Um artigo compartilhado dezenas de vezes nas redes sociais desde o �ltimo dia 20 de dezembro afirma que a Organiza��o Mundial da Sa�de “admitiu” que os testes PCR para detectar a covid-19 n�o s�o eficazes, pois h� um alto risco de mostram resultados falsos positivos. Contudo, o alerta da OMS, que se refere aos testes RT-PCR, n�o revela uma inefic�cia, mas que os resultados sejam interpretados com base nas instru��es de uso e juntamente com o quadro cl�nico.
, assinala o t�tulo do artigo publicado no “OMS admite que os testes PCR para COVID 19 n�o s�o confi�veis”site Oriundi.net, citando um texto publicado pela Organiza��o Mundial da Sa�de em 14 de dezembro em seu portal.
Replicada no Facebook por meio de uma captura de tela ou acompanhada pelo link do site do organismo, a afirma��o desse reconhecimento por parte da OMS come�ou a se espalhar, mas de maneira enganosa.
Intitulado “Aviso da OMS para os usu�rios de IVD [diagn�sticos in vitro]”, em tradu��o livre do ingl�s, o organismo explica em seu site que o objetivo da nota � “assegurar que os usu�rios de determinadas tecnologias de teste com �cido nucleico (NAT) tenha ci�ncia de certos aspectos das instru��es de uso (IFU) para todos os produtos”.
Ao longo de seu texto, no entanto, o �rg�o n�o diz que os resultados dos testes RT-PCR teriam muitos erros ou que n�o � um m�todo de diagn�stico adequado, como viralizou nas redes sociais.
Veja a seguir a verifica��o feita pela equipe de checagem da AFP de algumas alega��es viralizadas com base neste aviso sobre um dos tipos de teste que detecta a covid-19.
1 - “O teste de PCR usado para diagnosticar covid-19 � um processo de acerto e erro com muitos falsos positivo”: Falso
Para detectar o novo coronav�rus em um indiv�duo s�o usados dois tipos de testes: o teste de sorologia e a t�cnica PCR (rea��o em cadeia de polimerase, na sigla em ingl�s).
O teste de sorologia serve para detectar se uma pessoa foi infectada no passado a partir de uma amostra sangu�nea, na qual buscam os anticorpos que o sistema imunol�gico produz para atacar e eliminar o v�rus.
A t�cnica PCR, por sua vez, � usada quando a infec��o est� em curso. Com um swab coleta-se uma amostra do nariz, da parte posterior da garganta ou da saliva de um paciente, e esta � analisada em n�vel molecular em busca da presen�a de dois genes espec�ficos do SARS-CoV-2.
“O PCR tem vantagens e desvantagens, mas o que detecta � a presen�a de genoma e isso � indubit�vel”, afirmou � equipe de checagem da AFP Juan Carballeda, pesquisador do Conselho Nacional de Pesquisas Cient�ficas e T�cnicas (Conicet) e membro da Associa��o Argentina de Virologia (SAV), em meados deste ano.
“Se h� presen�a de genoma do v�rus � porque h� presen�a do v�rus. Esse genoma pode estar dentro de uma c�lula infectada, dentro de um exossomo, ou em part�culas virais liberadas no swab usado na pessoa. Em todos esses casos, h� infec��o viral e a pessoa tem a presen�a do SARS-CoV-2”, acrescentou.
Juan Sabatt�, m�dico e doutor em Microbiologia e pesquisador do Conicet, explicou � AFP que o teste PCR “detecta sequ�ncias espec�ficas de RNA presentes no RNA do v�rus SARS-CoV-2 e ausentes no RNA humano e no RNA de outros v�rus” e assegurou que � a t�cnica “mais espec�fica de todas as t�cnicas usadas no diagn�stico m�dico”.
