
"Olhamos para cima, e sua cauda superlonga e peluda o denunciou", acrescentou Bithell.
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"S�o criaturas lindas de se olhar, mas n�o t�o graciosas quanto voc� imagina que podem ser."
Um marsupial solit�rio — com orelhas peludas, olhos redondos e cauda semelhante a plumas, que que vive em �rvores das florestas de eucalipto do leste da Austr�lia —, o grande planador � frequentemente descrito como um gamb� voador desajeitado. S� que mais fofo.
"Eles s�o como Muppets vivos", afirma a ecologista Kara Youngentob, da Universidade Nacional da Austr�lia, via Zoom.
"A maioria das pessoas est� mais familiarizada com os petauros-do-a��car [uma esp�cie de planador pequeno que adora alimentos doces, muito explorada no com�rcio internacional ilegal de animais de estima��o]. Pense no grande planador como seu primo mais velho, mais pregui�oso e fofinho."
O grande planador � o �nico membro da fam�lia que n�o possui uma cauda pre�nsil aderente.
Mas tamb�m � diferente de seus parentes, pois se alimenta exclusivamente de folhas de eucalipto (como os coalas) e tem membranas planadoras que v�o apenas dos cotovelos aos tornozelos (diferentemente de seus primos, que t�m membranas que se estendem at� as patas dianteiras).
Isso permite que eles planem de forma mais controlada, conferindo a eles um status de super-her�i durante o voo.
"Quando eles saltam, colocam os bracinhos na frente como a Mulher Maravilha", diz Youngentob.
Semelhante � hero�na dos quadrinhos, a esp�cie tamb�m pode planar longas dist�ncias — at� 100 metros entre as copas das �rvores, onde se entoca em buracos nos troncos das �rvores que podem levar mais de um s�culo para se formar.
Tr�s vezes mais fofo
Anteriormente, pensava-se que o grande planador habitava as florestas tropicais quentes do Extremo Norte de Queensland at� as florestas �midas e frias das Central Highlands do Estado australiano de Victoria, um territ�rio que abrange cerca de 3.000 km, mas pesquisadores descobriram recentemente que se trata de tr�s esp�cies distintas — e os marsupiais noturnos s�o menores quanto mais ao norte eles vivem.
As varia��es de tamanho foram observadas quando o grande planador foi descrito pela primeira vez pela ci�ncia nos anos 1800 (pelo escritor cient�fico escoc�s Robert Kerr em um artigo de 1792 sobre o trabalho do bot�nico sueco e "pai da taxonomia moderna" Carl von Linn�), mas se sup�s que faziam parte de uma �nica esp�cie (Petauroides volans), que crescia mais em latitudes mais baixas para conservar o calor, uma teoria conhecida como Regra de Bergmann.
Denise McGregor, pesquisadora da James Cook University, na Austr�lia, que liderou o estudo publicado em novembro de 2020, testou essa teoria como parte de seu doutorado.
Com material gen�tico retirado de grandes planadores no norte de Queensland (que crescem at� o tamanho de um pequeno gamb�), ela provou que era uma esp�cie diferente da esp�cie meridional do tamanho de um gato encontrada ao sul do Tr�pico de Capric�rnio (� qual o nome cient�fico Petauroids volans agora se refere).
Mas esta n�o foi a �nica descoberta que ela fez.
"Nessa altura, outro grupo — (Stephen) Jackson e (Colin) Groves — publicou um livro sobre mam�feros planadores [Taxonomy of Australian Mammals (2015)], no qual sugeria que existiam tr�s esp�cies distintas," afirma McGregor.
"Ent�o, achei melhor pegar algumas amostras de onde eles achavam que a terceira esp�cie vivia [no meio de Queensland, a oeste de Mackay at� Townsville], e sem d�vida voltamos com tr�s esp�cies."
Pouco se sabe sobre a esp�cie do centro (Petauroides armillatus) e a esp�cie do norte (Perauroides minor; cujo territ�rio se estende apenas ao norte de Cairns). E a emo��o da descoberta foi atenuada por suas implica��es para a conserva��o da esp�cie.
Amea�as ambientais
Embora compreender a ecologia de uma esp�cie seja importante para o desenvolvimento da gest�o da conserva��o, diz Youngentob, coautora do estudo, dividir o grande planador em tr�s esp�cies significa que restaram poucos deles para proteger.
"J� t�nhamos os dados das novas esp�cies antes dos inc�ndios florestais do ver�o passado, ent�o quando todo o habitat do grande planador do sul estava em chamas, ficamos apavorados porque sab�amos que a esp�cie n�o existia em nenhum outro lugar", diz ela.
No entanto, de acordo com pesquisas de longo prazo conduzidas pelo professor David Lindenmayer, da Universidade Nacional da Austr�lia, principal especialista em grandes planadores do pa�s, as popula��es do sul j� haviam despencado 80% em algumas �reas antes dos inc�ndios florestais.
Esta perda � em grande parte atribu�da � extra��o de madeira, que destruiu vastas �reas de �rvores das quais os grandes planadores dependem.
