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Estado de Minas

Coronav�rus | 'Indignada' com aglomera��es: o desabafo de brasileira que perdeu 3 parentes ap�s festa de anivers�rio h� um ano

No in�cio de abril de 2020, Vera perdeu o marido e dois cunhados ap�s infec��o pelo novo coronav�rus depois de comemora��o pelo anivers�rio dela. Um ano depois, ela lamenta que eventos continuem acontecendo pelo pa�s.


22/03/2021 23:21 - atualizado 22/03/2021 23:21

'Acho um desrespeito a todos os mortos e suas famílias', diz Vera sobre eventos em meio ao pico da pandemia(foto: Arquivo pessoal)
'Acho um desrespeito a todos os mortos e suas fam�lias', diz Vera sobre eventos em meio ao pico da pandemia (foto: Arquivo pessoal)

Em 12 de mar�o, a servidora p�blica Vera L�cia Pereira completou 60 anos. Os dias que antecederam o anivers�rio, que no passado costumavam despertar alegria, se tornaram momentos de reflex�o e tristeza. O per�odo reacendeu as lembran�as de sua festa do ano passado.

 

Na comemora��o de mar�o de 2020, Vera reuniu 28 pessoas em sua casa, em Itapecerica da Serra, na grande S�o Paulo. Dias depois, quase metade dos convidados foram infectados pelo novo coronav�rus. O marido dela e dois cunhados morreram.

 

Vera classifica a comemora��o do ano passado como um pesadelo. "Me questionei muito: por que isso aconteceu no meu anivers�rio? Por que na minha casa, onde sempre recebemos as pessoas com muito amor?", diz � BBC News Brasil.

Na data da festa de anivers�rio no ano passado, havia cerca de 100 casos de covid-19 confirmados em todo o pa�s e nenhuma morte (o primeiro �bito foi confirmado posteriormente).

 

O isolamento social ainda era incipiente e as orienta��es referentes ao v�rus se limitavam principalmente � higieniza��o das m�os.

 

A partir de meados de mar�o do ano passado, Estados adotaram medidas mais r�gidas, como orienta��es para evitar aglomera��es.

 

Atualmente, o pa�s vive o pior per�odo da pandemia, com mais de 290 mil mortes pela covid-19 e pacientes tendo de esperar na fila por leitos em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs).

 

Apesar disso, diversas festas — entre eventos pequenos ou com centenas de pessoas — continuam acontecendo.

 

"Me sinto indignada. Acho um desrespeito a todos os mortos e suas fam�lias", desabafa Vera sobre esses eventos no atual per�odo.

 

"As pessoas precisam acreditar que (o coronav�rus) � real. Elas n�o devem acreditar naquele que at� hoje duvida do v�rus, que � o presidente (Jair Bolsonaro)", declara Vera, em refer�ncia aos constantes discursos de Bolsonaro nos quais tenta minimizar a situa��o da pandemia no pa�s.

A festa de 2020

A comemora��o dos 59 anos de Vera aconteceu em 13 de mar�o do ano passado, um dia depois do anivers�rio dela. O evento foi organizado por ela e pelo marido, o servidor p�blico Paulo Vieira, que tinha 61 anos. Ela relata que foram chamados somente os parentes mais pr�ximos, para evitar aglomera��o.

 

"Eu me perguntava se seria boa ideia fazer a festa. Falei com o meu marido: vamos desmarcar, Paulo? Ele respondeu que n�o precisava, porque a situa��o n�o estava assim desse jeito a ponto de desmarcar…", comenta Vera.


Paulo, Igor e Vera: família estava feliz durante festa de aniversário dela no ano passado(foto: Arquivo pessoal)
Paulo, Igor e Vera: fam�lia estava feliz durante festa de anivers�rio dela no ano passado (foto: Arquivo pessoal)

O primeiro registro oficial de covid-19 no Brasil foi em 26 de fevereiro de 2020. Por�m, estudos da Fiocruz apontaram, meses depois, que j� existia transmiss�o comunit�riado v�rus — quando n�o � poss�vel identificar a origem da infec��o — no in�cio de fevereiro do ano passado.