Sabatt� esclareceu que o teste n�o detecta exossomos, que, explicou, s�o “pequenos fragmentos celulares que usam as c�lulas para se comunicar, entre outras fun��es” e que “est�o presentes em todos os fluidos corporais”. Tamb�m enfatizou que se fosse assim, “todos os testes realizados seriam positivos”.
Carballeda tamb�m destacou a precis�o deste teste que, assinalou, � utilizado desde a d�cada de 1980 para a detec��o de v�rias doen�as e cujos inventores receberam o Pr�mio Nobel de Qu�mica em 1993. “N�o existe forma do resultado dar positivo sem existir genoma do v�rus presente na amostra”, assinalou.
De acordo com a Rede Argentina P�blica de Avalia��o de Tecnologias Sanit�ria, composta por universidades e minist�rios da Sa�de de diferentes prov�ncias do pa�s, o PCR “� o m�todo de primeira linha para diagnosticar a covid-19 recomendado pela OMS” e “conta com uma alta sensibilidade e especificidade”.

2 - “Expondo a loucura de confiar em um teste que at� o inventor, Professor Kary B. Mullis disse que nunca foi projetado para diagnosticar doen�as”: Falso
A afirma��o de que Kary B. Mullis negou a efetividade dos testes PCR para detectar doen�as infecciosas tem circulado desde o in�cio da pandemia de covid-19 e j� foi verificada pela AFP, neste texto em espanhol.
Mullis, que foi uma figura pol�mica no mundo cient�fico, negava as evid�ncias do aquecimento global e que o HIV fosse a causa da aids, o que o teria levado a desestimular o uso do PCR para esse v�rus em particular, n�o outros.
A equipe de checagem da AFP n�o encontrou uma declara��o de Mullis negando a utilidade de seu teste para detectar doen�as infecciosas em geral. Uma busca no Google pelas palavras-chave em ingl�s “Mullis + PCR + infectious diseases” tampouco mostrou resultados da suposta declara��o. Mas levou a um artigo com data de dezembro de 1996 se referindo ao HIV e � aids.
No texto, o autor, John Lauritsen (n�o Mullis), questiona a precis�o dos testes PCR para diagnosticar a aids, pois “detectam sequ�ncias gen�ticas de um v�rus, mas n�o o v�rus em si”. O artigo tamb�m cita Mullis, que teria dito: “O PCR quantitativo � um oximoro”, sem especificar a data e o contexto dessa declara��o. De qualquer maneira, nessa declara��o Mullis se referia � natureza de seu teste PCR, que n�o detecta a quantidade de v�rus em uma amostra, mas apenas sua presen�a.
O artigo, da d�cada de 1990, assinala que o teste PCR s� poderia “detectar as prote�nas que se acredita, em alguns casos erroneamente, serem exclusivas do HIV”. Diferentemente do novo coronav�rus, cujo mapa do genoma estava dispon�vel poucos meses ap�s ter sido detectado em Wuhan, na China, o genoma do v�rus da aids n�o havia sido decifrado at� 2009.
O PCR quantitativo (qPCR), por sua vez, foi introduzido pelo doutor em Biologia Molecular Russell Higuchi e sua equipe de pesquisa em 1992. Como explicado no site da Roche, a empresa que desenvolve e comercializa esses testes, diferentemente do PCR tradicional, o qPCR pode determinar “quanto de uma sequ�ncia espec�fica de DNA est� presente em uma amostra, ao inv�s de simplesmente identificar sua presen�a ou aus�ncia”.
3 - “Resultados positivos provavelmente indicam ‘doen�as respirat�rias comuns, como o resfriado comum’”: Enganoso
Um dos principais argumentos das pessoas que afirmam que os testes PCR d�o falsos positivos � que eles detectam genomas de outros v�rus e bact�rias. Mas especialistas consultados pela AFP em diferentes pa�ses e ocasi�es concordam que isso n�o procede, pois o PCR usado nos testes de covid-19 foi elaborado especificamente para detectar o v�rus causador desta doen�a.
