m3 de rejeitos de min�rio
- de ferro
- �rea: 65 mil m2
- M�todo de amplia��o: Alteamento a montante ou
- desconhecido
Em caso de rompimento, podem ser afetadas diretamente at� 100 pessoas. Os danos ambientais s�o considerados “significativos”, podendo prejudicar �reas de interesse ambiental relevante ou �reas protegidas. Os danos socioambientais, por outro lado, podem ser considerados “moderados” pela “baixa concentra��o de instala��es residenciais, agr�colas, industriais ou de infraestrutura”.
Contudo, eventual rompimento e despejo de 5 milh�es de metros c�bicos de rejeitos de min�rio de ferro (metade do que desceu de Brumadinho) interromperia em poucos minutos dois setores inteiros da principal liga��o entre Minas e S�o Paulo, a BR-381 (Fern�o Dias), nos Kms 530 e 534.
Amea�a para o abastecimento de �gua
O grande volume de lama acumulada por d�cadas de minera��o ingressaria, depois de 12,7 quil�metros, o Reservat�rio Rio Manso, respons�vel pelo abastecimento de 35% dos cerca de 6 milh�es de habitantes da Grande BH, podendo inviabilizar o fornecimento de �gua.
Tanto a Arteris, concession�ria da Rodovia Fern�o Dias, quanto a Copasa, que capta �gua do reservat�rio, assinam afirmativas de ci�ncia dos riscos e trabalham junto �s autoridades para sua preven��o.
Uma das esperan�as � a obra de constru��o da estrutura de conten��o, a dois quil�metros de dist�ncia da barragem sem atestado de estabilidade e que fica no leito em que desce o C�rrego do Motta. Esse novo dique poder� atingir uma altura de 45 metros e 200 metros de comprimento. A previs�o de conclus�o divulgada � de setembro de 2025.

O caseiro Guilhermino Alves Pereira Rocha, de 67 anos, afirma que nem quando o obst�culo estiver pronto vai ficar inteiramente tranquilo. “A ArcelorMittal destruiu os nossos sonhos, nos causou muitas dores. Trabalhava com outras pessoas, mas todas foram embora, pois ningu�m aluga mais o s�tio. Meu servi�o dobrou. Al�m de tudo, temos esse medo, a gente qualquer barulho acha que a sirene vai tocar, que vai ter de correr. S� dizem que � para ir para cima. Est� no n�vel pior de risco, igual a Mariana e Brumadinho”, compara.
Mar de rejeitos com seguran�a duvidosa
O somat�rio do volume de rejeitos de minera��o e sedimentos contidos nas 28 barragens sem garantias de seguran�a pela emiss�o de Declara��es de Condi��o de Estabilidade (DCE) � gigantesco. Chega a 458 milh�es de metros c�bicos.
Um total que representa 3,8 vezes a capacidade de armazenamento de �gua para a capta��o do Reservat�rio de Rio Manso, da Copasa, o maior do sistema de represas que abastecem Grande BH, fornecendo �gua para 35% dos 6 milh�es de habitantes da regi�o. A represa, inclusive, � a mais amea�ada por barragens sem garantias de estabilidade.

Das 28 barragens sem DCE em Minas, a maioria – 17 estruturas – pode produzir dano ambiental considerado “significativo”, com �rea afetada sendo de interesse ambiental relevante ou protegida em legisla��o espec�fica.
Uma delas tem risco “muito significativo agravado”, por conter rejeitos considerados t�xicos. Outras cinco t�m potencial destrutivo “muito significativo”, por conterem res�duos perigosos. Tr�s t�m amea�a considerada “pouco significativa”, e um, “insignificante”.
Dos 28 barramentos sem DCE que amea�am 40.705 mineiros, 15 s�o considerados capazes de danos socioecon�micos e culturais “altos”, uma vez que abaixo deles “existe alta concentra��o de instala��es residenciais, agr�colas, industriais ou de infraestrutura de relev�ncia s�cio-econ�mico-cultural na �rea afetada”. Seis representam amea�as m�dias, tr�s baixas e tr�s inexistentes.
Conten��o � prioridade, diz empresa
Sobre a Barragem de Rejeitos de Serra Azul, em Itatiaiu�u, a ArcelorMittal afirma que a “constru��o da Estrutura de Conten��o a Jusante (ECJ) � tema priorit�rio para a empresa” e que usa a tecnologia que garantiria maior prote��o, com tr�s fileiras de tubos de a�o cravados no solo com os espa�os preenchidos com pedras e concreto.
