
O problema � que, para Vladimir Putin, ex-oficial da KGB na Alemanha Oriental, o colapso da antiga Uni�o Sovi�tica parece ter se transformado em um amargo ressentimento pessoal que se agravou ao longo dos anos. O fato de a Ucr�nia, antes uma pe�a-chave da Uni�o Sovi�tica, ter se afastado da Federa��o Russa foi considerado um insulto a tudo que Putin acredita.
N�o importa que a pr�pria R�ssia tenha assinado um acordo internacional aceitando as fronteiras do novo Estado da Ucr�nia. Em 2014, o presidente russo Putin encontrou um caminho para tomar a Crimeia, a mais simb�lica parcela russa na Ucr�nia, ao infiltrar soldados na pen�nsula.
Eles bloquearam a regi�o e, depois de realizarem um referendo da maioria da popula��o russa �tnica, a transformaram efetivamente em parte do Estado russo. Era contra a lei internacional, mas os Estados Unidos e a Uni�o Europeia ainda se apegavam � ideia de que era poss�vel negociar com a R�ssia de Putin.
Houve discursos cr�ticos e san��es, mas nada que fizesse o presidente Putin ou seus aliados terem s�rias d�vidas sobre o que fizeram em rela��o � Crimeia.
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A mesma coisa aconteceu quando os inimigos de Putin, ou pessoas da antiga KGB (e do sucessor FSB), considerados traidores, foram envenenados, baleados ou eliminados na Gr�-Bretanha e na Europa. Pa�ses europeus e os Estados Unidos emitiram alertas e adotaram novas san��es, mas a R�ssia de Putin estava preparada para conviver com elas.
Nos �ltimos dez anos, a R�ssia come�ou a formar um novo bloco com a China — n�o necessariamente hostil a outras pot�ncias globais, mas apoiando-se mutuamente diante das cr�ticas da comunidade internacional.

O presidente chin�s, Xi Jinping, e Putin criaram um grupo de apoio m�tuo. Agora, a China est� se recusando a condenar a R�ssia por suas a��es na Ucr�nia, e as pessoas em Taiwan, o territ�rio separatista que Xi Jinping sempre se recusou a dizer que n�o invadir�, est�o come�ando a se perguntar se elas ser�o as pr�ximas.
Ent�o, o mundo � hoje um lugar muito mais preocupante do que era h� alguns anos. Em compara��o, os velhos anos da Guerra Fria eram muito mais simples e, na maioria das vezes, as regras eram muito mais claras: se um lado invadisse o espa�o do outro, havia a amea�a sempre presente de destrui��o m�tua garantida. Isso nunca aconteceu, embora a guerra em escala global tenha chegado desconfortavelmente perto mais de uma vez.
Mas ap�s o colapso do comunismo, o velho livro de regras foi rasgado. Agora, os limites s�o t�o vagos que ningu�m sabe onde est�o as linhas vermelhas que n�o devem ser ultrapassadas.
Em retrospectiva, e est� come�ando a haver muito disso, alguns pol�ticos e acad�micos est�o dizendo que a Otan (alian�a militar liderada pelos EUA) talvez devesse ter mudado toda a sua abordagem ap�s a queda do Muro de Berlim. Ou seja, deveria ter evitado humilhar Moscou atraindo seus antigos pa�ses-sat�lites na Europa Oriental, e alinhando-os de uma forma que pareceu ser problem�tica � R�ssia de Putin.
A mera sugest�o de que a Ucr�nia poderia um dia se juntar � Otan (embora essa hip�tese sempre tenha sido considerada improv�vel) enfureceu o Kremlin e ajudou a persuadir o presidente Putin de que ele deve lidar com a Ucr�nia de uma vez por todas.

Todo mundo sabe que esta � uma pol�tica dele, e somente dele. V�rios pol�ticos russos, e at� mesmo algumas figuras militares importantes, se manifestaram de antem�o contra qualquer invas�o. Mas Putin n�o seria desviado de seu objetivo. Agora, ele tem que ter sucesso, e a R�ssia tem que sair como a vencedora clara, se sua aposta � para ganhar o jogo. Mas aventuras militares como essa s�o notoriamente capazes de dar errado.
Putin teve sucesso na Crimeia, oito anos atr�s, e sua posi��o na R�ssia foi bastante refor�ada. Talvez ele tenha sucesso novamente, atravessando as for�as armadas ucranianas, obtendo alguns ganhos militares significativos, depois se retirando rapidamente e realizando uma parada da vit�ria na R�ssia.
Isso � perfeitamente poss�vel. Mas suponhamos que isso n�o aconte�a dessa maneira. Se os soldados russos come�arem a morrer em n�mero elevado, e as san��es contra a R�ssia come�arem a surtir efeito, a pr�pria posi��o de Putin sofrer� dentro de seu pa�s.
O que ele vai fazer, ent�o? H� apenas uma resposta poss�vel, com base no que ele j� fez at� hoje: ele reprimir� qualquer cr�tica interna com ainda mais for�a do que j� fez, em nome da seguran�a nacional.
A R�ssia �, mesmo agora, uma sociedade surpreendentemente aberta em compara��o com o passado. Mas isso, com certeza, chegaria ao fim. A economia russa sofreria e a ajuda chinesa n�o compensaria a perda.
Assim, Vladimir Putin, que parece ter lan�ado seu ataque � Ucr�nia por causa de seu ressentimento de 30 anos sobre o colapso do antigo imp�rio sovi�tico, pode trazer a R�ssia de volta aos dias da Uni�o Sovi�tica. E os pa�ses europeus e os EUA, que h� tanto tempo tentam fingir que a R�ssia � apenas mais um pa�s com o qual podemos fazer neg�cios, pode descobrir que os velhos tempos voltaram com for�a total.
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