Mar�a Victoria S�nchez, pesquisadora do Laborat�rio de Imunologia e Desenvolvimento de Vacinas do Instituto de Medicina e Biologia Experimental de Cuyo, unidade executora do Conselho Nacional de Pesquisa e T�cnica Cient�fica da Argentina (IMBECU-CCT-CONICET), afirmou � AFP este m�s que “a t�cnica de PCR � muito espec�fica e sens�vel” j� que detecta e amplifica “genes espec�ficos do SARS-CoV-2, n�o de outros v�rus”.
Segundo C�dric Carbonneil, chefe do servi�o de avalia��o de atos profissionais da autoridade de sa�de m�xima da Fran�a (HAS), a capacidade de um teste PCR de identificar corretamente um v�rus concreto � de 99%. Por isso, os “falsos positivos” s�o muito raros, indicou.
Vincent Enouf, do Instituto Pasteur da Fran�a tamb�m explicou o processo seguido para comprovar que o teste PCR � espec�fico: “Coletamos outras amostras, que se sabe que cont�m outros v�rus, como o da influenza ou o rinov�rus, e verificamos se o nosso PCR n�o detecta outros v�rus respirat�rios, mas apenas o [que provoca a] covid-19”.

Consultado pela AFP, Kenneth Witwer, professor de Patologia e Neurologia Molecular e Comparativa na Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins (JHU), nos Estados Unidos, assegurou que “n�o � verdade que os testes de SARS-CoV-2 detectem v�rus de resfriado comum”.
Witwer detalhou que essa t�cnica “amplifica uma breve sequ�ncia de �cido nucleico (o ‘amplicon’) utilizando dois ‘primers’ [iniciadores, uma sequ�ncia curta de DNA de cadeia simples] de �cido nucleico, e a sequ�ncia detecta muitas vezes uma terceira sequ�ncia de �cido nucleico, uma ‘sonda’. Quando utilizam essas tr�s sequ�ncias separadas para o teste, existe a possibilidade de uma especificidade extremamente alta”.
O aviso da OMS
O artigo publicado pela Organiza��o Mundial da Sa�de em seu site, a partir do qual surgiram as afirma��es viralizadas, indicava que o �rg�o recebeu informa��es de usu�rios do teste sobre o risco de resultados falsos para o SARS-CoV-2 submeter as amostras usando reagentes para RT-PCR em sistemas abertos.
O organismo pede, ent�o, que os provedores de atendimento de sa�de levem em conta, al�m dos testes, os sinais e sintomas cl�nicos, e a confirma��o de contato com infectados, por exemplo.
Al�m disso, estimula que os usu�rios de reagentes de teste RT-PCR leiam as instru��es de uso para determinar se ser� “necess�rio fazer ajustes manuais do limite de positividade do PCR a fim de levar em conta o ru�do de fundo que pode fazer que uma amostra com um valor alto de ciclo limite seja interpretada como um valor positivo”.
E finaliza indicando que os produtos s�o periodicamente revisados, motivo pelo qual as instru��es podem sofrer altera��es, j� que no in�cio da pandemia de covid-19 os produtos de diagn�stico in vitro foram elaborados e validados rapidamente. Assim, “n�o � inesperado que [...] necessitem de revis�o a partir da informa��o fornecida pelos usu�rios ap�s a introdu��o em escala”.
Em resumo, � enganoso afirmar que a Organiza��o Mundial da Sa�de “admitiu” que os testes PCR para detectar a covid-19 n�o s�o eficazes pelo fato de haver um alto risco de mostram resultados falsos positivos. Al�m do texto publicado pelo organismo n�o alegar isso, especialistas consultados pela AFP em diferentes circunst�ncias demonstraram que esse teste tem um alto n�vel de sensibilidade e especificidade para detectar o SARS-CoV-2.
Esta verifica��o foi realizada com base em informa��es cient�ficas e oficiais sobre o novo coronav�rus dispon�veis na data desta publica��o.