
O evento � visto como uma oportunidade central para que Biden assuma o papel de protagonismo pol�tico global em quest�es clim�ticas, agenda que ele reiterou ser uma prioridade de sua gest�o durante toda a campanha eleitoral de 2018, da qual saiu vitorioso.
Pela primeira vez na hist�ria, Biden criou na administra��o federal dos EUA o posto de Enviado Especial Clim�tico, que conferiu a John Kerry a miss�o de viabilizar a pauta verde dos democratas dom�stica e internacionalmente.
Os EUA est�o de volta?
"Os EUA est�o de volta", lema do atual governo americano, precisar� ser provado nas a��es do l�der da Casa Branca. Nos �ltimos quatro anos, os americanos haviam se retirado de sucessivos espa�os de debate multilaterais e mesas de negocia��es conjuntas entre l�deres estrangeiros. Foi assim em rela��o ao Acordo Clim�tico de Paris, foi assim com a Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS), foi assim no Acordo Nuclear com o Ir�.
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A guinada na pol�tica externa americana operada pelo ex-presidente Donald Trump preconizou a aproxima��o com expoentes da direita populista e conservadora mundial e concentrou os esfor�os - ou rompimentos - diplom�ticos em assuntos centrais para o eleitorado republicano, como a quest�o das disputas comerciais com a China ou as restri��es � entrada de migrantes e refugiados ao pa�s. O mote da administra��o era Am�rica - e americanos - primeiro, e isso se traduziu em uma aus�ncia dos EUA de assuntos de governan�a global.
Agora, a gest�o democrata tenta restabelecer o papel que os EUA se atribu�ram de farol dos valores econ�micos, democr�ticos e morais do Ocidente. "Vamos reparar as nossas alian�as para liderar n�o s� pelo exemplo da for�a mas pela for�a do exemplo", anunciou Biden, em seu discurso de posse, em 20 de janeiro.

Naquele mesmo dia, ele assinou a ordem executiva que recolocava os Estados Unidos no Acordo Clim�tico de Paris, do qual o ex-presidente Trump havia retirado os americanos. E apenas sete dias mais tarde anunciou que os EUA n�o apenas voltavam a se sentar � mesa de negocia��es clim�ticas como seriam eles mesmos os respons�veis por colocar o assunto � mesa na C�pula de L�deres que acontecer� dos pr�ximos dias.
O evento servir� para que os americanos reafirmem compromissos que ignoraram nos �ltimos anos de tentar impedir que o planeta se aque�a acima de 1,5 grau Celsius no futuro. O governo Biden pretende anunciar, diante dos chefes de Estado de 17 economias que juntas respondem por 80% das emiss�es de gases do efeito estufa e por 4/5 do PIB global, metas mais ambiciosas de redu��o das emiss�es de CO2 americanas at� 2030.
"Em seu convite, o presidente exorta os l�deres a usarem a C�pula como uma oportunidade para delinear como seus pa�ses tamb�m contribuir�o para uma ambi��o clim�tica mais forte", afirma o comunicado da Casa Branca sobre o lan�amento da C�pula.
"Depois de se ausentarem do debate, agora os EUA querem mostrar servi�o e querem que haja um grande n�mero de acordos com os pa�ses da C�pula para mostrar que retornam � arena com peso", avalia Tasso Azevedo, Coordenador do Sistema de Estimativa de Emiss�es de Gases de Efeito Estufa do Observat�rio do Clima. A C�pula de L�deres de agora � vista tamb�m como um passo importante para que as grandes pot�ncias mundiais se comprometam com planos mais ambiciosos na 26ª Confer�ncia das Na��es Unidas sobre Mudan�a Clim�tica, que acontecer� em Novembro, em Glasgow, na Inglaterra.
O Brasil como trunfo
� nesse contexto que o Brasil surge como uma oportunidade para o governo Biden mostrar a consist�ncia de sua agenda e a capacidade de persuas�o de seus argumentos.
Bolsonaro se elegeu presidente com as propostas de reduzir multas ambientais, interromper as demarca��es de terras ind�genas e promover os interesses de produtores rurais. Os dois primeiros anos de seu mandato foram marcados por sucessivas altas no desmatamento. A taxa de perda florestal saltou de 7,5 mil km2, em 2018, para 10,1 mil km2 e 11,1 mil km2 em 2019 e 2020, sucessivamente. Foram os maiores valores desde 2008.
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Ainda durante a campanha presidencial de 2020, o democrata Biden afirmou que gostaria de liderar o esfor�o de cria��o de um fundo internacional de US$ 20 bilh�es oferecido ao Brasil para manter a Amaz�nia conservada. Ao citar o Brasil, Biden mobilizava no imagin�rio do eleitor americano as imagens de queimadas na floresta que correram o mundo em 2019, no primeiro ano da gest�o de Bolsonaro.

"� claro que h� toda uma simbologia em negociar com o Brasil, que tem sido identificado globalmente como refrat�rio � preserva��o ambiental. Seria um trunfo do governo Biden obter um compromisso com Bolsonaro, um ganho n�o s� internacional como tamb�m com o eleitorado americano democrata, que se preocupa bastante com o assunto", afirmou � BBC News Brasil, em condi��o de anonimato, um diplomata brasileiro que acompanha as negocia��es entre Brasil e EUA no tema.