 

Por isso, especialistas frisam que muitos eventos entre fevereiro e mar�o, pequenos ou grandes, podem ter colaborado para a propaga��o do v�rus no pa�s.

 

Dias ap�s a comemora��o, diversos parentes de Vera come�aram a apresentar sintomas de covid-19. A princ�pio, os familiares pensavam que n�o se tratava do coronav�rus — em Itapecerica da Serra, por exemplo, ainda n�o havia nenhum registro na �poca.

 

Hoje, os parentes acreditam que algum convidado com sintomas leves pode ter transmitido o v�rus para os demais. Vera e o filho, Igor Pereira, de 27 anos, tiveram poucos sintomas da doen�a, assim como outros diversos convidados da festa, e logo se recuperaram.

 

Paulo e dois irm�os dele foram internados com os pulm�es comprometidos. No hospital, os m�dicos disseram n�o ter d�vidas de que os sintomas deles apontavam que haviam sido infectados pelo coronav�rus.

 

Em primeiro de abril, a aposentada Maria Salete Vieira, de 60 anos, n�o resistiu � covid-19. Nos dias seguintes, o mec�nico Cl�vis Vieira e Paulo tamb�m morreram.

 

Os exames de Maria Salete e Paulo confirmaram que eles haviam sido infectados pelo coronav�rus. J� o resultado de Cl�vis apontou que ele n�o estava com a covid-19, mas familiares e profissionais que acompanharam o caso afirmam que pode se tratar de um falso negativo. Isso porque, al�m do contato com pessoas infectadas, o mec�nico teve sintomas t�picos da doen�a, como o severo comprometimento nos pulm�es.

 

Desde as mortes dos tr�s parentes, Vera e os familiares enfrentaram o que ela define como "um ano bem dif�cil". "A gente teve que se adaptar com as mudan�as", lamenta.

 

A servidora p�blica teve de aprender a lidar com a aus�ncia de Paulo, seu primeiro namorado e com quem estava casada havia 28 anos. "Temos conv�vio desde que a gente se conheceu, h� cerca de 40 anos. Namoramos, ficamos sete anos separados, tivemos outros relacionamentos, mas depois voltamos e nunca mais nos separamos", detalha.

 

Ela conta que sente falta do marido em todos os momentos do dia. "O Paulo era uma pessoa presente em todos os momentos. � muito dif�cil olhar para a mesa de jantar e ele n�o estar ali, dormir e ele n�o estar ali… � dif�cil acordar todos os dias e precisar vestir a roupa da coragem para enfrentar a rotina. N�o h� outra sa�da a n�o ser caminhar, mas a falta dele vai ser eterna", desabafa Vera.

60 anos

Depois da morte do marido, Vera passou tr�s meses afastada do trabalho, usando licen�as e f�rias que tinha acumulado ao longo dos �ltimos anos.

Posteriormente, retornou ao servi�o, no setor de Recursos Humanos da Prefeitura de Itapecerica da Serra.

 

Ela considera que a atividade, na qual lida com servidores com problemas como depend�ncia qu�mica ou depress�o, tem sido fundamental para lidar com a aus�ncia do marido. "H�, por exemplo, muitos casos de pessoas que perderam parentes para a covid, como eu. E, quando estou no trabalho, preciso esquecer a minha dor para acolher essas pessoas."


Carreata surpresa para aniversariante reuniu parentes e amigos próximos(foto: Arquivo pessoal)
Carreata surpresa para aniversariante reuniu parentes e amigos pr�ximos (foto: Arquivo pessoal)

Ela comenta que est� isolada junto com o filho h� cerca de um ano, com exce��o das horas no trabalho, que foi suspenso na semana passada por 15 dias, em raz�o da explos�o de casos de covid-19.

 

Quando a pandemia for controlada, planeja ficar mais perto fisicamente dos outros familiares.

 

"Foi um ano muito dif�cil. Todo mundo acaba sofrendo com a situa��o e a gente n�o pode estar perto de muitas pessoas que a gente ama. Os encontros familiares suspensos. Muitos anivers�rios n�o foram festejados com a fam�lia.

