
A proposta, apresentada aos franceses no in�cio de janeiro pela primeira-ministra Elisabeth Borne e que agora passa pelas comiss�es do Parlamento franc�s sob forte resist�ncia dos partidos de centro e de esquerda, pretende aumentar a idade m�nima para a aposentadoria, de 62 para 64 anos, at� 2030. A reformula��o quer tamb�m prolongar os anos de contribui��o, de 42 para 43 anos, j� em 2027 para que se tenha acesso a uma pens�o integral.
As cifras s�o menores do que as dos protestos do dia 31 de janeiro, quando governo e sindicatos contabilizaram 1,3 milh�es e 2,8 milh�es de manifestantes, respectivamente. Mas s�o ainda um pouco maiores do que aquela da primeira chamada contra a reforma da Previd�ncia, ocorrida no dia 19 de janeiro, com 1,1 milh�o de pessoas, segundo dados do minist�rio. Uma nova mobiliza��o foi marcada para o pr�ximo s�bado (11/2) em todo o pa�s.
Protestos
Em protestos desta ter�a, foram grupos feministas que abriram as passeatas com cartazes como o de Kenza, gritos de guerra e par�dias de hits da m�sica pop que falam sobre baixos sal�rios, trabalho dom�stico, patriarcado e igualdade, e anunciam: "C'est la greve feministe!" (� uma greve feminista).
"As mulheres ter�o de trabalhar dois anos a mais, sendo que elas j� desempenham muito mais fun��es n�o remuneradas ao longo da vida do que os homens", argumenta Kenza, que diz ser parte de uma alian�a de movimentos sociais chamada Revolu��o Permanente, presente em toda a Fran�a. "Se olharmos por essa perspectiva, a reforma se torna ainda mais injusta."
Ela se refere �s atividades de cuidados com a casa, com filhos e com pessoas idosas, que s�o desproporcionalmente desempenhadas por mulheres na Fran�a, assim como no Brasil. Segundo o Instituto Nacional de Estat�sticas e Estudos Econ�micos (Insee), enquanto 7% dos homens inativos afirmam estar sem trabalho formal por motivos familiares ou por executarem trabalhos dom�sticos, entre as mulheres inativas esse percentual � de 54%.
Esse dado est� refletido na taxa de emprego de 2021, que tamb�m aponta para a disparidade de g�nero. As francesas atingem o pico na faixa entre 35 e 40 anos, quando 88% dos homens est�o empregados contra 76% das mulheres.
Para a professora Delphine Lannes, 46, o fato de as mulheres tirarem licen�a-maternidade ou interromperem o trabalho temporariamente para cuidar dos filhos torna imposs�vel o pagamento das cotas necess�rias � aposentadoria integral. "Queremos algo mais justo e que partilhe a riqueza que, de uma maneira ou de outra, ajudamos a produzir."
A assistente social Alina Rubio, 65, ilustra a observa��o da professora. Apesar de j� ter idade para se aposentar segundo a regra ainda vigente, ela ainda n�o conseguiu cumprir com as cotas de contribui��o necess�rias para receber o benef�cio integral. "Tive dois filhos, tirei licen�as, trabalhei meio per�odo por muito tempo. Agora, venho aqui por meus filhos e netos", diz.
Desigualdades
A reforma da dupla Macron-Borne parece espelhar ou mesmo aprofundar as desigualdades de g�nero j� presentes na sociedade francesa. Hoje, as mulheres recebem uma pens�o m�dia de EUR 1.274 por m�s, 24% menos que os homens (EUR 1674). Isso porque as mulheres ganham, em m�dia, sal�rios 16% menores do que os homens, segundo dados do Insee.
Elas s�o maioria em atividades menos valorizadas dos setores de educa��o, sa�de e limpeza e tamb�m est�o desproporcionalmente presentes nos trabalhos de meio per�odo -28% das mulheres contra 8,3% dos homens t�m esse tipo de arranjo de trabalho.
Um estudo de impacto sobre a proposta de reforma da Previd�ncia apontou que as mulheres ser�o mais penalizadas pelo projeto. Enquanto os franceses ter�o que trabalhar cinco meses a mais para se aposentar segundo as novas regras propostas, as francesas precisar�o de sete meses.
Quando questionado sobre o assunto, o pr�prio Ministro das Rela��es com o Parlamento, Franck Riester, um tanto envergonhado, admitiu diante do Senado Federal, na semana passada, que "elas s�o, de certa forma, penalizadas pelo adiamento da idade legal, isso n�o se pode negar".
A primeira-ministra correu para consertar a situa��o. "N�o posso deixar que se diga que nosso projeto n�o protegeria as mulheres. Pelo contr�rio", disse. Em uma tentativa de apagar o fogo, Borne prop�s que pessoas em carreira longa, ou seja, que come�aram a trabalhar antes dos 21 anos, poderiam antecipar a aposentadoria para os 63, n�o 64. Trata-se de uma medida que n�o fazia parte do primeiro texto proposto.
"A diferen�a entre as mulheres trabalhadoras organizadas e Borne � que ela � uma mulher burguesa, que n�o precisa se submeter a trabalhos violentos e mal pagos", diz a ativista Rozenn Kovol, 21, do coletivo feminista De P�o e de Rosas.
"Essa � uma reforma antifeminista e patriarcal", afirma, antes de pegar seu megafone e puxar o coro de uma vers�o de "Freed from Desire", can��o de Gala Rizzatto, rebatizada como "Sem a gente, o mundo para" por um grupo feminista de Rennes, no norte da Fran�a. A letra, que se tornou um dos hinos do protesto, diz: "Nosso trabalho, assalariado ou dom�stico, faz o capitalismo perdurar. Antes da corveia, � tempo de bloquear tudo. Se revoltar! E isso vai explodir."