As primeiras aproxima��es entre a equipe de John Kerry e as autoridades brasileiras, capitaneadas pelo ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles e pelo ent�o chanceler Ernesto Ara�jo, pareceram produzir impress�es positivas de parte a parte. Do lado americano, os negociadores pareceram surpresos com a receptividade do Brasil em tratar do assunto do meio ambiente como uma "nova prioridade" desde que fosse inclu�da na negocia��o uma contrapartida financeira pelos servi�os florestais do pa�s.
J� entre diplomatas brasileiros, chamou a aten��o o tom "humilde" e "flex�vel" de Kerry e de sua equipe � frente das propostas para o Brasil. Em meados de abril, � revista brit�nica The Economist, Kerry afirmou que n�o lhe cabia "ditar" o que o Brasil e que se trata de "um governo que se sentiu prejudicado pela forma como foi abordado at� o momento". De acordo com fontes na diplomacia americana, a preocupa��o de Kerry era n�o irritar a gest�o Bolsonaro, o que poderia levar a uma interrup��o completa das negocia��es caras aos americanos.
Press�o na negocia��o
Mas, nas �ltimas semanas, o governo americano aumentou o grau de press�o para que o Brasil se comprometa com metas claras de combate ao desmatamento e condicionou qualquer repasse significativo de recursos ao pa�s � apresenta��o de resultados. Exatamente o oposto do que o ministro Salles afirmou publicamente desejar. Em entrevista recente ao jornal O Estado de S. Paulo, o chefe da pasta de Meio Ambiente afirmou esperar por pagamentos antecipados da ordem de US$ 1 bilh�o por ano para que o Brasil pudesse se comprometer em reduzir entre 30% e 40% a devasta��o da Amaz�nia. Sem o recurso de antem�o, Salles afirmou que o pa�s n�o poderia oferecer qualquer meta.
Diante da barganha, o Departamento de Estado americano fez chegar ao Itamaraty que n�o existe a possibilidade de repasses sem resultados. E que do sucesso da negocia��o clim�tica dependeria tamb�m o futuro de outras pautas caras ao Brasil, como o avan�o em acordos comerciais bilaterais com os EUA e a manuten��o do endosso americano � entrada do pa�s na OCDE. Em car�ter reservado, um representante de entidade comercial dos dois pa�ses, que participou de reuni�es com as diplomacias de EUA e Brasil, afirmou que "os americanos deixaram muito claro que n�o v�o comprar terreno na Lua".
Ao mesmo tempo, o governo americano passou a ser cada vez mais pressionado por grupos ind�genas, integrantes da sociedade civil e at� mesmo governadores e parlamentares brasileiros a ampliar o escopo das conversas. Todos eles se queixavam de que as propostas levadas por Salles e Ara�jo a Kerry n�o representavam os interesses mais amplos da sociedade brasileira, j� que n�o houve processo de escuta p�blica do governo federal a esses grupos.
H� um m�s, em carta revelada pela BBC News Brasil, a Articula��o dos Povos Ind�genas do Brasil (APIB) pediu ao presidente americano Joe Biden e ao Enviado Clim�tico Kerry um "canal direto" de comunica��o com o governo dos EUA sobre assuntos ligados � Amaz�nia brasileira. Na �ltima ter�a-feira (13/04), tanto o embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman, quanto Jonathan Pershing, um dos assessores de Kerry, participaram de uma reuni�o com as lideran�as ind�genas.
"Eles se mostraram preocupados com o que relatamos e interessados em uma mudan�a da pol�tica ambiental do governo Bolsonaro. Eles sabem com quem est�o negociando. E n�s sabemos da capacidade deles de pressionar e estamos esperan�osos porque foi uma abertura de di�logo in�dita", afirmou � BBC News Brasil Dinaman Tux�, coordenador da APIB.
A conversa dos representantes americanos com os ind�genas brasileiros foi mais um sinal da gest�o Biden de que o governo brasileiro precisar� oferecer compromissos concretos e consistentes para que haja um an�ncio bilateral de compromisso no dia 22.
Dentro do Itamaraty h� um claro entendimento de que, sem isso, o pa�s n�o vai abocanhar recursos americanos. A sinaliza��o da meta poss�vel, no entanto, � fraca. Nesta quarta (14/04), o vice-presidente da Rep�blica Hamilton Mour�o anunciou em Di�rio Oficial que o pa�s trabalha com a expectativa de fechar a gest�o Bolsonaro com um desmatamento em torno de 8,7 mil km2 por ano. � certamente uma redu��o em rela��o aos dois primeiros anos da administra��o, mas � tamb�m um valor mais de 15% acima do patamar obtido no ano anterior � posse de Bolsonaro. Mesmo entre negociadores brasileiros h� ceticismo de que esse n�mero anime os americanos a abrirem o bolso.
Se um acordo bilateral falhar, resta ainda a possibilidade de uma sa�da multilateral: a proposta da cria��o de um fundo em torno de US$ 10 bilh�es que se destinaria aos pa�ses da Am�rica do Sul para a conserva��o dos biomas tropicais da �rea. Assim, os EUA poderiam usar o peso dos vizinhos brasileiros para aumentar a press�o sobre as a��es ambientais de Bolsonaro.
Na �ltima semana, o governo Biden enviou pela primeira vez um emiss�rio de alto n�vel � regi�o. O diretor s�nior para o Hemisf�rio Ocidental no Conselho de Seguran�a Nacional, Juan Gonzalez, embarcou para uma visita a Col�mbia, Argentina e Uruguai, para discutir, entre outros temas, a crise clim�tica. O Brasil n�o estava no itiner�rio de Gonzalez.
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