 

N�o fizemos encontros para tomar caf�, como faz�amos todos os fins de semana na casa da minha cunhada…", diz.

 

A servidora p�blica sonha com viagens e reencontros com familiares quando a pandemia estiver controlada.

 

Por�m, ela admite que esses momentos ainda est�o longe de acontecer, diante do atual contexto da pandemia no pa�s.

 

Vacinada, por fazer parte do grupo priorit�rio por trabalhar diretamente na �rea de sa�de do servidor em sua cidade, ela lamenta o atual cen�rio do coronav�rus no pa�s. "Se o governo federal n�o negasse sempre o perigo da pandemia e tivesse adquirido as vacinas com anteced�ncia, hoje o quadro seria outro", declara, em refer�ncia ao atual ritmo da vacina��o no pa�s.

Por n�o haver sinal de melhora na situa��o da pandemia no Brasil, Vera n�o cogitou qualquer reuni�o familiar para comemorar os seus 60 anos. Quando a data do anivers�rio se aproximou, a servidora p�blica voltou a sofrer intensamente com as perdas ap�s a sua festa em 2020.


Irmãos Vieira em registro feito em 2018. Na ponta estão Clóvis, Paulo (os dois de óculos de sol) e Maria Salete (blusa vermelha com estampa): os três foram vítimas da covid no ano passado(foto: Arquivo pessoal)
Irm�os Vieira em registro feito em 2018. Na ponta est�o Cl�vis, Paulo (os dois de �culos de sol) e Maria Salete (blusa vermelha com estampa): os tr�s foram v�timas da covid no ano passado (foto: Arquivo pessoal)

"Passei a semana anterior ao meu anivers�rio deste ano com muita tristeza e lembrando que foi um dia muito feliz no ano passado. Foi o �ltimo dia em que a fam�lia se reuniu. Pensei muito nisso. Meus familiares at� ficaram com medo de que eu entrasse em depress�o", relata.

 

O apoio do �nico filho foi fundamental para ela enfrentar o per�odo de uma forma mais leve. "Ele disse: m�e, o anivers�rio � um dia que precisa ser comemorado. � mais um dia de vida. Precisamos celebrar e (o que aconteceu no ano passado) foi apenas uma coincid�ncia, que poderia ter acontecido em qualquer outro dia", conta Vera.

 

Na noite de anivers�rio, ela encomendou um bolo e planejava passar a data somente com o filho. "Quando ele desceu pra pegar o bolo, me disse pra ir junto. Eu falei que n�o tinha necessidade, mas ele insistiu e fomos (com m�scaras). Enquanto a gente ia descendo as escadas, comecei a escutar as buzinas", relata.

 

Em frente � casa de Vera, amigos e familiares dela passaram em carros buzinando e desejando feliz anivers�rio.

 

Com m�scaras, duas irm�s dela e uma cunhada — as respons�veis pela surpresa — seguraram o bolo.

 

"Foi uma maneira que encontraram de dar uma mensagem de que eu deveria esquecer aquele dia do ano passado. Foi uma surpresa maravilhosa e inesquec�vel", diz Vera. "Percebi que sou muito amada. As pessoas t�m um carinho por tudo o que passamos", acrescenta.

 

A homenagem foi breve, mas marcante. Ela diz que as demonstra��es de carinho a ajudaram a encarar o anivers�rio de forma mais leve. "Hoje, tento encarar o dia 12 de mar�o como um dia de esperan�a e renascimento. N�o posso ficar pensando que seja algo ruim, porque sen�o como seria a vida daqui pra frente? E o meu marido, com certeza, n�o gostaria que eu ficasse assim", declara.

 

E quando se recorda da comemora��o de um ano atr�s, uma das lamenta��es de Vera � que eventos como o seu, que terminaram em infec��es pelo coronav�rus, n�o tenham servido de exemplo para muitas pessoas que continuam participando de festas.

 

"Acho que muitos n�o acreditam que � t�o grave, talvez porque n�o perderam ningu�m da fam�lia ou um amigo. E, por outro lado, temos um l�der que quer mostrar a todo instante que (a covid-19) n�o � nada, � apenas uma gripezinha", afirma.


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