“At� o dia 10 de abril, j� tinham sido cravados no solo 528 tubos de a�o, o que corresponde a mais que a metade dos 1.036 tubos previstos. A utiliza��o desse m�todo construtivo foi necess�ria para viabilizar a constru��o da ECJ em local que garante maior prote��o das �reas a jusante da ECJ, incluindo a BR-381 e o Reservat�rio do Rio Manso”, informa a empresa.
Segundo a ArcelorMittal, embora o local determinado para constru��o da estrutura de conten��o “traga desafios t�cnicos e construtivos significativamente maiores do que os de outras estruturas semelhantes j� constru�das, com essa escolha a empresa visa garantir a m�xima prote��o do meio ambiente, equipamentos p�blicos e patrim�nio particular”.
A empresa afirma ainda que planos de a��es espec�ficos tamb�m foram acordados junto ao Minist�rio P�blico, � Copasa e � Arteris (concession�ria que administra a BR-381), “prevendo, entre outras medidas, a instala��o de cortinas de reten��o de sedimentos no reservat�rio de Rio Manso, adapta��es dos dep�sitos de produtos qu�micos da Esta��o de Tratamento de �gua do Rio Manso, manuten��o de contratos de prontid�o para fornecimento de produtos qu�micos indicados nos estudos de tratabilidade e defini��o de rotas alternativas para o tr�fego na regi�o”.
Procurada pelo Estado de Minas, a Copasa informou que faz reuni�es peri�dicas com mineradoras cuja �rea de influ�ncia abrange seus sistemas de abastecimento, para tratar dos Plano de A��o de Emerg�ncia de Barragem de Minera��o e se inteirar sobre as inspe��es de seguran�a nas estruturas. Ainda segundo a concession�ria de saneamento, esse acompanhamento indica que, “at� o momento, n�o h� uma amea�a efetiva de rompimento das estruturas”.
A Arteris, concession�ria que opera a Rodovia Fern�o Dias, tem informado que tem planos de opera��o em caso de problemas com barragens, mas n�o respondeu aos contatos para esta reportagem.
A barragem est� desativada e a mineradora afirma que � monitorada 24 horas por dia, sendo que as condi��es permanecem inalteradas, segundo a empresa. Os atingidos tamb�m estariam em negocia��es de indeniza��o individualmente, com “pagamento de presta��o mensal para 867 fam�lias”.
Documento � essencial
A Ag�ncia Nacional de Minera��o (ANM) considera que a Declara��o de Condi��o de Estabilidade (DCE) � “o documento mais importante do processo de seguran�a de barragens de minera��o”, pois � a partir dele que se avalia a integridade do reservat�rio de rejeitos e se estabelecem as medidas de monitoramento, manuten��o e conting�ncia necess�rias para garantir a seguran�a da estrutura. A ANM destaca ainda que a DCE deve ser elaborada por profissionais habilitados e deve estar dispon�vel para consulta p�blica.
O Conselho Internacional de Minera��o e Metais (ICMM) tamb�m destaca a import�ncia da DCE, que classifica como uma forma de garantir que os riscos associados � barragem estejam sendo adequadamente avaliados e gerenciados, e que a estrutura esteja operando dentro dos padr�es de seguran�a estabelecidos pelos �rg�os reguladores.
Em artigo publicado na revista cient�fica "Journal of Cleaner Production", pesquisadores brasileiros destacam que a DCE � um instrumento importante para a transpar�ncia e a comunica��o com a popula��o e com autoridades, pois permite que as informa��es t�cnicas sobre a barragem sejam compartilhadas de forma clara e acess�vel.
Os autores ressaltam que a comunica��o transparente � fundamental para promover a confian�a e a coopera��o entre os diferentes atores envolvidos na gest�o da seguran�a dessas estruturas.
A Associa��o Brasileira de Normas T�cnicas (ABNT) tamb�m destaca a import�ncia do documento. A norma ABNT NBR 13028:2017, que estabelece os requisitos para a elabora��o da DCE, destaca que a declara��o � uma forma de garantir que a estrutura esteja operando de forma segura e que os riscos associados � barragem estejam sendo gerenciados adequadamente.
A norma tamb�m estabelece os crit�rios para a elabora��o da DCE e define as informa��es t�cnicas que devem ser inclu�das no documento.