De fato, um relat�rio do World Wildlife Fund (WWF) de 2020 revelou que a destrui��o de habitats de grandes planadores aumentou 52% em Nova Gales do Sul e Queensland depois que a esp�cie foi listada como vulner�vel � extin��o pelo governo em 2016.
"A extra��o de madeira n�o destr�i apenas o habitat dos grandes planadores", afirma Lindenmayer.
"Tamb�m faz com que os inc�ndios florestais queimem mais e muda a composi��o da paisagem para �rvores com alimentos menos palat�veis."
A mudan�a clim�tica tamb�m est� afetando as esp�cies, com o aumento das temperaturas � noite — Sydney registrou sua noite mais quente em novembro de 2020 —, o que pode fazer com que os grandes planadores percam o apetite, assim como acontece com os humanos em climas quentes.
"Os grandes planadores mant�m estoques m�nimos de gordura, de modo que n�o s�o capazes de sobreviver mais do que alguns dias sem comer", explica Youngentob.
"Em alguns lugares, as noites mais quentes provavelmente est�o matando esses animais."
Salvando o grande planador
Os inc�ndios florestais levaram o governo a reconsiderar o status de conserva��o do grande planador, mas os pesquisadores argumentam que mais a��es s�o necess�rias para proteger a esp�cie.
"Se n�o pararmos de devastar milhares de hectares de terra para minera��o de carv�o e derrubar milhares de hectares de floresta para produzir peda�os de madeira, o grande planador se tornar� o pr�ximo coala", adverte Lindenmayer, se referindo � crise de extin��o enfrentada agora pelo ic�nico marsupial.
Enquanto isso, organiza��es de vida selvagem ao longo da costa leste da Austr�lia est�o aumentando seus esfor�os para salvar a esp�cie.
Em meados de 2020, a Queensland Glider Network, um bra�o da Wildlife Preservation Society de Queensland, lan�ou um projeto de monitoramento de grandes planadores no sudeste do Estado para ajudar a promover a conscientiza��o sobre a conserva��o.
Ao sul da fronteira, conservacionistas est�o fazendo campanha atualmente contra a explora��o madeireira em v�rios habitats de planadores ao norte de Nova Gales do Sul, incluindo a Floresta Estadual de Bungabbee ao norte de Casino, onde uma pesquisa recente organizada pela North East Forest Alliance (NEFA) tamb�m revelou a presen�a at� ent�o desconhecida de dois animais vulner�veis — o marsupial Potorous tridactylus e a ave Podargus ocellatus.
"A �rea j� foi desmatada, ent�o a popula��o de grandes planadores ter� um grande problema se perder o que sobrou", afirma o cofundador da NEFA, Dailan Pugh, cujo ativismo ambiental na d�cada de 1990 levou � cria��o da primeira legisla��o estadual de esp�cies da fauna amea�adas de extin��o.
Em Victoria, conservacionistas aplaudiram a cria��o de uma reserva de 96.000 hectares de floresta, em 2019, para ajudar a proteger os grandes planadores. Mas, no ano novo, cerca de metade da �rea de prote��o foi dizimada por inc�ndios florestais.
"Podemos perder outra esp�cie de planador antes mesmo de sabermos que existe", diz McGregor.
Um novo turismo noturno?
Ativos somente ap�s o anoitecer, geralmente grudados � copa das �rvores e tendendo a evitar �reas residenciais onde criaturas noturnas maiores, como gamb�s, competem por recursos, os grandes planadores podem exigir algum esfor�o para serem avistados.
Isso explica de alguma forma por que o turismo de grandes planadores (ainda) n�o decolou exatamente. Mas buscar uma oportunidade de avistar essas criaturas misteriosas pode contribuir para sua conserva��o.
A Wildlife Preservation Society de Queensland realiza passeios peri�dicos de observa��o de grandes planadores, assim como a organiza��o de conserva��o Greening Australia, sediada em Melbourne, com os custos associados destinados a apoiar v�rios programas de conserva��o.
Passeios mais regulares s�o oferecidos pela Carnarvon Gorge Eco Tours, no centro de Queensland, e a Faunagraphic Wildlife Tours, no sudeste do Estado.
Se for temporada de acasalamento (que McGregor acredita que pode variar entre as esp�cies), voc� pode ter a sorte de avistar um casal entrela�ando suas caudas.
"As esp�cies do sul t�m cores diferentes, ent�o geralmente voc� consegue esse contraste bacana se tiver um claro e uma escura enroscados juntas", conta Youngentob.
Na minha caminhada noturna, avistei bandicoots-de-nariz-comprido, pademelons, gamb�s-de orelhas-curtas, ratos-do-mato e at� uma cobra enorme.
Mas incis�es no tronco de uma �rvore feitas por um planador comedor de seiva foi o mais perto que cheguei de avistar um grande planador, que outrora era uma atra��o comum nas florestas tropicais locais.
"J� faz um bom tempo que eu n�o vejo um", lamenta Bithell.
"Mas quando o avistamos, � um al�vio saber que ainda est�o por a�."
Leia a vers�o original desta reportagem (em ingl�s) no site BBC Travel.
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